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terça-feira, 2 de março de 2010

Maçonaria é religião?

Órgão

:

QUINTA TURMA CÍVEL

Classe

:

APC - APELAÇÃO CÍVEL

Num. Processo

:

2003 01 5 009352-5

1ºApelante(s)

2º Apelante

:

FAZENDA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS

loja maçônica duque de caxias nº 13 (Recurso Adesivo)

Apelado(a)(s)

:

OS MESMOS

Relator Des.

:

ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA

Revisora Desa.

:

HAYDEVALDA SAMPAIO

E M E N T A

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – IPTU – MAÇONARIA – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – POSSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 8º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 363/2001.

1. “A maçonaria é uma religião, no sentido estrito do vocábulo, isto é na “ harmonização da criatura ao Criador. É religião maior e universal”

A C Ó R D Ã O

Acordam os Senhores Desembargadores da Quinta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA - Relator, HAYDEVALDA SAMPAIO – Revisor(a) e JOÃO TIMÓTEO - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ROMEU GONZAGA NEIVA em CONHECER. NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 15 de março de 2004.

Desembargador ROMEU GONZAGA NEIVA

Presidente

Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA

Relator


R E L A T Ó R I O

Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida nos autos da Ação de Embargos à Execução proposta por Loja Maçonica Duque de Caxias nº 13 em desfavor da Fazenda Pública do Distrito Federal, a qual julgou procedente o pedido formulado na inicial, declarando a inexigibilidade do crédito tributário que deu origem à execução, em face do manto da imunidade que paira sobre o imóvel em questão, nos moldes do artigo 150, inciso VI, alínea b da CF.

A Fazenda Pública do Distrito Federal apelou da sentença, alegando em suas razões de apelação que o Decreto nº 16.100/94, longe de estabelecer condições à imunidade prevista no texto constitucional, apenas dispõe que compete ao interessado comprovar administrativamente, perante o Fisco, que preenche os requisitos necessários para o enquadramento da entidade e via de conseqüência do respectivo imóvel no referido benefício.

Assevera que a ora apelada, em momento algum pleiteou o reconhecimento de sua imunidade perante a autoridade fiscal do Distrito Federal.

Sustenta que o requerimento administrativo se mostra imprescindível para que o Poder Público possa aferir se o contribuinte preenche ou não os requisitos indispensáveis à fruição da imunidade, visto que seria impossível ao Fisco, proceder a uma constante e interminável diligência às propriedades locais com o objetivo de verificar a ocorrência concreta de eventuais isenções e imunidades.

Aduz que o MM. Juiz de Direito entendeu que as lojas maçonicas são abarcadas pelo conceito de templo, entretanto, a ora apelada não logrou comprovar, no presente feito, a sua condição de entidade imune, tendo em conta que as lojas maçonicas, não são consideradas templo para fins de gozo da referida imunidade.

Afirma que conforme documento de fl. 9, a finalidade declarada pela ora recorrida, não demonstra qualquer tipo de difusão de uma religião, de um culto, no imóvel objeto da execução fiscal, que não pode ser considerado um templo para os fins pretendidos.

Esclarece que as salas de reuniões da maçonaria não são e nunca poderão ser templos, mesmo porque, maçonaria não é religião, as reuniões da entidade não são cultos e a sede em que se reúne não é templo religioso.

Requer seja julgado improcedente o pedido inicial , invertendo o ônus da sucumbência.

Em contra-razões, enfatizando os argumentos anteriormente esposados, pela manutenção da sentença.

Loja Maçonica Duque de Caxias nº 13 também apelou da sentença alegando em suas razões de apelação , em síntese, que deve ser reformada a sentença no tocante à fixação dos honorários advocatícios que foram fixados em R$ 500,00 ( quinhentos reais), visando a majoração dos mesmos.

