04) A liberdade de expressão é direito fundamental, consoante o afirma a Constituição Federal (ver art. 5º).
Ademais de tal dispositivo, o art. 220, também do Texto Magno, igualmente valoriza a livre e plena manifestação do pensamento.
O Min. CARLOS BRITTO, do Excelso pretório, ao redigir o acórdão correspondente ao julgamento do Conflito de Competência de nº 130/DF, do qual foi relator, lecionou:
Silenciando a Constituição quanto ao regime da INTERNET (rede mundial de computadores), não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de idéias e opiniões, debates, notícias e tudo o mais que signifique plenitude de comunicação.
Sua manifestação, prenhe de lições valiosas para quem precisa definir os contornos da liberdade de expressão (que alguns mencionam como um rio caudaloso sem margens), recomenda que se transcreva, ainda, daquela maravilhosa peça jurídica os seguintes excertos:
(...) O possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor. O exercício concreto da liberdade de imprensa assegura ao jornalista o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero e contundente, especialmente contra as autoridades e os agentes do Estado. A crítica jornalística, pela sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente suscetível de censura, mesmo que legislativa ou judicialmente intentada. O próprio das atividades de imprensa é operar como formadora de opinião pública, espaço natural do pensamento crítico e “real alternativa à versão oficial dos fatos”.
(...)
A uma atividade que já era “livre” (inciso IV e IX do art. 5º), a Constituição Federal acrescentou o qualificativo de “plena” (parágrafo. 1º do art. 220). Liberdade plena que, repelente de qualquer censura prévia, diz respeito à essência mesma do jornalismo (o chamado “núcleo duro” da atividade).
E segue o insigne jurista lecionando sobre vários aspectos da matéria, afirmando, ainda:
(...) O direito de resposta, que se manifesta como ação de replicar ou de retificar matéria publicada é exercitável pela parte daquele que se vê ofendido em sua honra objetiva, ou então subjetiva, conforme estampado no inciso V do art. 5º da Constituição Federal (...)
Este último trecho tem pertinência com a alegação preliminar produzida pelo Querelado, às fls. 124, do seguinte teor:
(...) De outro lado, convém lembrar que o Querelante poderia ter exigido direito de resposta no mesmo veículo onde publicadas as matérias que considera ofensivas à sua dignidade e honra. Se não o fez, pode-se deduzir que ocorreu o que em direito costuma-se interpretar como perdão tácito de eventuais faltas da parte adversa.(...)
O que o Querelante almeja, em verdade, é que o Estado se posicione como algoz da democracia, reprimindo a livre manifestação de pensamentos e críticas. O Poder Judiciário não pode se prestar a tão reles desiderato. Se as supostas ofensas proferidas pelo Querelado contra o Querelante tivessem efetivamente magoado, causado desconforto significativo ou abalo na reputação da outra parte, deveria o suposto ofendido ter exigido, incontinenti, espaço no blog para opor-se às críticas desferidas contra a sua pessoa e políticos do seu relacionamento, atualmente ou no passado. Não o fez, merecendo ênfase a circunstância de que, embora as publicações remontem a 21 de outubro de 2008 (fls. 16), a ação só veio a ser proposta em novembro de 2009. Em verdade, quando da propositura da ação, a matéria já havia caído no esquecimento, substituída por outras que foi, segundo a dinâmica própria dos blogs.
Voltemos ao que pensa o egrégio STF sobre a liberdade de expressão e crítica jornalística. Em 23/03/2011, a Segunda Turma daquele sodalício, apreciando o Agravo de Instrumento de nº 705.630, oriundo de Santa Catarina, tendo funcionado como relator o Ministro CELSO DE MELLO, assim se manifestou:
(...) Não induz responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgue observações em caráter mordaz ou irônico, ou, então, veicule opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de pessoa pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender.
E arremata o insigne magistrado:
(...) O Estado – INCLUSIVE SEUS JUÍZES E TRIBUNAIS – não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais da imprensa.(...).
Mais à frente, ainda no mesmo aresto, preleciona o Julgador destacado:
(...) Reconheci, por isso mesmo, que o conteúdo da matéria que motivou a condenação do jornalista ora recorrido ao pagamento de indenização civil, por danos morais, ao ora agravante, longe de evidenciar prática ilícita contra a honra subjetiva do suposto ofendido, traduziu, na realidade, o exercício concreto, por aquele profissional de imprensa, da liberdade de expressão, cujo fundamento reside no próprio texto da Constituição da República, que assegura, a qualquer jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e mesmo em tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades. (...)
Tenho enfatizado nesta Corte, em inúmeros julgamentos, que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima, como sucedeu na espécie, de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional (CF, arts. 5º, IV, c/c o art. 220).
(...) a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes: a) o direito de informar; b) o direito de buscar a informação; c) o direito de opinar e d) O direito de criticar.
(...) O INTERESSE SOCIAL, QUE LEGITIMA O DIREITO DE CRITICAR, SOBREPÕE-SE A EVENTUAIS SUSCETIBILIDADES QUE POSSAM REVELAR AS PESSOAS PÚBLICAS (...) POR MAIS ACERBA, DURA E VEEMENTE QUE POSSA SER, DEIXA DE SOFRER, QUANTO AO SEU CONCRETO EXERCÍCIO, AS LIMITAÇÕES EXTERNAS QUE ORDINARIAMENTE RESULTAM DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE.
E as lições continuam a ser desenvolvidas ao longo do histórico acórdão, merecendo destaque a lembrança de que, não tendo agido movido por dolo, o Querelado, ao contrário, fez uso do exercício regular do direito de expor seu pensamento e tecer críticas (ínsito na atividade jornalística), que não pode ser confundido com intenção de difamar ou injuriar. Finalmente, da verdadeira aula de democracia dada pelo Ministro CELSO DE MELLO, cumpre destacar, ainda, a assertiva no sentido de que
(...) em nenhum caso deve afirmar-se que o dolo resulta da própria expressão objetivamente ofensiva.
Cumpre aduzir as definitivas palavras do eminente ministro CARLOS BRITTO, do egrégio STF, que sintentizam os rumos que devem tomar os embates resultantes da livre expressão versus suscetibilidades pessoais dos criticados:
(...) EM MATERIA DE IMPRENSA, NÃO HÁ ESPAÇO PARA MEIO-TERMO OU A CONTEMPORIZAÇÃO. OU ELA É INTEIRAMENTE LIVRE, OU DELA JÁ NÃO SE PODE COGITAR SENÃO COMO JOGO DE APARÊNCIA JURÍDICA. É a trajetória humana, é a vida, são os fatos, o pensamento e as obras dos mais acreditados formadores de opinião que retratam sob todas as cores, luzes e contornos que imprensa apenas MEIO-LIVRE é um tão arremedo de imprensa como a própria meia verdade das coisas o é para a explicação cabal dos fenômenos, seres, condutas, ideias. Sobretudo ideias, cuja livre circulação no mundo é tão necessária quanto o desembarçado fluir do sangue pelas nossas veias e o desobstruído percurso do ar pelos nossos pulmões e vias aéreas. O que tem levado interlocutores sociais de peso - diaga-se de passagem - a se posicionar contra a exigência de diploma de nível superior para quems e disponha a escrever e falar com habitualidade pelos órgãos de imprensa.
(...) o fato é que nada se comapra à imprensa como cristalina fonte das informações multitudinárias que mais habilitam os seres humanos a fazer avaliações e escolhas no seu concreto dia-a-dia.
E arremata: quanto mais a democracia é servida pela imprensa, mais a imprensa é servida pela democracia.
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