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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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sexta-feira, 13 de março de 2015

Templo religioso e poluição sonora - Decisão do TJ/SC

Apelação Cível n. 2014.028734-4, de Criciúma
Relator: Des. Sérgio Roberto Baasch Luz
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO SONORA. TEMPLO RELIGIOSO. REALIZAÇÃO DE CULTOS QUE EXTRAPOLAM OS NÍVEIS DE RUÍDO LEGALMENTE PERMITIDOS. LIBERDADE DE CULTO E DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. JUÍZO DE PONDERAÇÃO. PREVALÊNCIA, NO CASO, DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE SADIO E EQUILIBRADO. POLUIÇÃO SONORA. APLICAÇÃO DAS NORMAS MAIS RESTRITIVAS. PRECEDENTE.
"A garantia constitucional de liberdade de culto religioso não representa um alvará para que as entidades religiosas atuem em desconformidade com a lei. Deverão elas se ajustar às disposições do Código de Posturas do Município e compatibilizar as suas atividades, de modo a não desrespeitar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que também constitui garantia prevista na Lei Maior (CF, art. 225)". (Agravo de Instrumento n. 2009.003980-2, de Blumenau, j. 1º.12.2009)
"A Resolução do CONAMA n. 01, de 8.3.1990, e as normas da ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas, em se tratando de controle de poluição sonora, são tidas como normas gerais ditadas pela União e de observância obrigatória pelos demais entes federados". (ADI n. 2010.035165-4, de Caçador, rel. Desembargador Irineu João da Silva, j. 18.5.2011)
DANO MORAL AMBIENTAL. POSSIBILIDADE. REQUISITOS QUE AUTORIZAM A INDENIZAÇÃO NÃO VERIFICADOS.
RECURSOS DESPROVIDOS.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2014.028734-4, da comarca de Criciúma (2ª Vara da Fazenda), em que é apte/apdo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, e apdo/apte Igreja Cristã Maranata Presbitério Espírito Santense:
A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, negar provimento aos recursos. Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, realizado no dia 24 de fevereiro de 2015, os Exmos. Srs. Des. João Henrique Blasi, que o presidiu, e Des. Cid Goulart. Funcionou como representante do Ministério Público o Dr. Plínio Cesar Moreira.
Florianópolis, 4 de março de 2015.
Sérgio Roberto Baasch Luz
RELATOR

RELATÓRIO
Trata-se de apelações cíveis interpostas, respectivamente, pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina e pela Igreja Cristã Maranata Presbitério Santense contra a sentença que, na ação civil pública ajuizada pelo ente ministerial, nestes termos decidiu:
Ex positis, confirmando os termos da liminar, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para determinar que a Igreja Cristã Maranata Presbitério Espírito Santense se abstenha de realizar cultos, ensaios de coral, etc., que estejam em desacordo com os limites máximos estabelecidos pela legislação de regência (Resolução CONAMA n° 001/90 c/c NBR 10.151), sob pena de multa diária que fixo, desde já, em R$1.000,00 (um mil reais), na hipótese de descumprimento, a ser revertida em prol do Fundo para Reconstituição de Bens Lesados.
Sem custas processuais ou honorários advocatícios, consoante o disposto no artigo 128, § 5°, inciso II, alínea "a", da Constituição Federal. (fls. 281-282)
A irresignação do Ministério Público tange a afirmar a ocorrência de dano moral coletivo, cujo importe reparatório deve ser fixado em 300 (trezentos) salários mínimos. (fls. 283-297)
Por sua vez, a Igreja Cristã Maranata alega que a decisão impugnada viola o direito constitucional ao livre exercício dos cultos e dos templos religiosos, garantia prevista no art. 5º, inciso VI, da Constituição Federal, prejudicando a prestação da assistência religiosa. Além disso, afirma que os cultos são realizados diariamente às 19h30, com duração média de uma hora, que o período dos cânticos não ultrapassa 15 minutos, e que os sons emitidos respeitam os níveis estabelecidos pela Lei Municipal n. 5.373/2009, a qual deve ser aplicada ao caso, em observância ao princípio da legalidade. Salienta, ademais, que suas atividades são realizadas antes do período noturno, compreendido entre 22h e 7h, sendo que a emissão de ruídos deve ser aferida de acordo com os padrões estabelecidos para o período diurno. Por fim, invoca o princípio da proporcionalidade para dizer que a multa diária no valor de R$1.000,00 (mil reais), em caso de descumprimento, fere o direito à propriedade privada e o princípio da razoabilidade, além de inviabilizar o desenvolvimento das suas atividades. (fls. 300-318)
Contrarrazões às fls. 322-340 e 343-348.
