A Justiça argentina começou a julgar ontem três militares e três civis acusados de comandar o centro clandestino de detenção e tortura Automotores Orletti, instalado pelo serviço de inteligência do último regime militar do país (1976-1983). Disfarçado de oficina mecânica, o local foi cativeiro de argentinos, uruguaios, bolivianos e cubanos e é considerado símbolo da Operação Condor --articulação repressiva entre as ditaduras sul-americanas.

O Ministério Público atribui crimes contra a humanidade ao general do Exército reformado Eduardo Rodolfo Cabanillas, atualmente preso, ao coronel Rubén Visuara e ao comodoro da Força Aérea Néstor Guillamondegui. Os réus civis são Raúl Guglielminetti, Eduardo Ruffo e Honorio Ruiz, ex-agentes do órgão de inteligência argentino e do Exército. Os três já estão presos.

Não há previsão para o término do julgamento, mas estima-se que demore meses. Tantos os militares como os civis responderão por 65 casos de sequestro, tortura e assassinato.

A vítima mais conhecida do Automotores Orletti é Marcelo Gelman, filho do poeta e jornalista argentino Juan Gelman. O corpo dele foi encontrado em 1976 no fundo de um rio, dentro de um tanque de concreto. Sua mulher foi levada grávida a outro centro de detenção clandestino, no Uruguai, e nunca foi encontrada. A filha do casal nasceu em cativeiro e foi entregue pelos militares a uma família uruguaia. Em 2000, a menina foi restituída à família pela Associação Avós da Praça de Maio, que se dedica a recuperar filhos de desaparecidos.

As entidades de direitos humanos estimam que o aparato repressor do Estado argentino matou mais de 30 mil pessoas durante a última ditadura.

Os processos judiciais contra militares e agentes acusados de crimes ocorridos na época foram retomados depois de o governo do presidente Néstor Kirchner revogar a lei de anistia em 2005.

Fonte: Folha de SP