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quinta-feira, 3 de março de 2011

Fanatismo católico - 1910: anunciada a cura da sífilis, até então considerada castigo divino



Paul Ehrlich (1854–1915) recebeu em 1908 o Prêmio Nobel de Medicina

No dia 3 de março de 1910, foi anunciado o sucesso de um novo medicamento contra a sífilis, descoberto pelo sorologista Paul Ehrlich. O Salvarsan combate a doença que matara milhares de europeus durante séculos.


Ninguém quis acreditar quando o psiquiatra Konrad Alt anunciou à Associação de Medicina de Magdeburg, no dia 3 de março de 1910, que o tratamento de 27 pacientes de sífilis com um novo medicamento havia obtido êxito.



O novo antídoto contra a epidemia popular se chamava Salvarsan, e foi a sensação da época. Para se imaginar a euforia provocada pela notícia, pode-se pensar no que representaria o anúncio da cura da aids hoje.


A pessoa por trás do grande feito foi o sorologista Paul Ehrlich, de Frankfurt, que necessitou de dinheiro, paciência, talento e sorte para realizar seus experimentos.


Origem da doença


A sífilis foi trazida para a Europa com a expedição de Cristóvão Colombo ao retornar da América do Sul. Em 1495, houve a primeira epidemia entre soldados e marinheiros em Nápoles, na Itália, e a partir de então milhares de pessoas morreram vítimas da "doença do amor" ou "lues", alguns dos nomes comumente dados à sífilis.

Segundo um historiador de Düsseldorf, estima-se que um terço da população europeia tenha sido dizimada pela epidemia. "Havia, naquela época, duas doenças populares, a tuberculose e a sífilis. A sífilis era a mais temida."


Veneno contra veneno


A doença não escolhia classe social para fazer suas vítimas. Grandes personalidades como Beethoven, Schubert, Schiller, Schopenhauer, ETA Hoffmann e Nietzsche sofreram de sífilis, mal que podia levar à cegueira, à surdez, à loucura e frequentemente à morte, se não diagnosticado e tratado a tempo.


A descoberta de Ehrlich deu um novo rumo à história. A substância básica da sua pílula mágica era o arsênico. O nome, Salvarsan, vem das palavras latinas salve, que significa saudável, e arsen, o arsênico. Durante 400 anos, havia sido usado o mercúrio para o tratamento da sífilis, com sucesso duvidoso, devido à toxicidade da substância. Do arsênico também se tinha medo, pois uma dosagem alta demais é fatal.


O agente causador da sífilis é a bactéria treponema pallidum, descoberta em 1905 por Fritz Richard Schaudinn e Paul Erich Hoffmann. Ela é quase invisível ao microscópio e por isso só foi descoberta tão tardiamente, bem mais tarde do que os microorganismos causadores da tuberculose, malária e difteria.


Paul Ehrlich desenvolveu o medicamento em 1907 – mais de dois anos antes de a novidade ser apresentada em Magdeburg por seu colega Alt – depois de anos analisando preparados, mudando componentes, buscando encontrar alguma substância que combatesse o agente, sem prejudicar o organismo. E assim foi criado o Salvarsan 606, o 606º experimento. O restante do processo ainda demoraria anos. Ehrlich somente queria lançar o medicamento no mercado após havê-lo testado em seres humanos.


A "guerra do Salvarsan"


Houve uma grande pressão da mídia em favor da liberação do medicamento e, em consequência, processos que forçaram Ehrlich a colocar a substância à disposição do público. Ainda assim, ele recebeu em 1908 o Prêmio Nobel da Medicina.


1910 foi o ano decisivo. O medicamento tornou-se uma verdadeira fábrica de dinheiro. A industrialização foi feita pela detentora da patente, a Hoechst. Mas para Ehrlich a história ainda não terminara. Iniciou-se a chamada "guerra do Salvarsan", com inúmeras acusações de efeitos colaterais, que na maioria dos casos eram resultados de aplicação imprópria.



Na Alemanha havia então forte movimento antissemita, que organizou uma campanha contra o sorologista, que era judeu. E havia também os religiosos fanáticos, para quem a sífilis era o castigo merecido para o pecado da luxúria: portanto não deveria haver cura.


Para os editores de um livreto cristão, todos os possíveis medicamentos eram um escândalo, pois ainda contribuíam para sossegar a consciência e deixar de lado as medidas de precaução dos libertinos.
Paul Ehrlich morreu em 1915. Aos poucos, o escândalo em torno do Salvarsan se acalmou e o medicamento fez sucesso em todo o mundo. A história da pílula mágica de Ehrlich terminou com o aparecimento dos antibióticos modernos.

Fonte: DEUTSCHE WELLE
Ramón Garcia-Ziemsen (cv)

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