Brânquias de arraia para curar câncer e chifre de rinoceronte para combater ressaca são crendices asiáticas que colocam em risco a sobrevivência de algumas das mais belas espécies animais
André Julião, para ISTOÉ INDEPENDENTEFÉ CEGA
Apesar de não haver comprovação científica, asiáticos retalham arraias
crentes de que as brânquias do animal reforçam o sistema imunológico
Os rinocerontes torcem para que o Vietnã
adote uma rigorosa lei seca. Isso porque os moradores do país acreditam
que o chifre do bicho em pó é um eficiente remédio contra a ressaca.
Crenças desse tipo são responsáveis pela ameaça de extinção de diversas
espécies animais e têm um novo alvo: as arraias gigantes. Na semana
passada, as organizações Shark Savers e WildAid divulgaram um relatório
em que alertam para o risco de duas espécies desse animal desaparecerem.
A pesca foi intensificada nos últimos dez anos para a comercialização
das brânquias – estruturas responsáveis pela filtragem da água – que,
secas, podem valer até US$ 500 por quilo. Apesar de não haver nenhuma
comprovação científica dos benefícios de ingerir essas partes, alguns
asiáticos acreditam que comê-las fortalece o sistema imunológico,
melhora a circulação, e trata dores de garganta, catapora, problemas de
rim, câncer e ajuda até casais com problemas de fertilidade.
Curiosamente, a Medicina Tradicional Chinesa (MTC) não reconhece nenhum
valor farmacológico nas brânquias de arraia. “Entrevistamos praticantes e
eles não conseguiram localizar nenhuma referência nos textos mais
usados da medicina oriental. Alguns admitiram que esse ingrediente não
tem efeito algum”, disse à ISTOÉ Michael Skoletsky, diretor-executivo da
Shark Savers. A explicação para a demanda maior pode estar numa tática
comum em qualquer mercado. “Todo consumidor sabe que a efetividade do
marketing pode superar a do produto”, diz Skoletsky. Ele acredita que
falsas afirmações de que a ingestão das brânquias fortalece o sistema
imunológico uniram-se ao temor por epidemias, como as gripes suína e
aviária. O resultado foi o surgimento de uma “necessidade” pelo produto.
Animais de diversas partes do mundo estão à beira da extinção por conta
da crença de cura dos asiáticos. Entre eles estão os tigres-de-bengala,
que têm seus ossos e testículos reduzidos a pó. Ursos são mantidos em
cativeiro para a retirada da bile, líquido produzido pelo fígado, que,
alguns asiáticos acreditam, teria o poder de curar uma série de doenças.
E os chifres de rinoceronte, além de considerados suvenires caros, são
usados como se fossem capazes de dar fim a males que vão da ressaca ao
câncer. Essa parte do animal é composta de queratina, mesmo elemento que
compõe cabelos e unhas – ou seja, não traz nenhum benefício à saúde. A
crescente demanda fez com que 2011 tenha sido o ano com o recorde de
matança de rinocerontes na África do Sul – 448. Em 2007, foram 13.
“Certamente, o aumento da riqueza no Vietnã e na China tem um papel
importante nesse quadro”, disse à ISTOÉ Richard Thomas, porta-voz da
organização Traffic, que monitora o mercado de animais selvagens. É mais
um exemplo de que inteligência e bom-senso são duas coisas que o
dinheiro ainda não consegue comprar.
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