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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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terça-feira, 21 de agosto de 2012

Projeto de Norberto/Gean proibe circulação de cavalos no Município


As associações de cavaleiros e amazonas da Ilha de Santa Catarina precisam estar atentas para derrubar um projeto (1205/2012, protocolado na Câmara em 01/08/2012) assinado por NORBERTO STROICH FILHO, que dizem ser de autoria de GEAN LOUREIRO, com o qual pretendem impedir uma das atividades preferidas dos ilhéus, as cavalgadas. Consta que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara teria dado parecer contrário ao projeto, circunstância que ainda hoje estarei conferindo, pessoalmente.

O art. 2º, do aludido projeto, tem o seguinte teor: Fica proibida a circulação de veículos de tração animal e de animais, montados ou não, em vias públicas pavimentadas do Município de Florianópolis. excluindo-se aqueles utilizados pelo Exército brasileiro e pela Polícia Militar, em qualquer situação.


Ou seja, se aprovado o projeto sob comento, estará completamente vetada a circulação de veículos como carroças, charretes, aranhas, carruagens e assemelhadas por todas as ruas pavimentadas (asfalto, lajota, paralelepípedos ou similares). Como praticamente todas as vias de circulação da Ilha estão pavimentadas, os que se utilizam de tais veículos, até como meio de sobrevivência, estarão ferrados.

Se existem alguns indivíduos e famílias que se valem dos animais, de forma inadequada, para o transporte de material reciclável (papelão, metais, etc...), atividade que implica grandes sacrifícios para os cavalos e éguas, mormente quando a coleta é feita em perímetro urbano, o certo é que alguns dos nossos distritos ainda são considerados rurais (Ratones e Ribeirão da Ilha, para exemplificar) e que os animais do gênero são parceiros estimados e indispensáveis no lazer de incontáveis pessoas que os tratam dignamente.

A Ilha possui trilhas aprazíveis, em cuja exploração os equinos são parceiros indispensáveis e pretender coibir que cavaleiros circulem por algumas vias pavimentadas constitui rematado desatino, que fere o direito ao lazer, constitucionalmente assegurado. Ademais, em Ratones, assim como no Rio Vermelho, existem criatórios de equinos de passeio, da raça Mangalarga Marchador, também conhecido como "mineiro" e tais criatórios geram empregos e sustentam famílias.

É certo que as cavalgadas envolvendo grandes trechos asfaltados ou pavimentados de outra maneira constitui falta de bom-senso, ante os riscos que envolvem, seja para os cavaleiros, seja para os animais e para outras pessoas que também possuem direito de circular a pé, em automóveis, em motocicletas, em bicicletas, etc...É preciso, portanto, que os organizadores de tais eventos, previamente, busquem apoio dos órgãos policiais e da Guarda Municipal para que se providencie a necessária vigilância e organização, nas travessias e trechos de grande movimento, de modo a se conseguir a convivência pacífica dos demais transeuntes com os partícipes das cavalgadas.


É certo também que alguns "cabeças de bagre" engordam demais seus animais, tornando-os obesos e depois os utilizam em cavalgadas esporádicas e longas, causando-lhes danos como laminite (aguamento), e até, eventualmente, a morte, mas tais despreparados são poucos e por eles não deve pagar a maioria, perdendo sua diversão preferida. Às associações e aos que gostam de fato dos animais compete fazer um trabalho de conscientização e até denunciar eventuais maus tratos. Que paguem os verdadeiros e poucos responsáveis pelos excessos, não a totalidade das pessoas que interagem com os equinos.


Cumpre salientar que os ilhéus sempre foram amantes dos cavalos de montaria, além de utilizá-los como força de tração e de transporte com seirões (espécies de balaios interligados por uma estrutura de cipós, que eram apoiados sobre uma peça de madeira denominada cangalha e esta colocada no lombo do animal *), senão vejamos alguns registros históricos:


- Mapa de Sebastião Caboto (ou Gaboto), datado de 1527, reproduzido na obra de Nereu do Vale Pereira – Santa Catarina/A Ilha/500 anos/Origem de sua denominação e outros feitos – Fundação Cultural Açorianista/Fpolis-SC/2004, p. 63, mostra um cavalo, como que a afirmar que os eqüídeos eram conhecidos e utilizados em nossa região já naquela época.