A Fazenda Pública do Distrito Federal em resposta à apelação adesiva interposta pela Loja Maçonica Duque de Caxias nº 13, pleiteia a manutenção dos honorários fixados na sentença.

É o relatório.

V O T O (S)

O Senhor Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA - Relator

Conheço dos recursos, presentes os pressupostos de admissibilidade.

Pleiteia o 1º apelante a reforma da sentença que julgou procedentes os embargos à execução, declarando a inexigibilidade do crédito tributário que deu origem à execução, em face do manto da imunidade que paira sobre o imóvel em questão, a teor do disposto no artigo 150, inciso VI, alínea b da Constituição Federal.

A questão resume-se em saber a natureza das lojas maçonicas, para que se possa decidir quanto a imunidade tributária.

Rizzardo de Camino discorre sobre o tema:

“A maçonaria é uma religião, no sentido estrito do vocábulo, isto é na “ harmonização da criatura ao Criador. É religião maior e universal”.

No mesmo sentido é a lição de Joaquim Gervásio de Figueiredo:

“Maçonaria é um sistema sacramental que, como todo sacramento, tem um aspecto externo, visível, consistente em seu cerimonial, doutrinas e símbolos, e outro aspecto interno, mental e espiritual, oculto sob as cerimônias, doutrinas e símbolos e acessível só ao maçom que haja aprendido a usar sua imaginação espiritual e seja capaz de apreciar a realidade velada pelo símbolo externo.”

A Drª Sandra de Santis quando do julgamento da APC nº 2000015002122-8 assim se pronunciou sobre o assunto:

“A imunidade é forma qualificada de não incidência que decorre da supressão da competência impositiva sobre certos pressupostos previstos na Constituição, como nos ensina Misabel Derzi. Culto é o conjunto de práticas destinadas ao aperfeiçoamento dos sentimentos humanos. E, considerando que é denominado templo o local onde se reúnem os maçons periodicamente a fim de praticar as cerimônias ritualísticas para melhorar o caráter, a vida espiritual, meditar sobre a missão do homem na vida, recordando-lhe os valores eternos cujo cultivo lhes permite acercar-se da verdade, não se pode chegar a conclusão diversa daquela exarada pelo MM. Juiz na sentença recorrida.”

Da mesma forma manifestou-se o Des. João Mariosi quando prolatou seu voto em caso análogo:

“O argumento de que a parte é carecedora de ação, por não ter-se habilitado previamente junto à autoridade competente parte de uma falácia igonoratio elenchi. Na verdade, se se depender de habilitação junto à autoridade administrativa para se dizer que um templo é um templo, estar-se-ia atribuindo à Administração Pública o critério para afirmar a templacidade de um prédio.

Se há necessidade de se afirmar que um prédio é um templo, a autoridade já observou o aspecto de sua utilização, quando conferiu o habite-se. Do contrário teríamos que buscar o definiens ou o signficiado da coisa, admitindo um princípio dialético de acordo prévio. Isto seria uma falácia Aequivocum. O direito, quando tem uma pretensão herurísitica procura uma generalização de evidência, mas parte sempre da certeza, que é subjetiva.

Se se faz necessário um acordo prévio sobre os termos, como entidade religiosa, benefício constitucional e templo, o Estado passa a ser o Leviatan bíblico que também coordena o religioso. Estaríamos diante de um estado teocrático, fora do qual não haveria salvação nem religião. Com efeito religião advém de re+ eligere ou de re + ligare? Templum é o lugar de oração ou de contato divino. No entanto o que é divino? Divus significa Júpiter o primeiro dos deuses, que era filho de Kaos e que se união com a Thêmis a Justiça da normas, a qual pariu as horas e as moiras, entre aquelas esta a outra Justiça, cuja missão era ficar entre os súditos e juízes, a Diké.

Ora, o templo da embargante-apelante tem raízes no templo de Salomão, quer quanto a forma, quer quanto a destinação.

Num país em que a religião, também oriunda dos templos de Salomão, já foi religião de Estado e cujos membros eram servidores públicos, como se pode negar este fato à embargante?

O direito, também denominado legitimidade, está presente. Observe-se que o termo legitimidade do CPC, nada tem de comum com o termo legítimo dos léxicos da língua portuguesa.

O que se busca neste caso é a imunidade tributária. A imunidade não se confunde com isenção tributária. A imunidade não pode ser condicionada por qualquer norma infra constitucional.”

Cabe ainda ressaltar que o artigo 8º, § único da Lei Complementar nº 363/2001 assim dispõe:

“Ficam isentos do pagamento do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU os imóveis construídos e ocupados por templos maçonicos e religiosos, de qualquer culto, ficando remidos os respectivos débitos inscritos e não inscritos na dívida ativa, ajuizados e por ajuizar”.

Tendo em vista que os estudiosos consideram a maçonaria como “ religião” no sentido estrito da palavra, deve ser mantida a senteça hostilizada.

Quanto aos honorários, entendo que estes não merecem ser majorados tendo em vista a singeleza da causa, e o preceito do § 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil.

Por todo o exposto, nego provimento a ambos os recursos, mantendo “ in totum” a r. sentença hostilizada.

É como voto

A Senhora Desembargadora HAYDEVALDA SAMPAIO - Revisora

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.

Cuida-se de Embargos à Execução Fiscal opostos por LOJA MAÇÔNICA DUQUE DE CAXIAS N.º 13 em desfavor da FAZENDA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL, ao argumento de que goza da imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, letra “b”, da Constituição Federal.

O MM. Juiz julgou procedentes os embargos, declarando a inexigibilidade do crédito tributário que deu origem à execução, nos termos do artigo 150, inciso VI, letra “b”, da Constituição Federal, com a condenação do Embargado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais).

Em seu inconformismo, o DISTRITO FEDERAL insiste na assertiva de que a Apelada, para gozar do referido benefício, deveria ter formulado pedido administrativo, para comprovação de que o imóvel, que se pretende isentar da cobrança do IPTU, serve de templo para cultos. Assevera, ainda, que a Apelada não logrou demonstrar a sua condição de imune, bem como a destinação religiosa do imóvel tributado, considerando que a maçonaria não constitui uma religião, de acordo com seu ato constitutivo, a fim de que possa gozar da referida imunidade. Requer o conhecimento e provimento do recurso para reformar a r. sentença, julgando improcedente o pedido.

A Embargante, por sua vez, interpôs recurso adesivo, pleiteando a majoração dos honorários advocatícios.

O ponto nodal da questão consiste em saber se as lojas maçônicas são abarcadas no conceito de templo, e se, em tais circunstâncias, há ou não necessidade de requerimento administrativo.

A jurisprudência desta Corte de Justiça tem orientado no sentido de que a maçonaria é uma sociedade de cunho religioso, guardando suas lojas conotação de templo, contida no artigo 150, inciso VI, alínea “b” da Constituição Federal, e como tal, deve gozar da imunidade tributária.

Confira-se:

“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - IPTU - MAÇONARIA - RELIGIÃO - IMUNIDADE TRIBUTÁRIA - LEI COMPLEMENTAR DISTRITAL - ISENÇÃO – HONORÁ-RIOS ADVOCATÍCIOS - VALOR EXARCEBADO. 1. A IMUNIDADE É FORMA QUALIFICADA DE NÃO INCIDÊNCIA, QUE DECORRE DA SUPRESSÃO DA COMPETÊNCIA IMPOSITIVA SOBRE CERTOS PRESSUPOSTOS PREVISTOS NA CONSTITUIÇÃO. A MAÇONARIA É UMA SOCIEDADE DE CUNHO RELIGIOSO E SUAS LOJAS GUAR-DAM A CONOTAÇÃO DE TEMPLO CONTIDA NO TEXTO CONSTITU-CIONAL, DEVENDO, PORTANTO, FICAR IMUNES AOS IMPOSTOS. 2. ADEMAIS, O PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 8º DA LEI COMPLE-MENTAR Nº 277, DE 13 DE JANEIRO DE 2000, ACRESCIDO PELA LEI COMPLEMENTAR Nº 363, DE 19 DE JANEIRO DE 2001, AMBAS DO DISTRITO FEDERAL, PREVÊ A ISENÇÃO DE IPTU DE IMÓVEIS CONSTRUÍDOS E OCU-PADOS POR TEMPLOS MAÇÔNI-COS. 3. REDUZ-SE O VALOR DA VERBA DOS HONORÁRIOS ADVO-CATÍCIOS QUANDO A SINGELEZA DA CAUSA, O VALOR DO EXECUTIVO FISCAL E O PRECEI-TO DO PARÁGRAFO 4º DO ARTIGO 20 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL O AUTORIZAREM. 4. DADO PARCIAL PROVIMENTO. UNÂNI-ME.” (APC e RMO 20000150021228, TJDF, Terceira Turma Cível, Rela. Desa. Sandra de Santis, DJ 03.04.2002, pág. 38).

“TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. RE-CONHECIMENTO PELO PODER PÚBLICO. MAÇONARIA. ENTIDA-DE RELIGIOSA. A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA PARA AS ENTIDA-DES RELIGIOSAS, DENTRE ESTAS AS LOJAS MAÇÔNICAS, DECORRE DA LETRA CONSTITUCIONAL E DISPENSA QUALQUER PROCEDI-MENTO ADMINISTRATIVO PARA QUE EXISTA E PRODUZA TODOS OS SEUS EFEITOS. APELO PROVIDO. UNÂNIME.” (APC 5176599, TJDF, Primeira Turma Cível, Rel. Des. Valter Xavier, DJ 19.09.1999, pág. 44).

O douto Magistrado, a propósito, frisou:

“Trata-se de questão de alta indagação, cuja complexidade emerge da própria natureza semi-secreta da maçonaria, o que dificulta o iter a ser trilhado na busca do seu caráter religioso. A par disso, não se mostra possível destacar a natureza dos ritos praticados pela entidade autora tão-somente pela leitura dos seus atos constitutivos.

Ressalte-se que tal questão começa a ser debatida nos tribunais, não tendo a Suprema Corte se manifestado a respeito do tema. Todavia, apresenta-me razoável o entendimento segundo o qual as lojas maçônicas são abarcadas no conceito de templo.”

Mostra-se prescindível, no presente caso, requerimento administrativo para reconhecimento da imunidade tributária. Estando especificada a destinação religiosa do prédio, a imunidade independe de requerimento.

Cabe lembrar, ainda, que a Constituição Federal, no artigo 150, inciso VI, alínea “b”, ao estabelecer a imunidade tributária em relação aos templos de qualquer culto, não estabeleceu condições, sendo certo que “a imunidade tributária concedida constitucionalmente aos templos religiosos não está sujeita a qualquer condição implementada por qualquer outra norma de hierarquia inferior. Diferentemente do que se passa com a isenção, nem sempre é ocioso enfatizar, a imunidade tributária não é favor legal, nem está sujeita a qualquer requerimento” (APC e ROM 4593097, TJDFT, Quinta Turma Cível, Rel. Des. Waldir Leôncio Júnior, DJU 27.05.1998, pág. 76).

Quanto aos honorários advocatícios, a r. sentença não merece reparos, eis que fixados com moderação e razoabilidade, tendo em vista a singeleza da causa, nos termos do § 4º, do artigo 20, do Código de Processo Civil.

Ante o exposto, nego provimento aos recursos.

É como voto.

O Senhor Desembargador JOÃO TIMÓTEO - Vogal

Com a Turma.

D E C I S Ã O

Conhecido. Negou-se provimento aos recursos. Unânime.


-=-=-=-=-


O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul adotou entendimento diametralmente oposto, como pode-se deduzir do acórdão que segue reproduzido:


APELAÇÃO CÍVEL EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS. IPTU. MAÇONARIA. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E ISENÇÃO Não CARACTERIZADAS.

Descabe o reconhecimento da imunidade tributária à Maçonaria, na medida em que esse tipo de associação não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no art. 150, VI, alíneas “b” e “c”, da Constituição Federal. Descabe enquadrá-la como instituição de educação ou assistência social, na medida em que estas desenvolvem uma atividade básica que, a princípio, deveria ser cumprida pelo Estado, o que não é o caso da Maçonaria. Da mesma forma, não se pode admitir seja a Maçonaria um culto na acepção técnica do termo. Trata-se de uma associação fechada, não aberta ao público em geral e que não tem e nem professa qualquer religião, não se podendo afirmar que seus prédios sejam templos para o exercício de qualquer culto. Trata-se de uma confraria que, antes de mais nada, professa uma filosofia de vida, na busca do que ela mesmo denomina de aperfeiçoamento moral, intelectual e social do Homem e da Humanidade. Daí porque, não incidentes, à espécie, as hipóteses previstas no art. 150, VI, “b” e “c”, da CF.

Incabível, ainda, o pedido de isenção, não tendo a embargante atendido aos requisitos contidos na Lei que concedeu a benesse.

APELAÇÃO NÃO PROVIDA.

Apelação Cível

Primeira Câmara Cível

Nº 70010055200

Comarca de Porto Alegre

GRANDE ORIENTE DO RIO GRANDE DO SUL

APELANTE

MUNICIPIO DE PORTO ALEGRE

APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento à apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Irineu Mariani e Dr. Niwton Carpes da Silva.

Porto Alegre, 24 de novembro de 2004.

HENRIQUE OSVALDO POETA ROENICK,

Relator.

RELATÓRIO

Des. Henrique Osvaldo Poeta Roenick (RELATOR)

GRANDE ORIENTE DO ESTADO DO RIO GRANDE SUL interpôs embargos à execução fiscal que lhe é movida pelo MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE, sustentando que faz jus à imunidade tributária, relativamente ao IPTU incidente sobre o Palácio Maçônico localizado nesta Capital, tanto por estar inserida no contexto de “templos de qualquer culto”, previsto no art. 150, VI, “b”, da CF como por constituir patrimônio de entidade filantrópica ou beneficente, na forma da alínea “c” do mesmo dispositivo constitucional. Assevera, sucessivamente ter direito à isenção fiscal, nos termos do art. 70, I, da Lei Complementar nº 07/73.

Impugnou o Município, defendendo, primeiramente, a higidez da CDA. Quanto ao pedido de imunidade, afirma que a embargante não se enquadra em nenhuma das hipóteses do art. 150, VI, alíneas “b” e “c”, da Constituição Federal, porquanto a Maçonaria não é religião, culto, instituição de educação ou assistência social, estando o imóvel sujeito à tributação. Quanto ao pedido de isenção, refere que é condicional, ou seja, sujeito ao crivo da autoridade administrativa. Afirma que o pedido de isenção formulado na esfera administrativa foi indeferido por não ter a embargante preenchido os requisitos legais.

Houve réplica, manifestando-se o MP pela improcedência.

Sentenciou a Magistrada, dando pela improcedência dos embargos, restando a embargante condenada ao pagamento das custas e verba honorária de 10% sobre o valor da execução.

Apelou a vencida, pugnando pela reforma da sentença.

O recurso foi contra-arrazoado, subindo os autos a esta Corte.

Nesta Instância, o Procurador de Justiça opinou pelo provimento do apelo.

É o relatório.

VOTOS

Des. Henrique Osvaldo Poeta Roenick (RELATOR)

Conheço do recurso, por próprio e tempestivo.

O recurso merece o desprovimento.

Postula a apelante seja reconhecida, para si, em primeiro lugar, imunidade tributária, sustentando estar albergada pelas regras do art. 150, inciso VI, alíneas “b” e “c”, da CF.

De entidade assistencial ou educacional não há falar.

A Maçonaria (cujo nome, provavelmente do francês “Maçonnerie” significa uma construção qualquer, feita por um pedreiro, o maçom), conforme sua “Constituição”, é uma associação fechada, não aberta a qualquer um que dela queira participar, a não ser submetido a um procedimento prévio de apresentação do “profano” por um maçom, cuja admissão e iniciação depende da verificação de condições e requisitos essenciais estabelecidos pelo denominado Regulamento Geral. Só podem ser admitidas pessoas do sexo masculino, maiores de 21 anos, e através de escrutínio secreto por parte de todos os maçons presentes, forma unânime. Em termos de assistência, esta fica restrita às viúvas, irmãs solteiras, ascendentes e descendentes necessitadas de “justo” auxílio dos irmãos. O que é “justo auxílio”, só os maçons podem deliberar.

Com efeito, não há como considerar tal associação dentre aquelas referidas na alínea “c”, do inciso VI, do artigo 150 da Constituição Federal. Embora sem fins lucrativos, por certo não se trata de instituição de assistência social ou educacional .

As instituições de assistência social que estão abrangidas pela imunidade referida na Carta Política são aquelas entidades que necessariamente colaboram com o Poder Público em atividade específica, jamais a entidade que se preocupa apenas com os interesses de seus sócios.

Conforme refere PAULO DE BARROS CARVALHO, em sua obra Curso de Direito Tributário, Ed. Saraiva, 1991, pg. 122, “as instituições de educação e de assistência social desenvolvem uma atividade básica que, a princípio, cumpriria ao Estado desempenhar. Antevendo as dificuldades de o Poder Público vir a empreendê-la, na medida suficiente, o legislador Constituinte decidiu proteger tais iniciativas com a outorga da imunidade”.

Por certo, a Maçonaria não se enquadra, com sua atuação, em tais atividades.

Conforme decisão do TA-MG na AP nº 31.694, Relator o Dr. Cláudio Costa, “caracteriza-se como instituição de assistência social e, portanto, detentora de imunidade tributária, aquela que tem como objeto um fim público, fixado na sua criação, qual seja colaborar com o Estado na realização de uma obra social para a coletividade. Sendo a imunidade matéria sob reserva da Constituição, só esta, e não lei ordinária, pode declarar se uma pessoa é imune”.

Daí, não há como considerar a Maçonaria imune na forma do art. 150, VI, “c”, da CF.

Da mesma forma, não se há de admitir possa a Maçonaria estar enquadrada na alínea “b”, do mesmo dispositivo legal acima referido (templo de qualquer culto).

As Lojas Maçônicas, no que tange a sua organização, dividem-se em Grandes Lojas ou Grandes Orientes. Aquelas, recebendo reconhecimento da Grande Loja Unida da Inglaterra, enquanto estes são reconhecidos pelo Grande Oriente da França, embora se afirme que esta regra não seja universal, porquanto inexiste uma autoridade internacional que confira Regularidade Maçônica. A sua legitimidade é de origem, ou seja, para que se admita Regularidade de uma Grande Loja ou Grande Oriente, esta há de ter sido reconhecida por outra Grande Loja ou Grande Oriente previamente regular junto a outras denominadas Potências. Daí a Regularidade de Origem.

