Mudança de comportamento
O
problema da Justiça brasileira é a apatia dos juízes, e não a falta de
recursos financeiros e humanos e a ausência de uma reforma processual. A
opinião é do juiz federal Ali Mazloum, titular da 7ª Vara Criminal
Federal de São Paulo. "O juiz, na primeira chance que tem de adiar, de
empurrar a audiência, ele faz. Não muda a rotina dos processos porque
não quer. Está acostumado a postular alterações legislativas, pedir mais
orçamento, mais pessoal e instalação de mais varas. Grande equívoco",
afirmou Mazloum em entrevista ao jornalista Fausto Macedo publicada pelo
O Estado de S. Paulo.
A pregação de Mazloum vai contra o
argumento dominante entre seus colegas. É frequente ouvir deles que o
Judiciário precisa de mais verbas, retoques nos códigos ou mais
comarcas. Tudo isso, de acordo com o juiz federal de São Paulo, "é
desnecessário". "Quando o Judiciário diz que precisa de mais dinheiro e
mais leis, ele está jogando a culpa no Executivo. É uma estratégia
equivocada." Em sua opinião, a população paga caro por um Judiciário
ineficiente, que não presta bons serviços.
Por isso, há três anos,
Mazloum implantou em sua vara o processo cidadão. Entre as principais
conquistas, está o prazo inalterável do processo, que "tem que acabar em
dez meses, nenhum dia a mais".
Quando começou o projeto, tinha mil
ações penais nas mãos. Hoje, tem 270. "Basta vontade para mudar a
máquina do Judiciário. Bastam pequenas alterações, não precisa de
grandes milagres e reformas", resume.
Com o processo cidadão, a
vida de uma ação ficou mais curta. "Quando o réu é citado, no início da
ação, ele já fica ciente do dia em que será julgado. Adotamos uma pauta
inteligente, concentração de atos processuais sem causar danos ao
contraditório e à ampla defesa. É trabalho em equipe, todos os
funcionários da vara empenhados. A audiência é improrrogável", explica
Mazloum.
Para comprovar, o juiz faz contas: em 2007, a 7ª Vara
Criminal Federal de SP tinha mil ações penais, com duração média de
quatro anos. O custo de cada processo era de R$ 2.150 —
R$ 44,79 por mês por processo, dos quais "70% em salários e 30% em
insumos". Com o processo cidadão, conta, o preço de cada ação passou a
ser R$ 1.892, ou R$ 39,41 por mês — um abatimento de 40%.
Entre iguais
Ali Mazloum também cita sua famosa disputa pelo lugar de acusação e
defesa. Para ele, "acusação e defesa devem estar em pé de igualdade"
perante o Estado. Hoje, porém, o representante do Ministério Público
fica sentado à direita do juiz, em lugar mais alto do que o advogado.
Sua
luta pela causa é antiga. Ele tem uma disputa com a desembargadora
federal Cecília Marcondes pelo lugar do Ministério Público nas
audiências da Justiça Federal. Ele havia
determinado que o promotor e o advogado se sentassem "ombro a ombro"
com o juiz, garantindo tratamento igualitário. Ela, porém, obteve uma
liminar para garantir que o MP continuasse em seu lugar privilegiado.
Mazloum, então, foi ao Supremo Tribunal Federal registrar uma reclamação contra a liminar, pois sua decisão visou garantir a igualidade e isonomia entre todos nos processo. Na fala ao Estadão,
o juiz se defendeu mais uma vez: "o processo é feito para inocentes,
não para culpados. É um instrumento de interlocução entre o acusado e o
Estado, não é instrumento de punição, espada na cabeça do réu. Acusado e
Estado, acusação e defesa, devem estar em pé de igualdade. Obrigações,
direitos e deveres para ambos os lados."
Revista Consultor Jurídico, 25 de setembro de 2011
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