O Tribunal de Justiça de São Paulo se penitenciou oficialmente com Diva Ferreira, mãe de um garoto de 16 anos. Jhonny Rafael Ferreira de Bahamontes agonizou por 45 minutos, na rua em que morava, em Campinas, depois de ser atropelado por uma viatura policial. O socorro demorou porque os policiais informaram à equipe de resgate, de propósito, o endereço errado do local do acidente.
O pedido oficial de perdão da corte paulista foi provocado pelo segundo erro do Estado. Desta vez, patrocinado pelo próprio Judiciário. O Tribunal de Justiça levou dez anos para julgar o recurso de apelação da mãe do adolescente. Diva reclamou do valor da indenização arbitrado pelo juiz de primeira instância, em R$ 60 mil, por danos morais.
“Embora sem responsabilidade pessoal no fato, vejo-me obrigado a me penitenciar perante os autores, em nome da minha instituição, por esse verdadeiro descalabro, que se procurará a partir de agora por fim”, afirmou o desembargador Magalhães Coelho, que em 17 de junho se tornou relator do recurso apresentado por Diva Ferreira.
“Por longos e inaceitáveis dez anos remanesceram inertes [os autos] sem que os recursos fossem apreciados, constituindo-se o fato, na prática, em denegação da jurisdição, responsabilidade da qual o Tribunal de Justiça de São Paulo, como instituição respeitabilíssima e necessária à garantia do Estado Democrático de Direito, não tem como se furtar”, completou Magalhães Coelho.
O recurso de Diva Ferreira deu entrada no Tribunal de Justiça em 2001. Depois de ficar por mais de nove anos com o desembargador de origem, sem apreciação, foi redistribuído a outros dois julgadores. Só no mês passado chegou às mãos de Magalhães Coelho. Em cinco dias estava com a revisora, Beatriz Braga, que no mesmo prazo entregou à mesa para julgamento.
A turma julgadora, formada por três desembargadores da 7ª Câmara de Direito Público, reformou a sentença de primeiro grau, quanto ao dano moral, aumentando a indenização para R$ 200mil. O tribunal manteve os danos materiais (despesas do funeral e pagamento de pensão vitalícia) e reconheceu a responsabilidade do Estado pela tragédia.
“Nunca, em meus quase 30 anos de magistratura, vi um caso tão perverso, causado pela burocracia judicial”, disse o desembargador durante a sessão de julgamento. “Em nome do Tribunal de Justiça, quero me penitenciar com essa mãe pela demora injustificada para julgar caso tão grave”, completou.
Magalhães Coelho afirmou que o grande volume de processos, distribuído a juízes e desembargadores, não pode servir de justificativa para a demora de mais de dez anos para julgar o recurso. Segundo o relator, essa realidade tem que ser mudada sob pena de comprometer a credibilidade da justiça. “Não imagino o que essa mãe pode pensar da justiça de São Paulo”, completou.
O acidente
O garoto sofreu acidente na esquina da casa onde morava, em setembro de 1998. Ele passeava com sua mobilete quando foi atropelado por um carro da Polícia. A viatura passava pelo local em alta velocidade, com os faróis apagados e a sirene desligada. Depois do acidente, os policiais demoraram a chamar o resgate e quando o fizeram deram o endereço errado.
O garoto sofreu acidente na esquina da casa onde morava, em setembro de 1998. Ele passeava com sua mobilete quando foi atropelado por um carro da Polícia. A viatura passava pelo local em alta velocidade, com os faróis apagados e a sirene desligada. Depois do acidente, os policiais demoraram a chamar o resgate e quando o fizeram deram o endereço errado.
A Fazenda do Estado alegou que não podia ser condenada pelos danos morais e materiais uma vez que houve culpa exclusiva da vítima no acidente. De acordo com a defesa, o garoto conduzia a motocicleta sem a devida habilitação, conduta que, sendo ilegal tanto do ponto de vista civil como criminal, descaracterizaria a responsabilidade civil do Estado.