Instada a se manifestar, a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira, opinou pelo desprovimento dos recursos.
É o voto.
VOTO
Cuida-se de ação civil pública proposta pelo Ministério Público em desfavor da Igreja Cristã Maranata, com o fito de impedir que a demandada continue a desenvolver suas atividades em descompasso com os ditames legais atinentes à emissão de ruídos.
Os documentos constantes dos autos evidenciam que a Igreja apelante, nos momentos em que realiza os seus cultos, não está respeitando o limite sonoro estabelecido pela legislação, provocando assim, poluição sonora.
Para melhor elucidação, valho-me dos bem lançados argumentos pelo magistrado de piso que, com notória objetividade e clareza, analisou as provas coligidas ao caderno processual:
O cerne da questão, portanto, consiste em verificar se a Igreja Cristã Maranata Presbitério Espírito Santense estaria emitindo ruídos acima do permitido, agredindo o meio ambiente e a população circunvizinha; ou seja, faz-se mister comprovar se o barulho emitido pela ré durante o desempenho de suas atividades configura poluição sonora.
De acordo com a Resolução do CONAMA n. 001/90, combinada com a Norma Brasileira 10.151, os limites máximos para a região em que se encontra a ré, área considerada pelo zoneamento urbano como Zona Central (ZR 2-16) é de 60dB para o período diurno e 55 dB para o período noturno.
Conforme diversos Relatórios de Vistoria e Fiscalização da FAMCRI - Fundação do Meio Ambiente de Criciúma - (n° 0023/11, n° 0044/11, n° 003/12 e 008/12), realizados no período de maio de 2011 a março de 2012, restou constatado que, de fato, a Igreja Cristã Maranata Presbitério Espírito Santense emitia ruídos muito superiores aos previstos na legislação para o local em que se situa, isto é, em zoneamento urbano central (fls. 31/34, 75/78, 99/102 e 108/111).
Isso porque, embora tenha sido arbitrado um limite de 55dB para o período noturno e 60dB para o período diurno no local em que a Igreja está situada, restou demonstrado que os cultos e ensaios religiosos da demandada, à época, chegaram a atingir, durante o período noturno, o patamar de65,4dB, 70,1dB, 76,5dB e 76,0dB (fls. 32, 76, 100 e 109).
Tal constatação, pelo que se percebe, não configurou fato isolado, porquanto a mesma situação de irregularidade quanto à produção de ruídos em desacordo com a legislação foi verificada em quatro ocasiões antes da propositura desta demanda.
Durante o trâmite processual, a requerida informou ter tomado providências para efetuar o isolamento acústico do local, bem como determinou que os cultos fossem realizados sem o uso de instrumentos musicais elétricos e de percussão (fl. 244).
Em que pese as providências informadas, verifica-se que o problema não foi solucionado, haja vista o contido nos Relatórios de Vistoria e Fiscalização n° 032/12 e nº 003/13, realizados com base em vistorias efetuadas nos dias 21-10-2012, 8-11-2012 e 24-2-2013, ou seja, posteriormente à concessão da liminar, no qual restou demonstrado que a atividade religiosa da demandada chegou a atingir, durante o período da noite, os patamares de 72,4dB, 60,7dB e 73,8dB (fl. 253 e 264).
Os citados relatórios informam, inclusive, que a demandada não efetuou melhorias suficientes (isolamento acústico) para reduzir a emissão de sons e ruídos para a parte externa do estabelecimento (fls. 254 e 265).
Bem se vê, portanto, que a Igreja Cristã Maranata Presbitério Espírito Santense descumpriu os limites de ruído fixados pela legislação de regência, causando poluição sonora aos moradores do entorno de suas dependências. (fls. 278-280)
Calha frisar que, em se tratando de níveis relativos ao controle da poluição, a discussão a respeito da aplicabilidade de norma local em detrimento das normas editadas pelo CONAMA já foi objeto de ação julgada pelo Órgão Especial desta egrégia Corte, em voto da relatoria do saudoso Desembargador Irineu João da Silva, na ADI n. 2010.035165-4, que, a propósito, asseverou:
A Resolução do CONAMA n. 01, de 8.3.1990, e as normas da ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas, em se tratando de controle de poluição sonora, são tidas como normas gerais ditadas pela União e de observância obrigatória pelos demais entes federados.
