20/12/2011 11:50,
Por Redação, com Vermelho- de Lisboa
A Somália é um dos numerosos países subdesenvolvidos que desde
os anos 1980 recebeu inumeráveis cargas de resíduos nucleares e outros
dejetos tóxicos dos países desenvolvidos e os armazenou ao longo de sua
costa.
Os somalis informam agora que 40% de sua população padecem de
câncer.
Tratava-se de uma violação dos acordos internacionais a exportação de semelhantes dejetos à Somália, e era eticamente questionável que pudessem estabelecer-se semelhantes convênios com um país sacudido por uma guerra civil.
Tratava-se de uma violação dos acordos internacionais a exportação de semelhantes dejetos à Somália, e era eticamente questionável que pudessem estabelecer-se semelhantes convênios com um país sacudido por uma guerra civil.
A indignação do
Unep (United Nations Environment Programme), o Programa da ONU para a
proteção ao meio ambiente, parecia justificada. Mas a incógnita se
mantém aberta: se desde os anos 1980 se deram esses casos, por que o
Unep não tomou medidas mais enérgicas antes?
A ONU não se manifestou nem mesmo depois do escândalo do barco sírio
“Zenobia”, que em 1988 transportava cerca de 20 mil toneladas de
resíduos nucleares e durante meses esteve buscando um porto para poder
descartá-las.
Em 1989 a ONU convocou a Convenção de Basileia para o controle das
rotas dos resíduos nucleares. Os ecologistas protestaram: segundo eles, o
controle das rotas de lixo atômico não significava impedir seu embarque
para o Terceiro Mundo. Assim aconteceu pela primeira vez em 1995,
quando foi incluído um apêndice a Convenção de Basileia a partir do qual
ficava proibido aos Estados membros da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico, mais conhecida por sua sigla inglesa OECD,
exportar resíduos tóxicos aos Estados que não pertenciam a OECD. Mas
essa oposição chocou-se com a oposição dos EUA. Washington negou-se a
assinar o artigo adicional da Convenção de Basileia. No que diz respeito
a outros produtores de resíduos, buscaram rodeios para se desfazer do
seu lixo nuclear. A empresa ODM de Lugano inclusive indicava na internet
os melhores lugares para o armazenamento de dejetos nucleares.
Preferiu-se a Somália sacudida por uma guerra civil. Parece que Giorgio
Comerio, diretor da empresa ODM, ofereceu a um tal de Ali Mali US$ 1
milhão para depositar estes resíduos no nordeste da Somália.
Ilaria Alpi e Miran Hrovatin, dois jornalistas italianos, tentaram
averiguar mais sobre tais negócios. Em 18 de março de 1994 chegaram à
cidade somali de Bosasso, entrevistaram um funcionário local e no dia 20
de março deste mesmo ano, apenas algumas horas antes que pudessem
enviar por telefone seu informe à RAI, foram assassinados em plena Rua de Mogadíscio por um comando assassino.
Ocidente ganha bilhões
Os negócios com o lixo nuclear continuaram em grande escala. Da
Somália chegaram indícios de que o depósito de resíduos nucleares de
Obbia estava protegido por “soldados estrangeiros” e não por uma milícia
somali. Segundo uma fonte confiável, os franceses e os estadunidenses
já deram sinal verde nos anos 1980 para a construção de um armazém de
resíduos nucleares nesta região. Também o senhor da guerra somali,
general Morgan, que opera no sul do país, afirma que vários
representantes estrangeiros o haviam visitado em Nairobi para comprar
sua autorização para o depósito de resíduos nucleares, o qual recusou,
segundo disse.
Para Massimo Alberizzi, do Corriere della Sera, não existe a
menor dúvida: o comércio de resíduos nucleares e outros tóxicos que
chegam à Somália se encontra nas mãos do crime organizado. Mas também
parecem estar envolvidos interesses mais altos. Massimo Scalia,
presidente de uma comissão de investigação do Parlamento italiano, disse
à agência Inter Press Service que a Itália ganha, somente no comércio de resíduos atômicos, US$7 bilhões dos EUA.
