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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

TJ/SC CONDENA EX-GOVERNADOR PAULO AFONSO e inocenta ex-secretários

Processo:Apelação Cível nº 2009.026973-5
Relator:Ricardo Roesler
Data:15/12/2011

Apelação Cível n. 2009.026973-5, da Capital
Relator: Desembargador Substituto Ricardo Roesler
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AÇÃO DO ESTADO CONTRA EX-GOVERNADOR E SECRETÁRIOS. PESSOA JURÍDICA INTERESSADA. LEGITIMIDADE CONFIGURADA. TRANSFERÊNCIA DE VALORES DO FUNDO DE MELHORIA DA POLÍCIA MILITAR À CONTA DO TESOURO DO ESTADO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL, BEM COMO DE JUSTIFICATIVA. OFENSA A PRINCÍPIOS REGENTES DA ADMINISTRAÇÃO. IMPROBIDADE CONFIGURADA. OBSERVAÇÃO AO PRIMADO DA RAZOABILIDADE. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
O Estado detém legitimidade, na condição de pessoa jurídica interessada, para demandar contra ex-dirigente, em face da prática de ato de improbidade (art. 17, caput, da Lei n.º 8.429/92).
A transferência de valores fora da previsão orçamentária e sem prescrição legal compreende desvio de finalidade, e caracteriza ofensa aos princípios que regem a Administração Pública, em particular o da unidade orçamentária, o da moralidade e o da legalidade, implicando na imposição de sanções, nos termos do art. 12, III, da LIA. Hipótese em tese a configurar a culpa concorrente de todos os envolvidos, limitada no caso, de todo modo, ao Chefe do Executivo, por ser o ordenador direto da despesa (vencido o relator no particular).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.026973-5, da comarca da Capital (Unidade da Fazenda Pública), em que é apelante Estado de Santa Catarina, e apelado Paulo Afonso Evangelista Vieira e outros:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por maioria de votos, dar provimento parcial ao recurso do Estado em relação ao réu Paulo Afonso Evangelista Vieira, para condena-lo às penas, nos termos do voto do relator, mantida a sentença de improcedência em relação aos demais réus. Vencido parcialmente o relator, que dava parcial provimento ao recurso para condenar todos os demandados. Vencido, também, o Exmo. Sr. Des. Cid Goulart, que negava provimento ao apelo. Custas legais.
1. RELATÓRIO
Irresignado com a decisão que julgou improcedente seu pedido, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso.
Em síntese, O Estado de Santa Catarina manejou ação civil por ato de improbidade contra Paulo Afonso Evangelista Vieira, Neuto Fausto de Conto, Oscar Falk, Paulo Sérgio Prisco Paraíso, Nelson Wedekin, Renato Luiz Hinning e Marco Aurélio de Andrade, em face de transferências de ativos, ocorridas entre os anos de 1996 e 1998, do Fundo de Melhoria da Polícia Militar à Conta do Tesouro de Santa Catarina.
Segundo o Estado, as operações, animadas por quebra de caixa durante aquela administração, foram empreendidas à míngua de previsão legislativa, em ofensa aos princípios da legalidade e da moralidade, bem como aos princípios que orientam o orçamento, em particular o princípio da unidade, o da universalidade, e da proibição de estorno de verbas. Ressalta, ainda, que as operações ocorreram sem qualquer justificativa e sem observar os contornos das leis orçamentárias em cada período, caracterizando o desvio de finalidade. Aduzem, ademais, que a prática redundou em acúmulo de prejuízos ao Fundo, que não pôde sequer honrar suas despesas em diversas ocasiões, destacando que, nos termos dos relatórios do Tribunal de Contas, as transferências teriam alcançado os valores de R$ 6.101.082,02 em 1996, R$ 25.224.346,47 em 1997 e R$ 7.909.894,77 em 1998.
Postulou afinal que, reconhecida a prática de ato ofensivo aos princípios da Administração Pública, fossem impostas as penas previstas pelo art. 12 da Lei n.º 8.429/92.
Os demandados Paulo Afonso Evangelista Vieira, Neuto Fausto de Conto, Oscar Falk, Paulo Sérgio Gallotti Prisco Paraíso e Renato Luiz Hinning apresentaram contestação conjunta. Afirmaram inicialmente a irresponsabilidade do ex-Governador por atos dos Secretários, bem como a ausência de prova de algum ato que justificasse a imputação de ato de improbidade. Destacaram, ademais, que a administração do fundo estava jungida ao Comandante-Geral da Polícia Militar, e que as transferências dependiam apenas das respectivas diretorias, subordinadas à Secretaria, sem gerência do Chefe do Executivo.
Adiante afirmaram que o Estado destacou em "Restos a pagar" despesas a serem saldadas no ano seguinte pelo fundo, e que o expediente não se traduziria em transferência de numerários do Fundo para o Tesouro, simplesmente. Deduziram, pois, que não teria havido qualquer prejuízo ao fundo, sobretudo em face da transitoriedade das operações, a serem saldadas nos exercícios seguintes. Ressaltaram, também, que o relatório (parecer prévio) do Tribunal de Contas não é conclusivo ao identificar eventual prejuízo ao Fundo, e que nem mesmo demonstrou-se que algum dinheiro com aquela destinação deixara de ser empregado em fim correlato. Afirmaram, ainda, que atualmente há, inclusive, disciplina própria a autorizar operações dessa natureza, não havendo nada de imoral, considerando-se o fato de que as transferências questionadas se deram em caráter transitório. Destacaram, por fim, que a prática é comum em qualquer gestão, como aponta o relatório do TCE referente ao exercício de 1999, causando "estranheza" que a apuração tenha acontecido apenas no período em que o primeiro demandado exercia a governança, para apontar o arremedo político da ação.
Em peça distinta, o demandado Marco Aurélio de Andrade Dutra formulou sua contestação, afirmando que não detinha qualquer gerência sobre o fundo, não tendo participado de qualquer operação relativa a sua gestão. Destacou, também, que as operações em questão foram sempre contabilizadas, evidenciando sua transparência e permitindo o controle pelos órgãos de fiscalização. No mais, afirmou que não houve malversação com as reservas do fundo, que foram sempre empregadas em face de sua finalidade, não tendo havido provas de prejuízo àquela conta. Ressaltou, ainda, que "a inscrição de despesas relacionadas ao FUNPOM em restos a pagar reflete apenas as circunstâncias vividas num momento histórico marcado pela dificuldade econômica resultante da aguda recessão, que, como é notório, afetou a todos os Estados da Federação, naquele período" (fl. 235), concluindo pela ausência de vedação legal ao expediente. Aduziu, também, a necessidade de efetivo prejuízo para justificar as sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, conforme assentado pela jurisprudência do STJ. Postulou ao fim, a improcedência do pedido.
O Estado impugnou em fls. 244-246.
Pelos demandados foi reclamada a remessa dos autos ao STJ, em face de suposto foro especial por prerrogativa de função (fls. 247-249).
Em parecer de fls. 253-265, o Ministério Público opinou pelo indeferimento do pedido de nulidade dos atos processuais e de remessa dos autos à Corte Superior.
Remeteu-se os autos ao STF, por ostentar à época o primeiro demandado a condição de Deputado Federal (fls. 267-268). Os autos, contudo, foram devolvidos adiante, em decisão monocrática, em razão do julgamento da ADI n.º 2.797/DF (fl. 276).
Formulou-se pedido de suspensão, para o aguardo do julgamento da Recl n.º 2.138 (fls. 283), postulação que, após a ouvida do Ministério Público (fls. 292-307), foi indeferida (fl. 308).
Foram apresentadas razões finais (fls. 328-331 e 332-333).
O Ministério Público opinou pelo provimento do pedido (fls. 334-336).
O pedido foi julgado improcedente (fls. 337-344).
Sobreveio o apelo do Estado, revisitando a matéria já deduzida na inicial (fls. 349-361).
O recorrido Marco Aurélio de Andrade Dutra ofereceu contrarrazões (fl. 365).
Em primeiro grau, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e provimento do pedido, em manifestação de fls. 368-372); no mesmo sentido opinou o órgão atuante nesta instância (fls. 379-399), em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Procurador de Justiça André Carvalho.
Extemporaneamente, ofereceram contrarrazões os demais demandados (fls. 405-407).
Vieram-me conclusos.
2. VOTO
O Estado de Santa Catarina propôs ação civil a propósito de ato de improbidade patrocinado pelos demandados, entre os quais desfilam, no polo passivo, o ex-Governador do Estado, Paulo Afonso Evangelista Vieira, e os então Secretários de Estado da Fazenda em sua gestão, Srs. Neuto Fausto de Conto, Oscar Falk, Paulo Sérgio Prisco Paraíso, Nelson Wedekin, Renato Luiz Hinning e Marco Aurélio de Andrade.
