Perfil

Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

Mensagem aos leitores

Benvindo ao universo dos leitores do Izidoro.
Você está convidado a tecer comentários sobre as matérias postadas, os quais serão publicados automaticamente e mantidos neste blog, mesmo que contenham opinião contrária à emitida pelo mantenedor, salvo opiniões extremamente ofensivas, que serão expurgadas, ao critério exclusivo do blogueiro.
Não serão aceitas mensagens destinadas a propaganda comercial ou de serviços, sem que previamente consultado o responsável pelo blog.



domingo, 8 de setembro de 2013

Testemunha do holocausto mora em Florianópolis

Holocausto. Eslovaco foi obrigado a transportar corpos para o crematório no campo de extermínio de Ravensbrück, na Alemanha



Paulo Clóvis Schmitz


FLORIANÓPOLIS 

Débora Klempous/ND


Eslovaco Jack Miller sobreviveu à barbárie do campo de concentração de Auschwitz

“Estuvo en Auschwitz”, diz em espanhol o eslovaco Jack Miller, 84 anos, que em novembro de 1944 viu-se transportado para o campo de extermínio de Ravensbrück, próximo a Berlim, e de lá saiu oito meses depois, quando os alemães perderam a guerra para os russos e as tropas aliadas. Ele e sua família foram retirados à força de um bunker construído na cidade de Polodinesk, onde tinham negócios na área madeireira, e levados até campos onde poucos judeus sobreviveram. Como Ravensbrück era destinado principalmente a prisioneiras femininas, Jack foi com a mãe Charlot, nascida em Nova York, para lá. Samuel, o pai, ficou em Auschwitz, na Polônia, de onde jamais saiu. “Ele limpou o vidro da janela do trem e fez um sinal: foi a última vez que o vi”, conta.


Filho de uma família rica, passar a pão seco, água e alguma sopa, e transportar os homens mortos em carrinhos de mão até o crematório feminino, foi uma experiência terrível para o jovem eslovaco de 16 anos. O frio extremo, as “marchas da morte” e os trabalhos forçados, que esgotavam até o definhamento a energia dos prisioneiros, ainda marcam o corpo e a mente de Jack Miller. Ali e em outros campos, muitos judeus eram obrigados a carregar peso até morrer de fraqueza e esgotamento – e os homens que enterravam as vítimas eram executados em seguida, tombando na mesma vala. Em Ravensbrück, calcula-se que houve 95 mil mortes de 1939 a 1945. Foi ali que morreu a revolucionária Olga Benário, mulher de Luiz Carlos Prestes, em abril de 1942. Em Auschwitz, estima-se que pereceram entre 1,1 e 1,4 milhão de pessoas.


Hoje, Jack Miller mora em Florianópolis, para onde veio depois de um acidente de carro no Chile, onde morava com a mulher Silvia, descendente de russos. A única filha do casal, Judith, já residia na Ilha e cuida dos pais. “Estamos vivos por milagre”, diz o eslovaco, que fala sete idiomas e ainda recebe uma pensão do governo alemão por causa dos crimes praticados contra os judeus durante a 2ª Guerra.


Estupros, execuções, canibalismo


Entre o que viu e o que ficou sabendo, Jack Miller guardou relatos que chocam pela crueza. Estupros e a agressão a mulheres, a prostituição forçada, a execução sumária dos prisioneiros, a fome e as doenças – tudo o que está nos livros também ficou registrado em sua memória. Os alojamentos eram gelados, quase sem ventilação e luminosidade. E os alemães chegavam a fazer exames íntimos e de toque para evitar que os prisioneiros levassem jóias e outros objetos para os campos de concentração. Frank também ouviu notícias de canibalismo, praticado pelos russos que chegavam às regiões onde a Alemanha perdia terreno e recuava inapelavelmente, nos últimos anos da guerra.


Os conflitos ocorriam em diferentes partes da Europa e havia muita desinformação sobre o que estava acontecendo. “Por relatos que chegaram a Praga, ficamos sabendo dos campos de extermínio, mas muitas pessoas não acreditavam que eles de fato existissem”, diz Jack. O grupo que estava no bunker de Polodinesk caiu porque foi denunciado por pessoas lhes que forneciam comida. Eles tentaram se refugiar num bosque, mas foram alcançados pelos alemães. Foi um primo de Jack que era médico em Auschwitz que avisou, ainda no trem, que ele e a mãe iriam para Ravensbrück. Perguntando sobre a pior impressão que trouxe do campo, Frank não titubeia: “Hambre” (fome). Ele suspeita que o pai também morreu de inanição, porque fumava muito e trocava – prática comum nos campos de concentração – a rara comida por cigarros.