Somente no ano de 2001, embarcaram para África 600 mil toneladas de
dejetos nucleares. A Somália não era o único destino. Também estavam
previstos Zaire, Malawi, Eritreia, Argélia e Moçambique. Dada a
envergadura do embarque ilegal de lixo atômico desde a Europa, o Unep
tentou atuar. Moustapha Tolba, na ocasião diretor executivo do UNEP,
protestou já em setembro de 1992 perante os governos italiano e suíço e
exigiu por fim a exportação de resíduos para a África. O então ministro
do Meio Ambiente italiano, Carlo Ripa de Meana, afirmou que nenhuma
empresa italiana participava de semelhantes negócios. E nisso ficou.
O Unep cala
Mas os representantes do lobby nuclear seguiram pressionando. Segundo
algumas afirmações, foram eles que impediram o rápido fim das
negociações de paz entre os partidos da guerra civil somali. Segundo
algumas investigações, o Unep depende dos meios financeiros que
proporcionam a cada dois anos os Estados membros, por isso seria
demasiado arriscado se enfrentar abertamente os países industriais que
são seus principais financiadores. É difícil questionar esta afirmação.
O informe do Unep se ocupa detalhadamente de diversos aspectos dos
efeitos, especialmente dos resíduos lavados em terra, nos manguezais da
costa, os recifes de corais, a pesca e a água subterrânea. Por outro
lado, os danos sofridos já pelos seres humanos, alguns já mortos, apenas
se mencionam. Ademais, os autores se queixam de que não lhes foi
possível investigar a situação in loco.
Indiretamente, esta é também a justificação para as inócuas
conclusões do Informe Unep, que, praticamente, só se ocupa dos danos ao
meio ambiente e da repercussão do aquecimento do clima sobre a
diversidade biológica da Somália. Mas o que vai acontecer com as
pessoas, que são vítimas de uma atividade comercial sem escrúpulos,
orientada exclusivamente para o lucro? Sobre isso nada fala o informe do
Unep. Nada fala em absoluto sobre uma condenação dos instigadores que,
sem o menor escrúpulo, sacrificam seres humanos e estão empenhados em
converter hoje um país, e amanhã talvez todo um continente, em um
depósito de resíduos radioativos. Mas o que será feito se o preço para
armazenar os resíduos tóxicos custa US$250 a tonelada na Europa,
enquanto que na África paga-se somente US$2,5 pela mesma quantidade?
Sob esta pressão achava-se também o Unep – Johannes e Germana von
Dohnany afirmam em seu livro Schmutzige Geschäfte und Heiliger Krieg.
Al-Qaida in Europa (“Os negócios sujos e a guerra santa da Al Qaeda na
Europa”), publicado em 2002, que o Unep depende dos meios financeiros
que proporcionam cada dois anos os Estados membros. Por isso, segundo
eles, seria demasiado arriscado se enfrentar abertamente os países
industriais que são seus principais financiadores. É difícil questionar
esta afirmação.
Não há dúvidas de que o Unep modificou sua atitude sobre o
armazenamento ilegal de resíduos nucleares depois do tsunami do dia 26
de dezembro de 2006, no sentido de seu informe indicar com maior clareza
do que antes a ameaça ao equilíbrio ecológico e o perigo para os seres
humanos do armazenamento descontrolado de lixo atômico. Mais
precisamente, o informe do Unep se ocupa de maneira detalhada de
diversos aspectos dos efeitos, especialmente dos resíduos lavados em
terra, nos manguezais da costa, os recifes de corais, a pesca e a água
subterrânea. No entanto, os danos sofridos já pelos seres humanos,
alguns já mortos, apenas são mencionados.
O silêncio do PNUMA
O PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) modificou
um pouco sua atitude sobre o armazenamento ilegal de resíduos nucleares
após o tsunami de dezembro de 2004. Seu informe indicou com maior
clareza a ameaça ao equilíbrio ecológico e o perigo para os seres
humanos do armazenamento de lixo atômico. Ele enfoca diversos aspectos
dos efeitos, especialmente os resíduos lavados em terra, os manguezais
da costa, os recifes de coral, a pesca e as camadas de água. Mas os
danos sofridos pelos seres humanos, alguns já mortos, apenas são
mencionados.
E seus autores se queixam de que não lhes foi possível investigar in loco.
Indiretamente, esta é uma justificativa para as inócuas conclusões do
informe que, praticamente, só se ocupa dos danos ao ambiente e a
repercussão do aquecimento do clima sobre a diversidade biológica
somali.
Mas o que vai acontecer com as pessoas, que são as vítimas de uma
atividade comercial sem escrúpulos, orientada exclusivamente para o
lucro, disso, nada fala o informe.
Fonte: CORREIO DO BRASIL
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