Perfil

Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

Mensagem aos leitores

Benvindo ao universo dos leitores do Izidoro.
Você está convidado a tecer comentários sobre as matérias postadas, os quais serão publicados automaticamente e mantidos neste blog, mesmo que contenham opinião contrária à emitida pelo mantenedor, salvo opiniões extremamente ofensivas, que serão expurgadas, ao critério exclusivo do blogueiro.
Não serão aceitas mensagens destinadas a propaganda comercial ou de serviços, sem que previamente consultado o responsável pelo blog.



terça-feira, 29 de junho de 2010

Polícia e corrupção

"A corrupção se entranhou nas polícias"

O secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, afirma que essa é uma chaga das polícias em todo o país.

João Marcello Erthal

O secretário estadual de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, fala sobre a implantação da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) no Morro do Andaraí

O secretário estadual de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame fala sobre a implantação da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) no Morro do Andaraí, no Rio de Janeiro (PAULO ARAÚJO/AGÊNCIA O DIA/AE)

Não podemos atropelar o estado democrático de direito, a chance de defesa. Mas hoje há uma distância muito grande entre o patamar de ampla defesa e o caráter exemplar da pena. E aí está a sensação de impunidade

Prender policiais corruptos dá Ibope. O lado sujo das polícias está em cena em ‘Na Forma da Lei’, nas noites de terça-feira da Globo, e foi tema principal do seriado ‘Força Tarefa’ - em que Murilo Benício aparecia como agente da corregedoria, combatendo crimes dentro da Polícia Militar no Rio. Em setembro tem mais. É quando está prevista a estréia de ‘Tropa de Elite 2’, a continuação da saga do Capitão Nascimento (Wagner Moura), desta vez desafiado por policiais e políticos corruptos ligados a milícias. Corrupção e desvios de agentes da lei temperam a nova fase da ficção policial brasileira, inaugurada pelo primeiro ‘Tropa’. A nota triste é que, se nas telas a corrupção policial entrou em moda, na vida real nunca chegou a cair em desuso, desde os tempos em que a contravenção era alimentada apenas pelas apostas do jogo de bicho em bloquinhos de papel. Na definição do secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, esta é uma chaga das polícias em todo o país.

No Rio, só em 2009 foram expulsos 300 policiais militares e 36 civis. O número é parecido com o de São Paulo, que em pouco mais de um ano excluiu de seus quadros 317 agentes civis e militares envolvidos com desvios. Gaúcho, Beltrame é delegado da Polícia Federal e atuou em vários estados – entre eles o Rio, onde comandou a Missão Suporte, um grupo de elite dedicado a coordenar ações de inteligência entre a PF e as polícias estaduais. A função de secretário é ingrata, e exige administrar episódios como a derrubada de um helicóptero da PM por traficantes, em outubro do ano passado. Mas Beltrame tem tido bom ibope. Desde 2007 no cargo, completou um recorde em abril deste ano: foi o secretário que mais tempo permaneceu na cadeira desde a criação do estado do Rio de Janeiro, em 1975. É ele quem comanda programas como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que transformam favelas em cartões de visita do Rio. Uma delas, o Morro Santa Marta, ganhou status de ponto turístico e foi visitada no ano passado pela cantora Madonna, ciceroneada pelo governador Sérgio Cabral. Beltrame falou a VEJA.com sobre o desafio de, sem balas de festim, enfrentar o envolvimento de policiais com o crime.

O sucesso do combate à corrupção na ficção não é um sinal de que a sociedade quer ver isso acontecer na vida real?
A corrupção é um problema brasileiro, e o Rio está nesse contexto. É uma chaga das polícias. Através das corregedorias, colocando nelas pessoas fora dos quadros das polícias, avançamos bastante. Está bom? Não está. Há muito a se fazer. Culturalmente, a corrupção se entranhou nas polícias com uma série de práticas. Quando pegamos o flagrante, tiramos o policial imediatamente. Mas se não temos o flagrante temos que investigar, formar a prova. E provar é difícil.

Qual é a dificuldade?
Nas corregedorias, são policiais investigando policiais. Há vazamentos, ameaças. Mas acho que houve uma evolução. Temos um número grande de policiais presos, de demitidos. Não me lembro de, nos últimos governos, termos demitido delegados, inspetores de polícia como fizemos recentemente. Fomos além: conseguimos prender parlamentares.

