Agravo de Instrumento n. 2011.059542-4, de São José
Relator: Des. Luiz Cézar Medeiros
ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – PLEITO DE INDISPONIBILIDADE DE BENS
1 O provimento cautelar para determinar a indisponibilidade de bens, nos termos do art. 7º, parágrafo único da Lei n. 8.429/92, reclama indícios com carga de um mínimo de verossimilhança acerca da responsabilidade do agente a quem se imputa a prática de ato ímprobo, notadamente nas condutas que acarretem dano aos Cofres Públicos. Enquanto não verificado se o patrimônio do réu é suficiente para garantir o ressarcimento ao erário, inevitável que a medida assecuratória incida sobre a totalidade de seus bens.
O requisito do periculum in mora deriva diretamente do comando legal, cujo escopo é a garantia do integral ressarcimento do dano.
2 Satisfeitos os requisitos legais autorizadores da tutela de urgência, é admissível e recomendável o deferimento de medida liminar inaudita altera pars para a decretação de indisponibilidade e sequestro de bens com a finalidade de assegurar o resultado útil do processo, em especial o ressarcimento do eventual prejuízo causado ao Erário.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2011.059542-4, da comarca de São José (Vara da Fazenda Pública), em que é agravante Fernando Melquíades Elias, e agravado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:
A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar provimento parcial ao recurso. Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, realizado no dia 28 de fevereiro de 2012, os Excelentíssimos Senhores Desembargador Luiz Cézar Medeiros, Desembargador Pedro Manoel Abreu e Desembargador Carlos Adilson Silva.
Florianópolis, 29 de fevereiro de 2012.
Luiz Cézar Medeiros
Presidente e relator
RELATÓRIO
Fernando Melquíades Elias opôs agravo de instrumento em face da decisão proferida nos autos da Ação Civil Pública n. 064.09.029919-5 que "deferiu a liminar postulada e decretou a indisponibilidade dos bens integrantes do patrimônio do requerido e o bloqueio das suas contas bancárias e aplicações financeiras, ressalvados os proventos mensais percebido pelo mesmo, até o valor de R$ 297.000,00 (duzentos e noventa e sete mil reais)" (fl. 63).
Aduziu que não estariam demonstrados os requisitos necessários para a concessão da liminar de indisponibilidade de bens do agravante, bem como ela só poderia ser apreciada após a oportunização do contraditório.
Acrescentou que "não houve a subtração indevida de valores dos cofres públicos, pois foi efetivamente fornecido material da melhor qualidade ao Município, que após cinco anos de uso pesado e contínuo ainda se encontra em uso pela nova administração e em boas condições, assim não sendo aplicável sua condenação à reparação de valores que jamais subtraiu; porque quanto ao pequeno percentual de cadeiras que não teriam sido fornecidas, não cabe ao Prefeito penalização pois essa informação jamais foi veiculada no processo administrativo de aquisição, de modo que jamais tomou legalmente conta dessa notícia até que fosse dada a ordem de pagamento" (fls. 14-15).
Disse ainda: "o Administrador jamais ficou com qualquer equipamento ou valor para si, sendo que o material excedente e que não se encontra no Multi-Uso na realidade encontra-se instalado no Ginásio do Forquilhão, que é um Colégio da Rede Municipal, conforme foto (cartão) em anexo" (fl. 15).
Arguiu ser "ilegal a restrição da conta-salário e dos bens de família através de decisão judicial, quer em caráter liminar, como já defendido, quer em caráter definitivo" (fl. 31).
Afirmou que devem ser chamados ao processo todos os envolvidos no fato analisado, como o Secretário interino da Seplan, que requereu a compra das cadeiras na época (fl. 110), a Secretária de Administração juntamente com a comissão de licitação, que processaram, participaram do processo e receberam as mercadorias (fl. 36).
Argumentou que "somente uma cópia de uma nota fiscal do mesmo produto (ou mais similar possível), recente e de preferência com venda a ente público, comprovaria essas alegações de superfaturamento em relação ao preço do mercado praticado" (fl. 48).
Referiu que "às fls. 498 e 499 [...] (também fls. 6 e 7 do relatório final) o Tribunal de Contas do Estado ainda em primeira instância reconheceu que não houve qualquer irregularidade nos detalhes técnicos da cadeira ou no material entregue pelo fornecedor vencedor do certame" (fl. 53).
Disse ainda: "às fls. 503 deste mesmo processo (fls. 11 da decisão do Tribunal de Contas) o Agravante acabou condenado apenas no tocante à falta de algumas cadeiras. Entretanto, o Engenheiro Gonçalo reconheceu (conforme reconhece também o Tribunal de Contas às fls. 500, ou fls. 8 da decisão) que recebeu todas as cadeiras em nome da Prefeitura, e como o processo correu a revelia do Agravante, o mesmo acabou não informando que as cadeiras foram instaladas no Colégio Municipal Forquilhão (conforme comprovam as fotos em anexo), onde a diferença nas cadeiras naquele local (pois as que sobraram do multiuso não foram suficientes para o grande local) foi posteriormente adquirida" (fl. 53).
