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sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Brasil: Governo deixou de aplicar R$ 131 bilhões na saúde pública desde 2003



SÃO PAULO/BRASIL - No Brasil, segundo o Conselho Federal de Medicina (CFM), desde 2003, o Ministério da Saúde deixou de aplicar cerca de R$ 131 bilhões no Sistema Único de Saúde (SUS).

O valor é quase equivalente ao que Estados e municípios gastaram no setor durante todo o ano passado - cerca de R$ 142 bilhões. Segundo o CFM, os dados revelam em detalhes os resultados da falta de qualidade da gestão financeira em saúde no Brasil.

Por ANTONIO CARLOS LACERDA


No período apurado, pouco mais de R$ 1 trilhão foi autorizado para o Ministério da Saúde no Orçamento Geral da União (OGU). Os desembolsos, no entanto, chegaram a R$ 891 bilhões. Já em 2013, apesar do maior orçamento já executado na história da pasta - quase R$ 93 bilhões -, o valor efetivamente gasto representou 88% do que havia sido previsto.

Neste ano, até outubro, dos R$ 107,4 bilhões autorizados, R$ 80 bilhões haviam sido usados.

A administração dos recursos da saúde tem sido preocupação recorrente dos Conselhos Regionais de Medicina, pois a qualidade da gestão tem impacto direto na assistência da população brasileira e na atuação dos profissionais.

Na opinião do presidente do CFM, Carlos Vital, "A população brasileira tem o direito de saber onde, como e se os recursos que confiamos aos governos estão sendo bem aplicados. No caso da saúde, isso é ainda mais proeminente, tendo em vista as dificuldades de infraestrutura que milhares de pacientes, médicos e outros profissionais de saúde enfrentam todos os dias". 

Com R$ 131 bilhões seria possível construir 320 mil Unidades Básicas de Saúde de porte I (destinada e apta a abrigar, no mínimo, uma Equipe de Saúde da Família), edificar 93 mil Unidades de Pronto Atendimento de porte III (com capacidade de atender até 450 pacientes por dia) ou, ainda, aumentar em quase três mil o número de hospitais públicos de médio porte.

Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que cabe à União a aplicação do valor destinado ao orçamento no ano anterior mais a variação nominal do PIB. "Portanto, não existe redução nos recursos investidos em saúde ano a ano por parte do Ministério da Saúde", ressaltou. De acordo com a Pasta, nos últimos dez anos, os recursos totais empenhados pela pasta alcançaram a média anual de 99%".

Entre janeiro e julho deste ano, o Ministério da Saúde já empenhou 67% do valor total disponível para investimentos (R$ 6,4 bilhões) autorizados para 2014. Cabe ressaltar que no valor considerado "disponível" pela Pasta estão excluídas as emendas parlamentares, que constam no Orçamento Geral da União, aprovado no Congresso Nacional.

Apesar dos avanços do SUS, um de seus grandes desafios é aumentar o financiamento. O Brasil é o único país do mundo que tem uma rede de saúde pública universal e, ao mesmo tempo, vê o mercado privado e as famílias gastarem diretamente mais dinheiro do que o Estado.

Aqui, o gasto público representa 45,7% do total aplicado em saúde, o que, segundo o representante dos médicos, contraria o que acontece em muitos países de sistemas semelhantes ao brasileiro, onde a média de investimento público supera 70%.

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam que, historicamente, entre os países com sistema universal de saúde, o Brasil aparece com o menor percentual de participação do setor público (União, estados e municípios) no investimento per capita em saúde. Na Inglaterra, por exemplo, o investimento público em saúde é cinco vezes maior que no Brasil.

O governo federal afirma investir na compra de equipamento e na construção, reforma e ampliação de unidades de saúde. Dados apurados pelo CFM mostram que entre 2003 e 2013 foram autorizados R$ 81 bilhões específicos para este fim. No entanto, apenas R$ 30,1 bilhões foram efetivamente gastos e outros R$ 46,3 bilhões deixaram de ser investidos. Em outras palavras, de cada R$ 10 previstos para a melhoria da infraestrutura em saúde, R$ 5,6 deixaram de ser aplicados.

Em 2014, a dotação prevista para os investimentos do Ministério da Saúde é de quase R$ 10 bilhões. Até 20 de outubro, R$ 3,7 bilhões foram pagos, incluindo os restos a pagar quitados (compromissos assumidos em anos anteriores rolados para os exercícios seguintes). Além disso, somente R$ 4 bilhões foram empenhados (reservados no orçamento para futura aplicação), ou seja, 41% do autorizado.

"É curioso observar o quão distante a saúde está da prioridade orçamentária. Só este ano, o Governo investiu mais que o dobro do valor da saúde - R$ 8,6 bilhões - em armamento militar (blindados, aviões de caça e submarinos nucleares). Até compreendemos a importância da proteção à soberania nacional, mas enfrentamos uma guerra real e diária, contra a falta de infraestrutura na saúde pública, e que precisa de muito mais recursos que os investidos numa guerra invisível", afirmou o presidente do CFM.

O contingenciamento, uma das maneiras do governo obter superávit primário, afeta os investimentos da Pasta. De acordo com o Ministério, do total de recursos para obras e compra de equipamentos, R$ 6,4 bilhões estão disponíveis. A diferença entre a dotação autorizada e a "disponível" são as emendas parlamentares contingenciadas, as quais são relevantes para o setor. O contingenciamento é uma maneira do governo federal obter o superávit primário.

Em consequência, foram realmente investidos em 2014 até setembro, R$ 3,5 bilhões, enquanto em Defesa foram investidos R$ 8,6 bilhões. O Ministério da Saúde fica em 5° lugar entre os órgãos que mais investiram, sendo superado pelos Transportes (R$ 9,7 bilhões), Defesa (R$ 8,6 bilhões), Educação (R$ 7,3 bilhões) e Desenvolvimento Agrário (R$ 3,8 bilhões). Os valores incluem os pagamentos com o orçamento de 2014 acrescidos dos restos a pagar pagos de exercícios anteriores.



ANTONIO CARLOS LACERDA é Correspondente Internacional do PRAVDA.RU

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