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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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segunda-feira, 30 de maio de 2011

Recusa de fazer exame pericial (investigação de paternidade) em razão de crença religiosa

Decisão do TJ/SC:


Processo:Apelação Cível nº 2008.057607-7
Relator:Carlos Prudêncio
Data:11/05/2011

Apelação Cível n. 2008.057607-7, de Mafra
Relator: Des. Carlos Prudêncio

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM ALIMENTOS. EXAME DE DNA CONSTATOU QUE O PAI REGISTRAL NÃO É O PAI BIOLÓGICO DO AUTOR. RECUSA DO INVESTIGADO EM REALIZAR EXAME PERICIAL EM RAZÃO DE CRENÇA RELIGIOSA. COMPROVAÇÃO DA PATERNIDADE POR MEIO DE PROVAS TESTEMUNHAIS. FIXAÇÃO DE ALIMENTO. RECURSO PROVIDO.
"A prova testemunhal coligida, aliada aos demais elementos de convicção existentes nos autos - como, por exemplo, a prova pericial que excluiu a paternidade do requerido P. de A. M., bem como as contradições apontadas no depoimento pessoal do investigado H. -, indicam a existência de uma presunção de paternidade que não foi afastada pelo requerido, sob suposta crise de consciência religiosa, o que permite a atribuição da paternidade ao requerido H. A."
"O requerido recusou-se em se submeter ao único procedimento capaz de afastar a presunção da paternidade que sobre si recai pela palavra da genitora do autor, a qual não tem - ao menos não há a mínima comprovação nesse sentido - qualquer razão próxima ou remota para pretender prejudicá-lo e, muito menos, prejudicar a si própria admitindo uma relação espúria fora do casamento" (Promotor de Justiça).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.057607-7, da comarca de Mafra (2ª Vara Cível/criminal), em que é apelante P. de A. M. J., representado pela genitora E. A. P. M., e apelado H. A. e P. de A. M.:
ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por maioria de votos, conhecer e dar provimento ao recurso. Custas legais. Vencido o Desembargador Joel Figueira Júnior, que votou no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso.
RELATÓRIO
Adoto relatório de fls. 144 e 145 e acrescento que o Juiz de Direito Dr. Luís Paulo Dal Pont Lodetti julgou improcedente o pedido feito na ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos.
Inconformado, o autor P. de A. M. J. apela, aduzindo que: a) nasceu em 1-3-2001, fruto de relações sexuais entre sua genitora e o réu-apelado; b) o réu-apelado H. A. negou-se em realizar o teste de DNA, tendo sido produzidas provas testemunhais que confirmam o relacionamento entre a sua genitora e o investigado; c) diante da negativa para a realização do teste de DNA, o direito à identidade, que busca um interesse público, deverá se sobrepor à proteção do interesse privado, que assegura a intangibilidade do corpo humano. Requer, ao final, a anulação da sentença proferida para que seja declarada a paternidade do réu-apelado em face do autor-apelante e, consequentemente, seja fixados alimentos em seu favor, no valor de 30% (trinta por cento) dos rendimentos do réu-apelado.
O réu H. A. apresenta contrarrazões às fls. 164 a 166.
A douta Procuradoria Geral de Justiça manifesta-se pelo provimento do recurso interposto (fls. 172 a 174).
VOTO
Trata-se de ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos movida por P. de A. M. J., representado por sua genitora E. A. P. M., contra H. A., em que o autor requer o reconhecimento da paternidade por parte do réu e a fixação de pensão alimentícia no valor de 30% (trinta por cento) dos rendimentos.
Vejamos os fatos:
1 - Conforme consta na petição inicial, a genitora do autor-apelante manteve relação sexual com o réu-apelado H. A., gerando P. de A. M. J., enquanto estava separada de fato do Sr. P. de A. M., mas por ainda ser casada com este,a criança foi registrada em seu nome (fl. 7).
2 - À fl. 15, o autor-apelante requereu a inclusão de P. de A. M. no pólo passivo da lide, vez que se comprovada a paternidade do réu-apelado H. A., acarretará anulação de registro civil, tendo sido deferido pelo Juiz a quo à fl. 16.
3 - Em contestação (fls. 32 a 35), o réu-apelado H. A. alega que: a) jamais manteve qualquer relacionamento com a mãe da autor-apelante; b) a genitora de P. de A. M. J. é casada civilmente com o réu P. de A. M., com quem possui mais 2 (dois) filhos, presumindo-se ser ele o pai biológico do autor; c) o registro civil não pode ser alterado, salvo se houver erro ou falsidade do registro; d) o fato da alegação de que o marido da mãe do menor fez vasectomia antes da concepção do autor-apelante, não pode revogar o registro civil, vez que ele declarou ser o pai, reconhecendo a paternidade da criança.
4 - Houve impugnação à contestação às fls. 38 a 41.