Requereu, ao final, "a cassação da liminar concedida no juízo a quo; a intimação dos responsáveis diretos pela licitação, assim como da empresa vencedora, e que também foram alvo do processo do Tribunal de Contas que segue em anexo, já que a decisão atacada não deferiu esse pedido feito na manifestação inicial; alternativamente, se mantida a liminar, que se considere a mais recente decisão do Tribunal de Contas do Estado [...] onde se verificou ao final que não houve qualquer irregularidade na licitação, a não ser a falta de 143 cadeiras que não foram instaladas no Multiuso, no valor total de R$ 12.870,00, cuja decisão se encontra em grau de Recurso perante o Pleno (fls. 503 do Relatório do Tribunal de Contas), [...] as quais se encontram no Colégio Forquilhão, conforme faz prova com as fotografias anexas e que se encontram até hoje no local; caso não seja a liminar cassada totalmente, seja deferido além do direito de ter liberados ao menos os bens de família, para que possa efetivar o seu divórcio que já se arrasta desde quando se separou de fato em 2007" (fls. 57 e 58).
O efeito suspensivo postulado foi negado às fls. 67-75 pelo eminente Desembargador Domingos Paludo.
O Ministério Público, em contraminuta, pugnou pela manutenção da decisão, uma vez que "a referida providência acauteladora é a única que tornará mais efetiva a recomposição pecuniária dos prejuízos impostos à sociedade e ao patrimônio público, sobre os quais a prova documental carreada aos autos, em especial o parecer final do Tribunal de Contas, o qual evidencia o direcionamento da licitação à empresa Kango Brasil Ltda., reunindo força suficiente para justificar a manutenção da cautelar já concedida" (fl. 82).
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Doutor Durval da Silva Amorim, opinou pelo conhecimento e não provimento do agravo de instrumento, mantendo-se a decisão agravada que determinou a indisponibilidade dos bens do agravante.
VOTO
1 Trata a lide principal de "ação civil pública por ato de improbidade administrativa com pedido liminar" ajuizada pelo Ministério Público contra Fernando Melquíades Elias, na qual foi requerida "a indisponibilidade dos bens sobre o valor de R$ 594.000,00, referentes aos danos efetivamente causados ao Município de São José (cujo valor apurado foi de R$ 297.000,00 e, ainda, R$ 297.000,00, no que se refere ao dano moral coletivo" (fl. 17 dos autos principais - anexo).
O montante de R$ 297.000,00 equivale ao valor do contrato entabulado com a empresa vencedora do Pregão para o fornecimento das 3.300 cadeiras fl. 93 (167) dos autos principais (anexo).
O pedido inicial está fundado no Processo TCE-06/00024091 que tramita no Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina. A seguir, excertos do referido procedimento:
"Tratam os autos de Tomada de Contas Especial, referente a supostas irregularidades na realização das despesas decorrentes da Licitação – modalidade Pregão Presencial n. 026/2006, da Prefeitura Municipal de São José, tendo como objeto a aquisição e instalação de cadeiras numeradas e individuais para o Ginásio Multiuso de São José.
"Através dos Ofícios ns. 3.384/10, 3.385/10, 3.386/10 e 3.387/10 foram feitas as citações respectivamente dos Srs. Andrey Vicente da Luz, Fernando Melquíades Elias, Gonçalo Nuno Mendes Teixeira da Silva e Mario Celso Keinert Petraglia, representante da Kango Brasil Equipamentos Esportivos Ltda.
"[...] O Sr. Fernando Melquíades Elias, ex-prefeito Municipal de São José não se manifestou. Portanto, mantém-se a restrição.
"[...] 3. CONCLUSÃO
"[...] Considerando que os responsáveis foram devidamente citados, inclusive por Edital, no caso do Sr. Fernando Melquíades Elias – ex-Prefeito Municipal de São José;
"Diante do exposto, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações sugere ao Exmo. Sr. Relator:
"[...] 3.2. Condenar solidariamente, os Srs. Fernando Melquíades Elias, ex-Prefeito Municipal de São José e Gonçalo Nuno Mendes Teixeira da Silva, engenheiro que atestou o recebimento das cadeiras, ao pagamento da quantia de R$ 12.870,00 em razão do pagamento de 143 cadeiras que não foram instaladas [...].
"3.3 Aplicar multa ao Sr. Fernando Melquíades Elias, ex-Prefeito Municipal de São José, [...], em face do direcionamento verificado na licitação, pois as especificações do objeto licitado apresentaram exatamente as mesmas características e definições do produto da empresa vencedora da licitação, restringindo a participação de outras empresas (item 2.1.3 do presente Relatório e item 2.2 do Relatório DLC/INSP 1/023/09), [...] [grifou-se] (fls. 493, 494, 497, 502 e 503 dos autos no TCE).
O Tribunal Pleno do Tribunal de Contas Estadual na Decisão n. 810/2010, de 29.3.2010, determinou a citação dos responsáveis para se defenderem quanto à irregularidade concernente ao "direcionamento da licitação, em razão das especificações do objeto licitado apresentar as mesmas características e definições do produto da empresa vencedora da licitação (Kango do Brasil Ltda.), única participante do certame, afastando possíveis empresas interessadas com produtos similares, em afronta aos princípios da legalidade, da competitividade, da proposta mais vantajosa para a Administração e da impessoalidade [...]" (fls. 493 e 494 do processo administrativo do TCE – anexo).