A ação tem como pano de fundo a suposta malversação de dinheiro público, simbolizada na transferência indevida de ativos do Fundo de Melhoria da Polícia Militar - FUNPOM para a conta do Tesouro Estadual, no período compreendido entre 1996 e 1998. É essencialmente disso que se cuida; daí a alardeada ofensa aos princípios regentes da Administração Pública, a par do que é reclamada a aplicação das penas do art. 12 da Lei n.º 8.429/92.
Os fatos aqui narrados e a que se tributam a pecha de ímprobos, compõem um todo complexo; basta ver o alargado rol de demandados, que alcança desde o Chefe do Executivo Estadual, à época, até os prováveis executores ou mandantes imediatos das operações impugnadas. Aliás, observo, escapou ao polo passivo o então gestor do fundo em questão, o Comandante-Geral da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina no período dos fatos, o Coronel Valdir Lemos. Sua exclusão, ou, melhor situando, sua ausência neste processo veio justificada pela hierarquia e pelos deveres da caserna, que obrigam o Chefe-Maior da Polícia Militar a observar fielmente o comando do Chefe do Executivo, sem desvios ou questionamentos.
Sem discutir-se em pormenores a eventual responsabilidade daquele excluído, afigura-se, no mínimo, curiosa a justificativa que empresta o recorrente para afastar da demanda o Gestor do Fundo. Em termos de hierarquia, se assim se pretende, é fácil observar que não há distinção entre o gestor do fundo e quaisquer dos demandados; em última análise, todos devem obediência ao Governador. Logo, abstraído qualquer juízo de valor que idiosincraticamente possa sugerir a ostentação de dragonas, a legitimidade do gestor parece bem clara.
Na hipótese, ao que me parece, a estreita relação entre o Gestor do Fundo e o Governador ensejaria, a propósito de eventual condenação, a prévia constituição de litisconsórcio; questiona-se efetivamente atos que ligam um ao outro. No entanto, a essa altura a medida é insípida, porque transcorrido prazo muito superior ao lustro em que se permite a correção pela Lei n.º 8.429/92.
Ressalvo, no entanto, que o apontamento que faço em torno da legitimidade do gestor não é sem causa: fiz a alusão para introduzir o debate em torno de outro tema que, mesmo tratado de modo muito desbotado na contestação conjunta de parte dos demandados, já se viu suscitado em outras ações de mesma estirpe. Refiro-me ao interesse do Estado em postular demanda desse quilate.
Foi sugerido pelos recorridos, de modo bastante inexpressivo, a motivação política da ação, pondo em relevo a vendeta partidária. Embora não se tenha esmiuçado a dedução, ela por certo sustenta-se no antagonismo político entre os partidários das legendas, que se alternaram no poder naquele período (PMDB x PP), cuja rivalidade é notória e histórica no Estado de Santa Catarina.
O argumento vem embalado pela dedução de que a prática aqui hostilizada não teria sido aferida com o mesmo rigor em outros períodos, sobretudo no transcurso da gestão em que se propôs a ação, para arrematar com a conclusão de que a prática seria comum, a despeito de distinguir-se, num e noutro período, pela superveniência de diploma específico regulando a transferência do dinheiro público. E veja-se: esse último argumento, ainda que de passagem, desfila nas razões da decisão atacada, que, a bem da verdade, vale-se de fundamentos que repousam em outra sentença, que tratou da mesma matéria em outros autos.
Além de dar fôlego àquela dedução inicial, a ele somo a paradoxal exclusão do gestor a que já fiz conta, e assim propor a discussão em torno do legítimo interesse do Estado no patrocínio da demanda.
A lei de regência faculta às pessoas jurídicas interessadas a legitimidade para propor ação de improbidade (art. 17, caput); elas concorrem - e a concorrência aqui definitivamente não induz exclusão - com o Ministério Público, entidade incumbida da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127, caput, da CR). O rol de legitimidados, bastante apertado, é contudo coerente com a destinação da norma, que se volta à correção de condutas ímprobas no seio da Administração.
Mas o que se pode afirmar propriamente interesse nessa conjectura? Proponho a afirmação do interesse a partir da vocação da lei, cujo desdobre implicará em conferir algum superlativo aos legitimados, mas sem desbordar dos contornos que o texto comporta.
De nenhum texto legal pode-se extrair alguma interpretação minimamente satisfatória senão a partir da contextualização dentro do ordenamento como um todo; é a partir do entrosamento das leis afins e da orientação constitucional que se poderá dar evidência à expressão ao texto de lei. A bem do que afirma Eros Roberto Grau, nenhum texto é em si norma senão após interpretado, por que lhe falta a concreção; até então, todo texto é algo obscuro, pois mesmo que se conclusa por sua literalidade far-se-á a partir de alguma interpretação (Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito, Malheiros, 2009, p. 74 e segs.).
Afastar-se, nesse caso, a obscuridade reclama, mesmo que a certa distância, observar a disciplina que cuida da proteção do interesse público. Lembro, logo, que em se tratando da recomposição do patrimônio público - em sua acepção mais ampla - o cidadão comum tem à mão a ação popular (Lei n.º 4.717/65). Instrumento de envergadura constitucional, ele sinaliza de modo bem evidente a proteção à coisa pública; resguarda a qualquer cidadão o direito de pretender a anulação "anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural" (art. 5.º, LXXIII).
Aquele diploma em boa parte cumpriu o comando constitucional de zelo com o patrimônio público, mas o ordenamento ressentia-se da proteção da moralidade no âmbito da Administração, reclamada pelo art. 37, § 4.º, da Constituição da República. Para além da simples reparação do erário, o texto constitucional exigia o apenamento do agente público, com expressivo rigor. E assim fez a Lei n.º 8.429/92. Conforme exigia a Constituição, a Lei de Improbidade Administrativa desenhou substancioso rol de punições ao agente que atentasse contra a probidade no âmbito da Administração Pública.
De fato, há de se reconhecer considerável severidade na Lei n.º 8.429/92, naturalmente animada pelo sentimento comum de repugnância à prática de corrupção que tanto assolapa a Administração Pública. Ontologicamente, também justifica a rigidez da norma sua destinação: o diploma é dirigido contra quem detém poder ou dele faz uso, em quaisquer de seus quadrantes.
Ao contrário do que sucede na hipótese da ação popular - provavelmente em face de sua natureza - não se estendeu a qualquer cidadão a legitimidade para a ação regulada na Lei n.º 8.429/92; fez-se uso da discricionariedade que a Constituição Republicana permitiu no particular. Bem diferente do que se observa no comando que lapida a ação popular, o direito de reclamar a punição por ato de improbidade não tem titular definido pelo texto da Constituição. Diante da abertura, cuidou o legislador ordinário de limitá-la.
Não há, evidentemente, censura a ser feita porque, na prática, permanece a qualquer cidadão o direito de postular indenização em caso de prejuízo ao erário, e ao próprio Poder Público - titularizado pela pessoa jurídica interessada - o direito de reclamar as punições previstas em lei. Nada mais adequado: na prática, quem detém a prerrogativa de punir administrativamente, também pode reclamá-la na via judicial, tendo em vista ser notoriamente mais interessada em promover qualquer tipo de correção.
Assim sendo, em linha de princípio, a pessoa jurídica, de cujo agente compõe o quadro, detém potencial interesse na aplicação de punições. Mas, como fazê-lo quando ao seu mandatário é tributada a prática de ato ímprobo?
É neste particular que se encerra o questionamento proposto. Ora, é evidente que a pessoa jurídica, por si considerada, não manejará ação contra seu próprio dirigente. Na verdade, ficará mesmo tolhida do direito de representação, pelo notório conflito de interesses. Seria, afinal, patético imaginar-se, por exemplo, a investida do Estado contra seu Governador, com sua autorização. Não há como.
Diante desse cenário, e considerando uma vez mais o estreito rol de legitimados, apenas o Ministério Público teria legitimidade para levantar-se contra o dirigente ímprobo durante sua gestão. Se não o fizesse, quer por inércia, quer por desconhecer a prática do ato ímprobo, não haveria ação.
Não sem razão, é de se observar, a própria lei assegura o transcurso da prescrição, no caso de agente político, somente após o término do mandato (art. 23, I), evidentemente observando os entraves bem claros para operacionalizar a ação durante o mandato. Afinal, que espécie de efetividade se conferiria à norma nesse contexto?
Eis a razão para não se deixar embalar pela singela argumentação de vendeta partidária, e assim propor a limitação do direito de ação. Se há alguma animação política - e disso, no contexto, não se pode ignorar por completo - ela não é suficientemente densa para afastar o interesse do Estado que, em última análise, é quem efetivamente propõe a demanda. E é a ele, o ente político, que se deve resguardar o direito de ação; se houver excesso no manejo da ação ou abuso de direito, haverá instrumentos hábeis para censurar o proponente. O que não se pode é lançar opacidade sobre o direito de ação ao paliativo de rivalidade política.