A turma julgadora não aceitou a tese da Fazenda do Estado. “Não bastasse a imprudência dos policiais na condução da viatura, uma vez ocorrido o acidente, a vítima demorou mais de quarenta minutos para ser socorrida, já que os agentes públicos tardaram em chamar o resgate e, quando o fizeram, informaram o endereço errado”, disse o desembargador Magalhães Coelho.
De acordo com o relator, os policiais agiram com desrespeito à vítima e sua família e foram agressivos ao impedirem, com violência, que os parentes se aproximassem do garoto que agonizava à espera de socorro.
“No caso, a conduta dos agentes públicos [policiais] feriu os direitos mais essenciais da autora [mãe], ao passo que não bastasse causar o acidente por imprudência trataram a vítima e os seus familiares de maneira atroz, de forma incompatível com os seus deveres funcionais, maculando a instituição a que servem”, justificou o relator para aceitar o pedido da mãe de aumento do valor da indenização por danos morais.
“O valor da indenização deve, assim, servir de instrumento para conscientizar os agentes públicos das consequências de seus atos negligentes e abusivos, cabendo à Fazenda Estadual conferir efetividade a esta finalidade da sanção por meio do ajuizamento de ação de regresso”, completou.
Meta 2
A indignação do desembargador com o desleixo de sua instituição ocorre num momento delicado, em que a corte paulista faz uma verdadeira faxina, redistribuindo processo que estavam encalhados a anos, no acervo de desembargadores. No centro do debate está a Resolução 542/2011 e a redistribuição de um acervo de mais de 47 mil recursos da chamada Meta 2, do CNJ. A medida é alvo de bombardeios no CNJ e no STF.
A indignação do desembargador com o desleixo de sua instituição ocorre num momento delicado, em que a corte paulista faz uma verdadeira faxina, redistribuindo processo que estavam encalhados a anos, no acervo de desembargadores. No centro do debate está a Resolução 542/2011 e a redistribuição de um acervo de mais de 47 mil recursos da chamada Meta 2, do CNJ. A medida é alvo de bombardeios no CNJ e no STF.
Baixada no final de março, a Resolução prevê o julgamento de todos os processos que deram entrada na corte paulista até 31 de dezembro de 2006. Vai um pouco além ao fixar metas de produtividade para todos os desembargadores e possibilitar a aplicação de sanções administrativas para os que não as cumprirem. A redistribuição atinge desembargadores com atraso no acervo e manda para os gabinetes dos magistrados que estão com os recursos em dia para que façam os julgamentos dos litígios parados por tanto tempo.
De acordo com o ato, os julgadores que receberão os acervos não serão prejudicados por terem sido mais rápidos. Para compensar, terão suspensa a distribuição. Os retardatários, ao se livrarem dos processos antigos, receberão três novos para cada um que mandarem aos seus colegas. Essa regra foi uma estratégia importante para arrefecer o ímpeto de quem não se conformava em trabalhar para os “outros”. Nos primeiros dias da resolução, havia até ameaças de representação ao CNJ.
Além disso, os processos antigos em mãos dos retardatários deverão ser julgados em 120 dias, sob pena de apuração de responsabilidade disciplinar. Da mesma forma, serão responsabilizados os que tiverem produtividade igual ou inferior a 70% da média da Seção onde atua. Há ainda outro detalhe: os que são professores terão reexaminadas as autorizações para docência. Em outras palavras: serão lembrados de que a magistratura é a atividade principal.
Para a maioria dos desembargadores paulistas, a Resolução 542, por si só, não será a solução para todos os problemas da morosidade da Justiça. Porém, ela tem a grande virtude de colocar um basta na tradição de tolerância que sempre existiu em relação aos atrasos nos tribunais.