A Diretoria de Controle de Licitações e Contratações do Órgão Fiscalizador Estadual, a pedido do Ministério Público, explicou às fls. 189-195 do processo administrativo do TCE/SC (anexo), que as demais empresas que também utilizam a tecnologia de injeção plástica não atenderiam todas as características solicitadas no Edital, motivo pelo qual opinou no sentido de que "alguns aspectos das especificações do objeto poderiam ser mais abrangentes, evitando o direcionamento da licitação, sem, contudo, deixar de atender o interesse público" (fl. 190).
Argumentou o agravante:
"O Exmo. Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Comarca de São José proferiu decisão interlocutória nos autos, que é temerária, pois toma por base o valor total da licitação e não o valor da diferença entre o primeiro e o segundo colocado, isto sem levar em consideração, que a licitação foi correta e que a cadeira do segundo colocado era bem inferior, não atendendo às exigências do Corpo de Bombeiros e principalmente pela vencedora, ao contrário da perdedora, ter uma cadeira injetada, com os parafusos injetados junto, o que impossibilita a retirada de parafusos, sem a retirada da cadeira, enquanto a 2ª colocada tem suas cadeiras realizada em tecnologia ultrapassada pelo método da 'Rotormoldagem' e como tal não possui qualidade, durabilidade, acabamento e garantias comparáveis" (fl. 4).
Juntou também fotografias no ("Doc. 07" – anexo), demonstrando onde teriam sido instaladas as cadeiras faltantes – no Ginásio do Forquilhão.
2 A decisão que decretou a indisponibilidade dos bens do recorrente fundou-se nos seguintes aspectos:
"A pretensão do Requerente, pelo contido no processo de representação RPL 06/00024091 do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina que acompanha a inicial, se apresenta plausível, porquanto prima facie, relata irregularidades ocorridas no processo licitatório na modalidade de pregão presencial sob o número 026/2006, para a contratação de empresa para fornecimento e instalação de cadeiras numeradas e individuais para o futuro ginásio do Centro Multiuso de São José (SC) no mês janeiro de 2006, no exercício do mandato do Réu como prefeito do Município de São José, o que lhe assegura um possível provimento de mérito favorável, razão pela qual se impõe reconhecer a presença do fumus boni iuris, em grau suficiente para autorizar a tutela cautelar requerida.
"Por outro lado, é forçoso reconhecer também a existência de fundado receio de desaparecimento ou desvio de bens, porquanto o agente público que pratica atos de improbidade tem contra si presunção de que procurará se furtar aos efeitos da condenação, desviando ou dilapidando o seu patrimônio. Ademais, a demora natural do julgamento definitivo da lide que decorre da sua complexidade, da necessidade da produção de provas, além de outras diligências, torna imperiosa a indisponibilização dos bens do Réu, a fim de que, caso seja julgada procedente a presente Ação Civil Pública, haja recursos suficientes para ressarcir os danos causados ao erário" (fls. 62 e 63).
3 Considerando que em sede de agravo de instrumento só se discute o acerto ou desacerto do ato judicial hostilizado, passa-se a analisar se presentes os requisitos autorizadores da medida ora impugnada.
A possibilidade de indisponibilidade dos bens em razão de suposto ato de improbidade administrativa está prevista no § 4º do art. 37 da Constituição Federal de 1988, assim redigido:
"Art. 37. [...]
"§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível" (sem grifo no original).
De igual modo, o art. 7º, e seu parágrafo único, da Lei de Improbidade Administrativa – Lei Federal n. 8.429/92, estabelece o seguinte:
"Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.
"Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito." (sem grifo no original).
Sobre a possibilidade de decretação da indisponibilidade de bens daqueles que auferiram vantagem com o ato ímprobo, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu:
"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MEDIDA CAUTELAR. INDISPONIBILIDADE E SEQÜESTRO DE BENS. REQUERIMENTO NA INICIAL DA AÇÃO PRINCIPAL. DEFERIMENTO DE LIMINAR INAUDITA ALTERA PARS ANTES DA NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. POSSIBILIDADE. ARTS. 7º E 16 DA LEI 8429/92. AFASTAMENTO DO CARGO. DANO À INSTRUÇÃO PROCESSUAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 20 DA LEI 8.429/92. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA.
"1.É licita a concessão de liminar inaudita altera pars (art. 804 do CPC) em sede de medida cautelar preparatória ou incidental, antes do recebimento da Ação Civil Pública, para a decretação de indisponibilidade (art. 7º, da Lei 8429/92) e de seqüestro de bens, incluído o bloqueio de ativos do agente público ou de terceiro beneficiado pelo ato de improbidade (art. 16 da Lei 8.429/92), porquanto medidas assecuratórias do resultado útil da tutela jurisdicional, qual seja, reparação do dano ao erário ou de restituição de bens e valores havidos ilicitamente por ato de improbidade. Precedentes do STJ: REsp 821.720/DF, DJ 30.11.2007; REsp 206222/SP, DJ 13.02.2006 e REsp 293797/AC, DJ 11.06.2001.