Surge, então, o embate: a Constituição Federal, em seu art. 225, garante a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; da mesma forma, na Carta Política é assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e a proteção aos templos (art. 5º, VI).
É sabido que inexiste hierarquia entre garantias constitucionais, portanto, quando há conflito entre elas, cabe ao magistrado uma solução de equilíbrio.
Do escólio de Luís Roberto Barroso extrai-se ponderosos ensinamentos a respeito dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade:
I. A interpretação constitucional tradicional assenta-se em um modelo de regras, aplicáveis mediante subsunção, cabendo ao intérprete o papel de revelar o sentido das normas e fazê-las incidir no caso concreto. Os juízos que formula são de fato, e não de valor. Por tal razão, não lhe toca função criativa do Direito, mas apenas uma atividade de conhecimento técnico. Esta perspectiva convencional ainda continua de grande valia na solução de boa parte dos problemas jurídicos, mas nem sempre é suficiente para lidar com as questões constitucionais, notadamente a colisão de direitos fundamentais.
II. A nova interpretação constitucional assenta-se em um modelo de princípios, aplicáveis mediante ponderação, cabendo ao intérprete proceder à interação entre o fato e norma e realizar escolhas fundamentadas, dentro das possibilidades e limites oferecidos pelo sistema jurídico, visando à solução justa para o caso concreto. Nessa perspectiva pós-positivista do Direito, são idéias essenciais a normatividade dos princípios, a ponderação de valores e a teoria da argumentação.
[...]
A ponderação de valores, interesses, bens ou normas consiste em uma técnica de decisão jurídica utilizável nos casos difíceis, que envolvem a aplicação de princípios (ou, excepcionalmente, de regras) que se encontram em linha de colisão, apontando soluções diversas e contraditórias para a questão. (BARROSO, Luís Roberto (org). O Começo da História. A nova interpretação constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. inA Nova Interpretação Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 375/376)
Destarte, num juízo de ponderação, no enfoque do caso concreto, creio que o nó górdio da questão foi desatado com maestria pelo eminente Desembargador Luiz Cézar Medeiros que, em caso semelhante, apregoou: "A garantia constitucional de liberdade de culto religioso não representa um alvará para que as entidades religiosas atuem em desconformidade com a lei. Deverão elas se ajustar às disposições do Código de Posturas do Município e compatibilizar as suas atividades, de modo a não desrespeitar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que também constitui garantia prevista na Lei Maior (CF, art. 225)". (Agravo de Instrumento n. 2009.003980-2, de Blumenau, j. 1º.12.2009)
A título de reforço argumentativo, vale transcrever a reflexão do preclaro Ministro Herman Benjamin a respeito dos malefícios da poluição sonora e da importância do direito ao silêncio:
[...] 3. A poluição sonora, mesmo em área urbana, mostra-se tão nefasta aos seres humanos e ao meio ambiente como outras atividades que atingem a "sadia qualidade de vida, referida no art. 225, caput, da Constituição Federal.
4. O direito ao silêncio é uma das manifestações jurídicas mais atuais da pós-modernidade e da vida em sociedade, inclusive nos grandes centros urbanos.
5. O fato de as cidades, em todo o mundo, serem associados à ubiqüidade de ruídos de toda a ordem e de vivermos no país do carnaval e de inumeráveis manifestações musicais não retira de cada brasileiro o direito de descansar e dormir, duas das expressões do direito ao silêncio, que encontram justificativa não apenas ética, mas sobretudo fisiológica [...]" (REsp. n. 1051306/MG, j. 16.10.2008).
Este colendo Tribunal, em casos análogos, tem decidido:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO COMINATÓRIA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - ATIVIDADES RELIGIOSAS - SOM MECÂNICO EM ALTA POTÊNCIA DURANTE OS CULTOS - PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO ALHEIO - PROVA PERICIAL - EXCESSO DE RUÍDO - LIMITE LEGAL ULTRAPASSADO - POLUIÇÃO SONORA CONFIGURADA - MAU USO DA PROPRIEDADE - EXEGESE DO ART. 554 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 - REALIZAÇÃO DE OBRAS DE ISOLAMENTO ACÚSTICO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO.