Que regras são as da Maçonaria para que se possa verificar tratar-se de um culto na acepção técnica do termo? A principal regra a ser seguida é a da Constituição de Anderson, de 1723, formulada por Anderson Payne e Desaguillier, para a recém fundada Grande Loja de Londres, podendo-se afirmar que se divide em cinco pontos fundamentais:

a) Absoluto respeito aos antigos deveres, que estão reunidos em forma de Landmarks;

b) Só é possível aceitar homens livres, respeitáveis e de bons costumes que se comprometam a por em prática um ideal de Liberdade, Igualdade e Fraternidade;

c) Ter sempre como objetivo o aperfeiçoamento do Homem, e, como conseqüência, de toda a Humanidade;

d) Exigência de cumprimento fiel a rituais para tornar possível o Conhecimento, com práticas de iniciação próprias;

e) Imposição a todos os membros do mais absoluto respeito às opiniões e crenças de cada um, proibida qualquer discussão a respeito de religião ou política em suas Lojas.

Aliás, segundo sua própria Constituição, “proclama a prevalência do espírito sobre a matéria. Pugna pelo aperfeiçoamento moral, intelectual e social da Humanidade, por meio do comportamento inflexível do dever, da prática desinteressada da beneficência e da investigação constante da verdade”.

Ora, não há falar em culto na acepção técnica do termo, como quis a Carta Política. A prática Maçom é uma ideologia de vida. Não é uma religião. Não tem dogmas. Não é um credo. É uma grande família apenas. Ajudam-se mutuamente, aceitando e pregando a idéia de que o Homem e a Humanidade são passíveis de melhoria e aperfeiçoamento. Como se vê, uma grande confraria que, antes de mais nada, prega e professa uma filosofia de vida. Apenas isto. De certa forma, paradoxal, pois ao mesmo tempo em que prega esta melhoria e aperfeiçoamento do Homem e da Humanidade, só admite em seu seio homens livres (não mulheres) e que exerçam profissão (afirma que deve ser uma “profissão honesta”) que lhes assegure meio de subsistência. Os analfabetos não são admitidos, por não possuírem instrução necessária à compreensão dos fins da Ordem.

Como se vê, é uma associação fechada, não aberta ao público em geral e que não tem e nem professa qualquer religião, não se podendo afirmar que seus prédios sejam templos para o exercício de qualquer culto. Seus prédios (oficinas), estruturadas em Lojas ou Triângulos (dependendo do número de membros), são utilizados para sessões secretas de trabalho, com acesso apenas para os maçons, proibida a entrada de “profanos”, a não ser excepcionalmente nas denominadas sessões brancas.

Enfim não há como reconhecer, por tudo o que é a Maçonaria, que seja ela um culto na acepção técnica do termo tal qual querido e utilizado na Constituição Federal.

Por fim, quanto ao pedido de isenção, tratando-se de benesse fiscal, está ela condicionada ao preenchimento das condições e requisitos exigidos em lei para sua concessão. E, no caso, o benefício foi indeferido na esfera administrativa, por ausente no local edificação concluída, portanto em desacordo com o art. 70, I, da LC 07/73 e art. 109 da Lei Orgânica do Município, conforme se infere da fl. 51.

Dispõe o referido art. 70, I, da LC 07/73, no que interessa, que ficam isentos do IPTU os imóveis, ou parte deles, onde esteja instalada a sede ou filial de entidade maçônica. No caso dos autos, a prova documental, juntada pela própria autora, demonstra que no imóvel não se encontra instalada nem sede e nem filial da Maçonaria, pois projeto em construção.

Ademais, é claro o art. 109, da LOM, no sentido de que havendo infração não regularizada a qualquer dispositivo legal do Município, não há possibilidade de ser concedido qualquer benefício ou incentivo fiscal. Ocorre também estar provada tal infração, pois relativamente ao imóvel em questão há dívida de IPTU do período de 1989 a 1996 (fl. 51).

Assim, tanto pela regra do art. 70, I, da LC nº 07/73, quanto pelo art. 109 da LOM, o pedido de isenção foi corretamente indeferido pelo Fisco Municipal.

