Liam Mac an Bháird descobriu 25 propriedades vazias nos arredores de Dublin para ocupar.
Kim Haughton
Um novo movimento está a ocupar algumas das centenas
de imóveis abandonados desde o colapso económico de 2008, num protesto
não apenas contra falta de alojamentos, mas também contra a especulação
que levou à espetacular derrocada económica da Irlanda.
Numa altura em que a Irlanda põe em marcha um novo orçamento de
austeridade e se prepara para mais um ano de sofrimento económico, um
grupo de jovens ativistas começou a ocupar casas vazias geradas pelo
crescimento desmedido e abandonadas por bancos e empreiteiros por todo o
país.
Os ocupantes, ligados ao movimento Ocupar irlandês, dizem que
planeiam uma ocupação em massa de moradias e apartamentos na posse do
"bad bank" [banco incompetente] do Governo irlandês, a National Asset
Management Agency (NAMA – organismo governamental criado em finais de
2009 para trocar dívida dos bancos por títulos saudáveis do Estado).
Este organismo adquiriu milhares de propriedades aos especuladores, que
se desfizeram delas na sequência do desastre económico.
Liderados por um jovem de 27 anos que se expressa em irlandês,
formado na Universidade de Artes, Ciências Sociais e Estudos Celtas de
Galway, o grupo ocupou uma casa na zona norte de Dublin, que valia 550
mil euros na fase áurea e que agora está avaliada em menos de 200 mil
euros. Uma vez que a propriedade está vazia há vários anos, Liam Mac an
Bháird e os amigos ocuparam-na no outono passado, para enfatizar a falta
de alojamento, bem como a forma como construtores civis e bancos foram
socorridos pelo contribuinte.
Há cerca de 400 mil prédios vazios, na República da Irlanda, e o
Instituto Nacional de Análise Regional e Ordenamento Territorial (NIRSA)
alerta para que o número de imóveis vagos pode manter baixos os preços
da habitação por vários anos.
Seiscentas "propriedades-fantasma"
Mac an Bháird admite que o seu grupo está a infringir a lei, mas
argumenta que estão a manifestar uma posição política importante. "Há
milhares de pessoas sem abrigo no país, cerca de duas mil só nas ruas de
Dublin, esta noite. Mas por toda a cidade existem milhares de
apartamentos e moradias vazias – alguns podendo servir para a habitação
humana. Tenho vindo a defender, dentro do movimento Ocupar, que
precisamos de ocupar as casas do NAMA em Dublin, para revelar a
injustiça de um sistema em que milhares de milhões de euros foram
injetados nos bancos que deram tanto dinheiro a ganhar aos especuladores
imobiliários", argumenta.
As cerca de 600 "propriedades-fantasma" construídas nos anos do Tigre
Celta simbolizam agora a recessão irlandesa. O preço do salvamento de
bancos que emprestaram rios de dinheiro aos empreiteiros e aos
especuladores durante a fase de crescimento da bolha do imobiliário tem
sido altíssimo. Os economistas avaliam as perdas dos bancos irlandeses
em cerca de 106 mil milhões de euros.
Cresce a irritação em relação às instituições que a maioria do povo
irlandês culpa pelo colapso económico: os bancos privados apoiados pelo
Estado e os especuladores imobiliários. E é agravada pela miséria que
grassa por todo o país, uma vez que a Irlanda permanece atolada na
recessão. As estatísticas mais recentes do Instituto Central da
República, reveladas antes do Natal, constatam que o PIB da Irlanda
sofreu uma contração de 1,9% no terceiro trimestre de 2011.
Movimento vai impor regras aos "ocupas" da Irlanda
No acampamento dos Ocupar frente ao Banco Central da Irlanda, ponto
fulcral na oposição aos bancos e à política de salvamento que lhes tem
sido aplicada, Mac an Bháird sublinha que o seu movimento vai impor
regras aos “ocupas” da Irlanda: "Não são toleradas drogas nem bebidas
nesses lugares, durante as nossas ocupações, porque estamos a marcar uma
posição política. Também é um movimento totalmente não-violento, como
todo o movimento Occupy. E não levamos das casas que ocupamos nada que
não nos pertença." Explica que sobrevivem por "skip diving" – pedindo
restos de comida e alimentos que as grandes cadeias de supermercados
deitam fora todos os dias.
Quando o Governo irlandês impõe mais de 2,2 mil milhões de euros de
cortes no orçamento de dezembro, para equilibrar a dívida da Irlanda,
Mac an Bháird diz que a sua campanha está a ganhar o apoio de setores
normalmente conservadores: "Mesmo no acampamento Ocupar junto do Banco
Central, há pessoas de classe média que aparecem e nos dizem que
concordam com a nossa posição. É a classe média que está a pagar a
ganância dos banqueiros e empreiteiros, bem como este sistema corrupto.
Percebem a lógica de ocupar edifícios que iam ficar a apodrecer durante
anos."
Os ativistas pretendem ocupar em breve um edifício emblemático na
posse do NAMA, em Dublin, e testar a atitude das autoridades. "Vai ser
interessante ver se eles estão preparados para colocar pessoas
sem-abrigo fora do prédio, uma vez que é propriedade do Estado e,
portanto, do povo, e que irá provavelmente ficar vazio por muitos anos",
acrescenta.
Fonte: PRESSEUROP
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