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sexta-feira, 15 de maio de 2015

Menina cigana é mãe aos 14 e aos 15 anos e o marido está no banco dos réus



Tribunal de Aveiro começa hoje a julgar um caso que envolve uma menor mãe de dois bebés. Marido, mãe, padrasto e sogros estão acusados, em co-autoria, de dois crimes de abuso sexual de criança. Esta história tem usos e costumes da comunidade cigana. Como vai a justiça analisar este processo?Esta história tem usos e costumes da comunidade cigana. Como vai a justiça analisar este processo? ADRIANO MIRANDA



A história está contada no texto de acusação. Recuamos a 2011. Ela tem 12 anos, ele 17. Moram num acantonamento cigano na vila de Sosa, em Vagos, Aveiro. São primos diretos, começam a namorar, casam-se nesse mesmo ano com o consentimento das famílias e de acordo com os usos e costumes da comunidade cigana. No dia do casamento, segundo o Ministério Público (MP) da Comarca de Aveiro, passam a viver como marido e mulher, “em comunhão de cama, mesa e habitação”, em casa dos pais dele, sogros-tios dela. Aos 13 anos, ela engravida, aos 14 tem um menino. Sete meses depois, volta a engravidar. Com 15 é mãe pela segunda vez de mais um menino. O julgamento começa hoje no Tribunal de Aveiro às 14h00. No banco dos réus, estão cinco arguidos acusados, em co-autoria, de dois crimes de abuso sexual de criança agravados.

Em Fevereiro do ano passado, o marido-primo, a mãe, o padrasto, os sogros-tios da menina cigana são detidos pela Polícia Judiciária de Aveiro e ouvidos em tribunal. O caso chega à justiça através da comissão de protecção de menores e o processo acaba por seguir para julgamento. Os arguidos ficam proibidos de contactarem com a menor e obrigados a apresentarem-se duas vezes por semana no posto policial da sua área de residência – medidas entretanto extintas por terem sido ultrapassados os prazos máximos de duração previstos na lei. À mãe é ainda suspenso o exercício do poder parental. Na altura da detenção, a menina é institucionalizada com os dois filhos. Antes disso, ela e ele estudam numa escola em Vagos.

A 16 de Janeiro deste ano, o MP deduz acusação com base nos interrogatórios judiciais feitos aos arguidos. A menor também é ouvida na presença da mãe. Segundo o despacho de acusação, a que o PÚBLICO teve acesso, desde o dia do casamento que o rapaz “manteve relações sexuais de cópula completa com a menor, assim satisfazendo os seus instintos libidinosos”. Ela tinha 12 anos, ele 17. Ele é acusado de se ter aproveitado “da compleição física” da menor e da partilha da mesma casa para praticar “actos sexuais de relevo”, consciente de que ela poderia engravidar, como aconteceu por duas vezes, limitando assim, escreve o MP, “a liberdade de autodeterminação sexual” da menina. As famílias estão também acusadas por terem acordado e propiciado o casamento e, por conseguinte, os actos sexuais. O MP fala num “acordo de vontades” e numa “união de esforços” das famílias para que os seus filhos se juntassem e passassem a viver em casal. Sustenta que os arguidos agiram de “forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei” e sublinha ainda que todos os intervenientes no processo sabiam a idade da menina.

Em Maio do ano passado, na altura em que estava institucionalizada, e sem poder contactar com qualquer um dos arguidos, a menor é novamente ouvida por um juiz de instrução criminal, desta vez sozinha. Terá então mudado a história inicial. Nas declarações para memória futura, terá contado que fugiu com o namorado do acantonamento cigano, por sua insistência, e quando os dois regressam está grávida do primeiro filho. As famílias acolhem-nos. Nesta versão, terá negado o casamento cigano antes da primeira gravidez, relatará uma cerimónia simples de união depois do regresso ao acampamento.

Ela tem agora 16 anos, ele 20, em Julho fará 21. Há quase dois meses, quando fez 16 anos, sai da instituição, casa-se pelo civil com o pai dos seus filhos, com o consentimento da mãe. Emancipa-se pelo casamento. Ele está inscrito no centro de emprego, procura o primeiro trabalho. Já não está no acantonamento cigano, vivem numa casa arrendada em Vagos com a mãe dela.

Pressão social
Maria José Casa-Nova, investigadora da Universidade do Minho e coordenadora do Núcleo de Educação para os Direitos Humanos da mesma faculdade, investiga a população cigana portuguesa desde 1991. Tem vários livros sobre o tema. É conselheira do Alto Comissariado para as Migrações para a monitorização da implementação da estratégia nacional para a integração das comunidades ciganas e integra o conselho científico do Observatório das Comunidades Ciganas, recentemente criado. Na sua opinião, o foco deste caso deve estar nos pais e não no jovem casal.

“Independentemente da vontade, constrangida pelos processos de socialização, da adolescente – ou seja, manifestar desejo ou não de casar com o jovem em questão -, engravidar aos 13 anos e ser mãe aos 14, pode ser considerado uma violência física e psicológica, ao mesmo tempo que impossibilita a adolescente de viver a sua juventude. Por outro lado, a jovem foi retirada do meio familiar e colocada numa instituição, desconhecendo se por vontade própria ou não, o que se torna significativo na apreciação do caso”. “Criminalizar um jovem, o marido, que desconhecemos se também foi vítima de constrangimento familiar, não é, na minha perspectiva, fazer justiça”, refere. A ênfase deve, portanto, ser colocada nos pais dos jovens e nas suas motivações. “É usual dizer-se que a justiça tem de ser cega para ser justa – ou seja, aplicar igualmente a lei, independentemente do caso em análise. Ora se esta asserção é verdadeira para determinadas situações, não o é para outras em que a justiça, para ser justa, necessita de ter em atenção os contextos e os processos dos quais resultaram determinado tipo de comportamento. Isto é válido para qualquer situação em julgamento”, acrescenta.

Fonte: http://www.publico.pt/

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