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quinta-feira, 17 de junho de 2010

PROCESSO CONTRA O DIABO

Em 1971, Gerald Mayo, um cidadão da Pensilvânia (Estados Unidos), processou o Demônio e sua equipe. O Capeta seria o criador dos obstáculos que causaram desgraças na vida do autor e de muitas outras pessoas, violando-lhes seus direitos civis.

Nesse processo, o Diabo nem precisou de advogado.
Todavia, a ação coletiva foi barrada por motivos meramente processuais.

O autor não cumpriu dois requisitos essenciais para a espécie da ação proposta: não provou ser legítimo representante da imensa classe dos prejudicados pelo Anticristo nem demonstrou que o Excomungado seria um agente do Estado.

A decisão citou um suposto precedente em que o Rabudo, defendido por renomado advogado, teria alegado ser um príncipe estrangeiro, portanto não sujeito à jurisdição norte-americana. O tal precedente, contudo, nunca existiu; o juiz referia-se jocosamente a um conto fictício, que deu origem a um filme sugestivamente chamado “O julgamento do Diabo”.

Ocorre que, de fato, o autor não apresentou prova de que o Exu seria domiciliado na comarca nem forneceu o endereço para a citação do Cão, e isso foi decisivo para a rejeição do pedido.

Teria agido melhor o requerente se, ao preencher a informação sobre a residência do Tinhoso, tivesse mandado o oficial de Justiça ao inferno.

Dos fundamentos jurídicos, se acaso tivesse sido no Brasil:

Citação do réu. A relação processual só se apefeiçoa com a citação do réu, motivo por que o autor deverá requerer essa providência, já na petição inicial. O requerimento tem, ainda, sentido porque, dado o princípio dispositivo, que fundamenta o direito processual civil, ninguém é obrigado a litigar contra quem não queira. O autor, portanto, não é obrigado a dirigir sua ação contra determinado réu. Daí a necessidade de a citação ser requerida para poder ser deferida pelo juiz. Nos casos de litisconsórcio necessário (CPC 47) o princípio é o mesmo: caso haja necessidade de citar o litisconsorte, o juiz deverá intimar o autor para fazer tal requisição. Caso o autor não queira citar o litisconsórcio necessário, o processo é extinto sem julgamento do mérito (CPC 47 par. ún.), vedado ao juiz determinar a citação ex offcio.

Houve a inépcia da inicial. Não foram preenchidods os fundamentos da da peça vestibular, quais sejam: fundamentos de fato (causa de pedir próxima) e os fundamentos de direito (causa de pedir remota) do pedido. O autor deveria indicar o porquê de seu pedido.

Ademais, em nosso Sistema do CPC, pedido tem como sinônimas as expressões lide, pretensão, mérito, objeto. É o bem da vida pretendido pelo autor: a indenização, os alimentos, a posse, a propriedade, a anulação do contrato etc. O regime jurídico do pedido está no CPC 286 a 294. Divide-se em pedido imediato (sentença) e pedido mediato (bem da vida). Pede-se a prolação de uma sentença (imediato) que garanta ao autor o bem da vida pretendido (mediato). O pedido deve ser sempre explicito, pois é interpretado restritivamente (CPC 293). Há pedidos que não precisam constar na inicial para serem examinados pelo juiz, porque decorrem de disposição legal (juros de mora, correção monetária, honorários de advogado). As questões de ordem pública devem ser conhecidas pelo juiz, de ofício, independentemente de pedido da parte ou do interessado.

Quanto ao nome da ação. Para caracterizar a ação é suficiente e relevante o exame da causa de pedir e do pedido. O nome que o autor dá à ação não tem nenhuma importância: é irrelevante. Ainda que a denomine incorretamente, a petição inicial preencherá os requisitos legais se estiverem corretos o pedido e a causa de pedir. Se o autor, por exemplo, nomina a ação de "ação de despejo", mas pede somente a condenação do réu no pagamento dos alugueres em atraso, trata-se de "ação de cobrança" e não ação de despejo.

Portanto, independente de quem queira para se chamar ao processo, é necessário os pré-requisitos processuais, presentes em nosso Código de Processo Civil.

Não podemos nos esquecer que o processo é um meio para se chegar a um fim, então, a forma que se adere ao processo é imprescindível para que o princípio do impulso oficial seja deveras cumprido pelo juiz. Ademais, o processo é como uma seta vetorial, indicando um sentido e a trajetória a ser percorrida, isto é, uma marcha avante, para tanto, torna-se necessário a formalização dos procedimentos.

Com isso, podemos dizer que: Nos EUA, o Diabo não foi processado por motivos mais que justificáveis, frente a norma processual que é imprescindível para galgar o fim pretendido. E como um velho brocardo que o operador do direito nunca pode se esquecer:
"o diabo mora nos detalhes!"

Clovis Rodrigues Filho

Publicado no Recanto das Letras em 24/10/2008
Código do texto: T1245545

http://recantodasletras.uol.com.br/textosjuridicos/1245545

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