Editorial
13.01.2012 12:01
No
final de 2008 pareceu que o segundo muro havia ruído 19 anos após a
queda do primeiro em Berlim. Este para selar o colapso do chamado
socialismo real, aquele da main street do capitalismo para precipitar o
enterro do neoliberalismo. Enganaram-se os esperançosos analistas,
apressados. O célebre wall resistiu e o mercado prosseguiu no comando,
perdão, o MERCADO, deus último e famigerado.
Leio um texto exemplar de Carlo Azeglio Ciampi, límpido funcionário
do Estado, ex-presidente do Banco Central da Itália,
ex-primeiro-ministro, ex-presidente da República. Diz ele: “Desafiaram a
lei moral que permite distinguir a comunidade humana da selva (…)
fizeram da finança, aquela que, conforme os manuais de economia, está a
serviço da produção, da troca, do desenvolvimento, uma selva onde se
satisfazem apetites ferinos, onde impera a lei não escrita do desprezo
por todos os valores, afora o ganho, o sucesso, o poder”.
Ciampi fala de uma tormenta que dura há três décadas e confere ao
capitalismo “um rosto desumano”. A crise global atiça, em diferentes
instâncias, o debate sobre o estágio atual do capitalismo. Das
lideranças das forças produtivas aos intelectuais de diversos calibres e
aos analistas de publicações de alto nível, como The Economist, Foreign
Affairs, Financial Times. Em questão, o modelo político e econômico
ocidental, a partir de mudanças consolidadas. A globalização com seus
efeitos mais recentes, por exemplo. Ou o galope do avanço tecnológico.
É do conhecimento até do mundo mineral que conseguimos globalizar a
desgraça ao aprofundar os desequilíbrios entre ricos e pobres em todas
as latitudes de uma forma bastante peculiar. Deixemos de lado o Brasil,
reservado, como se diz de certos elementos de receitas culinárias.
Sobram países pobres, ou mesmo paupérrimos, e que continuam como tais, e
países ricos cada vez mais empobrecidos. A constatação inevitável nos
leva a validar a tese de que a riqueza foi transferida para algumas
corporações e seus mandachuvas. São eles os donos do mundo. A senhora
Merkel, o senhor Sarkô, tentam se dar ares de superioridade, mas não
convencem.
É a vitória dos especuladores e de -suas artimanhas, e não era com
isso que sonhava Adam Smith. Ou, muito tempo antes, o banqueiro genovês
que financiou a construção dos barcos destinados ao transporte das
tropas da Primeira Cruzada. As consequências do neoliberalismo, deste
selvagem fundamentalismo, não põem em xeque somente o sistema econômico
mundial, mas também a própria democracia, a qual não se satisfaz com a
-liberdade para buscar a igualdade. Ao menos, a igualdade de
oportunidades.
O mundo mineral continua a confirmar o senhor De La Palisse. O
neoliberalismo promove o predador espertalhão, ou, por outra, a lei da
selva, a acentuar a desigualdade. E onde fica a democracia? Daí a
preocupação de quem ainda a considera indispensável à realização de uma
sociedade que se pretenda justa. Chegou a hora de retirar o Brasil da
reserva em que me permiti colocá-lo, à espera de completar a receita. O
Brasil tende a sofrer menos com a crise, talvez muito menos, do que a
turma outrora seleta do ex-Primeiro Mundo.
O País deu e dá importantes passos à frente nos últimos nove anos.
Começa finalmente a aproveitar suas extraordinárias potencialidades, os
generosíssimos presentes da natureza, graças a governos contrariados
pela desigualdade. Como haveria de ser, aliás, todo capitalista
consciente das suas responsabilidades de cidadão de uma nação
democrática. Podemos crer que, de fato, somos uma nação democrática?
O Brasil é, a seu modo, um caso à parte, como alguns outros países.
Carecemos da passagem pelo Iluminismo e pela Revolução Francesa. A dita
elite brasileira é uma das mais atrasadas do mundo. Nunca usufruímos de
um Estado de Bem-Estar Social e os sistemas da indiscutível atribuição
estatal, educação, saúde e transporte público, são além de bisonhos. São
Paulo tem a segunda maior frota de helicópteros do mundo e uma enorme
área do País não conta com saneamento básico. Nesta moldura, a
democracia há de lutar bravamente para se afirmar.
A vantagem quem sabe esteja no seguinte ponto: a democracia perde
terreno para tantos que a conheceram e praticaram, nós temos largo
espaço à frente para conquistá-la.
-=-=-=-
Luis disse:
Fábio, pelo que eu entendo do Zizek, e que outros autores falam, como Ellen Woods (Democracia contra capitalismo), é que a "democracia" em termos do capitalismo é uma formalidade, é uma máscara para a tirania econômica que comanda a política como você acertadamente menciona. Assim, o que Zizek pelo menos qualifica positivamente de democracia ainda não existiu neste planeta, com exceção de algumas poucas experiências locais, visto que ele não é daqueles que sonham com Cuba, URSS ou os países nórdicos. Já Mino Carta, parece, acha que o PT é de esquerda e que está realizando ou caminhando no sentido de consolidar a democracia no país; eu discordo destas duas afirmações, embora concorde que em parte o PT rompe com o projeto da burguesia financeira "clássica" representado pela coligação PIG-PSDB-DEM e assim é "menos pior". Talvez também Mino seja da opinião que a democracia existe/existiu nos estados de Bem Estar Social, o que até seria mais aceitável, embora ainda para mim com muitas ressalvas. Assim, quem compra esta "imagem de democracia" que você se refere é Mino, e não o Zizek. Mino dá indícios de crer numa coexistência entre capitalismo e democracia - cita Adam Smith e menciona algo que nunca existiu, um "capitalista consciente das suas responsabilidades de cidadão de uma nação democrática". No momento em que for possível qualificar um capitalista desta maneira, ele passa a ser qualquer outra coisa, menos capitalista.
-=-=-=-
Luis disse:
Fábio, pelo que eu entendo do Zizek, e que outros autores falam, como Ellen Woods (Democracia contra capitalismo), é que a "democracia" em termos do capitalismo é uma formalidade, é uma máscara para a tirania econômica que comanda a política como você acertadamente menciona. Assim, o que Zizek pelo menos qualifica positivamente de democracia ainda não existiu neste planeta, com exceção de algumas poucas experiências locais, visto que ele não é daqueles que sonham com Cuba, URSS ou os países nórdicos. Já Mino Carta, parece, acha que o PT é de esquerda e que está realizando ou caminhando no sentido de consolidar a democracia no país; eu discordo destas duas afirmações, embora concorde que em parte o PT rompe com o projeto da burguesia financeira "clássica" representado pela coligação PIG-PSDB-DEM e assim é "menos pior". Talvez também Mino seja da opinião que a democracia existe/existiu nos estados de Bem Estar Social, o que até seria mais aceitável, embora ainda para mim com muitas ressalvas. Assim, quem compra esta "imagem de democracia" que você se refere é Mino, e não o Zizek. Mino dá indícios de crer numa coexistência entre capitalismo e democracia - cita Adam Smith e menciona algo que nunca existiu, um "capitalista consciente das suas responsabilidades de cidadão de uma nação democrática". No momento em que for possível qualificar um capitalista desta maneira, ele passa a ser qualquer outra coisa, menos capitalista.