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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Cabeludos fora!


Processo: 0180007-5

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CASAMENTO EM IGREJA CRISTÃ PENTECOSTAL. PROIBIÇÃO DE O PAI ACOMPANHAR A FILHA AO ALTAR POR USAR CABELOS COMPRIDOS. PROIBIÇÃO CONTIDA NO REGIMENTO INTERNO DA IGREJA. ALEGAÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO. FILHA QUE OPTOU PELO CASAMENTO NAQUELA IGREJA. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DA IGREJA DE MUDAR SUA REGRA PARA ATENDER O DESEJO DE PAI E FILHA. IGREJA À QUAL NINGUÉM É OBRIGADO A ADERIR, MAS SE ADERIR DEVE OBEDECER A SUAS REGRAS. NORMA INTERNA QUE NÃO CONTRARIA A CONSTITUIÇÃO. PUBLICIDADE DADA PELO PRÓPRIO AUTOR. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. IMPROVIMENTO DO RECURSO.
Se a proibição do uso de cabelos compridos nas cerimônias religiosas é regra geral e aceita pelos seguidores da igreja, e tendo a filha noiva escolhido a igreja para a cerimônia matrimonial, não pode o pai, que não é membro da igreja e usa cabelos compridos, se insurgir contra a proibição de conduzi-la até o altar, inclusive porque foi antecipadamente notificado da proibição, não se caracterizando ato discriminatório, não gerando dano moral.