Mesmo assim, persiste a sensação de impunidade. Ou de que, quando há punição, ela é muito lenta.
É preciso que o rito seja sumário. Não podemos atropelar o estado democrático de direito, a chance de defesa. Mas hoje há uma distância muito grande entre o patamar de ampla defesa e o caráter exemplar da pena. E aí está a sensação de impunidade. Levo dois anos e meio para expulsar um delegado da Polícia Civil que tenha se envolvido com o crime. Nesse meio tempo, o caráter exemplar da pena se perde. E a sociedade vai dizer que a corregedoria não trabalha, que a polícia é corporativa. O processo administrativo permite que um acusado intime uma testemunha do Piauí. Eles fazem isso e não temos como impedir.

Como melhorar a qualidade das forças policiais?
Os policiais que entram hoje nas novas turmas são melhores. Mas não é porque são apaixonados pelas polícias. Existe uma questão de mercado por trás dessa mudança. Está difícil, complicado conseguir emprego. E gente mais qualificada acaba buscando a polícia. Mas o ingresso nos quadros só vai dar um salto quando oferecermos um salário razoável. Só assim conseguiremos o efeito que se conseguiu na Polícia Federal. Imagine um concurso no Rio de Janeiro para o soldado receber o salário de um policial de Brasília, de mais de 3 000 reais... (no Rio, o salário é de 1 100 reais).

O estado está preparado para formar e contratar policiais de forma contínua, para atingir metas como as de 50 UPPs prometidas para os Jogos Olímpicos de 2016?
Não assumiríamos o compromisso de ampliar de 38 mil para o patamar dos 50 mil o número de policiais militares sem nos estruturarmos. As academias de polícia estão sendo preparadas para isso, e os gestores do estado estão conscientes. Independentemente de qualquer evento esportivo, temos que contratar. A carência é muito grande. Não temos hoje nenhum batalhão da PM que esteja sequer com 70% ou 80% de sua capacidade ideal, para a população que atende. Todos estão muito aquém disso. Até recentemente, não havia critério para se fazer concurso para a polícia. Nós precisamos e vamos formar, até 2016, 4 000 policiais militares por ano. E faremos isso a partir de 2010.

Em Copacabana, bairro que recebeu três Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), em fevereiro caiu a zero o índice de homicídios e de outros três crimes. Como isso foi possível?
O resultado foi obtido por um conjunto de medidas. O bairro recebeu três UPPs (ao todo, chegaram 343 novos policiais para as favelas, o que praticamente dobrou o total de PMs no bairro). O que deu certo ali está sendo levado para o resto da cidade. Temos viaturas circulando, operações para apreender motos, que são veículos muito usados para crimes.

Pouco depois de assumir a secretaria, o senhor afirmou que estaria com sua missão cumprida se devolvesse ao cidadão do Rio a tranquilidade para sair de casa, andar na rua. Quanto o Rio avançou nesse sentido?
Mostramos uma matriz do que é possível fazer, com condições logísticas. Não vou correr o risco de falar em números. Mas me animo a dizer que tiramos da ponta do fuzil mais de 200 mil pessoas que viviam diretamente afetadas pelo poder armado do tráfico. Temos condição de chegar a 2014 com uma taxa de 22 ou 23 homicídios para cada 100 mil habitantes. Assumimos com este índice em 39 e estamos perto de 33. Ainda é uma taxa muito alta. Mas saímos de um quadro bem pior.

As UPPs vão chegar às grandes favelas, como no Alemão e no Complexo da Penha, onde o controle do território ainda é do tráfico?
Vão. Não te digo quando. É preciso que chegue para que a população tenha tranquilidade e o policial também tenha. Este policial aqui da esquina, que está tomando conta do cruzamento, a qualquer momento pode ser chamado pelo comandante do batalhão com o aviso: vamos entrar numa favela. Ele, então, vai se transformar em guerreiro, botar um colete, largar a pistola, pegar o fuzil para subir o morro e, lá, matar ou morrer. Ele vive estressado, com a adrenalina a mil. Se eu diminuir isso, estou entregando para a população um policial com outra cabeça. Nas UPPs, entrego ao policial uma área pacificada, onde ele faz a manutenção da segurança. E com isso ele pode amarrar a linha da pipa que arrebentou, devolver a bola para os garotos, atender de fato a população. No Santa Marta, o policial trata a população de forma diferente porque também recebe tratamento diferente.

Fonte: Revista VEJA

Nenhum comentário: