As dívidas fiscais da Rede Globo e a investigação do sumiço do processo em que uma operação tributária irregular do grupo era apurada são assuntos que a grande mídia e a oposição — salvo raras exceções — praticamente sepultaram do debate nacional. É como se os valores bilionários que a organização é acusada de dever ao Fisco federal não fossem um tema de interesse público.
Na semana passada, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) — demonstrando coragem singular entre seus pares no Congresso Nacional quando se trata do principal conglomerado de comunicação do país — tomou a iniciativa de pedir explicações aos Ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, ao Ministério Público e à própria Globo sobre as dívidas, multas e empréstimos concedidos à emissora.
Dos ministérios, o senador quer saber — e nós também — qual o montante exato da dívida da empresa junto à Receita Federal, o valor das multas aplicadas pelo Fisco e como foram respondidos os pedidos de empréstimo feitos pela Globo ao BNDES, já que empresas em débito com a União não podem tomar crédito junto a bancos públicos. Já ao Ministério Público, Requião pediu informações sobre o andamento da investigação do sumiço do processo em que a emissora é acusada de sonegação fiscal e que desapareceu depois de ser subtraído por uma ex-servidora pública.
Apenas para relembrar, já que a notícia não teve nenhum destaque na mídia tradicional: recentemente o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda (Carf) negou recurso das organizações Globo contra a multa que lhe foi aplicada em 2009 pela Receita Federal, no valor de R$ 713 milhões (cerca de R$ 1 bilhão em valores atualizados). A penalidade foi imposta, de acordo com a Receita, pela redução indevida de tributos no processo de mudança societária entre empresas do grupo (Globopar, TV Globo e Globo Rio), que fizeram uma manobra contábil para amortizar artificialmente a dívida de uma delas. Surpreendentemente, a empresa conseguiu transformar uma dívida de R$ 2 bilhões em um crédito de mais de R$ 300 milhões em apenas 30 dias.
Requião também oficiou a Globo, questionando se ela já encontrou o DARF (Documento de Arrecadação da Receita Federal) referente ao processo que desapareceu da Receita e no qual a empresa era multada em R$ 615 milhões (valores referentes a 2006) por sonegação na compra de direitos autorais da Copa do Mundo de 2002. A Globo teria disfarçado a compra dos direitos de transmissão dos jogos como investimentos em participação societária nas Ilhas Virgens Britânicas.
O Ministério Público Federal, que acompanhava o caso desde 2005, informou que a investigação não foi aberta devido a impeditivos legais, pois a Globo já teria restituído os valores fiscais. Ora, se a dívida foi paga, deve haver alguma comprovação e não há cabimento na justificativa do Ministério Público para abandonar as investigações até que todos os fatos referentes ao pagamento da multa e ao roubo dos documentos pela servidora sejam esclarecidos.
Depois de requerer com tanta ênfase para si o poder investigatório, no episódio em que a PEC 37, que regulamentaria suas ações, acabou sendo derrubada, o MP tem o dever de realizar, nesta e em outras circunstâncias, uma apuração séria e que traga consequências.
As perguntas do senador Requião são pontuais, bem definidas e precisam ser respondidas igualmente. Não podemos mais permitir que o silêncio impere diante de tamanhos prejuízos aos cofres públicos.
José Dirceu, 67, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT
Fonte: SUL 21
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