Comprovada a emissão de som mecânico de alta potência, acima dos limites legais, durante a realização de atividades religiosas no interior de seu templo, impõe-se à Igreja a edificação de obras de isolamento acústico, a fim evitar que os ruídos continuem perturbando o sossego dos moradores das propriedades vizinhas. (Apelação Cível n. 2004.022121-5, de Araranguá, rel. Des. Wilson Augusto do Nascimento, j. 1º.7.2005)
Ainda:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. LEGITIMIDADE.
1. "O Ministério Público detém legitimidade para propor ação civil pública em defesa do meio ambiente, da vida e da saúde dos munícipes, inclusive o individual homogêneo, com repercussão no interesse coletivo" (TJSC, Apelação Cível n. 2007.016732-5, da Capital, rel. Des. Sônia Maria Schmitz, j. 27-04-2010).
POLUIÇÃO SONORA PROMOVIDA EM CULTOS RELIGIOSOS. DIREITO AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO. LIMINAR DEFERIDA PARCIALMENTE PARA QUE SEJA PROVIDENCIADA A CERTIFICAÇÃO DE TRATAMENTO ACÚSTICO E ALVARÁ DE LICENCIAMENTO JUNTO AOS ÓRGÃOS COMPETENTES. PRETENSÃO AO EFEITO SUSPENSIVO DO REFERIDO ATO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO. AGRAVO DESPROVIDO.
2. "A garantia constitucional de liberdade de culto religioso não representa um alvará para que as entidades religiosas atuem em desconformidade com a lei. Deverão elas se ajustar às disposições do Código de Posturas do Município e compatibilizar as suas atividades, de modo a não desrespeitar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que também constitui garantia prevista na Lei Maior (CF, art. 225). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2009.003980-2, de Blumenau, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 1º-12-2009). (Agravo de Instrumento n. 2011.082452-1, de Biguaçu, rel. Des. José Volpato de Souza, j. 22.8.2013)
Por fim, quanto à fixação de multa para o caso de descumprimento da decisão, fundada no art. 461, § 4º, do Código de Processo Civil, importa reconhecer que tanto a doutrina quanto a jurisprudência entendem que ela deve ser suficiente a estimular o cumprimento da obrigação fixada pelo juízo.
Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery comentam:
§ 4º: 14. Imposição de multa. Deve ser imposta multa, de ofício ou a requerimento da parte. O valor deve ser significativamente alto, justamente porque tem natureza inibitória. O juiz não deve ficar com receio de fixar o valor em quantia alta, pensando no pagamento. O objetivo das astreintes não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas obrigá-lo a cumprir a obrigação na forma específica. A multa é apenas inibitória. Deve ser alta para que o devedor desista de seu intento de não cumprir a obrigação específica. Vale dizer, o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o alto valor da multa fixada pelo juiz (Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 7. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 782/783).
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça também segue no sentido de que a multa deve ser fixada em patamar razoável a estimular o cumprimento da decisão, confira-se:
[...] 2. A função das astreintes é vencer a obstinação do devedor ao cumprimento da obrigação e incide a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância. [...]. (REsp n. 775.233, Rel. Min. Luiz Fux, j. 20.6.06)
A multa diária fixada pelo togado a quo em R$1.000,00 (mil reais), mostra-se adequada a estimular o adimplemento a obrigação de não fazer imposta à ré/apelante, sem que importe violação ao direito de propriedade e tampouco ao princípio da razoabilidade. Vale dizer, ainda, que o valor fixado na presente hipótese, é inferior aquele fixado pelo Desembargador Luiz Cézar Medeiros no Agravo de Instrumento n. 2009.003980-2, julgado em 1º.12.2009.
Não é demasiado realçar que a multa só terá incidência em caso de descumprimento, ou seja, se a demandada der cumprimento a decisão judicial não sofrerá tal ônus.
Por fim, o Ministério Público pugna pela reforma da sentença, com o fim de ver a apelada condenada ao pagamento de indenização a título de dano moral ambiental.
É cediço que o mandamento contido no § 3º do art. 225 da Constituição Federal prescreve que, "as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados."
Aplicável ao caso, ainda, os arts. 4º, inciso VII, e 14, § 1º, da Lei n. 6.938/81, os quais preceituam:
"Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:
(...)
VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos."
Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:
(...)
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente."
A Lei da Ação Civil Pública, após a alteração introduzida pela Lei n. 8.884/94, de igual forma possibilitou a responsabilização tanto moral quanto patrimonial por danos causados ao meio ambiente, in verbis:
"Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:
l - ao meio-ambiente;
(...)"