Desse modo, fica prejudicado o pedido feito da Tribuna quanto à desconstituição da sentença por cerceamento de defesa. Primeiro, pela regra do art. 245, caput, do CPC, pois no apelo não foi alegada a nulidade. Segundo, porque pelos fundamentos de direito elencados no voto, a prova pericial requerida seria de todo inóqua.

Com tais fundamentos, nego provimento ao apelo.

É o voto.

Des. Irineu Mariani (REVISOR)

Eminentes Colegas, ilustre advogado que ocupou a tribuna.

Também é a primeira vez que tenho a oportunidade de examinar a matéria com o perfil que se apresenta, considerando a qualidade da parte.

Não pode haver incidência de imposto sobre os “templos de qualquer culto”, diz o art. 150, inc VI, letra b, da Constituição Federal.

Muito singela e objetivamente, templo é o local, igreja ou não, em que se realiza o culto. Culto, no caso, significa adoração ou homenagem à divindade, em qualquer forma de religião. Abrange também a veneração às entidades não divinas, como são os santos para a religião católica, quer dizer, há vinculação do objeto à crença em uma divindade.

O templo está vinculado a culto, e culto está vinculado à religião. Religião, por sua vez, é a crença em uma força sobrenatural.

Religião é crença numa força sobrenatural ou forças sobrenaturais adoradas, obedecidas e veneradas, que se manifesta e pratica por meio de doutrina e rituais próprios.

À evidência, conforme bem demonstra o eminente Relator, a maçonaria não é uma religião; logo, o lugar de seus encontros e cerimoniais não é um templo, na acepção constitucional, e, efetivamente, não podemos alargar a compreensão do texto constitucional para além daquele sentido, bem identificado que o constituinte quis transmitir com a “templos de qualquer culto”. Sabemos que a imunidade deve ser interpretada extensivamente, mas isso não significa interpretação sem limites.

Conseqüentemente, pelo fundamento apontado, não merece acolhida a pretensão.

Quanto a ser entidade filantrópica ou beneficente, como prevê a letra c do mesmo inciso e artigo, de igual modo, não vejo como reconhecer a imunidade. É preciso que a beneficência, a filantropia, a caridade, enfim, seja o objeto da entidade, seja a razão de ser da entidade, e requer prestação indistinta a terceiros, e não, como acontece no caso, assistência restrita a familiares.

Se eventualmente é prestada assistência a pessoas indistintas, de modo tão secreto que “o que faz a mão direita a esquerda não fica sabendo”, para usar a famosa frase de Jesus Cristo a respeito da prática da caridade, só podemos louvar tamanha discrição, mas não inseri-la no campo do Direito Tributário.

Assim sendo, não há por que, eminentes Colegas, nos preocuparmos com o art. 14 do Código Tributário Nacional, que estabelece os requisitos para fazer jus à imunidade, mas àquelas instituições que têm por objeto social a filantropia, e, por decorrência, não há por que desconstituir a sentença para verificar se, no caso, tais requisitos são cumpridos.

Para finalizar, quanto à isenção, como Vossa Excelência salientou, não foram preenchidos os requisitos legais, pelo menos até agora. Poderá isso ocorrer no futuro.

Com essas considerações estou, Senhor Presidente, acompanhando o voto de Vossa Excelência.

Dr. Niwton Carpes da Silva - De acordo com o Relator..

Julgadora de 1º Grau: THAIS COUTINHO DE OLIVEIRA

Um comentário:

Unknown disse...

Eu, vocês, todos nós pagamos impostos e maçonaria não quer pagar nem sequer IPTU? Eu digo, NÃO a imunidade tributária! Porquanto a maçonaria é apenas mais um dos muitos clubes que já tosquiam seus rebanhos (suas próprias fontes de renda). Portanto, se maçonaria tiver direito a imunidade tributária todos os outros(as) (entidades, clubes etc) também terão! Justiça seja feita, chega de exclusivismo!