5 - O autor-apelante requereu a realização de exame de DNA (fl. 53), sendo que o réu-apelado H. A. afirmou taxativamente que não realizaria tal exame pericial, pois sua religião, Testemunha de Geová, não permite (fl. 65).
6 - Foi anexado aos autos exame de DNA realizado por P. de A. M., que trouxe um resultado negativo para a paternidade em face do autor P. de A. M. J. (fl. 78).
7 - O Ministério Público, por seu Promotor de Justiça Dr. Fernando da Silva Comin, manifestou-se pela procedência do pedido, reconhecendo a paternidade de H. A. em face do autor-apelante, além da fixação da verba alimentar em 30% (trinta por cento) dos seus rendimentos (fls. 121 a 132).
8 - Sentenciando, o Juiz de Direito Dr. Luís Paulo Dal Pont Lodetti julgou improcedente o pedido (fls. 144 a 149).
Analisando os fatos acima expostos, e diante do bem fundamentado parecer exarado pelo Promotor de Justiça, corroborando com seu entendimento, adoto-o como razões de decidir, a fim de que a sentença seja reformada e seja reconhecida a paternidade de H. A. em favor do autor-apelante:
"Quanto ao mérito da pretensão, tem-se a impressão de que as provas produzidas ao longo da instrução processual, aliadas ao resultado exclusivo do exame de DNA realizado no requerido P. de A. M. (fls. 72 a 78), estejam a retratar um contexto fático-jurídico suficiente à declaração da paternidade do requerido H. A.
Com efeito, isso porque muito embora não se tenha comprovado por prova pericial a relação de parentesco existente entre o autor e o requerido H. A. - o que, é necessário o registro, somente ocorreu em virtude de sua expressa recusa em se submeter ao exame pericial por motivo de crença religiosa -, constata-se que o fundamento jurídico da presente pretensão restou devidamente perfectibilizado pelas declarações harmônicas e coerentes das testemunhas ouvidas em juízo, o que vem ao encontro do alegado na inicial, autorizando, destarte, o reconhecimento da paternidade.
Devido à recusa do requerido H. em se submeter à prova pericial decorrente do exame de DNA, para a resolução da causa, pois, há de ser exaustivamente analisada a prova testemunhal.
Assim sendo, convém inicialmente reportar-se à palavra da genitora do autor P. de A. M. J., que ao prestar depoimento pessoal, assim afirmou:
'Que casou com o segundo réu há aproximadamente 15 anos; que conheceu o primeiro réu há 6 anos e meio, em Curitiba, porque sua irmã tinha uma filha doente e costumava parar na casa de H. quando ia a Curitiba fazer tratamento médico; que sua irmã parava lá porque o sobrinho de H. é casado com uma terceira irmã da depoente, e por isso H. se oferecia para ajudar; que H. começou a telefonar para a depoente; que no começo a depoente estava cortando mas depois acabou cedendo; que cedeu porque H. veio até a sua casa; que nesse dia a depoente concordou , a pedido de H., em acompanhá-la até a casa da sua irmã; que no meio do caminho H. forçou e acabaram mantendo relação sexual; que não usaram preservativo; que depois desse dia não houve mais nenhum encontro; que antes desse dia seu marido já fizera vasectomia; que descobriu que estava grávida e teve certeza de que H. era o pai, já que seu marido não poderia ter filhos; que a depoente não manteve relações com nenhum outro homem; que se não tivesse certeza de que H. é o pai, não estaria aqui; que o menino é a cara de H.; que ninguém viu o encontro da depoente com H.; que nunca contou isso para ninguém; que enquanto grávida tentou procurar H., mas ele não deu bola; que não sabe porque seu marido resolveu assumir a criança; que ele devia saber que o filho não era dele, ainda que a depoente lhe assegurasse o contrário; que certo dia resolveu parar com a mentira e por isso ingressou com a ação judicial; que está separada do marido, por esse motivo; que quando seu marido descobriu ele rejeitadaa criança, mas hoje continua cuidando do filho, com quem se dá muito bem; que seu filho hoje tem 6 anos e sabe de tudo porque seu marido contou; que a cabecinha dele está uma confusão; que a criança só diz que gosta do P. e não gosta do outro; que a criança não conhece Henrique. DADA A PALVRA AO DOUTOR PROMOTOR DE JUSTIÇA, ÀS SUA REPERGUNTAS, RESPONDEU: que a relação sexual ocorreu dentro do carro. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO RÉU, ÀS SUA REPERGUNTAS, RESPONDEU: que faz um ano que separou de Pedro; que não lembra agora o mês e o ano em que manteve a relação sexual com H.; que sua gestação foi normal e a criança nasceu perfeita; que seu filho nasceu no dia 01/03/2001 às 09:00 horas, em Mafra/SC'.
O requerido H. A., por sua vez, alegou:
'Que conheceu E. porque a irmã dela passou um tempo hospedada na casa do depoente em Curitiba, enquanto a filha fazia tratamento médico; que o depoente ofereceu ajuda porque seu sobrinho é casado com outra irmã de E.; que E. esteve em sua casa por umas 6 vezes, sempre acompanhada do marido, e lá aguardava até chegar o horário de visitar a sobrinha no hospital; que nunca teve contato mais íntimo com E.; que no ano de 2000 para cá não veio a Mafra por mais de 3 vezes; que em nenhuma das vezes sequer viu E., e nem sabe onde ela reside; que não sabe também onde moram as irmãs de E.; que todas as vezes veio junto de sua esposa, e visitava sua irmã viúva de nome L.; que L. mora na rua Capitão João Braz; que nunca viu a criança autor da ação; que tem outra irmã que mora na zona rural de Mafra; que sabe que E. costuma visitar essa sua irmã; que o depoente não costumava visitar essa irmã; que é Evangélico; que se nega a realizar o exame de DNA porque sua religião Testemunha de Geová não permite; que nunca manteve relações sexuais ou mesmo insinuou-se para Eliane; que na época de 2000 tinha um veículo Santana Quantum de cor vinho; que nesse mesmo ano vendeu esse carro. DADA A PALAVRA AO DOUTOR PROMOTOR DE JUSTIÇA, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: que antes da Quantum tinha um veículo Gol de cor verde e que depois da Quantum comprou um Kadett verde; que na época da Quantum não tinha outro carro; que é testemunha de Geová faz 23 anos; que sua religião impede inclusive que o depoente ceda um fio de cabelo para o exame; que não sabe como é feito o exame de DNA; que conversou a respeito com o Pastor da igreja; que o Pastor jurou que afastaria o depoente da religião; que prefere morrer a fazer o exame de DNA. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO AUTOR, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: que não costumava telefonar para Mafra'.
A testemunha J. B. da S., disse:
'Que conhece E. de vista, porque já os viu em uma lanchonete em Curitiba; que a lanchonete é do filho do Sr. H.; que H. contou ao depoente que E. e o marido iam lá nas idas a Curitiba para visitar uma sobrinha doente; que nunca viu E. sozinha por lá; que pelo que sabe H. não vem muito a Mafra; que o depoente já veio com H. por duas vezes para esta cidade de Mafra e em uma delas a esposa de H. não os acompanhou; que ele costumava vir na casa da sogra; que H. é religioso, Testemunha de Geová, desde que ele parou de beber, há 20 anos. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO RÉU, NADA PERGUNTOU. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO AUTOR, ÀS SUA REPERGUNTAS, RESPONDEU: que H. tinha Verona azul e depois um Volksvagem parecido com a Parati de cor meio lilás; que não sabe dizer se viu E. por lá durante a semana ou em sábados e domingos. DADA A PALAVRA AO DOUTOR PROMOTOR DE JUSTIÇA, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: que H. freqüentava quase diariamente a lanchonete; que ele ficava lá conversando; que lá vende bebida alcoólica'.
A testemunha A. da S., informou:
'Que já viu E. na casa de H., que pelo que sabe uma sobrinha dela estava doente em tratamento em Curitiba, e por isso E. ia até lá visitar; que sempre a via com o marido; que H. costumava vir bastante a esta cidade Mafra; que não sabe se H. vem sozinho ou acompanhado da esposa; que conhece H. há uns 40 anos; que ele é da religião Testemunha de Geová faz 33 anos; que o depoente é Católico; que não sabe se H. teve um caso com E.; que H. é um cara bacana e ajuda muita gente; que não pode dizer, entretanto, se H. é um cara namorador ou não. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO RÉU, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: que H. leva a religião a serio; que ele freqüenta a igreja nas quintas e nos domingos. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO AUTOR, ÀS SUA REPERGUNTAS, RESPONDEU: que nunca esteve na casa de H. enquanto E. estava lá; que não soube de outras vezes que E. esteve na casa de H. sem o marido; que lembra quando o réu tinha um veículo Verona azul claro; que depois do carro Verona ele teve uma Santana Quantum vermelho. DADA A PALAVRA AO DOUTOR PROMOTOR DE JUSTIÇA, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: que faz mais de 7 anos que o réu teve o veículo Verona; que não se os filhos de H. são da mesma religião, ainda que o depoente seja mais amigo deles; que nunca soube de H. ter tido alguma moléstia grave ou ter tido se internar em algum hospital'.
Segundo o informante J. A. P.:
'Que em meados de 2000, Eliane, sua irmã, já era casada com P. de A. M. e nunca viu em qualquer época o réu H. Que soube pelo próprio P. M. que havia sido vasectomizado antes dessa época. Que não tocou no assunto da paternidade do autor, após o nascimento deste com E. Que E. esteve em Curitiba cerca 7 anos para visitar uma sobrinha, filha de Terezinha, outra irmã do declarante. Que o sobrinho de H., R. R., é casado com outra irmã do declarante, M. R. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO AUTOR, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: Que o réu H. tem uma irmã, de nome C., que reside nesta cidade, sendo que ela é benzedeira e já aconteceu de levarem membro da família a ela, e sabe o declarante que o réu H. sempre visita sua irmã, já há muitos anos. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO RÉU, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: Que a irmã Cecília mora na localidade de Rio Branco II. Que o declarante mora na localidade de Rio Branco I, distante 08 km daquela. E. sempre morou no bairro Vila Nova, distante cerca de 09 Km da casa de C. Que reafirma que não conhecia o réu H. pessoalmente, apenas de ouvir dizer. Que em meados de 2000, E. já morava com seu marido no bairro Vila Nova, onde moram até hoje na mesma residência, mas ouviu dizer o declarante que estão separados como casal. Que ouvia comentários na comunidade que se duvidava da paternidade de P. sobre o autor, antes da propositura da ação. Que o menino está estudando na escola pública, onde no cadastro respectivo provavelmente consta como pai P. M. Que antes da propositura da ação o declarante ouviu P. M. dizer em mais de uma oportunidade que o autor não era seu filho, presenciando também o declarante que ele não tratava o menino muito bem. Que apesar de saber que P. era vasectomizado ante o nascimento do autor, não chegou a questionar sua irmã a respeito da paternidade do menino. DADA A PALAVRA AO DOUTOR PROMOTOR DE JUSTIÇA, ÀS SUA REPERGUNTAS, RESPONDEU: Que sua irmã tampouco nunca veio comentar com o declarante a respeito dessa paternidade, nada ouvindo ainda de terceiros. Que P. e E. tem outros dois filhos mais velhos, de 15 e 13 anos, respectivamente, que moram com eles, e que por sua vez são tratados com maior deferência por P. de que o autor. Que os irmãos mais velhos também caçoam do autor, dizendo a ele que ele deve ir para o "pai velho dele". Que atualmente E. está trabalhando como faxineira, ignorando sua renda ou seu emprego é formal'.
O informante E. P., por sua vez:
'Que mais ou menos há 07 anos atrás E. morava com seu marido P., com quem tinha dois filhos. Não sabe se na época P. poderia ter filhos. Que ouviu dizer pelo próprio P. que ele fizera vasectomia, mas não sabe precisara ocasião, porém quando o autor nasceu já tinha ouvido dizer isso (da vasectomia) por P. Que após o nascimento do autor E. quando ia visitar o declarante, disse voluntariamente que o pai do autor era outra pessoa, que não P., sem esclarecer quem era. Que não sabe quem escolheu o nome do autor. Que o declarante percebeu que P. não dá a mesma atenção ao autor, que aquela destinada a seus filhos maiores. Que o declarante nunca presenciou P. dizer não ser pai do autor. Que há uns 07 anos atrás o declarante e E. tinham uma sobrinha que estava internada em Curitiba, e E. ia visitá-la em algumas oportunidades, sempre em companhia de seu marido P. Que não conhecia anteriormente a esta audiência o réu H., mas sabe que um sobrinho dele é casado com uma irmã do declarante. Que todavia já ouvia dizer que H. vem visitar sua irmã, que é benzedeira, residente neste município, não sabendo a freqüência. Que E. e P. moram juntos até hoje. Que a comunidade, família, tem P. como pai de criação do autor, mas não biológico. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO AUTOR, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: Que tem conhecimento de que quando P. e E. foram à Curitiba visitar a sobrinha internada, visitaram também a casa de H., conhecido por intermédio do sobrinho dele, cunhado de E. Que ignora a condição econômica atual de E. DADA A PALAVRA AO PROCURADOR DO RÉU, ÀS SUAS REPERGUNTAS, RESPONDEU: Que a sobrinha internada em Curitiba chamava-se T. L., e faleceu cerca de 04 anos. Que quando E. contou que o autor não era filho de P., o declarante não a questionou sobre a verdadeira paternidade e circunstâncias que a envolveram, porque isso não lhe dizia respeito. Ignora porque E. fez esse relato, talvez para desabafar. Que não sabe a quanto tempo a família e a comunidade tem notícia de que o autor não é filho biológico de P. Que a benzedeira, C., irmã do réu, reside na localidade de Rio Branco II, distante cerca de 04 Km da casa do declarante, e uns 10 Km da casa de E. Que visita sua irmã cerca de 4 ou 5 vezes por ano, em média. Que há anos vem também até Rio Branco I, onde moram o declarante outro irmão, cerca de 3 vezes por ano, em média.
Dos depoimentos anteriormente transcritos, especialmente aqueles referentes à mãe do autor e ao requerido H., é possível extrair aspectos de congruência que autorizam a conclusão de que é possível conferir certa credibilidade às afirmações da genitora do autor.
Com efeito, o requerido admite que conheceu a autora na cidade de Curitiba, e que esta frequentou por algum tempo sua residência, pois estaria acompanhando sua irmã, que fazia tratamento médico naquela cidade. A genitora confirmou tais informações.
Ainda de acordo com o depoimento pessoal do requerido H. é possível concluir-se que este teria oferecido ajuda à família da genitora do autor porque seu sobrinho é casado com uma irmã desta. A genitora igualmente confirma essas declarações.
O requerido admite que a genitora do autor foi em torno de seis vezes a Curitiba, porém sempre acompanhada do marido, e que algumas vezes esteve nesta cidade de Mafra para visitar sua irmã L., afirmando que nestas ocasiões sempre se fazia acompanhar de sua esposa. A genitora do autor, ao contrário do que se poderia supor, afirma que as relações sexuais teriam sido realizadas aqui em Mafra e não em Curitiba, justamente em uma dessas visitas do requerido, quando teria concordado em acompanhá-lo no seu carro, até a casa da irmã do requerido, no meio do caminho.
É interessante a semelhança dos depoimentos de ambos na descrição das circunstâncias e dados periféricos, porém sua divergência nas informações principais.
Enquanto o requerido H. afirmou que viera poucas vezes visitar sua irmã neste município e que em todas elas estava acompanhado de sua esposa, a genitora do autor insiste em afirmar que em determinada oportunidade, quando acompanhava o requerido em direção à residência de sua irmã, teriam mantido relações sexuais sem o uso de preservativo.
Nesse aspecto, muito embora tenha o requerido afirmado que em todas as oportunidades que aqui esteve, assim o foi na companhia de sua esposa, é necessário o registro de que a testemunha J. B. da S., ouvida à fl. 90, disse que 'já veio com H. por duas vezes para esta cidade de Mafra e em uma delas a esposa de H. não os acompanhou'.
Referida contradição do requerido não teria maiores consequências não fosse a constatação de que, pela palavra da genitora do autor, na única oportunidade em que mantiveram relações sexuais, acabou engravidando do requerido H., o que traz em si o seguinte questionamento:por que razão o requerido procura esconder o fato de em determinada oportunidade ter vindo a este município desacompanhado de sua esposa, justamente naquela que teria sido o dia da concepção do autor, segundo sua genitora?
Não quer parecer razoável que a representante do autor tenha se sujeitado a tamanha humilhação, inclusive colocando em risco seu casamento e sua reputação, ajuizado em nome do autor a presente ação de modo temerário, não fosse movida pela dor da crise de consciência de uma falha do passado, valendo lembrar igualmente que em momento algum da presente relação processual restou provada a exceptio plurium concubentium capaz de fazer afastar a presunção de paternidade que recai sobre o requerido H.
[...]
Dessa forma, tem que a prova testemunhal coligida, aliada aos demais elementos de convicção existentes nos autos - como, por exemplo, a prova pericial que excluiu a paternidade do requerido P. de A. M., bem como as contradições apontadas no depoimento pessoal do investigado H. -, indicam a existência de uma presunção de paternidade que não foi afastada pelo requerido, sob suposta crise de consciência religiosa, o que permite a atribuição da paternidade ao requerido H. A., até mesmo para que se possa resgatar um mínimo de dignidade a que tem direito o pequeno P., numa história em que não há culpados ou inocentes.
Além disso, chama a atenção a veemência da recusa do requerido H. em se submeter à única prova capaz de afastar a presunção que sobre si recai se, como ele próprio confirmou em juízo, 'não sabe como é feito o exame de DNA' (fl. 93).
Ora, como pode alguém afirmar com categórica convicção que não pode realizar determinado procedimento que sequer sabe como é realizado?!
Enfim, o fato é que o requerido recusou-se em se submeter ao único procedimento capaz de afastar a presunção da paternidade que sobre si recai pela palavra da genitora do autor, a qual não tem - ao menos não há a mínima comprovação nesse sentido - qualquer razão próxima ou remota para pretender prejudicá-lo e, muito menos, prejudicar a si própria admitindo uma relação espúria fora do casamento.
De outro lado, no que pertine à pretensão alimentar, uma vez declarada a paternidade na forma pretendida, impende seja fixada a verba alimentar correspondente.
Desse modo, não havendo maiores elementos de convicção quanto às reais possibilidades do requerido, há de prevalecer, até mesmo em virtude da mutabilidade da presente sentença, os valores afirmados pelo autor à fl. 5 (30% por cento dos vencimentos), dos quais se extrai sua necessidade". (fls. 123 a 132).
Posto isso, voto no sentido de dar provimento ao recurso interposto, para que seja reformada a sentença, reconhecendo H. A. como pai biológico do menor P. de A. M. J., fixando alimentos no valor de 30% (trinta por cento) dos seus vencimentos.
DECISÃO
Nos termos do voto do relator, decide a Câmara, por maioria de votos, conhecer e dar provimento ao recurso. Vencido o Desembargador Joel Figueira Júnior, que votou no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso.