I - RELATÓRIO:
O autor propôs a presente ação de indenização por danos morais alegando que é pai da Sra. Elaine dos Santos de Guerra, cujo casamento civil e a cerimônia religiosa foram realizadas em 07 de março de 1998.
Diz que no dia da celebração do casamento religioso o autor, pai da noiva, foi impedido de levá-la até o altar sob o argumento de que seu cabelo era comprido demais.
Alega que o presbítero confirmou perante testemunhas e depois perante a imprensa que o autor não poderia levar a filha até o altar por usar o cabelo muito comprido.
Assim alega ter sofrido danos morais, não podendo levar a filha até o altar e posteriormente ser motivo de piadas por populares e familiares.
Diz que a Constituição Federal garante o direito à reparação do dano moral e que os réus violaram sua intimidade, privacidade, honra e imagem, sofrendo ainda discriminação.
O segundo réu José Paixão de Barros em contestação de fls. 26/37 alega em preliminares a sua ilegitimidade passiva por ser apenas um religioso da igreja, não concorreram as condições da ação, litigância de má fé, preclusão no fato de não ter sido arroladas testemunhas na petição inicial.
No mérito alega que o pastor que realizou o casamento não foi o segundo réu, sendo que este estava viajando a serviço da igreja para a cidade de Sorocaba - SP.
Alega que não houve nenhuma atitude ilícita dos réus tendo o presbítero apenas seguido o regimento interno da igreja, não se tendo notícia de que tenha sido lançado qualquer tipo de ofensa ao autor e que a filha escolheu por vontade própria a igreja para se realizar o casamento.
Diz que quem deu publicidade ao fato foi o próprio autor que procurou emissoras de televisão, rádio e imprensa escrita.
Alega que o que configura os danos são toda e qualquer ofensa configurada como calúnia, difamação ou injúria, que não ocorreu no presente caso.
A primeira ré, Igreja Pentecostal Deus é Amor, em contestação de fls. 38/54 alega em preliminares as matérias abordadas também na contestação do segundo réu.
O autor impugnou a contestação (fls. 83).
Audiência de conciliação e saneamento (fls. 107).
Em instrução foram ouvidas testemunhas (fls. 214 e seguintes)e realizado perícia em fita cassete gravada pelo autor (fls. 156).
A sentença de fls. 219/224 julgou improcedente a ação.
O autor apelante em recurso de apelação de fls. 226/233 alega que ficou comprovado que o apelante sofreu grande constrangimento devido a uma imposição descabida do representante da igreja ré. Diz que a Constituição assegura a liberdade e direito de qualquer crença. Alega que os regulamentos devem ser respeitados, mas nunca estes podem se sobrepor a Constituição, o que ocorreu neste caso. Discorre que foi ameaçado pelo pastor de que se não cortasse o cabelo não poderia acompanhar a filha até o altar, conforme se verificou na fita gravada. Diz que o corte de cabelo feriria totalmente sua liberdade individual, e ainda que como músico profissional o corte iria lhe acarretar um prejuízo para sua imagem. Aduz que os danos morais estão claros tendo sido motivo de piada para amigos e familiares presentes à festa do casamento e ainda que os meios de comunicação também veicularam esta discriminação após o apelante tê-los contatado.
Ao final requer o provimento do recurso.
Recebido o recurso os réus apelados, em contra razões de fls.236/241, requerem o improvimento do recurso.
É O RELATÓRIO.
II - VOTO:
O recurso não merece provimento.
Não se configurou neste caso qualquer discriminação como alega o autor apelante.
Conforme se verifica dos autos, a filha do autor, seguidora da Igreja ré, por livre e espontânea vontade decidiu realizar a cerimônia de seu casamento nesta instituição religiosa. A filha segue as normas da Igreja. Antes da realização da cerimônia o autor foi informado pelo pastor presbítero que o regimento interno da igreja não permitia que o mesmo acompanhasse a filha até o altar pela proibição de uso de cabelos compridos, no que o autor foi tentar persuadi-lo, usando de um gravador para gravar a conversa entre ambos.
Não houve nenhuma agressão, física ou verbal, do representante da Igreja, que apenas lhe explicou os motivos do impedimento. Ora, qualquer instituição possui regulamentos internos que se fazem respeitar.
A proibição de uso de cabelos compridos é uma norma geral, para todos que nela pretendem ingressar ou que participem de suas cerimônias. O autor não comprovou que outra pessoa qualquer, que também usasse cabelos compridos, tenha sido autorizada a acompanhar a noiva até o altar. Se isso ocorresse ficaria configurada a discriminação contra o autor.
A filha do autor, como seguidora da Igreja ré, tinha pleno conhecimento do regulamento interno. Com isso sabia da proibição do pai de acompanhá-la até o altar com os cabelos compridos. Mas, mesmo assim insistiu em realizar o matrimônio naquela igreja, aceitando a regra do regulamento da instituição.
A Igreja tem regras internas próprias e só participa da cerimônia quem aceita as regras. Por isso, não houve atitude hostil da Igreja. A controvérsia, na verdade, se estabeleceu entre o autor e sua filha, pois esta quis que a cerimônia de casamento se desse naquela igreja, enquanto o autor condicionou sua participação ao uso dos cabelos longos, contrariando as normas da Igreja. Para solucionar a controvérsia estabelecida entre pai e filha, quis o autor que a igreja, alheia à controvérsia, contrariasse seus princípios. Ora, para a Igreja ré, a questão é RES INTER ALIOS ACTA.
Com relação à publicidade dada ao caso, a mesma foi provocada pelo próprio autor apelante que procurou a mídia para relatar os acontecimentos, não podendo com isso querer fundamentar o hipotético dano moral à publicidade havida.
A Constituição Federal não foi violada, pois se trata de uma regra de conduta interna de uma comunidade religiosa à qual ninguém é obrigado a aderir, mas se fizer a opção de adesão, deve respeitar seus regulamentos. No caso presente, foi a filha do autor quem optou, não podendo o autor exigir que a Igreja ré mude suas regras, para atender o desejo da filha de ali casar e do autor de usar cabelos compridos.
Diante disso meu voto é pelo improvimento do recurso.
ACORDAM os Juízes integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto.
Participaram do julgamento os Senhores Juízes RONALD SCHULMAN, Presidente, com voto e HAYTON LEE SWAIN FILHO.
Curitiba, 21 de outubro de 2003.
MARCOS DE LUCA FANCHIN - Relator

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