Deixar de legitimar o Estado, aliás, redundaria em verdadeiro paradoxo sob tal pretexto. Afinal, nada impediria ao Estado que, em lugar de manejar a ação, remetesse as informações, que lhes são inatas, cativas, ao Ministério Público, e esse, por sua titularidade, propusesse a ação. Haveria em tal hipótese de se cogitar também de diferenças políticas? Daí porque ao Judiciário deve ser tributada a censura a eventuais excessos, e não a indiscriminada limitação do direito de ação, resguardado em lei e amparado pela Constituição da República.
Daí a conclusão: independentemente do objeto que se busca, a pessoa jurídica tem interesse no manejo da ação, cujo eventual excesso deverá ser pontualmente reprimido. Assim deve ser. Observo, a propósito, que o próprio STJ tem admitido a legitimidade do Estado para propor açãocontra ex-dirigente (e sem observar algum ineditismo nisso). Cito, no particular:
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS AJUIZADA PELO MUNICÍPIO EM FACE DO EX-PREFEITO. SUPOSTO ATO ILÍCITO PRATICADO NA EXECUÇÃO DE CONVÊNIO CELEBRADO COM O GOVERNO FEDERAL. VIOLAÇÃO DO ART. 3º DO CPC. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MUNICÍPIO. RECURSO INCAPAZ DE INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO DESPROVIDO.
1. A causa de pedir reside nas irregularidades que o ex-prefeito municipal teria cometido na execução de convênio firmado com o Governo Federal. Essa atuação ilícita do agente público teria, segundo o ora agravado, causado sérios prejuízos financeiros à municipalidade, porque fora incluída nos cadastros restritivos de crédito (CADIN e SIAFI) e não consegue realizar novos convênios nem receber as verbas federais as quais tem direito. O pedido, portanto, é de ressarcimento - na forma de indenização -, e não de prestação de contas. Assim, deve ser reconhecida a legitimidade ativa ad causam do Município, com o retorno dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja regularmente processada a ação indenizatória.
2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 748877/PB. Rel. Min. Denise Arruda. Decisão de 23.10.07).
E ainda:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PROPOSTA CONTRA EX-PREFEITO. MALVERSAÇÃO DE APLICAÇÃO DE VERBAS RECEBIDAS DE CONVÊNIO FIRMADO COM A UNIÃO. IMPORTÂNCIA INCORPORADA AO ERÁRIO MUNICIPAL. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MUNICÍPIO. OFENSA AO ART. 3º DO CPC RECONHECIDA.
1. Tratam os autos de ação de reparação de danos por atos de improbidade administrativa ajuizada em face de João Rodrigues Neto, ex-prefeito municipal de Lontra, e Radier Construções Consultoria Ind. e Com. Ltda. sob o fundamento de descumprimento de convênio firmado com a Fundação Nacional de Saúde - Funasa, entidade vinculada ao Ministério da Saúde, no valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais), visando à execução de sistema de esgotamento sanitário. A sentença extinguiu o feito, sem resolução de mérito, por considerar o Município de Lontra parte ativa ilegítima, sendo legítima a Funasa. O TJMG confirmou a sentença, reconhecendo a legitimidade ativa ad causam do Ministério da Saúde. Recurso especial da municipalidade sustentando, além de divergência jurisprudencial, ofensa ao art. 3º do CPC.
2. A verba liberada, por meio do convênio firmado com a Fundação Nacional de Saúde, foi incorporada ao erário municipal (tendo sido creditada em conta-corrente na data de 11/06/2002), detendo, pois, o Município a legitimidade para perseguir judicialmente a reparação pelos danos sofridos.
3. Ofensa ao art. 3º do CPC que se constata. Interesse e legitimidade ativa do Município reconhecidas, impondo-se a reforma das decisões ordinárias.
4. Recurso especial conhecido e provido determinando-se o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau para que prossiga à análise da ação. (REsp 1.024.648/MG. Primeira Turma. Rel. Min. José Delgado. Decisão de 22.04.08).
Por derradeiro, destaco, enfim, que desde a promulgação da vigente Constituição Republicana não mais se justifica a distinção, até então defendida por alguns, entre interesse de natureza puramente fazendário (de natureza patrimonial) e interesse público comum. Conforme lição de Consuelo Yatsuda M. Yoshida,
"A partir da Constituição de 1988 está superado aquele entendimento que preconiza que o interesse público não se confunde com o interesse meramente patrimonial da Fazenda Pública. Havendo lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público, deixa de haver interesse meramente estatal, o chamado interesse público secundário, e concomitantemente surge o interesse público primário ou interesse social, ou, ainda, interesse difuso, de toda a coletividade, cuja defesa é função institucional do Ministério Público, entre outros legitimados" (O Ministério Público e sua função institucional de defesa do patrimônio público lesado ou ameaçado de lesão. Boletim dos Procuradores da República, out. 1999, n.18, p.12).
Logo, se o interesse público é um só, e diz a todos os interessados de modo linear, a pessoa jurídica interessada é legítima em sentido amplo, quer para reclamar a recomposição do patrimônio, quer para impor sanções, nos termos do imperativo constitucional.
Dito isso, é imperativo o cotejo dos atos apontados na inicial.
Pelo recorrente é denunciada a prática, com alguma habitualidade, de transferência de ativos inicialmente destinados ao Fundo de Melhoria da Polícia Militar - FUNPOM, para a conta do Tesouro do Estado, sem previsão em lei, fato que, em síntese, caracterizaria o desvio de finalidade. Ofenderia sobretudo o primado da legalidade, por não respeitar as diretrizes da lei orçamentária naqueles períodos. Assim teria sucedido entre 1996 e 1998.
A prova feita, que desde logo acompanhou a inicial, dá conta do noticiado. Anoto que se juntou aos autos cópias dos relatórios do Tribunal de Contas do Estado daquele período, ocasião em que houve glosa das operações aqui questionada, porque irregulares. Destaco, em particular, dos documentos de fls.26 e segs., observa-se, além do fluxo negativo da conta do fundo, as transferências efetuadas entre os anos de 1996 e 1998.
Em relação às transferências do fundo à conta única do Tesouro, as cópias dos balancetes de fls. 40-83 discriminam as quantias e as datas em que ocorreram estas operações. O inventário é o que segue:
R$ 200.000,00, em 08.05.96 (fl. 42);
R$ 150.000,00, em 28.05.96 (fl. 43);
R$ 150.000,00, em 03.06.96 (fl. 44);
R$ 150.000,00, em 09.07.96 (fl. 45);
R$ 2.000.000,00, em 10.07.96(fl. 46);
R$ 150.000,00, em 18.07.96 (fl. 47);
R$ 200.000,00, em 26.07.96 (fl. 48);
R$ 200.000,00, em 19.08.96 (fl. 49);
R$ 699,72, em 20.08.96 (fl. 50);
R$ 150.000,00, em 10.09.96 (fl. 51);
R$ 150.000,00, em 25.09.96 (fl. 52);
R$ 150.000,00, em 08.10.96 (fl. 53);
R$ 1.800.000,00, em 18.10.96 (fl. 54);
R$ 150.000,00, em 31.10.96 (fl. 55);
R$ 150.000,00, em 27.11.96 (fl. 56);
R$ 50.000,00, em 17.12.96 (fl. 57);
R$ 450.000,00, em 19.12.96 (fl. 58);
R$ 382,30, em 27.12.96 (fl. 59);
R$ 50.000,00, em 31.12.96 (fl. 60);
R$ 62.307,96, em 31.12.96 (fl. 61);
R$ 47.070,96, em 31,12,96 (fl. 62);
R$ 36.427,60, em 31.12.96 (fl. 63);
R$ 41.500,00, em 07.03.97 (fl. 64);
R$ 13.000,00, em 07.04.97 (fl. 65);
R$ 44.000,00, em 08.05.97 (fl. 66);
R$ 36.500,00, em 09.06.97 (fl. 67);
R$ 35.000,00, em 02.07.97 (fl. 68);
R$ 2.651.455,52, em 07.07.97 (fl. 69);
R$ 2.000,00, em 10.07.97 (fl. 70);
R$ 30.000,00, em 01.08.97 (fl. 71);
R$ 30.000,00, em 01.09.97 (fl. 72);
R$ 3.429,93, em 04.09.97 (fl. 73);
R$ 30.000,00, em 02.10.97 (fl. 74);
R$ 25.000,00, em 04.11.97 (fl 75);
R$ 30.000,00, em 02.12.97 (fl. 76);
R$ 23.000,00, em 19.01.98 (fl. 77);
R$ 20.000,00, em 11.02.98 (fl. 78);
R$ 19.844,00, em 09.03.98 (fl. 79);
R$ 68,56, em 10.03.98 (fl. 80);
R$ 22.000,00, em 01.04.98 (fl. 81);
R$ 23.200,00, em 04.05.98 (fl. 82);
R$ 1.500.000,00, em 06.07.98 (fl. 83);
Entre os demandados, que oferecem em boa parte defesa conjunta (assim fizeram Paulo Afonso Evangelista Vieira, Oscar Falk, Renato Luiz Hinning, Neuto de Fausto De Conto e Paulo Sérgio Gallotti Prisco Paraíso), o ex-Governador deduziu de sua irresponsabilidade pelos atos questionados, afirmando que "não se atribui qualquer ato ao senhor ex-Governador. Muito menos ação dolosa ou culposa", para concluir que "o autor não indicou muito menos provou qualquer ato que os contestantes tenham praticado" (fl. 188).