Conquanto haja farta legislação prevendo a responsabilização civil dos agentes que pratiquem ilícitos contra o meio ambiente, existem algumas divergências doutrinárias a respeito da possibilidade de se responsabilizar os transgressores quando a indenizabilidade diz com que o dano moral ambiental.
Segundo Rui Stocco falar em dano moral ambiental:
"É desvirtuar o objetivo da Carta Magna e tangenciar os princípios que informam a responsabilidade civil, pois o que se resguarda é o meio ambiente e não o dano causado à pessoa, individual ou coletivamente. Estes, caso sofram prejuízos, por danos pessoais (físicos) ou materiais (em seus bens), terão direito de ação para obter a reparação por direito próprio, mas não podem beneficiar-se do resultado alcançado pelo Ministério Público ou pelas entidades legitimadas a ingressar com ações civis públicas para a proteção, salvo quando a ação tenha natureza diversa, como a proteção do consumidor ou qualquer outro interesse difuso ou coletivo que cause dano de per si e possa ser individualizado e quantificado posteriormente." (Dano moral ambiental. Repertório IOB de Jurisprudência, n. 7, p. 147)
De outra banda, oriundo da corrente que defende a possibilidade de responsabilização pelo dano extrapatrimonial ambiental, o professor José Rubens Morato Leite acentua:
"No contexto brasileiro, como já visto, há fundamento legal para este dano extrapatrimonial difuso ligado à personalidade, que tem seu escopo na proteção de um interesse comum de todos, indivisíveis e ligados por uma premissa de solidariedade. Com efeito, os direitos da personalidade evoluem e já podem ser visualizados e inseridos como valores ambientais de caráter difuso, posto que atingem direitos essenciais ao desenvolvimento de toda a coletividade. Sendo o direito ao ambiente um direito fundamental, conforme apreciado, pode ser também qualificado como direito da personalidade de caráter difuso, que comporta dano extrapatrimonial". (Dano extrapatrimonial ou moral ambiental e sua perspectiva no direito brasileiro. In Ação civil pública Lei 7.347/1985 - 15 anos. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 440).
Essa discussão, contudo, está restrita muita mais ao campo doutrinário, uma vez que na prática os Tribunais têm entendido pela efetividade das normas protetivas do meio ambiente, admitindo, porquanto, o dano moral ambiental.
Nesse sentido:
"TOMBAMENTO - NEGLIGÊNCIA DOS PROPRIETÁRIOS - DESTRUIÇÃO PARCIAL DO BEM - DANO MORAL COLETIVO.
Com a evolução do amparo ao meio ambiente no Brasil, a doutrina pacificou o entendimento acerca da possibilidade de reconhecimento da indenização por dano moral coletivo, quando decorrente de agressões ao patrimônio ambiental, com respaldo, após 1994, no art. 1º da Lei da Ação Civil Pública." (Apelação cível n. 2005.013455-7, de Lages, rel. Des. Volnei Carlin, j. 06.10.2005)
"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANO AMBIENTAL - EXTRAÇÃO DESMENSURADA DE SAIBRO - NÃO-CUMPRIMENTO DAS EXIGÊNCIAS CONTIDAS NA LICENÇA CONCEDIDA PARA EXPLORAÇÃO DA ÁREA - DEFEITO NO SISTEMA DE DRENAGEM PLUVIAL E REVEGETAÇÃO - CASO FORTUITO (FORTES CHUVAS) - IRRELEVÂNCIA - RESPONSABILIDADE DA EMPRESA EXTRATIVISTA PELA RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA - TERMO DE COMPROMISSO FIRMADO COM A FUNDAÇÃO MUNICIPAL DO MEIO AMBIENTE (FLORAM) - PROJETO ELABORADO E APROVADO COM RESSALVAS - OBRIGAÇÃO DE FAZER MANTIDA - DANO MORAL AMBIENTAL CARACTERIZADO - LIGAÇÃO CLANDESTINA - ATERRAMENTO E CONTAMINAÇÃO VIRÓTICA DA LAGOA DE PONTA DAS CANAS - INDENIZAÇÃO DEVIDA - RECURSO DOS RÉUS DESPROVIDO - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO.
Não há falar em caso fortuito quando verificado que o dano ambiental foi provocado por chuvas torrenciais, sobretudo quando constatado que as intempéries não teriam provocado o referido dano se a empresa voltada à atividade de extração mineral (saibro) tivesse efetivamente cumprido com as exigências de drenagem pluvial e revegetação da área explorada. Assim, não há eximi-la da responsabilidade de elaborar e executar projeto de recuperação do local degradado.
