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terça-feira, 4 de outubro de 2011

A mania das grandezas apodera-se dos Balcãs

Ex-Jugoslávia

Jutarnji List
Zagreb
Para evitar problemas com a Grécia, esta estátua de Alexandre, o Grande, em Skopje, Macedonia, tem o nome de "Guerreiro no cavalo"
Para evitar problemas com a Grécia, esta estátua de Alexandre, o Grande, em Skopje, Macedonia, tem o nome de "Guerreiro no cavalo"
AFP

De Skopie a Nils, passando por Split, a antiga Jugoslávia reveste-se de monumentos megalómanos e nacionalistas. Na opinião do escritor croata Jurica Pavicic, destinam-se a reescrever a História.


Alguns dias antes do Presidente da Câmara de Split, Zeljko Kerum, anunciar a construção da maior estátua de Jesus do mundo na riva, o passeio marítimo da cidade que administra, duzentos quilómetros para nordeste, um outro xerife local, o presidente da Republika Srpska, Milorad Dodik, acompanhado pelo "seu" arquiteto chefe, o ilustre realizador de cinema Emir Kusturica, tinha inaugurado o estaleiro para a construção de Kamengrad em Visegrad, na Bósnia Herzegovina.
Kamengrad foi projetada como um conjunto de edifícios de estilo retrógrado e heterogéneo, e de gosto duvidoso, situado no centro histórico de Visegrad, na margem do Drina, próximo da ponte que o romance Ponte sobre o Drina (Nobel de literatura em 1961), de Ivo Andric, imortalizou a nível mundial. Como uma Disneylândia local, supõe-se que Kamengrad venha a ser usada como cenário da adaptação cinematográfica do romance de Andric. Depois da rodagem do filme, esta construção no valor de 230 milhões de euros deverá ser mantida, substituindo a velha Visegrad, tão bósnia e comum. “Aqui estarão representadas todas as épocas, incluindo o Renascimento, de que os povos dos Balcão foram privados devido à invasão turca”, explicou Kusturica que, obviamente, tem a sua própria visão da História.

Sentido de irmandade

Kamengrad e a futura estátua de Jesus em Split ilustram bem a obsessão por monumentos que se apoderou dos Balcãs nos últimos tempos. Quando as armas se calaram nesta parte do mundo, a arquitetura tornou-se uma extensão da política. Uma política que, por força das circunstâncias (obrigado Europa!), deve agora ser menos agressiva. Mas que não recua perante simbolismos ou proporções. Em Nis, no sul da Sérvia, a "maior cruz do mundo" foi erguida a poucos metros da autoestrada que atravessa a cidade. O mesmo acontece em Skopje, na Macedónia, onde acaba de ser concluída a instalação de uma peça kitsch horrível, mais precisamente, um monumento com mais de quarenta metros de altura, representando Alexandre, o Grande, [para não voltar a visar os gregos, este monumento foi batizado oficialmente como] Cavaleiro. Em poucos anos, o poder nacionalista na Macedónia conseguiu trucidar o centro de Skopje – que é, no entanto, um exemplo de urbanismo moderno projetado por Kenzo Tange após o terramoto de 1960 -, transformando-o num parque de esculturas vulgares que representam "heróis nacionais." Em Split, o presidente da câmara não pretende, na verdade, limitar-se a Jesus, mas também gostaria de erguer estátuas de João Paulo II e do primeiro presidente da Croácia, Franjo Tudjman, entre outros.
Nas sociedades ocidentais, os monumentos foram erigidos na época da construção da nação (entre os séculos XVIII e XX), para proporcionar às populações um conjunto de imagens, mitos e heróis destinado a fazê-las unir-se  e esquecer as suas divergências. Os monumentos contribuíam para a manutenção de uma fraternidade que poderia servir como aglutinador social e de identidade.

Pureza simbólica

Nos Balcãs, os monumentos exercem uma função completamente diferente. Compensam as lacunas da História, sejam elas reais ou imaginadas. O gosto dos nacionalistas pela História é uma manifesta mentira. A história do seu povo nunca lhes basta, pois não conseguem deixar de imaginar uma história alternativa.
Nos países dos Balcãs, os monumentos obedecem à lógica da exclusão do Outro. O delírio arquitetónico do VMRO [o partido no poder na Macedónia, da direita nacionalista] não serve para fortalecer a identidade macedónia, mas para fazer esquecer tudo o que não lhe convém, ou seja, o internacionalismo modernista do período de Tito e a memória das velhas cidades Otomanas, com o seu encanto oriental e a sua população albanesa, cuja contribuição para a identidade nacional tem que ser apagada.
A operação Kamengrad em Visegrad destina-se unicamente a "purificar" simbolicamente a velha ponte que, apesar dos esforços de Emir Kusturica, se mantém obstinadamente otomana. Na cidade projetada por Kusturica, esta ponte é apenas um simples componente cenográfico, um elemento integrado no nacionalismo sérvio.
Humilhar o Outro, mas também mostrar-lhe que deixou de haver lugar para ele: este é também o objetivo dos sacerdotes da Herzegovina [parte croata e católica da Bósnia] que "enfeitaram" Mostar com uma floresta de cruzes e campanários para ofuscar o número e a altura dos minaretes locais.

Fonte: PRESSEUROP

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