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quarta-feira, 16 de junho de 2010

Busca da felicidade - Exemplo corajoso

Geral | 06/03/2010 | 05h49min

52 Histórias: União de ex-padre e ex-freira durou 31 anos

Na década de 70, casamento entre ex-religiosos surpreendeu os gaúchos e incomodou a Igreja Católica

Nilson Mariano | nilson.mariano@zerohora.com.br

O fato de um padre largar a batina para se casar já provocaria falatórios. Agora imagine se a noiva for uma freira de caridade que também abandona o hábito para subir ao altar. É alvoroço na certa, um prato cheio para saciar desde intelectuais até os que gostam de um fuxico. Ainda mais se tal união foi celebrada em plena ditadura militar, quando padrões conservadores regiam os brasileiros.

Estão de alguma forma surpresos, talvez admirados com tão improvável matrimônio? Pois há mais novidades. Há sete anos, os dois resolveram se separar. Como acontece a qualquer casal cujos laços se rompem.

Tudo começou em 1972, quando Lauro Carlos Wittmann, então com 36 anos, e Diles Terezinha Tombini, 32 anos, trocaram alianças. Incentivados por padrinhos e testemunhas, disseram o “sim” na capela da Vila Betânia, em Porto Alegre, no mês de maio – como recomenda a tradição. Nenhum ritual foi esquecido. Depois da chuva de arroz, rumaram para a lua de mel em lugar secreto.

Mas o que teria motivado a reviravolta na vida? Nascido em Gramado, Lauro ingressara no seminário ainda criança, aos 11 anos. Depois de ordenado padre, atuou em paróquias de Estrela, Novo Hamburgo, Alvorada, São Leopoldo e Porto Alegre. Rezou missas, aspergiu água-benta nos fiéis, batizou, deu a extrema-unção aos moribundos, ouviu confissões de pecadores e, claro, abençoou dezenas de noivos.

Era um pastor zeloso do seu rebanho, porém insatisfeito. Adepto da Teologia da Libertação, ansiava por se dedicar mais aos oprimidos, os quais definia como “peixinhos” (o povo) acossados por “tubarões” (os donos do poder). Por conta de sermões considerados subversivos, foi preso duas vezes pela Delegacia de Ordem Política e Social (Dops).

Numa das detenções, Lauro foi tirado da cadeia pelo arcebispo metropolitano, dom Vicente Scherer. O austero prelado – era um cardeal do Vaticano, do seleto grupo de príncipes que elege o Papa – não queria seus pupilos metidos em contestações ao regime militar, mas também não tolerava que fossem presos assim no mais.

– Dos padres cuido eu – teria dito ao delegado do Dops.

As frustrações de Lauro aumentavam. Dom Vicente era inflexível: a Bíblia por guia, nada de rebeldia. Por não se sentir o padre que almejava ser, resolveu se desligar. Hoje, ele analisa retroativamente aquele momento:

– A perseguição da Igreja era pior que a da polícia política. A polícia podia prender o corpo, a Igreja estava comprimindo a minha consciência. Era a hora de quebrar a casca do ovo.

Casal morou no Rio e teve duas filhas
No Natal de 1970, concluída a última homilia, despediu-se do púlpito disposto a ser igual a outros homens. Decepcionado com o sacerdócio, pensava em Diles, a freira da ordem do Imaculado Coração de Maria com quem havia trabalhado em um colégio da Capital. Já haviam disparado olhares – discretos como convém a dois religiosos, mas com aquela cintilação que só os apaixonados conseguem decifrar.

Diles também estava em dúvida vocacional, desejava ser uma mulher como as outras. Libertos dos votos de castidade, passaram a namorar. Após as núpcias que incomodaram a cúpula católica, foram morar no Rio de Janeiro.

Antes desconfortável como padre, Lauro desabrochou. Maravilhou-se com a família, extremou-se como o pai coruja das filhas, Tatiana e Luisa. Na profissão, destacou-se como especialista em educação. Fez mestrado na Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, mais doutorado e pós-doutorado na Universidade de Londres, na Inglaterra. Lecionou em universidades, publicou livros, deu palestras no Exterior, acumulou distinções.

Lauro e Diles foram felizes, não para sempre. Continuam amigos, desvelam-se pela primeira neta, mas estão separados desde 2003. A causa? O efeito cupim das pequenas incompatibilidades, quase imperceptível no início, mas pernicioso ao longo do tempo.

Morando em Santa Catarina, Diles não fala sobre o assunto. Residindo em Gramado, Lauro segue as pesquisas sobre o ensino e se mantém longe do celibato: casou-se novamente com Maria José de Morais.


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