Até a morte carregando pedras


Nascido em 16 de dezembro de 1928, Jack Miller (Müller de nascimento) é um homem de cultura refinada, que chegou a estudar o latim e o grego e que vê todos os filmes que saem sobre a 2ª Guerra Mundial. Chegou a ser chamado pelo cineasta Steven Spielberg para participar de um documentário sobre o conflito, mas recusou o convite. Sem ter visto o recente “Hannah Arendt”, de Margarethe Von Trotta, recorda da história de Adolf Eichmann, considerado um dos maiores carrascos do nazismo, julgado e enforcado em Israel em 1952. A cada pergunta que tentava explorar aspectos delicados no campo de concentração onde ficou, os traumas que carrega e situações políticas envolvendo judeus e alemães, ele repetia, através da neta Catherine, que traduzia parte de suas falas: “Isso não tem importância!” Ele viu um dos melhores amigos e seu filho (familiares de uma tia que não quis se prostituir) trabalharem até a morte carregando peso. “Ninguém vivia mais de três meses nessas condições”, afirma.


Pelo mundo, até chegar ao Chile e ao Brasil


Depois de saírem do campo de Ravensbrück, após conseguirem passaportes válidos em Praga, Charlot e o filho foram para os Estados, embarcando no porto de Marselha, no sul da França. A família tinha parentes ricos que garantiram seu sustento em terras americanas. Ali, Jack se alistou no exército e chegou a ser cogitado para lutar na guerra do Coreia, mas acabou ficando e atuando como tradutor. Morou no México, no Equador, na Espanha, na Inglaterra e na Venezuela, onde nasceu a filha Judith. Supervisor da empresa multinacional Gilette, também morou no Chile, e foi em Arica, no norte do país, que conheceu a mulher, Silvia Guelfand.


Em Santiago, certa vez, viu um ex-oficial da SS, e pensou em agredi-lo, mas foi contido por um cunhado, irmão de sua mulher. Morando perto do palácio de La Moneda, nos anos em que Augusto Pinochet era presidente, ouvia sempre uma marcha militar chamada “Erika”, usada pelos nazistas na Alemanha. “También me gusta”, confessa Frank falando sobre a canção, mesmo sabendo que era uma música adotada pelos nazistas e que era a preferida do ditador chileno.


Na casa onde mora, em Florianópolis, Jack vive com Silvia, a filha Judith e o genro, a neta Katherine e o marido e o bisneto Gabriel. Mostra fotos dos pais e avós, primos e tios na Eslováquia, e imagens da juventude, veraneando em Acapulco, então a praia mais famosa do México. Também tem algumas imagens da infância em Polodinesk, quando “ia para a escola de esqui”. A família era a única que tinha carro na cidade natal, e os carrões o acompanharam em outros lugares, sempre rodeado de amigos e jovens bonitas, já na América do Norte. Até hoje, a família luta na justiça para reaver as propriedades na Eslováquia. Na semana passada, Jack e Silvia comemoraram 51 anos de casamento.






CRONOLOGIA DA GUERRA


1933 – Adolf Hitler torna-se chanceler da Alemanha, abolindo a democracia e criando as condições para a implantação de um governo unipartidário liderado pelos nazistas


1936 – Hitler e o líder fascista italiano Benito Mussolini apóiam a insurreição nacionalista do general Francisco Franco que resultou na Guerra Civil Espanhola


Março de 1938 – A Alemanha anexa a Áustria ao seu território


01/09/1939 – Começa a 2ª Guerra Mundial, com a invasão da Polônia pelas tropas alemãs


10/05/1940 – A Alemanha, que já havia anexado vários territórios e países europeus, invade a França, a Bélgica, os Países Baixos e Luxemburgo


22/06/1941 – A Alemanha e outros membros europeus do Eixo invadem a União Soviética


07/12/1941 – O Japão, que já entrara em conflito com a China, ataca a frota americana em Pearl Harbour, no Pacífico, levando os Estados Unidos, o Reino Unido, a China e a Austrália a declarar guerra formal contra os japoneses


1942 – Os Aliados começam a virar o jogo, recuperando territórios conquistados pelo Eixo na Europa e no norte da África


Final de 1943 – Os Aliados ocidentais lutam até chegar à principal linha defensiva alemã, na península itálica


Janeiro de 1944 – Grande ofensiva soviética expulsa os alemães da região de Leningrado


06/06/1944 (o dia D) – Os Aliados invadem o norte da França e começam a virar os rumos da guerra no centro da Europa


Setembro de 1944 – Tropas do Exército Vermelho avançam sobre a Iugoslávia e forçam a saída paulatino das forças alemãs também da Grécia e da Albânia


Fevereiro de 1945 – Os soviéticos invadem a Silésia e a Pomerânia, e em seguida os Aliados ocidentais cercam os últimos batalhões alemães e invadem a Itália


28/04/1945 – Benito Mussolini é morto por partisans italianos 


30/04/1945 – O Reichstag foi capturado, simbolizando a derrota militar do Terceiro Reich. Hitler comete suicídio





Agosto de 1945 – Os Estados Unidos lançam bombas atômicas sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, e o Japão se rende poucos dias depois

Fonte: DIÁRIO CATARINENSE

Nenhum comentário: