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quarta-feira, 3 de agosto de 2011

COM QUEM ESTÁ A RAZÃO, NO EMBATE ENTRE CIVIS E MILITARES?

Conflito aberto entre a Polícia Civil e Polícia Militar


Confira, abaixo, a íntegra da carta encaminhada pela Associação dos Delegados ao presidente do Tribunal de Justiça:

Sr. Presidente,

Vivemos em uma sociedade civil e democrática. Não se pode admitir em sã consciência que sejamos investigados por entes militares, auxiliares do exército. Não se pode admitir que pessoas sejam conduzidas a quartéis militares, de acesso restrito e controlado, para responderem por crimes civis praticados em tempo de paz. Não se pode admitir uma sociedade civil organizada ser controlada por organizações militares cujo treinamento e escalonamento hierárquico é direcionado e derivado da guerra.
A Polícia Civil de Santa Catarina, desde há muito tempo, vem denunciando a sobreposição ilegal de atribuições praticada a “manu militari” pela Polícia Militar de Santa Catarina, através da postulação em juízo para obtenção de medidas cautelares como buscas e apreensões e interceptações de ligações telefônicas. Todavia, pior do que a postulação em juízo é o acolhimento judicial de tais postulações sem sequer a existência de um procedimento persecutório regular instaurado. Uma verdadeira afronta às garantias individuais a tanto sacrifício conquistadas.
Por vezes, tais postulações em juízo são realizadas através de subterfúgios imorais, onde o Ministério Público é manipulado por Policiais Militares que lhe entregam investigações informais, rústicas e amadorescas e que servem de embasamento para as representações de busca e apreensão ou de interceptação de ligações telefônicas que culminam deferidas pelo Poder Judiciário catarinense.
Tais usurpações de atribuições reiteradamente realizadas pela Polícia Militar de Santa Catarina têm gerado, ao longo dos anos, situações de conflito e crises institucionais alimentadas pela omissão das autoridades competentes em simplesmente determinar que cada instituição cumpra o seu papel constitucional.
Pior ainda do que a usurpação das atribuições constitucionais é a usurpação seletiva das atribuições, onde Policiais Militares escolhem o que desejam investigar e investigam sem qualquer compromisso com a resolutividade ou a legalidade. Afinal, se entendem ter atribuição, por que não a assumem integralmente? Aí não…tudo não, só o que interessa.
Tais atitudes chegaram aos seus ápices, na forma dos “cases” que se anexa nesta oportunidade e que revelam a torpeza, a inconseqüência e o desrespeito para com o ordenamento jurídico, trazendo a triste recordação dos períodos ditatoriais em que a solução era sempre “militar”.
O fundamento jurídico do inconformismo apresentado é cristalino ao ponto de ser óbvio, a partir da prática lesiva da extensão ilegal da competência da Polícia Militar catarinense à patamares afrontosos ao ordenamento normativo, conforme reitera-se a seguir:



Constituição Federal, art. 144, § 5º:
§ 5º – às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
Constituição Estadual, art. 107:
Art. 107. À Polícia Militar, órgão permanente, força auxiliar, reserva do Exército, organizada com base na hierarquia e na disciplina, subordinada ao Governador do Estado, cabe, nos limites de sua competência, além de outras atribuições estabelecidas em Lei:
I – exercer a polícia ostensiva relacionada com:
a) a preservação da ordem e da segurança pública;
b) o radiopatrulhamento terrestre, aéreo, lacustre e fluvial;
c) o patrulhamento rodoviário;
d) a guarda e a fiscalização das florestas e dos mananciais;
e) a guarda e a fiscalização do trânsito urbano;
f) a polícia judiciária militar, nos termos de lei federal;
g) a proteção do meio ambiente;
h) a garantia do exercício do poder de polícia dos órgãos e entidades públicas, especialmente da área fazendária, sanitária, de proteção ambiental, de uso e ocupação do solo e de patrimônio cultural;
II – cooperar com órgãos de defesa civil; e
III – atuar preventivamente como força de dissuasão e repressivamente como de restauração da ordem pública.
Da análise do fundamento normativo brasileiro e catarinense, extrai-se com clareza meridiana que a Polícia Militar de Santa Catarina têm se esmerado na usurpação das atribuições da Polícia Civil de Santa Catarina, estendendo suas atribuições sob as vistas silentes de todos os órgãos governamentais, judiciais e ministeriais, gerando inúmeros conflitos pela omissão do Estado em colocar cada um no seu lugar.
Recentemente, o desrespeito aos preceitos constitucionais que fixam as competências nos organismos de segurança pública, gerou ao Brasil uma condenação pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, no conhecido caso Escher, quando um Policial Militar, usurpando as funções da Polícia Judiciária, investigou um crime civil envolvendo integrantes do MST no Paraná.
O maior benefício que se pode dar à segurança pública é o cumprimento da lei. Mas o que dizer quando a lei passa a ser descumprida por quem deveria zelar pelo seu cumprimento?
Ao que se extrai da atual situação, zelar pelo cumprimento da lei passou a se chamar “corporativismo”, e violar a norma passou a se chamar “interesse público”.
Não é possível que se permaneça a admitir a competência administrativa concorrente, onde uma instituição (Polícia Civil) é obrigada a agir e a outra (Polícia Militar) seleciona aonde agir de acordo com seus interesses. Trata-se de uma desorganização do Estado agravada pelo famigerado Decreto Estadual 660/2007, que misturou atribuições e agudou um quadro que culminará em inevitável confronto.
 O problema instalado é grave e o alerta está lançado. A solução preconizada é de tamanha lógica que chega a ser risível se chegar a este patamar de conflito. Basta que cada um desempenhe suas atribuições dentro do que limita a lei; basta que cada um faça a sua atribuição; basta o respeito institucional.
A apuração das infrações penais se materializa através da investigação criminal, em todos os níveis, por meio do Inquérito Policial e do Termo Circunstanciado instruídos pela Polícia Judiciária. Assim como as medidas cautelares somente podem ser lançadas no curso de uma investigação policial formal em um dos dois instrumentos pré-processuais citados, sob pena de subversão da ordem e da violação dos direitos e garantias individuais.
Cita a Constituição Federal, art. 144, § 4º:
§ 4º – às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
A Constituição Estadual ratifica no art. 106:
Art. 106. A Polícia Civil, dirigida por delegado de polícia, subordina-se ao Governador do Estado, cabendo-lhe:
I – ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração das infrações penais, exceto as militares;
II – Revogado pela Emenda Constitucional n. 39;
III – a execução dos serviços administrativos de trânsito;
IV – a supervisão dos serviços de segurança privada;
V – o controle da propriedade e uso de armas, munições, explosivos e outros produtos controlados;
VI – a fiscalização de jogos e diversões públicas.

A Lei 9.296/96 condiciona a concessão da interceptação telefônica a existência de Inquérito Policial em curso:
Art. 3° A interceptação das comunicações telefônicas poderá ser determinada pelo juiz, de ofício ou a requerimento:
 I – da autoridade policial, na investigação criminal;
 II – do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal.
Art. 8° A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas
Por estes motivos é que se requer à Vossa Excelência que:
  1. Na estrita obediência ao ordenamento jurídico vigente e válido, oriente os Dignos Magistrados do Estado de Santa Catarina a reconhecer como única autoridade policial para fins processuais o Delegado de Polícia no exercício de suas atribuições;
  2. Dentro das limitações legais que vinculam as instituições policiais, oriente os Magistrados do Estado de Santa Catarina para que se abstenham de conceder medidas cautelares de busca e apreensão, ou interceptações telefônicas, senão aquelas oriundas do Ministério Público ou da autoridade policial processualmente reconhecida como o Delegado de Polícia;
  3. Em obediência aos ditames constitucionais, oriente os Magistrados Catarineneses no sentido de não mais recepcionarem investigações policiais materializadas em Termos Circunstanciados oriundos de instituições militares com competência única e exclusiva para proceder a apuração penal de crimes militares;
Firmo respeitosamente,

Fonte: DIÁRIO CATARINENSE

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