"2. Os arts 7º e 16, §§ 1º e 2º, da Lei 8.429/92, que tratam da indisponibilidade e do seqüestro de bens, dispõem: Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito. [...]" (REsp 929483 / BA, Min. Luiz Fux, julgado em 2/12/2008). [sem grifo no original].
“Consoante o disposto no art. 7º da Lei n. 8.429/92, a indisponibilidade incidirá sobre tantos bens quantos forem necessários ao ressarcimento do dano ou acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito, podendo recair sobre quaisquer bens do agente acusado, independentemente de terem sido adquiridos antes ou depois do ato supostamente ímprobo. Precedentes: AgRg na MC n. 11.139/SP, Francisco Falcão, DJ de 27/03/2006 e REsp n. 401.536/MG, Rela. Min. Denise Arruda, DJ de 06/02/2006” (REsp n. 781431/BA, Min. Francisco Falcão) [sem grifo no original].
"AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DECRETAÇÃO DA INDISPONIBILIDADE DOS BENS - REQUISITOS - PERICULUM IN MORA E FUMUS BONI IURIS - MATÉRIA DE PROVA - INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO 7 DA SÚMULA DESTE TRIBUNAL - FALTA DE COTEJO.
Quanto à decretação da indisponibilidade dos bens presença dos requisitos autorizativos da concessão da cautelar, vê-se que o Tribunal apreciou a causa, com fundamento nas provas ali existentes. Vejam-se trechos do decisum que corroboram esta assertiva (fl. 114): '...os argumentos e provas indicados na inicial, dão conta da participação da agravante como beneficiária de atos de improbidade administrativa, praticados por seu pai (primeiro réu da ação) consistente no desvio de verbas públicas.' Mais adiante, ainda, afirma o acórdão que 'este requisito se faz presente na indicação de que a agravante, embora não tenha cometido pessoalmente os atos de improbidade, teria auferido ilegais benefícios, recebendo imóveis, sem ter renda suficiente para as aquisições' (fl. 114). Por fim assevera o acórdão que 'no caso presente, existe o receio justificado de que tal conduta se realize, como já vem ocorrendo com a venda de vários imóveis, de modo que a indisponibilidade é medida acautelatória devida.' (fl. 117)" (AgRg no Ag 685351 / PR, Min. Humberto Martins) [sem grifo no original].
Apesar de a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, escudada na Súmula n. 7 daquela Alta Corte, não apreciar especificamente o preenchimento dos requisitos necessários para a decretação de indisponibilidade de bens em ação de improbidade administrativa em sede de Recurso Especial, a Segunda Turma, em recentes julgados, posicionou-se no sentido de ser desnecessária a verificação efetiva do ato de dilapidação patrimonial para embasar a medida de indisponibilidade do patrimônio dos réus. Veja-se:
"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º DA LEI 8.429/1992. VIOLAÇÃO CONFIGURADA. ACÓRDÃO ASSENTADO EM FUNDAMENTO JURÍDICO EQUIVOCADO. AFASTAMENTO CAUTELAR DO CARGO. SÚMULA 7/STJ.
"1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública ajuizada contra Deputados Estaduais e servidores da Assembléia Legislativa de Mato Grosso, aos quais são imputados atos de improbidade administrativa por fraude a licitação, além de desvio e apropriação indevida de recursos públicos por emissão e pagamento de cheques para empresas inexistentes e irregulares.
"2. No Agravo de Instrumento, ficou registrado que estão em curso mais de sessenta Ações Civis Públicas contra os ora recorridos por supostos atos reiterados de improbidade administrativa, que no total ultrapassam a vultosa quantia de R$ 97.000.000,00 (noventa e sete milhões de reais) – o caso dos autos envolve dano de R$ 3.028.426,63 (três milhões, vinte e oito mil, quatrocentos e vinte e seis reais e sessenta e três centavos) decorrentes de pagamentos feitos à empresa Comercial Celeste de Papéis e Serviços Ltda.
"3. A instância ordinária indeferiu o pedido de decretação de indisponibilidade dos bens, ao fundamento de que o Parquet não os individualizou nem comprovou a existência de atos concretos de dilapidação patrimonial pelos réus.
"4. Cabe reconhecer a violação do art. 7º da Lei 8.429/1992 in casu, tendo em vista o fundamento jurídico equivocado do acórdão recorrido.
"5. A decretação da indisponibilidade, que não se confunde com o seqüestro, prescinde de individualização dos bens pelo Parquet. A exegese do art. 7º da Lei 8.429/1992, conferida pela jurisprudência do STJ, é de que a indisponibilidade pode alcançar tantos bens quantos forem necessários a garantir as conseqüências financeiras da prática de improbidade, mesmo os adquiridos anteriormente à conduta ilícita.
"6. Desarrazoado aguardar a realização de atos concretos tendentes à dilapidação do patrimônio, sob pena de esvaziar o escopo da medida. Precedentes do STJ.
"7. Admite-se a indisponibilidade dos bens em caso de forte prova indiciária de responsabilidade dos réus na consecução do ato ímprobo que cause enriquecimento ilícito ou dano ao Erário, estando o periculum in mora implícito no próprio comando legal. Precedentes do STJ.
