Polícia Nacional argentina vigia entrada da sede da emissora de televisão Cablevisión, em Buenos Aires, após mandado judicial
Comunicação
Ação policial teve como objetivo apreender documentos e designar um interventor, segundo o juiz que autorizou a invasão
Publicado em 21/12/2011 | Agência O Globo
Da união ao ódio
Depois de um passado de cumplicidade, a relação entre os governos Kirchner e o Clarín se transformou em uma grande guerra.2003/2007 – durante o mandato de Néstor, Kirchner o jornal Clarín era alinhado com o governo.
2008 – o jornal se opõe ao governo para defender a bandeira dos produtores rurais contra a alta dos impostos de importação. A partir do fim da aliança Clarín-Kirchners, Cristina passa a justificar os ataques ao jornal com a justificativa de democratização dos meios de comunicação.
Setembro de 2009 – A AFIP, equivalente à receita Federal Argentina faz uma fiscalização nos escritórios do Clarín, aborda funcionários e revista casas de diretores. A ação foi repudiada pelos opositores do governo e por organizações internacionais de imprensa.
28 de março de 2011 – o jornal circulou com a capa em branco em protesto a um bloqueio feito por manifestantes na porta da gráfica que atrasou em 12 horas a publicação. Segundo o Clarín, a manifestação foi liderada por grupos ligados ao governo. O editor-chefe do jornal disse que a capa em branco representava o “silêncio forçado” e “uma metáfora do que o jornalismo pode se tornar se os espaços de liberdade continuarem sendo restritos”.
Junho/Julho de 2011 – Os herdeiros do Grupo Clarín, Marcela e Felipe Herrera de Noble, adotados há 35 anos pela principal acionista, aceitam fazer um exame de DNA para verificar se eles seriam um dos 500 bebês que os militares sequestraram durante a ditadura. A pressão popular pelos exames dos dois era estimulada pelo governo argentino. As amostras foram comparadas com 55 famílias e o resultado foi negativo.
Dezembro de 2011 – projeto do governo de tornar a única fábrica de papel-jornal do país de “interesse público” é aprovado pela Câmara dos Deputados. O Clarín tem 49% das ações, o jornal La Nación tem 22% e os 27,5% restantes são do governo. Os dois grandes jornais – que vendem papel para outros veículos – consideram que se perderem sua ações vão ficar reféns de governo ao depender de sua regulamentação para adquirir o material.
Numa ação considerada sem precedentes pelos opositores do governo de
Cristina Kirchner, a sede da empresa fornecedora de serviços de tevê a
cabo Cablevisión, em Buenos Aires, foi ocupada ontem durante três
horas — em circunstâncias inusitadas — por policiais no que críticos
consideram um novo capítulo da briga entre Cristina e o Grupo Clarín. A
Cablevisión pertence ao grupo de comunicação crítico ao governo.
A incursão da Gendarmería National Argentina — polícia de elite
ligada ao Ministério da Segurança — à sede em Buenos Aires foi
autorizada por um juiz da cidade de Mendoza, onde a empresa não opera. O
objetivo, segundo o juiz, era designar um interventor e apreender
documentos para um processo movido contra a Cablevisión pelo grupo
Vila-Manzano, dono da Supercanal, empresa concorrente. O grupo
Vila-Manzano é aliado dos Kirchner: seus veículos de comunicação, mais
influentes no interior, estão entre os campeões em arrecadação
publicitária do governo federal.
Além disso, um dos donos do grupo é José Luis Manzano, peronista,
ministro do Interior do governo Carlos Menem, muito próximo ao chefe de
Gabinete de Cristina, Juan Manuel Abal Medina. O Vila-Manzano acusa o
Grupo Clarín — que detém 47% do mercado de tevê a cabo argentino — de
monopólio e concorrência desleal desde que houve a fusão entre a
Cablevisión e o Multicanal, outra operadora de cabo. A união foi
autorizada pelo governo em 2007. Neste ano, um tribunal ordenou que o
governo anulasse a fusão. Só que o Grupo Clarín recorreu, e o processo
está em andamento.
“É uma história muito mal contada. Como um juiz de Mendoza autoriza
uma incursão numa empresa de Buenos Aires? Porque está ligado à
Vila-Manzano, que é muito influente na cidade”, disse Martín
Etchevers, gerente de Comunicações Externas do Grupo Clarín.
O cientista político Adrían Ventura, colunista do jornal La Nacíon,
outro jornal crítico ao governo, diz não ter dúvidas de que a Casa
Rosada está por trás da intimidação, em mais um exemplo de que “a
liberdade de expressão agoniza na Argentina”. A vinculação do governo
com o ocorrido ontem foi considerada “um disparate” pelo ministro do
Interior, Florencio Randazzo.
Segundo Ventura e Etchevers, não é mera coincidência a ação ocorrer
na mesma semana em que deve ser votado, no Senado (a Câmara já aprovou),
o projeto do governo federal que declara de “interesse público” o
papel-jornal, cuja única fábrica (a Papel Prensa) tem a participação do
Estado, mas é controlada por La Nación e Clarín. Segundo o governo, as
empresas realizaram manobras para obter o controle da Papel Prensa
durante a ditadura militar (1976-1983).
Os opositores alegam que a medida afetará a distribuição dos jornais no país.
O Grupo Clarín entrou, ontem, com uma ação contra o tribunal de
Mendoza por abuso de poder por parte do juiz Walter Bento, que autorizou
o mandado de busca e apreensão. O juiz e o interventor designado por
ele tiveram de sair da sede sob escolta policial e gritos de revolta dos
funcionários da Cablevisión.
Associações de imprensa como o Comitê de Proteção dos Jornalistas
(CPJ) e a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) disseram, na noite
de ontem, estar analisando o caso antes de emitir um parecer.
Fonte: GAZETA DO POVO
Nenhum comentário:
Postar um comentário