Participaram do julgamento, realizado no dia 10 de agosto de 2010, os Exmos Srs. Desembargador Edson Ubaldo e Desembargador Joel Figueira Júnior.
Florianópolis, 8 de setembro de 2010.
Des. CARLOS PRUDÊNCIO
Presidente e Relator
Declaração de voto vencido do Exmo. Sr. Des. Joel Dias Figueira Júnior
APELAÇÃO CÍVEL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. RECUSA DO SUPOSTO PAI EM REALIZAR O EXAME DE DNA POR MOTIVO DE CONVICÇÃO RELIGIOSA. INFANTE FRUTO DE SUPOSTA AVENTURA AMOROSA DA MÃE BIOLÓGICA. PAI REGISTRAL. FILIAÇÃO AFETIVA QUE SE SOBREPÕE A PATERNIDADE BIOLÓGICA. BOA CONVIVÊNCIA FAMILIAR. VONTADE DA CRIANÇA EM PERMANECER COM A FILIAÇÃO DOS DEMAIS IRMÃOS. IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA SOCIOLÓGICA. LAÇOS FAMILIARES. COMPANHEIRISMO. BOA CONVIVÊNCIA. AMIZADE. FUNDAMENTAIS PARA UMA FAMÍLIA BEM ESTRUTURADA. PREVALÊNCIA DO BEM ESTAR DO INFANTE.
Ousei discordar dos insignes Desembargadores por entender que se fazia mister, negar provimento ao recurso e manter incólume a sentença de primeiro grau, vejamos:
Analisando o caderno processual, extrai-se que a genitora do infante manteve uma aventura amorosa com o réu, ambos casados, do que resultou a gravidez inesperada, pois seu esposo já era vaseictomisado, não podendo, assim, gerar mais filhos biológicos.
A criança foi criada como se filho fosse de P. A. M., assim como seus outros dois irmãos, mantendo uma boa relação familiar. O infante demonstrou em juízo que gosta muito do pai registral, e, quer assim permanecer.
Ademais, verifica-se que o autor não possui qualquer vínculo afetivo ou mesmo qualquer espécie de contato, com o pai biológico. Em tais casos deve prevalecer o bem estar da criança, que tem uma boa convivência com seu pai afetivo.
O Magistrado sentenciante muito bem consignou sobre o caso aqui discutido:
O primeiro réu, de sua vez, conta com praticamente sessenta anos de idade, e disse preferir 'morrer a fazer o exame de DNA' (f. 93), donde se imagina a 'atenção e afeto' que vá conferir ao pequeno autor, acaso dele seja declarado pai.
Edco Pscheidt disse que : 'Eliana e Pedro moram juntos até hoje' (f. 109).
Resolvi converter o julgamento em diligência para inquirir o próprio autor da ação, e dele ouvi que 'tem seis anos e estuda no Colégio Santo Antônio, na segunda série. Tem bastante amiguinhos. Brincam bastante, ninguém pega no seu pé ou fala besteiras por qualquer motivo que seja. Estuda de manhã. Vai de ônibus para o colégio. Tem dois irmãos de nome Bryan e Alan, de treze e dezesseis anos. Não gosta de futebol. Joga basquete na escola. Em casa brinca com seus bonequinhos e vê televisão. Seu pai e sua mãe trabalham, a mãe na Brunatto e o pai na Lan House. Seus pais se separaram mas agora estão juntos de novo. Ficou feliz que eles voltaram a viver juntos. Seus pais não lhe dão bronca. As vezes a mãe brinca junto. O pai também. Dos dois, o pai é mais legal e a mãe que pega mais no pé. Gosta mesmo do pai e da mãe. Tem o mesmo nome do pai, e acha isso legal. É mentira se alguém disse que algum dos dois não lhe trata bem. Não te pai e mãe melhor que os seus. Se fosse perguntadose que trocar, diria que não quer. Os irmãos não incomodam. Ganha presentes no aniversário e no natal. As vezes a mãe leva no parque. (f. 139)
[...]
Plausível, dessa forma, o reconhecimento da filiação independentemente do liame genético, bastando que se revele o vínculo afetivo e social construído entre a criança e o pai.
E o caso dos autos, segundo se retira dos depoimentos transcritos, é exatamente esse.
Para a criança, existiu e existe apenas um pai, Pedro.
O pai afetivo, segundo se apurou, ao tempo da concepção da criança já não tinha mais a possibilidade de conceber filhos, porque enfrentara cirurgia de vasectomia. Logo, sempre conviveu, no mínimo, com a desconfiança de que a criança pudesse ser fruto de eventual relação extraconjugal da esposa. Ainda assim efetuou o registro, de modo que não poderia mesmo alegar erro escusável. Anos após, sobreveio a confirmação da traição, mas felizmente sempre teve a grandeza de tratar a criança como seu filho que é. Claro, não se dúvida de eventual comportamento retraído de Pedro com Pedro Júnior no período subsequente à descoberta, mas essa situação, segundo os mesmos depoimentos, aos poucos foi superada.