A tese, evidentemente, pretende o reconhecimento de eventual responsabilidade apenas dos ex-Secretários de Estado, como que se não houvesse liame entre estes e aquele.
Ora, é bem sabido que as secretarias são órgãos da Administração Direta (Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito administrativo, Atlas, 2008, p. 56-57; Hely Lopes Meirelles, Direito administrativo brasileiro, Malheiros, 2008, p. 747-748). Estes organismos, em decorrência de sua localização topográfica na hierarquia administrativa, não detém prerrogativas de auto-gestão; a exemplo do que preleciona Marçal Justen Filho, a competência administrativa é tributada a entidade que em si representa a Administração Direita - União, Estados, Distrito Federal e Municípios - sem distribuição de poder no mesmo plano; apenas em algumas hipóteses se observará, pelos mecanismos próprios, a distribuição de funções entre os órgãos da Administração Indireta (Curso de direito administrativo, Saraiva, 2009, p. 173). Daí a conclusão elementar de que os órgãos da Administração Direta agem às vistas e por determinação do Chefe do Executivo, pois são órgãos auxiliares na consecução dos objetivos do Poder.
Essa dinâmica é tão evidente que, bem se sabe, o cargo de Secretário de Estado não está afeito às amarras da Súmula Vinculante 13, do STF, que veda a contratação, no Poder Público, de companheiro ou parente. Assim se concluiu pela simetria e identidade que guarda com cargo eletivo - considera-se tal qual cargo de natureza essencialmente política (Rcl 6650 MC-AgR/PR, Rel. Min. Ellen Gracie).
Ademais, não fosse a subordinação que o cargo de Secretário de Estado exige - pois não age a seu intento, mas ao do mandatário - há ainda que se considerar a natureza dos atos que se impugna. Afinal, por quê razão haveria de autorizar-se as transferências à conta do Tesouro, senão no interesse do Administrador? É evidente que não agem para além ou aquém das determinações do Chefe do Poder Executivo.
Todavia, perceba-se a responsabilidade do mandante a partir de prisma diverso: a exigir-se maior concretude na sua conduta para impor-se a responsabilidade, ela assim evidenciar-se-ia em face da omissão do ex-Governador, no exercício da fiscalização das atividades dos seus subordinados - atribuição esta que lhe é inerente (Emerson Garcia, Improbidade administrativa, Lumen Juris, 2008, p. 211).
E é por essa razão que, não obstante não se aponte conduta imediata, responde ele pelos atos questionados, quer porque os tenha determinado em face evidente superioridade hierárquica, quer porque tenha se omitido em seu dever de fiscalização, caso assim se pretender, numa análise mais pueril do contexto.
No mais, deduziu-se, propriamente em relação ao mérito, que as transferências não ensejaram prejuízo ao fundo; isso porque as operações contábeis, que lançariam o valor transferido em "Restos a pagar", importariam em despesas a serem pagas no exercício seguinte. Além disso, segundo afirmam, todo o valor repassado foi empreendido na consecução das finalidades do fundo.
De outro vértice, segue na contramão a dedução defensiva do demandado Marco Aurélio de Andrade Dutra, que procura justificar as transferências de modo inusitado porém previsível, afirmando que
"O objetivo almejado pelos administradores que conduziram o Estado na gestão Paulo Afonso, ao transferir os recursos dos fundos, autarquias e fundações para o Caixa Único, era o mesmo que almejam os responsáveis pela administração pública na atual gestão, qual seja: aplicar com mais propriedade os parcos recursos de que dispõe o Estado para fazer frente aos seus compromissos. Lembrando, entretanto, que se tratam de dois momentos históricos totalmente distintos, eis que atualmente o Estado goza de boa 'saúde' econômico-financeira, o que não ocorreu na gestão anterior, sobretudo pela queda na arrecadação do ICMS, resultado da recessão econômica e da entrada em vigor da Lei Kandir" (fl. 240).
No particular, e nada obstante a falta de convergência entre as teses defensivas, bem se vê que a defesa segue divorciada da prova juntada pelo autor; deu-se conta das transferências, sem justificar a quê. Olvida-se, ainda, da própria avaliação do Tribunal de Contas, que censurou as operações; mais que isso, afirmou-se que "a exordial não apanhou os dados corretos dos documentos do Tribunal de Contas" (fl. 189) - permitindo concluir a ciência e aquiescência com a glosa feita por aquela corte - para concluir que não houve operação questionável, notadamente porque se cuidariam de expedientes "transitórios" (alusão à tese de que eventuais retiradas seriam recompostas no exercício seguinte).
O fato, porém, é que se trouxe a glosa da Corte de Contas, com apontamento dos valores malversados. É o que indicam os documentos de fls. 91-99. A propósito, do parecer prévio se fez constar, em relação, ao exercício de 1996, que:
"A Conta Realizável é composta especialmente por 'Valores Realizáveis - Tesouro do Estado Conta Valores Realizáveis', em R$ 6.101.082,02, referente à transferência do Fundo de Melhoria da Polícia Militar ao Tesouro do Estado, prática irregular apontada no Relatório de Auditoria Ordinária n.º AOR 0248903/67, por contrariar o art. 10 da Lei n.º 10.056/95" (fl. 93).
Em relação ao exercício de 1997, concluiu aquele Tribunal que:
"A Conta Realizável é composta principalmente por 'Valores Realizáveis - Tesouro do Estado Conta Valores Realizáveis', no montante de R$ 12.946.821,24, decorrentes de transferências ao Fundo de Melhoria da Segurança Pública ao Tesouro do Estado. A Lei que institui o Fundo de Melhoria da Segurança Pública não prevê a realização desse tipo de repasse.
Observa-se que o montante de Restos a Pagar (R$ 11.081.113,55) do Fundo de Melhoria da Segurança Pública é menor que o valor registrado na conta 'Valores Realizáveis - Tesouro do Estado Conta Valores Realizáveis' (R$ 12.946.821,24), portanto, verifica-se que o Fundo deixou de honrar seus compromissos em razão de transferências ocorridas ao Tesouro do Estado" (fl. 95).
A mesma ressalva foi feita em relação ao exercício de 1998:
"A Conta Realizável é composta principalmente por 'Valores Realizáveis - Tesouro do Estado Conta Valores Realizáveis', no montante de R$ 7.909.894,77, decorrentes de transferências ao Fundo de Melhoria da Segurança Pública ao Tesouro do Estado. A Lei que institui o Fundo de Melhoria da Segurança Pública não prevê a realização desse tipo de repasse" (fl. 99).
O que se pode concluir, então, é que houve, no mínimo, quebra ao primado da legalidade, com transferências de numerário da conta do Fundo para a conta do Tesouro, do que decorre o desvio de finalidade.
A propósito, detenho-me aqui, com mais vagar, aos fundamentos da sentença, que tendem a afirmar, alicerçados, inclusive, em precedente desta Corte (AC n.º 2003.020326-5), que o procedimento em questão configuraria, quando muito, "mero descumprimento formalidade burocrática".
O argumento, que me causa certa perplexidade, exige cautela em sua observação. Não creio, a par do trato que o ordenamento confere ao orçamento público, que seu desvio, seja a que fim for, pode ser taxado de simples inobservância de procedimento.
Dado o relevo e complexidade que envolve o orçamento, há disciplina própria, inclusive de envergadura constitucional, regendo tanto sua formação quanto sua destinação. Aliás, é dada sua importância que a lei orçamentária tem origem no Executivo (art. 50, § 2.º, III, da CE). Assim é por ser esta a função de Poder a deter a prerrogativa de implementação das políticas públicas, que compreende desde a definição de metas de investimentos, em tese afirmadas no interesse social, até sua concretização, com os investimentos necessários. Sua prerrogativa é, pois, insofismável, e intata a qualquer tentativa de usurpação ( STF, ADI 882/MT, Rel. Min. Maurício Corrêa).
Por outro lado, reservadas aquelas destinações específicas de natureza prioritária, assim definidas no texto constitucional, goza o Administrador de considerável discricionariedade no investimento das receitas públicas; na prática, é-lhe permitido aplicar a receita pública nos investimentos que, a propósito das necessidades públicas e das metas de governo idealizadas, parecerem mais convenientes, posto que transitórias (Aliomar Baleeiro, Uma introdução à ciência das finanças, Forense, 2008, p. 8).
No entanto, essa liberalidade não é plena, e sujeita-se a alguma fiscalização que, bem se sabe, é exercida pelo Poder Legislativo, quando aprecia a proposta de orçamento nascida no Executivo, a quem compete historicamente tal exercício, a fim de que seja observado o primado da legalidade. Sobre o tema, a lição de José Afonso da Silva:
"O princípio de que Administração se subordina à lei - princípio da legalidade - revela-se como uma das conquistas mais importantes da evolução estatal. Seria, contudo, ineficaz, se não se previssem meios de fazê-lo valer na prática. A função de fiscalização engloba esses meios que se preordenam no sentido de impor à Administração o respeito à lei, quando sua conduta contrasta com esse dever, ao qual se adiciona o dever de boa administração, que fica também sobre a vigilância dos sistemas de controle.
A função de fiscalização, que surgira com o constitucionalismo e o Estado de direito implantado com a Revolução francesa, sempre constituiu tarefa básica dos parlamentos e assembléias legislativas. No sistema de separação de poderes, cabe ao órgão legislativo criar as leis, por isso é da lógica do sistema que a ele também se impute a atribuição de fiscalizar seu cumprimento pelo Executivo, a que incumbe a função de administração (...)" (Curso de direito constitucional positivo, Malheiros, 2008, p. 749).
A amplitude dessa função, é bem sabido, antecede mesmo a execução da lei orçamentária, e é aferida quando de sua proposição pelo Executivo, ocasião em que o Legislativo empreende o primeiro exame de legalidade. Ora, a razão de eleger-se uma lei para tal fim (orçamentário) tem vocação evidente: a de permitir a ampla fiscalização do Legislativo sobre a destinação do dinheiro público, atividade que encontra suas raízes no sistema de freios e contrapesos (check and balances).
É por razão tal que o orçamento não é descompromissado exercício de caprichos de quem administra, e porque se submete à aprovação de lei: a aplicação das receitas públicas deverá, obrigatoriamente, seguir o norte do orçamento, que sintetiza, a um só tempo, o anseio do administrador público e a chancela do seu órgão fiscalizador, o Poder Legislativo. Não fosse assim, a permitir-se o deliberado remanejamento de receita, em contraposição ao texto da lei de orçamento, haveria verdadeira burla à sua vocação, pois o ordenador ficaria livre para, sob um aparente verniz de legalidade, conferido pela lei orçamentária, remanejar as verbas de acordo com o seu interesse.
Destaco a pontual observação de Ives Gandra da Silva Martins sobre o tema:
"As programações orçamentárias são projetadas pelo Poder Executivo e aprovadas pelo Poder Legislativo, razão pela qual a lei orçamentária retrata um projeto que, em tese, exterioriza o desejo da sociedade de que seja aplicado da forma como foi aprovado.
Ora, a mudança de programação por iniciativa do Executivo e em sentido contrário à disposição constitucional representaria reduzir a lei orçamentária a singela sugestão de literatura jurídica, sem quaisquer outras funções que não de mero aconselhamento ao Executivo.
A lei orçamentária perderia toda a sua finalidade se os programas aprovados pudessem ser afastados e substituídos pelo Poder Executivo em sua execução" (Comentários à Constituição do Brasil, 6.º vol., t. II, Saraiva, 1991, p. 351-352).
Nesse contexto, transferir verbas de um lugar para outro não é, e nem pode ser considerado simples descumprimento de formalidade burocrática. Afinal, de que procedimento está a se cuidar? Da lei orçamentária?
Ora, o descuido dialético e o desvio técnico em tal afirmação é reprovável. Tratar lei orçamentária como formalidade burocrática padece de lamentável atecnia, e faz relativizar grandezas que, a olho nu, evidenciam-se no todo assimétricas(Claude Lévi-Strauss, Tristes trópicos, Cia. das Letras, 1996, p. 50); é maneira nada sutil de distorcer noções que, por sua natureza, são incompatíveis.
Formalidade, na linguagem corriqueira, é o apego a etiquetas; a maneira de se cumprir algum ato. Mera formalidade, nesse contexto, é algo sem maior expressão, de evidenciado apelo estético (Dicionário Houaiss da língua portuguesa, objetiva, 2001, p. 1373). A lei orçamentária por certo não é apenas um expediente formal, e bem por isso seu descumprimento, por qualquer forma, não pode simplesmente ser taxado como mera desatenção à formalidade.
Aliás, tanto não se dispõe da malversação do orçamento como mera formalidade, ainda que o seja para transferir verbas de uma rubrica para outra que condutas dessa natureza tem, em regra, repercussão criminal (art. 85, VI, da CR). Observo, no particular que a Lei n.º 1.079/51 assim fê-lo em relação ao Presidente da República, dispondo que:
"Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra: (...)
VI - A lei orçamentária; (...)"
No mesmo passo, o Decreto-Lei n.º 201/67 disciplina em relação aos prefeitos:
"Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: (...)
Ill - desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas; (...)
V - ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-Ias em desacordo com as normas financeiras pertinentes;(...)"
O Decreto-Lei, aliás, qualifica a conduta como infração político-administrativa:
"Art. 4º São infrações político-administrativas dos Prefeitos Municipais sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato: (...)
VI - Descumprir o orçamento aprovado para o exercício financeiro; (...)"
Daí questionar-se: se há tanto rigor penal em face da malversação do orçamento, em face da sua lei de regência, como considerar-se, em análise de improbidade, cuidar-se do desvio de receitas como "descumprimento de mera formalidade"? Argumento dessa natureza, cuja sutileza esconde algo muito mordaz, permitiria acobertar, em não raras hipóteses, o exercício da ilegalidade; eis, por exemplo, um bom argumento para afastar em muitos casos, por exemplo, a exigência de licitação: até que se evidencie real prejuízo, por que não cogitar-se, inocentemente, de simples descumprimento de formalidade?
Argumentos dessa natureza - sobretudo no âmbito do Direito Público, em que tudo se rege a par das severas amarras da legalidade - devem ser sempre manejados com muita cautela e responsabilidade: em se cuidando de Administração Pública o exercício retórico é regido pela legalidade; a informalidade é sempre argumento lateral, e de regra suficiente apenas para malferir a legalidade.
Em matéria de execução orçamentária, desvela discurso ainda mais vazio: aqui não há diálogo possível com tal argumento. A discricionariedade na aplicação do dinheiro publico, mesmo que regrada, antecede a elaboração do orçamento, não havendo razão para que, estabelecida as balizas da lei orçamentária, seja possível a reordenação de receita, ao sabor do ordenador das despesas.
Tal qual se pode pressupor, eventual alteração de gastos, uma vez elaborado e aprovado o orçamento anual, depende de novo diploma, específico. Daí, por exemplo, ter afirmado o STJ que "a lei do orçamento anual (ato-regra) pode autorizar, genericamente, as operações de crédito por antecipação de receita (art. 165, § 8º), o que não afasta a necessidade de aprovação, em cada caso, por ato legislativo de inferior hierarquia (ato-condição)" (REsp 410.414/SP, Rel. Min. Castro Meira). É, no mesmo passo, que este Tribunal já assentou que configura ato de improbidade, atentatório aos princípios regentes da Administração, o proceder de "réu que, no tempo em que era Prefeito Municipal de Painel, nos dois últimos quadrimestres do seu mandato contraiu vultosa (para o porte do Município) obrigação de despesa, sem suficiente provisão de caixa que permitisse o seu cumprimento no exercício seguinte" (AC n.º 2009.036163-7, de Lages. Rel. Des. Vanderlei Romer).
A regra-matriz que orienta estes entendimentos é a mesma que impede a livre ordenação da receita pelo Administrador, qual seja, a irrestrita obediência à diretriz orçamentária; evitando-se toda sorte de desvios. A bem da verdade, a retidão no cumprimento das diretrizes orçamentárias encontra teto na própria Constituição; o artigo 167, inciso V, aliás, é pontual, dispondo que "a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa" (regra essa albergada, com o mesmo tom, pela Constituição do Estado de Santa Catarina - art. 123, VII).
Na prática, portanto, a alteração do prognóstico traçado pela lei orçamentária exigiria, por via transversa, a edição de diploma equivalente (lei, em sentido estrito) autorizando o expediente (José Cretella Júnior, Comentários à Constituição Brasileira de 1988, Vol. VII, Forense Universitária, 1992, p. 3.821; Ives Gandra da Silva Martins, Comentários à Constituição do Brasil, 6.º vol., t. II, Saraiva, 1991, p. 353; Uadi Lammêgo Bulos, Constituição Federal anotada, Saraiva, 2008, p. 1.252). A razão, bem evidente, é a de permitir a fiscalização pelo Legislativo, e assim evitar a prática de desvios orçamentários ao sabor do ordenador de despesas. Daí porque é vedado o manejo de medida provisória no manejo de matéria orçamentária (art. 62, d, da CR).
Dado o contexto, a improbidade é em si desvelada pela ausência de diploma legislativo. Nada obstante, lembro que a sentença afirma que na prática não houvera "desvio" porque se teria direcionado o dinheiro daquele fundo "a áreas prioritárias" (f. 341). Pois bem; se havia alguma prioridade, ela certamente estava albergada pela lei orçamentária, e dela não poderia haver esquivos. No mais, se havia "prioridades" outras, para além dos contornos da lei orçamentária, faltou mesmo apontá-las; afinal, em momento algum é justificada, mesmo que de passagem, as razões pelas quais se justificariam os remanejamentos de receitas. Até aqui, o que se tem é, no mínimo, emprego irregular de verba pública, à revelia da lei de orçamento.
Ao que se vê, portanto, houve apenas remanejamento de verba pública, sem se dizer a quê, e nem porquê, que na hipótese é suficiente para caracterizar improbidade. A despeito do que dito na sentença, é dispensável na espécie cuidar-se de prejuízo efetivo, pois que se reclama, desde a origem, a punição por ofensa a princípios regentes da Administração Pública. Demonstração de efetivo prejuízo, como se pretende, é pressuposto para a reparação material, o que não se reclama aqui; o contexto é outro, e só se postula com fundamento no dever de retidão do agente público.
No que pertine ao dever de observância aos princípios da Administração Pública, dispõe a Lei n.º 8.429/92 que "constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência (...)" (art. 11). Os fatos apontados, já foi dito, caracterizam desvio de finalidade, ofendendo os princípios da unidade orçamentária, da moralidadee sobretudo o primado da legalidade, sujeitando os demandados aos rigores da lei. No mais, é de se observar, "a lesão a princípios administrativos prevista no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente, nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para configurar o ato de improbidade" (STJ, REsp 1.112.062/SP. Primeira Turma. Rel. Min. Luiz Fux. Decisão de 22.09.09). A prática de ato ofensivo aos princípios regentes é causa suficiente à imposição das penas cominadas em lei.
Tenho particularmente a responsabilidade de todos os demandados, porque direta e indiretamente patrocinam o desvio em questão. Diverge, contudo, a maioria, a entender pela responsabilidade unicamente do Chefe do Executivo, ordenador de despesas. De qualquer sorte, firmo a condenação considerando todos os envolvidos, sem prejuízo da dicção da maioria quanto à limitação da responsabilidade somente ao Sr. Paulo Afonso Evangelista Vieira, no que permaneço vencido.
Pois bem. Observo que a punição deve orientar-se pelas regras ordinárias aotrato de aplicação de sanções. Daí que, à maneira do que se observa na disciplina penal, é necessário sopesar-se a pena de acordo sobretudo com a conduta, de modo a não banalizar a punição, ou mesmo jogar na vala comum agentes com condutas distintas, ofendendo por via reflexa a individualização de penas, de que a Constituição da República não permite ressalvas (art. 5.º, XLVI).
Essa individualização, inclusive, tem raízes na própria lei, que determina que as sanções "que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato" (art. 12, caput, da Lei n,º 8.429/92). É também o resguardo feito pela jurisprudência, que tem orientado cotidianamente que "no campo sancionatório, a interpretação deve conduzir à dosimetria relacionada à exemplariedade e à correlação da sanção, critérios que compõem a razoabilidade da punição" (STJ, REsp 1.113.200/SP. Primeira Turma. Rel. Min. Luiz Fux. Decisão de 08.09.09).
Dito isso, e sopesando as variáveis do caso concreto e a natureza dos atos que se deduz ímprobos, do que à primeira vista não se vislumbra ofensa para além dos princípios deduzidos, voto pela imposição aos demandados, com fundamento no art. 12, III, da Lei n.º 8.429/92, a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 3 (três) anos; voto, ainda, pela condenação daqueles ao pagamento de multa. No particular, é de impor-se ao demandado Paulo Afonso Evangelista Vieira penalidade equivalente a 10 (dez) vezes a remuneração percebida à época dos fatos. Em relação aos demais réus, voto pelo arbitramento individual de multa equivalente a 3 (três) vezes a remuneração então percebida (considero, pois, que atuavam como longa manus do então governador). A multa deverá ser corrigida desde a citação. Devem arcar ainda com o pagamento de custas. Fixo a honorária em 15% sobre o valor da condenação em dinheiro, com vistas ao disposto no art. 20 § 3.º, do CPC.
3. DECISÃO
Ante o exposto, a Câmara decidiu, por maioria de votos, dar provimento parcial ao recurso do Estado em relação ao réu Paulo Afonso Evangelista Vieira, para condena-lo às penas, nos termos do voto do relator, mantida a sentença de improcedência em relação aos demais réus. Vencido parcialmente o relator, que dava parcial provimento ao recurso para condenar todos os demandados. Vencido, também, o Exmo. Sr. Des. Cid Goulart, que negava provimento ao apelo.
O julgamento, realizado no dia 14 de dezembro de 2010, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Cid Goulart, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Newton Janke.
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. André Carvalho.
Florianópolis, 14 de dezembro de 2010.
Ricardo Roesler
Relator
Declaração de voto vencido do Excelentíssimo Senhor Desembargador Cid Goulart
Trata-se de ação civil pública por suposto ato de improbidade administrativa que teria sido praticado pelos então Governador e Secretários da Fazenda do Estado de Santa Catarina, consistente em transferir ou autorizar a transferência de recursos do Fundo de Melhoria da Polícia Militar - FUMPOM - para a Conta Única do Tesouro Estadual (fls. 2-24).
Após regular trâmite, sobreveio a sentença a quo, que julgou improcedente o pedido, adotando como razão de decidir acórdão desta Corte que enfrentou matéria similar (fls. 337-344).
Irresignado, o Estado de Santa Catarina interpôs o presente recurso de apelação cível (fls. 348-361).
Submetido o feito à julgamento, o douto Desembargador Ricardo Roesler votou pela reforma da sentença, com o julgamento de procedência do pedido para o fim de impor aos apelados a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 3 (três) anos e o pagamento de multa, bem como o pagamento de custas e honorários advocatícios.
É a síntese do essencial.
Em que pese os fundamentos apresentados pelo voto do ilustre relator, tem-se que o recurso interposto não comporta provimento.
Conforme já dito, a sentença recorrida está fundamentada em acórdão que enfrentou situação análoga, da relatoria do Desembargador Luiz Cézar Medeiros e que também contou com os votos dos Desembargadores Francisco Oliveira Filho e Newton Trisotto, verbis:
"Como se trata de sentença de improcedência do pedido formulado no bojo de ação civil pública pelo Estado de Santa Catarina, conforme autoriza o art. 19 da Lei n. 7.347/85, inteiramente aplicável ao caso as disposições do Código de Processo Civil que determinam o reexame necessário.
"A decisão em reexame, contudo, não merece reforma, pois deu o adequado equacionamento à lide. Nesse norte, por concordar inteiramente com o posicionamento adotado pelo digno julgador monocrático, adoto a sentença como razão de decidir:
"'Questionam-se transferência de valores da conta do FUNJURE para o caixa único do estado e a utilização desses recursos em fim diverso, a implicar improbidade, nos termos do art. 11, I, da Lei n. 8.429/92.
"'Um ato administrativo pode ser denominado ímprobo por ensejar proveito patrimonial ilícito a quem o pratica (na forma do art. 9º e incisos da Lei n. 8.429/92), causar prejuízo ao erário público (na forma do art. 10º e incisos da mesma Lei) e também por atentar contra os princípios da honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade (conforme o art. 11, e incisos, ainda dessa lei).
"'Segundo a inicial, os atos dos demandados seriam ímprobos porque desviaram a finalidade de verbas públicas, aplicando-as em fim diverso do previsto na lei orçamentária, sem qualquer alegação de proveito pessoal ou prejuízo ao erário público.
"'O princípio que teria sido violado seria o da legalidade, pois o fim do ato praticado é diverso daquele previsto em Lei.
"'Eis o teor do art. 11, controvertido:
"'Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
"'I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;
"'II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
"'III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;
"'IV - negar publicidade aos atos oficiais;
"'V - frustrar a licitude de concurso público;
"'VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;
"'VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço'.
"'Tenho que o ato de que versam os autos não se amolda a tais dizeres legais, se bem que deixou de observar o critério da destinação das verbas públicas, em estrita correlação com a lei orçamentária.
"'A obtenção de vantagem indevida e a causação de prejuízo ao erário público, são pressupostos de configuração das práticas descritas nos arts. 9º e 10º, respectivamente, da Lei de Improbidade Administrativa, daí porque aqui não vêm ao caso.
"'Mas há uma marca nos atos descritos no art. 11 e seus incisos ilustrativos que não se configura na espécie, que faz com que a conduta dos demandados não se subsuma à do inciso I, do tal artigo.
"'É que o ato praticado pelos demandados não fere a direito algum, de quem quer que seja, nem tampouco atenta assim severamente contra o balizamento legal respectivo, além do que não causou benefício ou vantagem alguma, ilícita ou indevida, a qualquer pessoa.
"'Como consta alhures, o fim dos atos em questão, durante a gestão do atual governo, acabou mesmo sendo o direcionamento generalizado através da edição do Decreto n. 839/99, de 27.12.99, que consta a fls. 237, onde se legitimou a prática, mencionando todos os fundos e não apenas aquele de que versam os autos.
