Relendo Thomas Hobbes (Leviatã - Editora Martin Claret - SP/2004) deparei-me com um trecho que motivou uma reflexão sobre o preâmbulo da Constituição Federal de 1988, onde se lê a polêmica expressão "sob a proteção de Deus", ao mesmo tempo em que se afirma que o estado brasileiro é republicano, democrático é laico, isto é, não confessional, ou seja, separado e independente de qualquer religião.
Na obra mencionada, escrita em 1651, quem se incumbiu de escrever o "perfil biográfico" do autor mencionado - que se diz haver influenciado outros importantes pensadores como Rousseau, Kant e os enciclopedistas e que contribuiu para preparar, no plano ideológico, o advento da Revolução Francesa -, afirmou:
Paradoxalmente, o chamado "despotismo esclarecido" do século XVIII, em contestação frontal aos dogmas religiosos, não impedia aos monarcas reclamarem, mais que em qualquer outra época, origem divina para os poderes que se atribuiam. O reinado de Luis XIV, que se estendeu do fim do século XVII ao princípio do XVIII, constituiu o momento culminante do absolutismo.
As teorias do direito divino perderam efetivamente a força depois da Revolução Francesa e da independência dos Estados Unidos. Chegam, porém, até nossos dias, os vestígios desse período, com os títulos e prerrogativas formais de certas monarquias, como a inglesa, em que o monarca é também chefe da igreja (anglicana) e exerce seus poderes "pela graça de Deus" (p. 574).
Pois bem: uma monarquia, onde os poderes são exercidos "pela graça de Deus" difere - no particular da influência dos cultos e da defesa dos interesses dos mesmos -, de uma república, onde uma Constituição é promulgada "sob a proteção de Deus", apesar do presidente da república não cumular a posição de chefe de qualquer Igreja?
Será que uma república que se diz "sob a proteção de Deus" (o que implica reconhecer a existência da divindade - poder que não foi outorgado pelos cidadãos aos legisladores constituintes - e certa submissão à mesma, eis que ninguém dá proteção a quem não se submete) está livre do absolutismo do Papa, dos cardeais e bispos e goza efetivamente de independência, ou não passa de uma colônia do Império do Vaticano?
Será que uma república que se diz "sob a proteção de Deus" (o que implica reconhecer a existência da divindade - poder que não foi outorgado pelos cidadãos aos legisladores constituintes - e certa submissão à mesma, eis que ninguém dá proteção a quem não se submete) está livre do absolutismo do Papa, dos cardeais e bispos e goza efetivamente de independência, ou não passa de uma colônia do Império do Vaticano?
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