Grécia
26 setembro 2011
Paris
Atenas, 2 de abril. Um sacerdote ortodoxo grego na celebração da Páscoa na Apokathelosis Ortodoxa.
FP
Enquanto o país se defronta com a crise e as suas
consequências, o património da Igreja Ortodoxa continua a escapar às
severas medidas de austeridade do Governo. Um tabu que é protegido pelas
suas estreitas ligações com o Estado e pela sua influência no domínio
da política.
A Igreja e os mosteiros gregos não vão pagar o muito
impopular novo imposto sobre o imobiliário, aprovado com caráter de
urgência no domingo, 11 de setembro, pelo Governo grego, para cumprir os
objetivos orçamentais impostos pelas entidades financiadoras. "A Igreja
pagará impostos sobre os bens que explora comercialmente", precisa
contudo um porta-voz do Ministério das Finanças, perante o tumulto
causado por este anúncio. Ficarão isentos os locais de culto e as
organizações de caridade. Mas, em alguns casos, as fronteiras são
difusas e as contas da Igreja ortodoxa não são muito transparentes.
O dinheiro da Igreja continua a ser um tabu na Grécia. "Os seus
rendimentos são tributáveis mas há dois grandes problemas", adverte o
professor de sociologia da religião da Universidade do Egeu de Rodes,
Polikarpos Karamouzis. "Não há um sistema económico que permita fazer o
levantamento dos seus verdadeiros rendimentos e ninguém sabe quantas
propriedades tem, porque não há cadastro."
Esta situação convém tanto à Igreja como ao Estado, "porque os
políticos não querem ficar de mal com as autoridades ortodoxas", explica
o deputado independente Stefanos Manos, que é um dos raros políticos a
pedir a separação entre a Igreja e o Estado. "A Igreja da Grécia é uma
igreja nacional, o que significa que há uma ligação política entre a
Igreja e o Estado, que lhe confere os seus privilégios", explica
Polikarpos Karamouzis. "O seu papel espiritual está estreitamente
associado ao seu papel político, o que alimenta a confusão entre fiéis e
cidadãos, que é explorada pelos políticos em busca de votos."
Papas e bispos são pagos pelo Estado
Os sacerdotes são líderes de opinião que os políticos preferem não
ofender. Em dezembro de 2010, num texto distribuído em todas as
paróquias, o Sínodo Sagrado, que reúne 13 bispos, classificava a
"troika" – os representantes do Fundo Monetário Internacional, da
Comissão Europeia e do Banco Central Europeu – como uma força de
"ocupação estrangeira".
A Igreja Ortodoxa é um dos elementos constitutivos da nação grega. A
Constituição foi escrita "em nome da Santa Trindade indissociável e
indivisível". Os sacerdotes abençoam a reabertura das aulas e os novos
governos; o catecismo é ensinado nas escolas públicas; pessoas de todas
as idades benzem-se quando passam por uma igreja.
Foi em março de 2010 que o Governo socialista de Georges Papandreou
decidiu tributar as igrejas em 20% dos rendimentos comerciais e entre
5% e 10% dos donativos declarados. Os 10 000 sacerdotes e os seus
bispos são pagos pelo Estado, o que representa um montante de 220
milhões de euros anuais.
O antigo ministro das Finanças, Georges Papaconstantinou, tentou
reduzir a contribuição do Estado mas, quando este tipo de informações
transpirava, a vontade do Governo desaparecia. O atual ministro das
Finanças, Evangelos Venizelos, muito próximo dos meios ortodoxos, não
tem esse género de veleidades.
A riqueza da Igreja, "um mito"?
As polémicas suscitadas pela isenção deste novo imposto sobre o
imobiliário levaram a Igreja a abandonar a sua reserva e a divulgar, na
sexta-feira, 16 de setembro, o montante dos seus impostos. A sua direção
dos serviços económicos afirma ter pago 2,5 milhões de euros de imposto
predial e imposto sobre o rendimento, em 2010. Refere de passagem que
possui 30 propriedades em Atenas (seis das quais desocupadas) e 14 em
Salónica.
Quando a Igreja é atacada por causa dos seus bens, o que é cada vez
mais frequente, o arcebispo de Atenas, Hieronymos, que é a mais alta
autoridade ortodoxa na Grécia, reage e explica que a riqueza da Igreja é
"um mito": restarão apenas 4% dos bens que a Igreja detinha antes da
revolução grega de 1821, sendo de destacar as numerosas confiscações de
propriedades pelo Estado.
Os jornais publicaram documentos sobre a fortuna da Igreja Ortodoxa.
Segundo o Kathimerini (de centro-direita), em 2008, os seus bens
ascenderiam a 700 milhões de euros. O antigo ministro da Economia,
Stefanos Manos, avalia-a em mais de mil milhões de euros. Os 2,5 milhões
de euros pagos pela Igreja parecem bem pouco, em função destes
montantes não confirmados oficialmente. Mas trata-se apenas de uma parte
dos bens eclesiásticos, geridos pelos serviços centrais da Igreja. Não
abrange as paróquias, algumas das quais são muito ricas. Nem as
propriedades diretas dos 80 bispos gregos, que beneficiam de uma grande
autonomia. Isto sem contar com os bens dos 450 mosteiros, dependentes ou
não da Igreja da Grécia (como os do Monte Athos, que têm um estatuto
especial). Para a lista ser completa, seria preciso acrescentar os bens
detidos na Grécia pelos patriarcas ortodoxos de Constantinopla,
Jerusalém e Alexandria.
Segundo proprietário do país
A Igreja é o segundo proprietário fundiário (depois do Estado grego),
detendo 130 000 hectares de terrenos. "Trata-se de florestas e de
terrenos não urbanizáveis", explica Vassilis Meichanetsidis, do serviço
de comunicação do arcebispo de Atenas. Trata-se também de imóveis nos
bairros chiques de Atenas e nas ricas estâncias balneares a sul da
capital.
A Igreja detém 1,5% das ações do Banco Nacional da Grécia e conta com
um representante no Conselho de Administração, o bispo de Ioannina,
Theoklitos, que, segundo a revista financeira Forbes, terá recebido 24
000 euros em senhas de presença, em 2008.
Até os terrenos incultos permitem fazer negócios. Os monges do rico
mosteiro de Penteli, a norte de Atenas, procuram investidores, para um
montante de mil milhões de euros, para explorar uma parte da sua
montanha, a fim de a transformar num parque fotovoltaico e captar a
energia solar. É a nova estratégia oficial da Igreja: rentabilizar os
seus bens em benefício das suas organizações filantrópicas. Em 2010, a
Igreja gastou mais de 100 milhões de euros em atividades caritativas,
que aumentaram com a crise. "Em Atenas, fornecemos entre 10 000 e 12 000
refeições por dia", explica Vassilis Meichanetsidis.
Contudo, a vocação filantrópica da Igreja Ortodoxa é relativamente
recente e registou altos e baixos. Em 2010, foi obrigada a encerrar e
depois a mudar o nome da sua associação Solidariedade, por motivos de
péssima gestão.
Fonte: PRESSEUROP
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