Quatro de julho
O declinismo está em alta nos EUA (tradução: ascensão da China), os americanos estão pessimistas sobre o futuro, desolados com sua liderança política (num estado de espírito bipartidário), lamentam uma década perdida na economia e cada vez mais alheios aos problemas mundiais. Está aí, portanto, uma penca de problemas que não contribui para um ambiente muito festivo no 4 de julho, a data da independência dos EUA. Nada de fogos de artifício?
Que nada, vamos celebrar, embora eu fique constrangido com a patriotada do number one, number one, USA, USA.
Mas pior são os derrotistas, os rancorosos e os inimigos automáticos. Esta coluna torce contra, ela torce contra o antiamericanismo. Não se trata, é claro, de negação dos problemas. Imagine, por estes dias existem alertas de que a nação americana pode terminar em Grécia, não a Grécia berço da democracia, mas da cova que está sugando a Europa e quem sabe o próprio projeto de União Européia.
Sim, pode acontecer uma tragédia americana devido a um sistema político disfuncional. Fala-se de uma competição adolescente entre a Casa Branca de Barack Obama e o comando republicano no Congresso. Muito pior. É infantil mesmo esta teimosia sobre como lidar com um déficit fiscal a longo prazo e dramas imediatos como a elevação do teto da dívida. Existe um jogo perigoso entre democratas e republicanos para ver quem vai recuar primeiro. Enquanto isto, políticos perdem o crédito e o mesmo pode acontecer com o USA, USA.
Os democratas são complacentes sobre a necessidade de corte de despesas e os republicanos são zelosos para repudiar a necessidade de alta de impostos. Obama, cheio de vapor, tem basicamente hoje uma mensagem de medo, e não de esperança, sinalizando que ele merece a reeleição, pois o outro lado é pior. Pede paciência para um país impaciente. Já os republicanos brincam com o fogo (caso não ocorra a elevação do teto da dívida) e estão empenhados em levar a economia ao fundo para impedir a reeleição do presidente. O povo vive suas fantasias gregas. Não quer o aumento de impostos, mas quer manter seus benefícios. Um grande foguetório de artifício em Washington. Pouco para festejar.
Evidentemente, é uma frustração ver ilusões sociais, teatro político, paralisia decisória e a incapacidade do país crescer (e gerar empregos). E de pensar que nos anos 80 e 90, sob presidentes dos dois partidos (o republicano Reagan e o democrata Clinton), o país desfrutou de quatro anos de crescimento econômico acima de 4% em cada uma destas décadas. Desde então, isto aconteceu em apenas um ano (o último da década passada).
No entanto, tanto pessimismo é irrealista, embora a curto prazo é preciso estar muito preocupado. Sobre o declinismo, ele é relativo, em particular a longo prazo. A China avança, mas também vários países emergentes. Isto é ótimo negócio para uma economia competitiva e diversificada como a americana. Em termos geopolíticos, a liderança americana ainda é indispensável. Muitos poderosos emergentes, como a Índia, não estarão na órbita chinesa. O século 21 se mostra multipolar e os EUA se posicionam com vantagens, com sua alianças tradicionais (Europa e Japão) e máquina militar imbatível. Isto é não é mesmo que vencer guerras, a destacar as assimétricas, como no Afeganistão.
Na demografia, com contínua imigração e taxa de natalidade, os americanos estarão bem preparados para competir na corrida da globalização, com suas legiões de consumidores, produtores e empreendedores (e pagadores de impostos). Nunca podemos esquecer fatores como inovação, direitos de propriedade e liberdade política. São excelentes produtos americanos para consumo interno e para exportação.
É moda falar que o modelo chinês de capitalismo autoritário (ou capitalismo vermelho) é fonte de inspiração. Sim, é um modelo formidável e tentador para países em desenvolvimento com pressa ou aqueles agoniados com o paralisante processo decisório em sociedades democráticas. Mas na festa dos 90 anos do Partido Comunista Chinês fica claro como o regime de Pequim está inseguro e temeroso do cheiro da Revolução Jasmim do mundo árabe. O perigo do radicalismo islâmico é exagerado,. Não há condições que ele confronte o Ocidente em um choque de civilizações, embora o terror suicida seja parte da vida e haja inquietações na Europa com imigração muçulmana.
O fascismo morreu e o comunismo tem uma sobrevida em algumas relíquias históricas como Coréia do Norte e Cuba (a China do capitalismo vermelho é bipolar). A atual liderança política nos EUA e Europa deixa muito a desejar, mas a democracia capitalista liberal, à la americana, ainda é a onda do futuro para países em busca de prosperidade e cidadãos em busca de dignidade individual. É o melhor sistema também para as sociedades maduras, apesar de tentações populistas, mais à direita ou mais à esquerda.
No Wall Street Journal do fim-de-semana, o historiador Walter Russell Mead escreveu que o Brasil pode ser o país do futuro, mas os EUA são sua casa. Comentário um pouco provinciano, mas, de qualquer forma, feliz 4 de julho. Um pouco adiante, feliz 7 de setembro.
Fonte: Rev. VEJA
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