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quinta-feira, 5 de agosto de 2010

A opinião de Scliar sobre a obra de Freire

05/08/2010 - 15h30

Em mesa da Flip, Moacyr Scliar critica antissemitismo em Freyre

FABIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A PARATY

Na primeira mesa de debates da Flip, hoje de manhã, o "gilbertófilo" Edson Nery da Fonseca foi aplaudido de pé pelo público ao recitar um poema de Gilberto Freyre, o homenageado desta oitava edição da festa.

Professor emérito da UnB (Universidade de Brasília) e um dos maiores conhecedores da vida e da obra do sociólogo pernambucano, Nery debateu com o escritor Moacyr Scliar e com o ohistoriador Ricardo Benzaquen o viés literário da produção de Freyre.

Scliar apontou o homenageado como um dos raros intelectuais a transitar com desenvoltura entre ciência e humanidades, mas logo desviou do tema para criticar declarações antissemitas de Freyre e a tendência do sociólogo a fazer generalizações.

Já Benzaquen ressaltou a riqueza do Freyre ensaísta. "Ao se filiar à tradição do ensaio, Freyre está chamando a atenção para a incompletude; parte do pressuposto de que as coisas têm de ser debatidas e não que têm de ter uma conclusão".

Nery foi mais fiel ao tema da mesa, batizada de "Ao Correr da Pena".

Disse que o estilo literário de Freyre tinha três características: imagismo (influenciado pela poeta americana Amy Lowell), enumeração caótica (tendo como inspirador o poeta americano Vachel Lindsay) e expressionismo.

Pôs-se então a ler o poema "Bahia de Todos os Santos e de Quase Todos os Pecados", escrito por Freyre em 1926 após sua primeira visita a Salvador.

Os versos exaltando a miscigenação e a diversidade cultural baiana e tom apaixonado da declamação de Nery seduziram a plateia da Tenda dos Autores, que levantou e gritou para aplaudi-lo.

Fonte: FOLHA DE SP

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Ainda sobre FREIRE e seu antissemitismo:

O anti-semitismo em Gilberto Freire
por Cláudio Salm

GILBERTO FREIRE freire34.jpg (7476 bytes)

Resumo
Ensaiando uma grande polêmica, este texto detalha o pensamento anti-semitista presente na obra do pensador de Apipucos, Gilberto Freire.

Eu nunca havia lido, antes, Casa Grande & Senzala, de Gilberto Freire. Mesmo dando o desconto da influência dos ventos do mundo da época em que foi escrito – início dos anos 30 - fiquei estarrecido com o racismo do autor da "obra mais importante da cultura brasileira", do " maior dos livros brasileiros", na apreciação de Darcy Ribeiro.

Achava que tinha aprendido com Hannah Arendt a distinguir entre o velho anti-judaísmo cristão e o moderno anti-semitismo, até que li Freire. Pensei, de início, em enquadrá-lo na primeira categoria que não sei porque me parece mais simpática que a segunda. Talvez seja porque não saiba de nenhum parente queimado vivo em autos-de-fé, enquanto tive muitos asfixiados em câmaras de gás. Acontece que não fica claro quando, em Casa Grande e Senzala, termina um tipo de preconceito e começa o outro.

Queria enxergar em Freire apenas a valorização da luta pela defesa da fé, algo que a mente humana pode até condenar, mas compreende, enquanto que atribuir a tão influente sociólogo brasileiro, a motivação irracional do anti-semitismo, seria doloroso demais para mim. Mas, deixando de lado os desejos, a verdade é que Freire fala dos judeus como um anti-semita qualquer.

Darcy Ribeiro, na magnífica introdução que fez ao clássico, denuncia o reacionarismo e os equívocos de Gilberto Freire no tratamento que dispensa a índios e negros. Seja quando fala mal do índio, de seu atraso, de sua indolência ("incapaz e molengo"), seja quando fala bem do negro por sua adaptabilidade ao trabalho na lavoura, decorrência de sua superioridade cultural diante do nosso índio ou mesmo diante do português colonizador. Mas, no caso do judeu, Darcy limita-se a registrar, sem maiores comentários, o tratamento "caricaturesco e impiedoso" dado por Gilberto Freire:

Técnicos da usura, tais se tornaram os judeus em quase toda parte por um excesso de especialização quase biológica (sic), que lhes aguçando o perfil de ave de rapina, a mímica em constantes gestos de aquisição e de posse, as mãos incapazes de semear e de criar. Capazes só de amealhar.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 290)

Não deixa de ser irônico que, junto com o estereótipo, com a visão preconceituosa do judeu "inimigo do trabalho manual", Gilberto Freire destaque em outro trecho a importância dos mecânicos judeus nos engenhos de açúcar do século XVI. O anti-judaismo cristão de Freire fica explícito quando ele tenta justificar a Inquisição, para a qual oferece a mais cândida (ou a mais sacana) das explicações. Segundo ele, o Tribunal do Santo Ofício teria sido criado ...

Para conter (sic) os ódios que se levantaram...contra a minoria israelita..., reunindo à função de examinar as consciências o poder de examinar (sic) a frio e metodicamente os bens acumulados por mãos de herege.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 272)

Se o papa tivesse lido Casa Grande e Senzala, não teria pedido perdão a Deus pelas crueldades cometidas em Seu nome.

Freire responsabiliza os judeus por praticamente tudo que possa haver de ruim no caráter do português, assim como tudo de ruim que teria acontecido a Portugal (enquanto que muitos dos aspectos positivos da cultura lusitana, dever-se-ia aos mouros).

Darcy Ribeiro sintetiza em apenas um parágrafo as malditas marcas judaicas no caráter do português:

Buscando identificar as influências sefarditas sobreviventes no caráter lusitano e no brasileiro, Gilberto encontra, como de hábito, muita novidade (ironia?). Deles nos viriam, por um lado, o horror ao trabalho manual e, por outro, nosso pendor ao bacharelismo, associado ao nosso fraco por títulos doutorais e docentes, assim como por tudo que simbolize sabedoria letrada, como os anéis de grau e os óculos. Os judeus seriam, também, muito dados a ter escravos para lhes fazer todo o trabalho; e concubinas, também escravas, para doces misteres".

(Darcy Ribeiro, Introdução a Casa Grande & Senzala, pg. 31)

Darcy apoia-se em trechos como o seguinte:

...o pendor português para viver de escravos parece (para ele, GF) ter contribuído o sefardim. Inimigo do trabalho manual, o judeu desde remotos tempos inclinou-se à escravidão. Diz Chamberlain que Isaías insinua a idéia de que os estrangeiros deveriam ser os lavradores e os vinhateiros dos hebreus. E o certo é que na Península muitos dos judeus mais longínquos de que se tem notícia foram donos de escravos cristãos e possuíram concubinas cristãs".

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 291)

Pena que Freire, já morto, não possa ler a obra monumental de Alberto da Costa e Silva, "A Manilha e o Libambo - A África e a escravidão de 1500 a 1700" (Editora Nova Fronteira – 2002), onde a importância do islã para o desenvolvimento do comércio de escravos negros é relatada minuciosamente.

É boa a síntese feita por Darcy, mas, ainda assim, um understatement, próprio de quem não é preconceituoso, mas que também não é vítima do preconceito. Freire trata o sefardita de forma muito mais "caricaturesca e impiedosa" do que Darcy deixa entrever. Passa pela cabeça de alguém que os judeus, em Portugal, buscavam o estudo para tornarem-se advogados ou médicos? Ledo engano. "Que encontrassem na advocacia, na medicina e no ensino superior a maneira ideal de se aristocratizarem" (CG&S, pg. 293). Cuidado ao pensar que os judeus abandonaram sua amada Sefarad apenas porque foram expulsos pelos reis católicos. Afinal, aprendemos no livro que os judeus submetem-se "... a determinações ritualísticas proibindo-lhes, depois do exílio, de se fixarem em qualquer terra..." (CG&S, pg. 292). Esta "novidade", Freire diz tê-la encontrado em Max Weber. E por aí vai, quanto ao comportamento dos judeus, resultado de uma imposição "quase biológica".

E quanto a Portugal, o que teria acontecido de tão ruim assim, por culpa dos judeus? As conquistas ultramarinas, certamente um fato histórico e não "biológico". Não um fato histórico qualquer, mas a maior revolução técnico-econômica que a humanidade havia conhecido até então. A navegação, o caminho marítimo para as Índias, tudo isso é visto por Freire como uma perversão judaica que privou os portugueses da "saúde econômica" de que um dia desfrutaram.

Com relação a Portugal, deve-se salientar que seus começos foram todos agrários; agrária a sua formação nacional depois pervertida pela atividade comercial dos judeus e política imperialista dos reis.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 294)

Devido ao meu viés de economista, detenho-me mais neste ponto, do domínio do comércio sobre a agricultura, que parece ter sido de transcendental importância na origem do ódio de Gilberto Freire aos judeus. Freire leu Adam Smith, pois o cita a respeito de uma questiúncula demográfica, mas parece não ter entendido nada da teoria econômica que Smith fundou e o sefardita David Ricardo desenvolveu. Não entendeu o mais elementar, que o desenvolvimento da agricultura depende das possibilidades abertas pelo comércio, e não o contrário.

Mas os grandes antagonismos que se defrontaram foram os econômicos. O interesse agrário e o comercial.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 302)

Ou, se entendeu, preferiu aferrar-se à sua admiração pelo feudalismo católico (mesmo declarando-se um "acatólico")...

(Em Marialva) Víveres que, alimentando centenas de eclesiásticos, ainda chegavam para dar de comer a numerosos viajantes e indigentes (sic). O Portugal que chegara a exportar trigo para a Inglaterra tornou-se, na sua fase de mercantilismo, o importador de tudo para a sua mesa – menos sal, vinho e azeite. Do estrangeiro vinham trigo, centeio, queijo, manteiga, ovos, galinha. A não ser para os últimos redutos de produção agrícola e portanto de alimentação fresca e sadia. Esses redutos foram os conventos.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 297)

... posto a perder pela cobiça dos capitalistas judeus:

Ao lado da tradição moura, foi a influência dos frades, grandes agricultores, a força que em Portugal mais contrariou a dos judeus. Se mais tarde o parasitismo invadiu até os conventos é que nem a formidável energia dos monges pôde remar contra a maré. Contra o Oceano Atlântico – diga-se literalmente. Tanto mais que no sentido do grande Oceano, e das aventuras ultramarinas de imperialismo e de comércio, remavam os fortes interesses israelitas, tradicionalmente marítimos a antiagrários".

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 295/296)

Aquela primeira globalização teria empobrecido Portugal...

[...] a crítica não é o clero ou a Igreja que a merece. O mal vinha de raízes mais fundas. Do declínio da agricultura causado pelo desenvolvimento anormalíssimo do comércio marítimo. Do empobrecimento da terra depois de abandonada pelos mouros. Do parasitismo judeu.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 300)

... já debilitado de antes pelas deformações de caráter do português, corrompido pelo apego à escravidão, por influência judaica, como vimos:

Engana-se, ao nosso ver, quem supõe ter o português se corrompido na colonização da África, da Índia e do Brasil. Quando ele projetou por dois terços do mundo sua grande sombra de escravocrata, já suas fontes de vida e de saúde econômica se achavam comprometidas. Seria ele o corruptor e não a vítima. Comprometeu-o menos o esforço, de fato extenuante para povo tão reduzido, da colonização dos trópicos, que a vitória, no próprio reino, dos interesses comerciais sobre os agrícolas. O comércio marítimo precedeu ao imperialismo colonizador e é provável que, independente deste, só pelos desmandos daquele, Portugal se tivesse arruinado como país agrícola e economicamente autônomo (sic). A escravidão que o corrompeu não foi a colonial mas a doméstica. A de negros da Guiné que emendou com a de cativos mouros.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 302)

Em suma, Freire odeia o capitalismo e o debita à conta aos judeus que, segundo ele, possuíam "grande força" em Portugal. Que "grande força" seria essa, incapaz de impedir sua expulsão do reino com um peteleco!

Constituíram-se os judeus em Portugal em grande força e sutil influencia pelo comércio, pela agiotagem, pelo exercício de altos cargos técnicos na administração, pelas ligações de sangue com a velha nobreza guerreira e territorial, pela superioridade de sua cultura intelectual e científica. Especialmente a dos médicos – rivais poderosos dos padres na influência sobre a família e sobre os reis. O rumo burguês e cosmopolita tão precocemente tomado pela monarquia portuguesa, contra as primeiras tendências agrárias e guerreiras, cavou-o mais fundo que qualquer outra influência a dos interesses econômicos dos judeus, concentrados estrategicamente, e por ancestral horror dos "homens de nação" à agricultura, nas cidades marítimas; e daí, em fácil e permanente contato com centros internacionais de finança judia.

Os reis de Portugal é evidente que não protegeram aos judeus pelos seus belos olhos orientais mas interesseiramente, fazendo-os concorrer com largas taxas e impostos para a opulência real e do Estado. É digno de nota o seguinte: que a marinha mercante portuguesa desenvolveu-se em grande parte graças a impostos especiais pagos pelos judeus por todo navio construído e lançado ao mar. De modo que da prosperidade israelita aproveitaram-se os reis e o Estado para enriquecerem. Na prosperidade dos judeus baseou-se o imperialismo português para expandir-se.

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 291)

Não pretendo seguir adiante com mais e mais adições de excertos, como se quisesse, pela quantidade deles, dirimir qualquer dúvida quanto ao anti-semitismo de Freire. É evidente que não devo ser o primeiro a denunciar o mestre de Apipucos como anti-semita. Provavelmente muitos o fizeram. Tanto é que ele vai tentar se defender de acusações que, entretanto, não menciona, apesar de ser tão cuidadoso nas referências bibliográficas. Fará a sua defesa num trecho escondido, como num sussurro, ao final de uma extensa nota ao capítulo IV, dedicada à Biologia Social. Foi escrita em 1949, ou seja, 16 anos depois da primeira publicação do livro, 4 anos depois da derrota do nazismo. Lá pelas tantas, usando como gancho uma citação de Franz Boas (seu mestre e "hebreu", segundo Darcy), Freire produz um texto confuso, indigno do grande escritor que inegavelmente é. Mas a confusão é inevitável pela impossibilidade da tarefa a que se propõe - reiterar o que disse a respeito dos judeus, sem que se sinta obrigado a vestir a carapuça de anti-semita ou racista:

E nunca será demasia salientar-se a importância da obra científica de FRANZ BOAS, desde seus memoráveis estudos sobre alterações de forma de corpo de imigrantes (1911), no sentido de conter os excessos na identificação de "raça" ou "classe" com os chamados "monopólios [...] de virtudes ou vícios humanos". Do que, entretanto, devemos nos guardar é do exagero de nos fecharmos de modo absoluto ao reconhecimento de diferenças hereditárias entre grupos humanos; e também do de considerarmos certos grupos, como o israelita, sagrados, ou invariavelmente caluniados, no que se refere ao seu comportamento, como minoria étnica, ou antes, religiosa ou cultural, entre outro grupos, só para não parecermos "anti-semitas" ou "racistas".

(Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala, pg. 438)

Não só parece, como é. Se os judeus fossem portadores de genes responsáveis por apenas uma pequena fração dos traços de caráter que lhes atribui Gilberto Freire, eu não teria dúvida em fazer uma cirurgia plástica que me reconstituísse o prepúcio; buscaria o batismo e declarar-me-ia devoto do mais carniceiro dos santos entre todos os que deram combate aos hereges. Mas nasci e me criei entre eles, ou melhor, entre nós, judeus, e posso assegurar (como se fosse necessário) que somos, no "comportamento", igualzinhos ao resto da humanidade, com todas as suas poucas "virtudes" e todos os seus muitos "vícios".

http://www.partes.com.br



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