"'A punir-se o ato dos demandados, o subscritor de tal diretiva legal haveria também de ser punido, e com muito maior severidade ainda, porque deu a diretriz a todos os fundos e não apenas ao FUNJURE.
"'O grau de ostensividade da prática o ato administrativo é irrelevante.
"'Isto já seria de molde a ressaltar a absoluta ausência de lesividade, odiosidade, imoralidade, ética ou mácula de alguma ordem, já que o autor, por sua administração atual, repetiu a prática de que inculpa os demandados, editando um diploma legal para torná-la corrente deixando, para si, de merecer a pecha de ilegal, proibida em lei.
"'Ocorre que semelhante atitude, de estipular um diferenciador entre as duas condutas, a partir da edição de um decreto, pelo atual mandatário do autor da demanda, soa algo insólito, para não dizer anti-ético.
"'Ou será que a ilegitimidade está em que apenas se dirigiu a um ato em concreto, recolhendo ao Tesouro do Estado de Santa Catarina apenas o numerário existente no FUNJURE?
"'Quer nos parecer que o fato de constar a determinação de um decreto, ou dirigir-se ela a todos os fundos, autarquias, fundações, e empresas dependentes de recursos do Tesouro do Estado, ou mesmo a justificativa de que servia a medida para "aprimorar o encerramento do exercício financeiro e facilitar a tomada de contas dos ordenadores de despesas", não alteram o quadro em questão.
"'No mais a restituição do numerário não ficou garantida no decreto, pois os fundos, que tinham de apresentar para tanto "plano de aplicação na forma da regulamentação em vigor" (art. 4, do dito Decreto), sendo certo que "A Secretaria de Estado da Fazenda orientará todos os Dirigentes e Órgãos e Entidades mencionadas no art. 2º sobre a forma de operacionalizar este Decreto, ficando o seu Secretário autorizado a expedir Instruções Complementares" (art. 5º), certamente condicionantes de tal restituição.
"'Note-se aí inclusive uma carta branca ao Secretário da Fazenda, no recolhimento dos dinheiros dos fundos e também na instituição de regras relativas forma do plano de aplicação exigível.
"'Desta forma, se tem por descabida a alegação de fls. 275, do autor, no sentido de que "deveria eventual saldo positivo ser transferido para o exercício seguinte, a crédito do mesmo fundo", pena de quebra da destinação dos valores, porque nem o normativo baixado pelo atual mandatário cogitou.
"'E depois, não parece que qualquer proibição legal se constitua em óbice à prática do ato, porque administrar bem, notadamente em épocas como esta, de escassez de recursos e abundância de necessidades públicas e sociais, implicará em fazer, o administrador, opção justa, na escala hierárquica de interesses, havendo de se ampliar a esfera honesta de atuação, para reprimir apenas e tão somente os verdadeiros assaltos aos cofres públicos noticiados amiúde por uma imprensa ávida de notícias que tais.
"'Desta forma, por exemplo, afigurar-se-ia absurdo condenar sumariamente o desvio de recursos de certos fundos, como o controvertido, para cuidar de interesses situados no topo da pirâmide constitucional, como por exemplo a vida e saúde dos cidadãos.
"'Não será demais lembrar que as normas que instituem formas, ritos e o próprio orçamento, são de índole imensamente menor do que aquelas que dizem com as diretrizes políticas maiores, a serem observadas por primeiro.
"'E não será esta a primeira vez que o Poder Judiciário se pronuncia sobre o valor secundário do orçamento do Estado de Santa Catarina, pois bastaria consultar a Apelação Cível n. 00.014747-8, da Comarca da Capital.
"'No mais, o próprio STJ tem fixado diretrizes interpretativas mais consentâneas com o estágio atual da hermenêutica jurídica:
"'... ILEGALIDADE DA AUTORIDADE COATORA NA EXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DE FORMALIDADE BUROCRÁTICA - 1 - A existência, a validade, a eficácia e a efetividade da Democracia está na prática dos atos administrativos do Estado voltados para o homem. A eventual ausência de cumprimento de uma formalidade burocrática exigida não pode ser óbice suficiente para impedir a concessão da medida porque não retira, de forma alguma, a gravidade e a urgência da situação da recorrente: a busca para garantia do maior de todos os bens, que é a própria vida... faz-se imprescindível interpretar a lei de forma mais humana, teleológica, em que princípios de ordem ético-jurídica conduzam ao único desfecho justo: decidir pela preservação da vida. 6 - Não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e sim, considerá-la com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do legislador, mormente perante preceitos maiores insculpidos na Carta Magna garantidores do direito à saúde, à vida e à dignidade humana, devendo-se ressaltar o atendimento das necessidades básicas dos cidadãos...' (STJ - ROMS 11183 - PR - 1ª T. - Rel. Min. José Delgado - DJU 04.09.2000 - p. 00121).
"'É possível o levantamento do FGTS para fins de tratamento de portador do vírus HIV, ainda que tal moléstia não se encontre elencada no artigo 20, XI, da Lei 8.036/90, pois não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e sim considerá-la com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do legislador, mormente perante o preceito maior insculpido na Constituição Federal garantidor do direito à saúde, à vida e a dignidade humana e, levando-se em conta o caráter social do Fundo que é, justamente, assegurar ao trabalhador o atendimento de suas necessidade básicas e de seus familiares...' (STJ - RESP 249026 - (200000158534) - PR - 1ª T. - Rel. Min. José Delgado - DJU 26.06.2000 - p. 00138).
"'Como se vai vendo, se o próprio Judiciário centra-se num esforço de solução dos problemas cruciais da atualidade, não lhe é dado impor ao administrador um proceder em sentido diverso, desprezando diretrizes que tais, mais grandiosas que sejam, para propor ao representante governamental uma conduta fincada sempre e sempre na letra morta, fria e estática das normas.
"'Com tal, concluo que não se pode, simplisticamente, dar por ímprobo um administrador apenas e tão somente em atendimento à mudança de destino de alguma verba pública, se a ninguém prejudicou ou beneficiou pecaminosamente.
"'Não seria demais lembrar que, segundo o proclamou o próprio STJ, na forma também lembrada a fls. 102:
"'Não havendo enriquecimento ilícito e nem prejuízo ao erário municipal, mas inabilidade do administrador, não cabem as punições previstas na Lei nº 8.429/92. A lei alcança o administrador desonesto, não o inábil. Recurso improvido.' (STJ - REsp 213.994 - MG - 1ª T. - Rel. Min. Garcia Vieira - DJU 27.09.1999 - p. 59).
"'O raciocínio merece aplauso, segundo também penso, porque a lei em questão visa claramente reprimir os atos nocivos ao erário público, ou de que defluam indevidas vantagens a alguns administrados.
"'Para que efetivamente a lei vise combater a improbidade na administração, há de centrar-se no ataque aos atos praticados por administradores de mau caráter, desonestos, malvados, perversos, de má índole, defraudadores do patrimônio público (seja ele ético, moral ou econômico), todos que acabam por auferir, ou atribuir a alguém, vantagem indevida, relacionada com o mau exercício de função pública, em detrimento da satisfação das necessidades públicas, segundo seu juramento.
"'Deste modo observadas as coisas, o princípio da legalidade envolve mais do que a pura e simples transposição de verbas, e, na modalidade do inciso I do art. 11 antes copiado, adquire outro sentido, de praticar ato contrário não apenas à letra fria das normas, mas ao bem comum, que é o fim último de todas as leis, ou simulado, ou com violação de regra de competência.
"'Não é esta a tônica destes autos.
"'Aqui os demandados destinaram valores para atendimento de necessidades diferentes daquelas para cuja satisfação eram destinados, e, ficou evidente, sem que daí surgisse algum prejuízo'. (fls. 298-302)." (Apelação Cível n. 2003.020326-5, da Capital, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 6-12-2005)
Comungo inteiramente com os fundamentos supra, razão pela qual tenho que a solução aqui não poderia ser outra senão a manutenção da sentença que julgou improcedente o pedido formulado na presente ação civil pública.
A Primeira Câmara de Direito Público também já teve oportunidade de discutir a matéria, por meio de acórdão da lavra do douto Desembargador Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, que foi acompanhado pelos Desembargadores Vanderlei Romer e Sérgio Roberto Baasch Luz, que não conheceu de reexame necessário nos seguintes termos:
"A incidência de reexame foi cogitada apenas pelo ilustre Procurador de Justiça, Dr. Aurino Alves de Souza.
"Vejamos o que dispõe o Código de Processo Civil:
"Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
"I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público.
"Data venia, mas a melhor interpretação é de que não há duplo grau obrigatório na espécie.
"É certo que o pedido formulado pelo Estado, por intermédio de sua Procuradoria Geral, foi improcedente, mas o reexame só deve incidir quando o direito controvertido for de valor certo e excedente a 60 salários-mínimos (CPC, 475, § 2º) ou representar interesse público qualificado como primário.