Fernando Porfírio é repórter da revista Consultor Jurídico
Revista Consultor Jurídico, 26 de julho de 2011
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Em Portugal:
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Estado perdeu cinco casos no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos só em Julho
Só em Julho, o Estado português perdeu cinco casos no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) todos relacionados com a morosidade excessiva de processos judiciais. Um deles prolongou-se de 1974 até 2005.
Todos os casos de condenação divulgados este mês foram por morosidade dos processos (Pedro Cunha)
A 26 de Julho o TEDH, para o qual foi eleito, em Janeiro, o juiz português Paulo Pinto de Albuquerque (como representante de Portugal), condenou o Estado a pagar a 18 queixosos uma indemnização de 7800 euros, quantia definida para cada um deles, por causa de um processo de direito de trabalho, iniciado em 1997, que só culminou em 2009.
E no mesmo dia foi emitida uma outra sentença, também contra o Estado português, e também por excessiva morosidade de um processo. O caso, iniciado em 2001, prendia-se com uma dívida de uma empresa para com o queixoso, no valor de 3500 euros. O processo, perdido pelo Estado português, custou 10.400 euros de indemnização por danos morais e mais 1500 euros de custas.
Também ontem, dia 26, o TEDH divulgou um outro caso de condenação do Estado por morosidade em processo judicial. Desta feita trata-se do caso mais antigo destes últimos três. Reporta a 1974 e tem a ver com uma nacionalização de uma empresa de vinhos, a Sociedade dos Vinhos Borges S.A. O caso só se resolveu em 2005. O TEDH fixou a indemnização a pagar pelo Estado português em 9600 euros a cada um dos queixosos.
Mas no mês de Julho o TEDH já tinha divulgado mais dois casos em que o Estado português foi condenado. Foi a 12 de Julho. Um deles reportava a 2003 e tinha a ver com direito de trabalho. O queixoso, que reclamava ordenado e pagamentos em atraso, no valor de 900 euros, foi indemnizado pelo Estado português em 6200 euros por danos morais. E o segundo caso, de 2004, fala de uma querela entre duas partes em que uma se queixa de lhe ter sido vendido material de construção defeituoso. O caso acabou em 2008. O queixoso recebeu do Estado português 1500 euros.
Em todos os casos os relatórios do TEDH consideram que foram feridos vários artigos da Convenção dos Direitos Humanos.
Fonte: PUBLICO (PT)
E no mesmo dia foi emitida uma outra sentença, também contra o Estado português, e também por excessiva morosidade de um processo. O caso, iniciado em 2001, prendia-se com uma dívida de uma empresa para com o queixoso, no valor de 3500 euros. O processo, perdido pelo Estado português, custou 10.400 euros de indemnização por danos morais e mais 1500 euros de custas.
Também ontem, dia 26, o TEDH divulgou um outro caso de condenação do Estado por morosidade em processo judicial. Desta feita trata-se do caso mais antigo destes últimos três. Reporta a 1974 e tem a ver com uma nacionalização de uma empresa de vinhos, a Sociedade dos Vinhos Borges S.A. O caso só se resolveu em 2005. O TEDH fixou a indemnização a pagar pelo Estado português em 9600 euros a cada um dos queixosos.
Mas no mês de Julho o TEDH já tinha divulgado mais dois casos em que o Estado português foi condenado. Foi a 12 de Julho. Um deles reportava a 2003 e tinha a ver com direito de trabalho. O queixoso, que reclamava ordenado e pagamentos em atraso, no valor de 900 euros, foi indemnizado pelo Estado português em 6200 euros por danos morais. E o segundo caso, de 2004, fala de uma querela entre duas partes em que uma se queixa de lhe ter sido vendido material de construção defeituoso. O caso acabou em 2008. O queixoso recebeu do Estado português 1500 euros.
Em todos os casos os relatórios do TEDH consideram que foram feridos vários artigos da Convenção dos Direitos Humanos.
Fonte: PUBLICO (PT)
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