Esta expressão foi usada, durante muito tempo, para justificar a pretensão de rescisão contratual, em face de algum ato ou fato governamental, que tenha engendrado desequilíbrio contratual ou impossibilidade de cumprimento de pacto negocial.
O momento excepcional - no mau sentido, obviamente - que estamos a viver, fez-me lembrar de tal figura jurídica.
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O FATO DO PRÍNCIPE
Visualizamos nestes artigos da CLT, a ocorrência do factum principis,
ou seja, a paralisação do trabalho por ato de autoridade, que constitui
uma das espécies da força maior. Se uma lei municipal, estadual ou
federal impede ou obstrui as atividades de uma empresa, o Estado (por
aquele ente da federação) responderá solidariamente pelos débitos
trabalhistas.
Mozart Victor Russomano já declarava que o “factum principis
é ato de autoridade pública que determina a suspensão temporária ou
definitiva das atividades da empresa, evidentemente, na forma da
definição do art. 501 e ss., é modalidade de força maior”. (RUSSOMANO,
Mozart Victor. CLT anotada. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003).
Declara ainda aquele autor que sobre o factum principis
existe norma especial, contida no art. 486 da CLT, que transfere a
responsabilidade pelo pagamento das verbas rescisórias à pessoa jurídica
de Direito Público, que praticou o ato determinador da suspensão
(temporária ou definitiva) do trabalho da empresa.
A título ilustrativo, transcrevemos ementa do colendo TST sobre o tema:
CLÍNICA MÉDICA “SANTA GENOVEVA”. FACTUM
PRINCIPIS. FATO NOTÓRIO. PROVA. O factum principis supõe ato estatal, um
ato de império, e não se caracteriza se a administração pública age
como contratante e intervém na contratada que, por má administração,
causou a morte de quase uma centena de pacientes, bem como não acarreta a
responsabilidade do ente público pelos encargos trabalhistas do
empregador. Portanto, a decisão que, sob exame da prova, reconheceu a
notoriedade do fato descrito, para efeito de recusar a alegação de que
houve um fato do príncipe, não viabiliza o recurso de natureza
extraordinária. Cabia à Reclamada o ônus da contraprova (CPC, art. 333,
II). Agravo de instrumento a que se nega provimento. (Tribunal: TST
Decisão: 6.11.2002, Proc: AIRR n. 699730. Ano: 2000. Região: 1. Agravo
de Instrumento em Recurso de Revista Turma: 5. Órgão Julgador — Quinta
Turma Relator: Juiz Convocado Walmir Oliveira da Costa, DJ 22.11.2002)
Com exceção desses casos, a responsabilidade é sempre da empresa que
deve arcar com o risco do negócio. O empregado não pode ser constrangido
a socializar prejuízos para os quais não concorreu. Não acarreta,
ademais, a responsabilidade do ente público pelos encargos trabalhistas
do empregador.
Se o empregador, por sua culpa exclusiva, der causa à interdição de
um ou mais de seus estabelecimentos ou plantas industriais, pelo órgão
fiscalizador, deverá assumir, na integralidade, a responsabilidade por
sua incúria ou negligência na administração de seus negócios, como,
aliás, preconiza o art. 501 da CLT, anteriormente enunciado. Nesse caso,
não poderá invocar a ocorrência de força maior, nem o enquadramento do
evento na Teoria da Imprevisão (Teoria Rebus Sic Stantibus) para tentar se desincumbir do pagamento dos encargos.
Para a configuração do fato do príncipe, de forma que o empregador
possa elidir a sua responsabilidade pelo evento, será necessária a
ocorrência das seguintes situações fáticas, quais sejam:
- a) a imprevisibilidade do evento danoso;
- b) a inexistência de concurso direto ou indireto do empregador no aludido fato;
- c) a necessidade imperativa de que o evento atinja frontalmente e significativamente a situação econômico-financeira do empreendimento do empregador.
Desta forma, podemos concluir neste ponto que se o empregador tiver
suas atividades suspensas, temporária ou definitivamente, por ato
estatal (Município, Estado e União), sem que tenha havido de sua parte
qualquer concurso direto ou indireto e o evento, no caso, a pandemia do
coronavírus atingiu frontalmente e substancialmente sua situação
econômica e financeira, o Estado deverá responder solidariamente por
eventuais custos com rescisão de contratos de trabalho de empregados
da empresa, enquanto esta responderá por suas inerentes responsabilidade
contratuais (salários pendentes, férias atrasadas, normais, terço
constitucional etc).
Portanto, havendo dispensa individual ou coletiva (esta
preferencialmente negociada com o sindicato da categoria profissional
para que não haja problemas com as autoridades), o Estado, nos casos do
coronavírus, deverá responder solidariamente com as empresas pelas
verbas da indenização. As verbas rescisórias ficarão a cargo do Estado,
como responsável solidário, e as verbas normais do contrato de trabalho
sob a responsabilidade do empregador.
Fonte: http://genjuridico.com.br/2020/03/20/responsabilidade-empregador-coronavirus/
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