"O móvel desta ação é o exame da probidade do repasse de verba da Fundação de Desporto para a conta única do Tesouro do Estado, sem que isto tenha significado proveito pessoal aos agentes ou prejuízo ao erário, muito menos conduta gerada por dolo ou culpa dos réus.
"Nesse aspecto, convém observar do corpo da sentença:
"'Para que efetivamente a lei vise combater a improbidade na administração, há de centrar-se no ataque aos atos praticados por administradores de mau caráter, desonestos, malvados, perversos, de má índole, defraudadores do patrimônio público (seja ele ético, moral ou econômico), todos que acabam por auferir, ou atribuir a alguém, vantagem indevida, relacionada com o mau exercício de função pública, em detrimento da satisfação das necessidades públicas, segundo seu juramento.
"'Deste modo observadas as coisas, o princípio da legalidade envolve mais do que a pura e simples transposição de verbas, e, na modalidade do inciso I do art. 11 antes copiado, adquire outro sentido, de praticar ato contrário não apenas à letra fria das normas, mas ao bem comum, que é o fim último de todas as leis, ou simulado, ou com violação de regra de competência.
"'Não é esta a tônica destes autos.
"'Aqui os demandados destinaram valores para atendimento de necessidades diferentes daquelas para cuja satisfação eram destinados, e, ficou evidente, sem que daí surgisse algum prejuízo (f. 502).
"Fácil concluir que o direito controvertido é distinto das duas exceções antes destacadas, por isso não é caso de reexame." (Apelação Cível n. 2007.031948-1, da Capital, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. 17-7-2009)
Cumpre destacar, ainda, que não há qualquer prova de que tenha partido de algum dos apelados ordem determinando que o gestor do Fundo de Melhoria da Polícia Militar - FUMPOM, que conforme destacou o douto relator não figura no pólo passivo da presente, apesar de ser o responsável pela gestão do FUMPOM, nos termos do art. 7º, caput, do Decreto n. 4.749/94 (fl. 87), determinando a movimentação de recursos.
A prova dos autos que indica as transferências tidas por ímprobas é constituída por relatórios contábeis (fls. 40/41, 50, 59, 67-82) e ordens bancárias, estas firmadas pelo Tesoureiro Geral e por Coronel da Polícia Militar diverso do Comandante Geral (fls. 42-49, 51-58, 60-66, 83).
Referidas ordens determinavam o crédito de certas quantias na Conta Única do Estado, "de conformidade com os documentos comprobatórios em nosso poder". Ocorre que tais documentos que justificariam a transferência dos recursos não foram apresentados.
Os apelados, ao contestarem a actio, negaram a responsabilidade pelas transferências.
Neste sentido, colhe-se de peça de defesa de fls. 185-197:
"Assim, é induvidoso que o senhor ex-Governador Paulo Afonso Evangelista Vieira não tem qualquer responsabilidade pelas transferências atacadas, por sinal, todas elas absolutamente legais.
"4.2 Quanto aos senhores ex-Secretários da Fazenda, também é equivocada a "conclusão" de sua suposta responsabilidade pelas transferências combatidas.
"O autor não indicou muito menos provou qualquer ato que os contestantes tenham praticado." (fl. 188)
A condenação nas severas penas previstas na Lei de Improbidade Administrativa, ao meu sentir, não pode decorrer das atribuições legais dos cargos então ocupados pelos recorridos, ou na responsabilidade daí decorrente. Demandaria, na realidade, a comprovação de ato ou omissão efetiva, deliberada, de cada um dos agentes acusados.
Não pode deixar de ser destacado, ainda, que inexiste prova nos autos demonstrando que não houve o dispêndio de quantia igual ou superior à que foi transferida para a Conta Única para a consecução da finalidade de "melhoria dos serviços da Polícia Militar" a que se destina o FUMPOM, nos termos do art. 2º da Lei n. 7.672/89, com a redação que lhe deu a Lei n. 9.383/93 (fl. 85).
Somente com tal comprovação é que se poderia falar em desvio de finalidade.
Além do mais, a moderna orientação emanada pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria exige, para a caracterização das condutas ímprobas previstas no art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa, a presença do dolo dos agentes, conforme muito bem ilustra o julgado que segue:
"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ART. 11 DA LEI 8.429/92). ELEMENTO SUBJETIVO. REQUISITO INDISPENSÁVEL PARA A CONFIGURAÇÃO DO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PACIFICAÇÃO DO TEMA NAS TURMAS DE DIREITO PÚBLICO DESTA CORTE SUPERIOR. SÚMULA 168/STJ. PRECEDENTES DO STJ. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NÃO CONHECIDOS.
"1. Os embargos de divergência constituem recurso que tem por finalidade exclusiva a uniformização da jurisprudência interna desta Corte Superior, cabível nos casos em que, embora a situação fática dos julgados seja a mesma, há dissídio jurídico na interpretação da legislação aplicável à espécie entre as Turmas que compõem a Seção. É um recurso estritamente limitado à análise dessa divergência jurisprudencial, não se prestando a revisar o julgado embargado, a fim de aferir a justiça ou injustiça do entendimento manifestado, tampouco a examinar correção de regra técnica de conhecimento.
"2.O tema central do presente recurso está limitado à análise da necessidade da presença de elemento subjetivo para a configuração de ato de improbidade administrativa por violação de princípios da Administração Pública, previsto no art. 11 da Lei 8.429/92. Efetivamente, as Turmas de Direito Público desta Corte Superior divergiam sobre o tema, pois a Primeira Turma entendia ser indispensável a demonstração de conduta dolosa para a tipificação do referido ato de improbidade administrativa, enquanto a Segunda Turma exigia para a configuração a mera violação dos princípios da Administração Pública, independentemente da existência do elemento subjetivo.
"3. Entretanto, no julgamento do REsp 765.212/AC (Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 23.6.2010), a Segunda Turma modificou o seu entendimento, no mesmo sentido da orientação da Primeira Turma, a fim de afastar a possibilidade de responsabilidade objetiva para a configuração de ato de improbidade administrativa.
"4. Assim, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que, para a configuração do ato de improbidade administrativa previsto no art. 11 da Lei 8.429/92, é necessária a presença de conduta dolosa, não sendo admitida a atribuição de responsabilidade objetiva em sede de improbidade administrativa.
"5. Ademais, também restou consolidada a orientação de que somente a modalidade dolosa é comum a todos os tipos de improbidade administrativa, especificamente os atos que importem enriquecimento ilícito (art. 9º), causem prejuízo ao erário (art. 10) e atentem contra os princípios da administração pública (art. 11), e que a modalidade culposa somente incide por ato que cause lesão ao erário (art. 10 da LIA).
"6. Sobre o tema, os seguintes precedentes desta Corte Superior: REsp 909.446/RN, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 22.4.2010; REsp 1.107.840/PR, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 13.4.2010; REsp 997.564/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 25.3.2010; REsp 816.193/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 21.10.2009; REsp 891.408/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, DJe de 11.02.2009; REsp 658.415/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 3.8.2006. No mesmo sentido, as decisões monocráticas dos demais integrantes da Primeira Seção: Ag 1.272.677/RS, Rel. Herman Benjamin, DJe de 7.5.2010; REsp 1.176.642/PR, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Dje de 29.3.2010; Resp 1.183921/MS, Rel. Min. Humberto Martins, Dje de 19.3.2010.
"7. Portanto, atualmente, não existe divergência entre as Turmas de Direito Público desta Corte Superior sobre o tema, o que atrai a incidência da Súmula 168/STJ: "Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado".
"8. Embargos de divergência não conhecidos." (EREsp 875163/RS, rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, j. 23-6-2010, DJe 30-6-2010)
No mesmo norte:
"ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
"1. Embora tenha havido discrepância inicial, pacificou a jurisprudência desta Corte em reconhecer que as condutas descritas no artigo 11 da Lei de Improbidade dependem da presença do dolo, ainda que genérico. Consequentemente, afasta-se a responsabilidade objetiva dos administradores, não se fazendo necessária a demonstração da ocorrência de dano para a Administração Pública. Precedentes.
"2. Embargos de divergência não providos." (EREsp 917437/MG, rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, j. 13-10-2010, DJe 22-10-2010)
"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TIPIFICAÇÃO. INDISPENSABILIDADE DO ELEMENTO SUBJETIVO (DOLO, NAS HIPÓTESES DOS ARTIGOS 9º E 11 DA LEI 8.429/92 E CULPA, PELO MENOS, NAS HIPÓTESES DO ART. 10). PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS DA 1ª SEÇÃO. RECURSO PROVIDO." (EREsp 479812/SP, rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, j. 25-8-2010, DJe 27-9-2010)
Por tais razões, votei pelo desprovimento do apelo, mantendo integralmente a sentença objurgada, que julgou improcedente a ação civil pública.
Florianópolis, 22 de novembro de 2011.
Cid Goulart
Desembargador


Fonte: PORTAL DO TJ/SC

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