O art. 14, §1º, da Lei n. 6.938/1981 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente), prevê a possibilidade de responsabilização objetiva do causador de eventual dano ambiental, independentemente da aferição de culpa ou casos de força maior.
"[...] É admissível a indenização por dano moral ambiental nos casos em que a ofensa ao meio ambiente acarreta sentimentos difusos ou coletivos de dor, perda, sofrimento ou desgosto [...]" (AC n. 2000.025366-9, da Capital)." (Apelação Cível n. 2005.014245-1/000000, da Capital, rel. Des.Rui Fortes, j. 11.03.2008)
Dos bem lançados fundamentos no Recurso Especial n. 598281, cujo relator foi o eminente Min. Luiz Fux, extrai-se:
"O advento do novel ordenamento constitucional - no que concerne à proteção ao dano moral - possibilitou ultrapassar a barreira do indivíduo para abranger o dano extrapatrimonial à pessoa jurídica e à coletividade.
No que pertine a possibilidade de reparação por dano moral a interesses difusos como sói ser o meio ambiente amparam-na: art. 1º da Lei da Ação Civil Pública e o art. 6º, VI, do CDC.
Com efeito, o meio ambiente integra inegavelmente a categoria de interesse difuso, posto inapropriável uti singuli. Consectariamente, a sua lesão, caracterizada pela diminuição da qualidade de vida da população, pelo desequilíbrio ecológico, pela lesão a um determinado espaço protegido, acarreta incômodos físicos ou lesões à saúde da coletividade, revelando lesão ao patrimônio ambiental, constitucionalmente protegido."
Este relator, perfilhando do mesmo entendimento esposado nos arestos acima colacionados, admite a viabilidade da indenização por danos morais originados de ilícitos ambientais.
Todavia, para uma possível condenação do agente agressor, há que se verificar, contudo, quais os reflexos produzidos pelos danos ambientais à coletividade, ou seja, é necessário aferir-se o alcance do ilícito ambiental nos sentimentos coletivos, nestes compreendidos, a dor, a perda, o sofrimento, o desgosto.
Nessa linha de raciocínio, o eminente Des. Volnei Carlin assentou posicionamento:
"O dano moral transindividual, para ser indenizável, deve acarretar sentimentos coletivos de dor e perda, causando a destruição de bens relacionados ao sofrimento de uma comunidade ou grupo social.
Assim, conclui-se que a cognição do dano moral ambiental não está ligado à agressão física do bem ambiental, visto em sua acepção ampla, mas, ao contrário, relaciona-se com a violação do apreço coletivo, em razão de determinado acometimento ao patrimônio lesado." (Apelação cível n. 2005.013455-7, de Lages, rel. Des. Volnei Carlin, j. 06.10.2005).
Não discrepa o entendimento perfilhado pelo insigne Des. Newton Janke:
"3. É admissível a indenização por dano moral ambiental nos casos em que a ofensa ao meio ambiente acarreta sentimentos difusos ou coletivos de dor, perda, sofrimento ou desgosto.
O reconhecimento do dano moral ambiental, entretanto, não se revela pelo só fato de ter havido uma repercussão física lesiva ao meio ambiente em local ou imóvel particular, sem qualquer característica de patrimônio paisagístico coletivo, ainda mais quando a lesão resultou de atividade expressamente autorizada pela Administração pública". (Apelação Cível 2000.025366-9, da Capital, rel. Des. Newton Janke, j. 23.09.04).
No caso, como dito, o Ministério Público pleiteia a indenização por dano moral em face da ora apelada, pois esta teria lesado a coletividade ao realizar cultos cuja emissão de ruídos extrapolaria os níveis admitidos para a região em que situada sua sede.
O caso vertente não alberga a possibilidade de indenização.
Em que pese a agressão ambiental decorrente de poluição sonora, entendo que os danos, como apresentados, não ultrapassaram os sentimentos de ordem individual da comunidade que habita o entorno das instalações da Igreja.
Diante desse quadro, infere-se que a comunidade local não teve de suportar qualquer tipo de ofensa que fosse capaz de ensejar a possibilidade de indenizabilidade por dano moral ambiental, sobretudo porque o excesso de ruídos, embora desagradável e prejudicial à saúde, é uma realidade cotidiana dos aglomerados urbanos.
Pelo exposto, nega-se provimento aos recursos.
É o voto.

Gabinete Des. Sérgio Roberto Baasch Lu

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