Refletindo acerca dos efeitos de eventual procedência do pedido, cheguei à conclusão de que isso significaria retira da criança o pai que desde sempre lhe deu (e dá) sustento, carinho e atenção, e que ainda reside em sua casa, para colocar um estranho no lugar, com efeitos nefastos.
Como explicar, ademais, que Pedro 'Júnior' seria filho de Henrique?
Pode-se sustentar serem essas premissas todas falsas à medida que o próprio autor optou pelo ingresso da ação, mas ainda é uma criança e o fez por intermédio da mãe, a qual, reputo, não tomou a atitude que melhor atende aos interesses do filhos, estes a merecerem primazia. (fls. 144-149).
Maria Berenice Dias traz o novo conceito de família no século XXI;
Como diz Tereza Wambier, a 'cara' da família moderna mudou. O seu principal papel é de suporte emocional do indivíduo, em que há flexibilidade e, indubitavelmente, mais intesidade no que diz respeito a laços afetivos. Difícil encontar uma definição de família de forma a dimensionoar o que, no contexto social dos dias de hoje, se infere nesse conceito. É mais ou menos intuitivo identificar família com a noção de casamento, ou seja, pessoas ligadas pelo vínculo do matrimônio. Também vem à mente a imagem da família patriarcal, o pis como a figura central, , na companhia da esposa e rodeado de filhos, genros, noras e netos. Essa visão hierarquizada da família, no entanto, sofreu com o tempo enormes transformações. Além de ter havido significativa diminuição do número de seus componentes, também começou a haver significativa diminuição do número de seus componentes, também começou a haver um embaralhamento de papéis. A emancipação feminina e o ingresso da mulher no mercado de trabalho levou-a para fora do lar. Deixou o homem de ser o provedor exclusivo da família, sendo exigida a sua participação nas atividades domésticas (ver 6).
O afrouxamento dos laços entre Estado e Igreja acarretou profunda evolução social e a mutação do próprio conceito de família, que se transformou em verdadeiro caleidoscópio de relações que muda no tempo de sua constituição e se consolida em cada geração. Começaram a surgir novas estruturas de convívio sem uma terminologia adequada que as diferencie. Nas famílias formadas por pessoas que saíram de outras relações, seus componentes não têm lugares definidos. Os novos contornos da família estão desafiando a possibilidade de se encontrar uma conceituação única para sua identificação.
Faz-se necessário ter uma visão pluralista da família, abrigando os mais diversos arranjos familiares, devendo-se buscar a identifcação do elemento que permita enlaçar no conceito de entidade familiar todos os relacionamentos que têm origem em um elo de afetividade, independentemente de sua conformação. O desafio dos dias de hoje é achar o toque identificador das estruturas interpessoais que permita nominá-las como família. Esse referencial só pode ser identificado na afetividade. É o envolvimento emocional que leva a subtrair um relacionamento do âmbito do direito obrigacional - cujo núcleo é a vontade - para inseri-lo no direito das famílias, que tem como elemento estruturante o sentimento do amor que funde as almas e confunde patrimônios, gera responsabilidades e compromentimentos mútuos. Esse é o divisor entre o direito obrigacional e o familiar: os negócios têm por substrato exclusivamente a vontade, enquanto o traço diferenciador do direito de família é o afeto. A família é um grupo social fundado essencialmente nos laços de afetividade após o desaparecimento da família patriarcal, que desempenhava funções procriativas, econômicas, religiosas e políticas." (Manual de direito das famílias. Dias. Maria Berenice. RT. São Paulo. 2007. fls. 40-41).
E mais adiante, acrescenta:
Em tema tão intrincado, em que várias verdades se superpõem, mister é estabelecer - ou ao menos tentar - um critério para a identificação dos vínculos de parentalidade. Até o advento da Constituição Federal, prevalecia o critério da verdade legal, ou seja, alguém era filho porque a lei assim ordenava, mesmo que todos soubessem que não era filho biológico do marido da mãe. Tanto assim era que a lei concedia exíguo prazo de dois meses para o marido 'contestar a legitimidade do filho de sua mulher' (CC1916 178 §3º). A mudança foi radical. Agora a lei afirma que a ação é imprescindível (CC 1.601), privilegiando a verdade biológica. Cresce o movimento para emprestar maior importância ao critério sócioafetivo, que se sobrepõe à verdade presumida e também à verdade biológica, pois tem por base um valor maior: o vínculo de afetividade que a constituiu. Tem prevalência até sobre a coisa julgada, pois nada deve obstaculizar o estabelecimento de vínculo jurídico para chancelar uma verdade que não existe. Comprovada a posse de estado de filho, ou melhor, o estado de filho afetivo, não há como destruir o elo consolidado pela convivência, devendo a justiça, na hora de estabelecer a paternidade, sempre respeitar a verdade da vida, constituída ao longo do tempo. (bis idem. fls. 346).