- Na revista Resenha Eclesiástica (Órgão oficial da Diocese de Florianópolis), ano II, nº 12 (1902), p. 193, lê-se, entre Apontamentos históricos sobre a Diocese de Florianópolis, um relato sobre uma visita do espanhol ALVAR NUÑES CABEÇA DE VACA, em 1.540, à nossa Ilha, nos seguintes termos: (...) Apenas o governador chegou com sua esquadra à Ilha de Santa Catarina, mandou a gente desembarcar, assim como os vinte e seis cavalos que tinham sobrevivido de quarenta e seis embarcados na Hespanha (...) A mesma Resenha, continuando a história do Diocese, agora no seu nº 1, do ano III (03/1913), às ps. 13, revela a saída de tais animais da Ilha. Não há notícias se por aqui deixaram alguma cria. É pouco provável, pois, à época, não se apreciava muito montar em éguas e os animais trazidos certamente não eram destinados a tirar cria, sendo mais plausível que se tratassem de castrados, uma vez conhecidos os problemas representados pelo transporte de inteiros e éguas, mormente em navios, em demoradas viagens como as de então. 


O festejado historiador VIRGÍLIO VÁRZEA, na obra A canção das gaivotas Edit. Lunardelli/Fpolis/1985, ps. 86 e 87: 
- (...) Homens a cavalo, vindos de longe, das Aranhas, do Inglês e das Capivaras, passavam por elas, dando-lhes “boas tardes”, trotando (...) 
- (...) Diziam querer envelhecer e morrer, serenos e cheios de paz, em um sítio como aquele, com uma rede de pesca, uma roça, um cavalo de montaria, uma junta de bois e um carro, numa casinha branca, com o engenho de farinha ao lado, entre pomares, ouvindo os sabiás cantar nas laranjeiras em flor. (...) 

Reportagem do viajante inglês JAMES GEORGE SEMPLE LISLE, que por aqui passou, datada de 1799, transcrita na obra Ilha de Santa Catarina/Relatos de viajantes estrangeiros - Editora Lunardelli e Editora da UFSC/1990, p. 125, revela que até os íncolas (**) faziam uso intenso dos equinos: 

- (...) O uniforme da milícia da ilha, tanto para a infantaria, como para a cavalaria, é azul-claro; são homens vigorosos e de boa compleição, e os cavalos são ainda melhores que os do Rio Grande. Isso se deve ao fato de que eles comem milho, o que não acontece em Rio Grande, exceto com os cavalos que são domados e acostumados a esse tipo de alimento. Mas a maior parte deles, que são vistos em todo lugar, são animais de pouco garbo. Os índios, que são muito hábeis em apanhá-los, cavalgam de maneira muito singular: suas selas são ásperas e os encilhamentos de couro; os freios são muito semelhantes aos usados pelos Mouros, Turcos e Tártaros, circunstância que muito me impressionou, já que não existe nenhuma relação entre esses países e os indígenas.

Os estribos, no entanto, são completamente diferentes e verdadeiramente únicos em sua concepção: consistem de um pedaço de madeira de forma semi-circular, com cerca de uma polegada de diâmetro, com um orifício em cada extremidade para receber tiras de couro. O índio põe seu dedo grande nessa peça de madeira curva, que é exatamente da medida para isso, não tocando o estribo com nenhuma outra parte do seu pé. De fato, eles cavalgam (contrariamente ao que acontece com os Mouros e os outros) com os couros dos estribos muito longos, de forma a exigir que a perna esteja totalmente distendida para que eles possam firmar seus dedos grandes nos orifícios (...) 


Excertos do Relatório do Interventor Federal Nereu Ramos, enviado ao presidente da República, datado de 1938, p. 106:
- Para exercícios de equitação dos oficiais, dos elementos do pelotão de cavalaria e dos alunos do curso de sargentos foi construído, no fundo do quartel, um picadeiro de 40 x 15 metros. Deu-lhe o comandante acertadamente o nome de Bartolomeu Costa, modesto e bravo soldado morto em combate por ocasião do movimento revolucionário de 32. 
O quartel a que se refere, certamente, é o da Polícia Militar de SC (na Praça Pereira Oliveira – frente – e Rua Pres. Nereu Ramos – fundos) e tal picadeiro foi utilizado nos primeiros movimentos (treinamentos e competições) de hispismo clássico aqui na Ilha. 

Como se pode deduzir dos trechos transcritos e considerações minhas, a convivência dos ilhéus com os equinos é antiga e sempre foi prazerosa e útil, não sendo possível que um cidadão vindo de Joaçaba, sem afinidade com os nossos costumes e preferências, queira ditar regras inaceitáveis por aqui, as quais poderão tolher um dos esportes preferidos dos nativos e adventícios.

Mas, se o projeto é mesmo do GEAN LOUREIRO, segundo disse o próprio Norberto, por telefone, a um amigo meu, o erro é ainda mais grave, porque o candidato a Prefeito é daqui da região e tem a obrigação de conhecer melhor nossos costumes.

Portanto, cavaleiros e cavaleiras, cumpre "botar pressão" em cima da Câmara para que não ocorra a supressão de mais um elemento da cultura local, de vez que, por conta do interesse turístico já forçaram a extinção da pesca artesanal, com o desparecimento dos ranchos, das tradicionais canoas de voga e do batelão, das redes de cerco, dos espinhéis, dentre outras coisas das quais os pescadores se utilizavam. Ou, dentro em breve, a nossa "cultura" estará reduzida ao boi-de-mamão, à renda de bilro e às Igrejas católicas preservadas com dinheiro público. Ou os amantes dos cavalos serão forçados a participar dos chamados CTGs ou a se associarem à Sociedade Hípica Catarinense, os primeiros voltados para a tradição gaucha (laço, paleteada, gineteada) e a segunda edicada a modalidades outras  (salto, adestramento, volteio, por exemplo), igualmente interessantes, mas de custo muito alto, insuportável para a grande maioria dos donos de equinos.
E por falar na brincadeira boi-de-mamão, dentre as figuras que o compõem, não falta o cavalinho com o laçador montado nele (Lá vai, lá vai, lá vai o meu cavalinho..., cantam os figurantes), a atestar a presença dos equinos no nosso folclore, que retrata a importância do animal, na vida real, na lida com o gado vacum.

Para arrematar: por que, ao invés de um projeto para reprimir, não se dedicam os vereadores a um projeto para incrementar a atividade equestre na Ilha de SC, como alternativa de lazer e diversão nos períodos entre as temporadas de verão?
Há alguns anos encaminhei a diversos vereadores da Capital um esboço de projeto (que denominei de Projeto Pesgasus) sugerindo fosse implantada uma estrutura no Parque do Rio Vermelho, voltada para a prática de todas as modalidades de equitação, incluindo tal projeto um centro de formação de tratadores, ferradores, treinadores, ginetes, técnicos em veterinária, etc..., com aproveitamento de presos de baixa periculosidade na manutenção do complexo. Infelizmente não consegui o necessário apoio e a ideia não vingou. Mas, ainda há tempo de desenvolvê-la e implementá-la.

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* -  A bico de pena, FOSSARI registra a presença do cavalo com seirão, na antiga Florianópolis - Ver GLAUCO CARNEIRO - Roteiro da Ilha Encantada - Museu de Arte Moderna de SP/1987, p. 129.

- O termo aparece no Diário de Álvaro Velho, datado de 1497, como seirão (no plural  seirões) - EDUARDO BUENO - O descobrimento das Indias/O diário de viagem de Vasco da Gama -  Editora Objetiva/1998, pág. 170.

** - Silvícolas, indígenas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Tá certo cavalo detona tudo......e os cavalheiros costuma jogar todo o lixo pelas vias públicas

I.A.S. disse...

Os donos de automóveis costumam jogar muito mais lixo nas vias públicas, você não acha, anônimo?
Ignorantes existem em todas as classes sociais, usem cavalos, automóveis ou helicópteros.
A sua justificativa é muito fraca, ao meu modo de entender.
Mas respeito a sua opinião e agradeço o comentário.