"8. Hipótese em que, considerando a natureza gravíssima dos atos de improbidade administrativa imputados aos réus e os elevados valores financeiros envolvidos, a indisponibilidade dos bens deve ser declarada de imediato pelo STJ.
"9. O art. 20, parágrafo único, da Lei 8.429/1992 prevê a viabilidade de afastamento cautelar do cargo, emprego ou função, quando a medida se fizer necessária à instrução processual. A alteração do entendimento do Tribunal a quo, de que não ficou demonstrada tal necessidade, demanda reexame dos elementos fático-probatórios dos autos, o que esbarra no óbice da Súmula 7/STJ.
"10. Friso que a impossibilidade da conclusão lançada no acórdão recorrido não proíbe que o pedido de afastamento seja eventualmente renovado nos autos com base em novos elementos que comprovem o cabimento da medida.
"11. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido para determinar a indisponibilidade dos bens dos recorridos" [grifou-se] (REsp n. 1177290, Segunda Turma, Min. Herman Benjamin, j. 22.6.2010).
"ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – INDISPONIBILIDADE DE BENS – ART. 7º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.429/1992 – REQUISITOS PARA CONCESSÃO – LIMINAR INAUDITA ALTERA PARS – POSSIBILIDADE.
"1. O provimento cautelar para indisponibilidade de bens, de que trata o art. 7º, parágrafo único da Lei 8.429/1992, exige fortes indícios de responsabilidade do agente na consecução do ato ímprobo, em especial nas condutas que causem dano material ao Erário.
"2. O requisito cautelar do periculum in mora está implícito no próprio comando legal, que prevê a medida de bloqueio de bens, uma vez que visa a 'assegurar o integral ressarcimento do dano'.
"3. A demonstração, em tese, do dano ao Erário e/ou do enriquecimento ilícito do agente, caracteriza o fumus boni iuris.
"4. É admissível a concessão de liminar inaudita altera pars para a decretação de indisponibilidade e seqüestro de bens, visando assegurar o resultado útil da tutela jurisdicional, qual seja, o ressarcimento ao Erário. Precedentes do STJ.
"5. Recurso especial não provido" (REsp n. 1135548, Segunda Turma, Min. Eliana Calmon, j. 15.6.2010).
Quanto à presença dos requisitos autorizadores da medida, reproduzo os bem lançados argumentos do Desembargador Domingos Paludo, proferidos quando da análise do pedido de concessão do efeito suspensivo à decisão ora impugnada, que exauriu a matéria e deu o equacionamento que melhor se coaduna com os preceitos legais aplicáveis à espécie e que se harmonizam perfeitamente com o entendimento abalizado pela melhor doutrina e pela jurisprudência desta augusta Casa de Justiça. Por estas razões, como substrato de meu convencimento, adoto os fundamentos consignados por Sua Excelência:
"Trata-se de agravo de instrumento que objetiva a integral suspensão da decisão que decretou a indisponibilidade de bens dos demandados.
"A alegação de que o denunciante é suspeito para a realização da denúncia não é válida, uma vez que, conquanto seja Deputado Federal pelo Partido dos Trabalhadores - logo, opositor do agravante -, não há qualquer normativo que impeça a formulação de denúncias pelo simples fatos de denunciante e denunciado serem "políticos".
"O fato de a Promotora de Justiça, subscritora da ação civil pública originária, exercer o cargo de Secretária Adjunta de Justiça e Cidadania, de índole política, não a incompatibiliza para tais funções, nem invalida a ação.
"O fato de o agravante tentar qualificar a referida profissional como pessoa de 'comportamento difícil e instável' (fl. 14), não macula os procedimentos legais que contra si foram movimentados.
"O objetivo maior do Direito Público, que há de nortear fundamentalmente a hermenêutica dos seus importantes institutos, organizadores da atuação estatal, é a satisfação do interesse coletivo.
"A execução dos serviços públicos deve sempre estar de par com os princípios da eficiência, legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.
"Os inquéritos civis e as ações judiciais movidas pelo Ministério Público devem ser revestidos de isenção partidária, pena de desmerecer importantes institutos, de salvaguarda da sociedade, na fiscalização e proteção dos bens públicos coletivos materiais - a violação do erário e dos princípios da Administração Pública é pecado capital - e morais da sociedade civil organizada.
"O Estado Democrático de Direito exige o atendimento a todas as garantias sociais e individuais constitucionalmente estabelecidas, e para tanto se exige o exemplar combate a condutas como essas denunciadas na exordial e costumeiramente noticiadas nos meios de comunicação, pois atingem as propriedades sacrossantas da sociedade, que arca silente com sua responsabilidade social tributária em prol da manutenção do sistema político administrativo.
"Aqueles cidadãos que se dispõem a obrar perante à Administração Pública, devem ter bem esclarecidos seus deveres perante à sociedade - tais geram ônus dos quais não podem se furtar, como a possibilidade de responder em juízo por atos como os noticiados na inicial originária -, não podendo, em momento algum, sobrepor direitos individuais em detrimento das garantias sociais. Daí, por corolário, a possibilidade de indisponibilidade dos bens em caso de improbidade administrativa, assim assegurada em nossa Carta Magna:
" 'Art. 37 [...]
" '[...]
" '§ 4 º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
"A medida, portanto, é viável sempre que presentes os requisitos legais autorizadores da indisponibilidade, como na espécie.
"Não passa despercebido o entendimento de que, inexistindo a notificação prévia dos demandados, o pedido de indisponibilidade de bens não poderá, em absoluto - pelo menos essa é a impressão que se denota acórdãos dos AI's 2008.055223-5 e 2009.003031-6 -, ser deferido.
"A ementa dos referidos julgados, assim ficou:
" 'AÇÃO POPULAR. MEDIDA LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS. PRESSUPOSTOS LEGAIS IMPRESENTES. RECURSO PROVIDO.
" 'O só fato do ajuizamento de ação popular ou de ação civil pública não legitima o deferimento da medida liminar de indisponibilidade de bens; será preciso, a par da existência de dano ao Erário Público, haver alguma indicação objetiva - e não mera presunção - de que o réu poderá dilapidar ou desviar o seu patrimônio para escapar de eventual futura responsabilização' (Agravo de Instrumento nº 2008.006680-6). (AI 2009.003031-6, Des. Newton Janke, de 29.06.2010).
" 'AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – DEFERIMENTO LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS, ANTES MESMO DO RECEBIMENTO DA INICIAL – NECESSIDADE DE OPORTUNIZAÇÃO PRÉVIA DE APRESENTAÇÃO DE DEFESA PRELIMINAR – EXEGESE DO ART. 17, § 7°, DA LEI N. 8.429/92 – REVOGAÇÃO QUE SE IMPÕE – RECURSO PROVIDO.
" 'O processo judicial destinado a apurar a prática de ato de improbidade administrativa, a despeito de seu rito ordinário, impende da manifestação do requerido antes do recebimento da petição inicial, sob pena de nulidade (Agravo de Instrumento n. 2008.013635-4, de Joaçaba, Rel.: Des. Jânio de Souza Machado, j. 12/09/08)'. (AI 2008.055223-5, Des. José Volpato de Souza, de 18/06/2009).
"Divergimos do entendimento, porque na linha do garantismo - e de resto, garantia por garantia, em face da índole protetiva do erário público da lei em comento, por opção legislativa que não é dado ao intérprete inverter sem incorrer em interpretação contra legem, ainda que a pretexto de garantir outro bem, de menor vulto -, marcha francamente a impunidade dos atos ímprobos nas searas da Administração Pública, cujo combate é fim precípuo da legislação de regência.
"É que, não raro, a indisponibilidade somente terá fim prático justo na sua concreção antes de oportunizar malabarismos oportunos e presumíveis, a quem malbarata os recursos sacrossantos a todos pertencentes.
"Vejamos, neste passo, o entendimento hodierno preponderante no STJ:
" 'PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. AQUISIÇÃO ANTERIOR AO ATO ÍMPROBO. POSSIBILIDADE. DEFERIMENTO DE LIMINAR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. SÚMULA 07/STJ. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, CPC. NÃO CONFIGURADA
" '1. A concessão de liminar inaudita altera pars (art. 804 do CPC) em sede de medida cautelar preparatória ou incidental, antes do recebimento da Ação Civil Pública, para a decretação de indisponibilidade (art. 7º, da Lei 8429/92) e de seqüestro de bens, incluído o bloqueio de ativos do agente público ou de terceiro beneficiado pelo ato de improbidade (art. 16 da Lei 8.429/92), é lícita, porquanto medidas assecuratórias do resultado útil da tutela jurisdicional, qual seja, reparação do dano ao erário ou de restituição de bens e valores havidos ilicitamente por ato de improbidade, o que corrobora o fumus boni juris. Precedentes do STJ: REsp 821.720/DF, DJ 30.11.2007; REsp 206222/SP, DJ 13.02.2006 e REsp 293797/AC, DJ 11.06.2001.
" '2. A decretação de indisponibilidade dos bens, em decorrência da apuração de atos de improbidade administrativa, mercê do caráter assecuratório da medida, pode recair sobre os bens necessários ao ressarcimento integral do dano, ainda que adquiridos anteriormente ao suposto ato de improbidade. Precedentes do STJ: AgRg no Ag 1144682/SP, PRIMEIRA TURMA, DJe 06/11/2009; REsp 1003148/RN, PRIMEIRA TURMA, DJe 05/08/2009; REsp 535.967/RS, SEGUNDA TURMA, DJe 04/06/2009; Resp 806301/PR, PRIMEIRA TURMA, DJe 03/03/2008. [...] (REsp 1078640, Min. Luiz Fux, DJe 23/03/2010).
"Como se verifica do julgado acima citado, perfeitamente viável e razoável a indisponibilização dos bens dos demandados na ação civil pública originária, mesmo que ainda em modo cautelar inaudida altera pars, uma vez que tal ato processual visa assegurar o resultado útil da demanda: a reparação do dano ao erário ou a restituição de bens e valores havidos ilicitamente por ato de improbidade.
"O art. 7º da Lei 8429/92, prevê expressamente a possibilidade de indisponibilizar os bens dos agentes políticos - inclusive, a medida liminar está fulcrada na imperatividade dos princípios constitucionais administrativos discriminados no art. 37, caput, da CF/88 -, ou terceiros envolvidos, ante indícios de responsabilidade por atos ímprobos (art. 37, § 4º, da CF/88) - lesão ao patrimônio público ou enriquecimento ilícito decorrente -, no caso de ineficácia da medida se concedida ao final.
"Já sobre os requisitos da medida, é da jurisprudência do STJ:
" 'A medida prevista no art. 7º da Lei n. 8.429/92 é atinente ao poder geral de cautela do juiz, prevista no art. 798 do Código de Processo Civil, pelo que seu deferimento exige a presença dos requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora (REsp 731109, Min. João Otávio de Noronha, DJU 20.03.2006).
E, do e. TJSC:
" 'ADMINISTRATIVO – AÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – PLEITO DE INDISPONIBILIDADE DE BENS – APARENTE ILEGALIDADE E LESÃO AOS COFRES PÚBLICOS – FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA COMPROVADOS
" 'Os arts. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, e 7º, parágrafo único, da Lei Federal n. 8.429/92, autorizam, ante a existência de indícios de improbidade administrativa, que se tornem indisponíveis os bens dos agentes que cometeram o ato, bem como daqueles que foram beneficiados com a prática, tantos quantos sejam suficientes para assegurar a reparação integral do dano causado ao erário, exsurgindo daí o fumus boni juris.
" 'O periculum in mora, por sua vez, "repousa no dano em potencial que decorre da demora natural no trâmite das ações principais, de modo que, se não seqüestrados os bens, o agravante poderia deles se desfazer, tornando-se ineficazes os pedidos nas ações civis públicas” (AI n. 2000.005398-8, Des. Anselmo Cerello). (AI 2008.027159-3, Des. Luiz Cézar Medeiros, de 27/05/2009).
"A judicial indisponibilidade dos bens, então, condiciona-se à simultânea existência dos requisitos do fumus boni juris - plausibilidade do direito invocado - e do periculum in mora - possibilidade de lesão grave e de difícil reparação se a medida não for concedida de imediato.
"Presentes os requisitos necessários, não haverá qualquer empecilho à decretação da liminar indisponibilidade, como sói ocorrer a todas as medidas protetivas de direitos em geral, afigurando-se injustificável que onde é mais odiento o ato, não disponha o sistema jurídico pátrio, justo aí em que mais sagrados são os recursos porque a todos pertencentes, de meios de pronta atuação judicial, como os há para evitar desfalques na esfera privada do cidadão.
"Seguindo no que tange à relevância do fundamento, e alterando o que merece ser alterado, é a decisão de nosso Tribunal:
“ 'É altamente questionável a validade do ato de contratação de escritório de advocacia, sem procedimento licitatório, para a apuração e cobrança de créditos tributários, ainda mais quando o Município contratante conta com quadro jurídico próprio.
“ 'Em tal contexto, longe de merecer crítica ou reforma, deve ser louvada a concessão de medida cautelar que suspende os efeitos do contrato, proíbe novos pagamentos e indisponibiliza bens dos réus para garantir o eventual ressarcimento do dano traduzido por elevado montante já apropriado pela parte contratada' (AI n. 2004.031195-0, de Itajaí, j. 28.7.2005). (AI 2004.033931-2, Des. Rui Fortes, de 24/04/2007).
"Na espécie, os requisitos para a indisponibilidade estão bem evidenciados, pois há fortes indícios de propagação de edital de licitação viciado por direcionamento do objeto objetivado a empresa determinada - a qual, coincidência ou não, foi a vencedora; somente a dilação probatória poderá afastar ou acolher a denúncia formulada na ação originária.
"Em análise perfunctória, não vislumbro acerto nas alegações da agravante, pois nada há de ilegal no deferimento da medida, vez que é obrigação do Poder Judiciário, quando instado, proteger os princípios constitucionais que regem a Administração.
"Já o periculum in mora exsurge da possibilidade de os demandados, diante do receio de uma provável condenação, praticarem condutas para dissipar seus bens, o que frustraria todos os objetivos da ação originária, coisa completamente inaceitável e que, pois, logicamente, ao ordenamento jurídico repugna.
"Sobre o dispositivo de indisponibilidade de bens, é a lição de Marino Pazzaglini Filho:
"Verifica-se, pois, que o dispositivo trata de típica providência cautelar assecuratória do resultado prático do futuro processo eventualmente a ser instaurado contra o agente público infrator. Visa, pois, assegurar bens destes para garantir a efetividade do provimento judicial futuro. E, consequentemente, ante a demora da tramitação processual, impedir o risco de dilapidação de seu patrimônio (periculum in mora) (Lei de Improbidade Administrativa Comentada, 2.ª ed., São Paulo, Ed. Atlas, p. 43, destaquei).