Nesse sentido, assim tem se posicionado os tribunais pátrios:
DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. 1. A paternidade socioafetiva, em especial, prescinde da paternidade biológica; revela-se quando os filhos derivam do amor e dos vínculos puros de espontânea afeição. A filiação é vista, portanto, na sua concepção eudemonista. Nessa esteira. ""a paternidade sociológica assenta- se no afeto cultivado dia a dia, alimentado no cuidado recíproco, no companheirismo, na cooperação, na amizade e na cumplicidade. Nesse ínterim, o afeto está presente nas relações familiares, tanto na relação entre homem e mulher (plano horizontal) como na relação paterno-filial (plano vertical, como por exemplo, a existente entre padrasto e enteado), todos unidos pelo sentimento, na felicidade no prazo de estarem juntos. (...) dessa forma, a família sociológica é aquela em que existe a prevalência dos laços afetivos, em que se verifica a solidariedade entre os membros que a compõem. Nessa família, os responsáveis assumem integralmente a educação e a produção da criança, que, independentemente de algum vínculo jurídico ou biológico entre eles, criam, amam e defendem, fazendo transparecer a todos que são os seus pais. A paternidade, nesse caso, é verificada pela manifestação espontânea dos pais sociológicos, que, por opção, efetivamente mantêm uma relação paterno-filial ao desempenhar um papel protetor educador e emocional, devendo por isso ser considerados como os verdadeiros pais em caso de conflito de paternidade"" (Luiz roberto de assumpção, in aspectos da paternidade civil no novo Código Civil, saraiva, 2004, p. 53). A dimensão do vínculo de afeto entre pais e filhos não tem o condão de afastar, por si só, a verdade genética. ""esse vínculo de sangue é considerado, ainda hoje, o padrão e continua sendo um dos elementos definidores da qualificação jurídica da pessoa, do seu estado, do status de cidadão, no qual se apóia a investigação da paternidade"" ( in op. Cit., p. 208). 2. Não se sustenta hoje a intangibilidade do ato registral frente à verdade genética quando se permite, em atenção ao princípio do melhor interesse da criança, indagação a respeito dos efeitos da coisa julgada nas ações de investigação de paternidade da era pós-DNA. O direito não pode viver às margens dos avanços científicos. E, por consequência, autoriza-se o temperamento da Res judicata com fulcro na premissa de que a busca da ascendência genética interessa tanto ao filho quanto ao indigitado pai. Nessa rota, ao que parece, o direito de família no Brasil caminha para a quebra excepcional da imutabilidade deste instituto. Não há, pois, como afastar a importância da pesquisa da tipagem do DNA. Além do mais, importante discussão a respeito da importância do patrimônio genético de cada indivíduo foi levada ao Excelso Supremo Tribunal Federal no julgamento do hbc 71.373-4/RS. Embora tenha aquela egrégia corte de justiça decidido que o direito à liberdade, à intimidade, à vida privada e à integridade física do suposto pai é que deve prevalecer em face da investigação genética, restou assentada a importância do exame de DNA para efeito de verificação do vínculo de paternidade. O ministro Ilmar Galvão, naquele julgamento, assim se pronunciou. ""não se busca com a investigatória a satisfação de interesse meramente patrimonial, mas, sobretudo, a consecução de interesse moral, que só encontrará resposta na revelação da verdade real acerca da origem biológica do pretenso filho, posto em dúvida pelo próprio réu ou por outrem"". (TJ-DF; Rec. 2006.05.1.009388-9; Ac. 351.397; Segunda Câmara Cível; Rel. Desig. Des. Waldir Leôncio Júnior; DJDFTE 24/04/2009; Pág. 44) (sem grifos no original).
"NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. ANULAÇÃO DE REGISTRO. IMPOSSIBILIDADE. ADOÇÃO AFETIVA. Narrativa da petição inicial demonstra a existência de relação parental. Sendo a filiação um estado social, comprovado estado de filho afetivo, não se justifica a anulação de registro de nascimento por nele não constar o nome do pai biológico e sim o do pai que desempenhou a função parental. Reconhecimento da paternidade que se deu de forma regular, livre e consciente, mostrando-se a revogação juridicamente impossível. NEGADO PROVIMENTO AO APELO" (TJRS, AC n.º 70012565388, Desª Maria Berenice Dias).
Assim, para que não haja traumas ao infante, pois para ele seu pai é P. de A. M., que representa a figura paterna, dando educação, atenção e carinho, amizade, gerando uma boa convivência familiar, a filiação (paterna) não deve ser mudada.
Por esses fundamentos, proferi voto no sentido de conhecer e negar provimento ao presente recurso.
Florianópolis, 31 de março de 2011.
Joel Dias Figueira Júnior
Desembargador

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