"Ainda, quanto à inexistência de periculum in mora decorrente da simples garantia de eficácia da condenação futura, pertinente o seguinte entendimento:
" 'O agente público ímprobo tem contra si presunção de que procurará se furtar aos efeitos da condenação, desviando ou dilapidando o seu patrimônio. "Por isso, a indisponibilidade de seus bens, tantos quantos bastem para assegurar a recomposição do dano causado ao erário, prescinde da demonstração do periculum in mora' (AI 2004.030936-4, Des. Newton Trisotto, de 12/04/2005; destaquei).
"A evidência da prática de atos ímprobos atrai para o agente, público ou não, a presunção de que buscará frustrar os efeitos da condenação, o que por si, entendo, caracteriza o periculum in mora.
"E, ainda:
"Havendo multiplicidade de réus, a responsabilidade deles é solidária, em ordem a que a indisponibilização dos seus bens não seja fracionada para adscrever-se a cotas proporcionais, dado que a insolvência de um ou mais dos corréus inviabilizaria o ressarcimento integral do prejuízo. É certo, então, que a solidariedade passiva defere ao credor a faculdade de exigir, de qualquer dos devedores, o cumprimento integral da obrigação, cuja satisfação, entrementes, não extingue os deveres dos co-obrigados, que podem ser alcançados por ação regressiva. (AI 2009.017727-4, Des. João Henrique Blasi, de 03/12/2010).
"A medida de indisponibilidade, diante deste contorno, denota grande relevância para a persecução dos fins almejados pela Lei de Improbidade e na ação civil pública originária, porquanto visa garantir a eficácia da imposição judicial em caso de futura decisão positiva.
"Já a questão da inexistência de atos ímprobos por parte do agravante diz diretamente com o mérito da ação de improbidade administrativa originária, razão pela qual não se pode, no campo perfunctório do agravo de instrumento, realizar uma análise abissal do mérito que sequer ainda foi aferido pelo Juízo originário ou aclarado pela produção de prova.
"Neste rumo, a solução da quaestio não prescinde da análise da veracidade dos fatos, documentos e provas a serem produzidas, bem como para se aferir se as condutas do agente político réu causaram ou não prejuízos ao erário, se configuraram ou não improbidade administrativa.
"Tais temas só poderão ser solucionados quando da análise do mérito da ação de improbidade, não havendo como tratá-los neste momento, uma vez que necessitam de dilação probatória.
"E o elemento subjetivo - dolo ou culpa -, não precisa ser necessariamente comprovado para o recebimento da ação de improbidade, a demonstração da existência de indícios de atos administrativos passíveis de terem causado lesão ao erário já é suficiente.
"Ante o exposto, nego o efeito suspensivo postulado" [grifou-se] (fls. 67-75).
Ademais, "cumpre ressaltar que diante da complexidade da demanda, que requer produção de provas, além de outras diligências discutidas nos autos próprios, deve-se manter a decisão de indisponibilidade de bens, a fim de que após grande transcurso de tempo, ao fim da demanda, caso seja julgada procedente a Ação Civil Pública, haja recursos suficientes para ressarcir o dano causado ao erário" (AI n. 2007.057889-6, Des. Cláudio Barreto Dutra).
4 Importa destacar, por fim, que não houve excesso do Magistrado a quo ao indisponibilizar todos os bens do agravante no processo de ação civil pública.
A Lei n. 8.429/1992 prevê que se o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, é possível pleitear a indisponibilidade dos bens dos indiciados. Determina também que a indisponibilidade "recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito" (art. 7º, parágrafo único).
O Meritíssimo Juiz decretou "a indisponibilidade dos bens integrantes do patrimônio do Requerido e o bloqueio das suas contas bancárias e aplicações financeiras, ressalvados os proventos mensais percebido pelo mesmo, até o valor de R$ 297.000,00 (duzentos e noventa e sete mil reais)" [grifou-se] (fl. 63).
Há de se esclarecer, porém, que, conforme decidido, a limitação em R$ 297.000,00 (duzentos e noventa e sete mil reais) refere-se à totalidade dos bens do agravante até alcançar o referido montante, sendo que os proventos mensais por ele percebidos estão liberados da restrição.
Nesses termos, inconteste que o valor definido no despacho ficou adstrito ao necessário para assegurar o integral ressarcimento do dano relatado na inicial, conforme previsto na norma citada. Apesar de várias empresas terem retirado o edital do certame (fls. 142-151 do segundo anexo), somente a vencedora compareceu ao pregão presencial (fls. 166), de modo que não há outra referência que o Julgador pudesse acatar se não o preço constante do contrato.
Não era possível ao Magistrado, também, no momento em que proferiu a decisão impugnada, ter conhecimento do patrimônio do réu, a fim de delimitar o que seria indisponibilizado.
No decorrer da instrução, por outro lado, se demonstrado que a garantia é desproporcional ao dano apurado, poder-se-á fazer o devido ajuste. Somente após a indisponibilização dos bens é que o Juiz terá dados suficientes para viabilizar a constrição somente dos que bastem para garantir o ressarcimento do dano decorrente do ato administrativo analisado na ação principal.
5 Ante o exposto, dou provimento parcial ao recurso tão somente para esclarecer que a indisponibilidade de bens do recorrente está limitada ao montante de R$ 297.000,00 (duzentos e noventa e sete mil reais) e que os proventos mensais por ele percebidos estão liberados da restrição.
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