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sexta-feira, 6 de abril de 2012

Sobre judeus e árabes: boas cercas fazem bons vizinhos?


Cecília Araújo, de Hebron

Cerca separa assentamentos israelenses de áreas palestinas construídas
Cerca separa assentamentos israelenses de áreas palestinas construídas - Cecília Araújo / VEJA

Twani é um típico vilarejo árabe localizado no distrito de Hebron, no sul da Cisjordânia. Seus moradores são, em sua maioria, muçulmanos extremamente conservadores. Ali, as mulheres quase não saem de casa e pouco se comunicam com a vizinhança. Numa tarde de quarta-feira, excepcionalmente, dezenas delas se dirigiam a uma sala pertencente à municipalidade. Pela primeira vez, participariam de uma reunião coletiva promovida pela missão dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Hebron. Geralmente, o tratamento psicológico promovido pela organização não governamental é feito individualmente. Agora, tentariam algo diferente, com o objetivo de incentivar a interação das moradoras da cidade. Sentadas sobre tapetes persas no chão de um cômodo amplo, todas elas traziam um lenço cobrindo a cabeça, das mais variadas cores e estampas. Três delas, ao saberem que poderiam ser fotografadas a qualquer momento, preferiram usar a burca, a fim de cobrir o rosto também. Algumas trouxeram seus filhos pequenos para participar do encontro.
Muitas no grupo eram analfabetas. Durante a apresentação das psicólogas do MSF, foram levadas a refletir primeiro sobre os conflitos mundiais, depois sobre as disputas entre israelenses e palestinos, em seguida sobre questões locais de Hebron, especialmente o problema que enfrentam com os colonos judeus, até chegar aos seus traumas domiciliares. As mulheres participavam ativamente do interrogatório, interessadas e curiosas. Tornavam-se enfáticas ao falar dos colonos judeus. Armados, diziam as mulheres, eles ameaçavam seus maridos e filhos, e as Forças de Defesa de Israel (IDF, sigla em inglês) não faziam nada para detê-los. Os israelenses também destruiriam mesquitas e postes de eletricidade - a fim de dificultar a vida dos vizinhos palestinos.
Segundo as psicólogas, a insegurança causada pela presença israelense provoca uma sensação de impotência nos homens de Twani, que, por sua vez, colabora para o aumento da necessidade de se impor dentro de casa. Eles batem em suas mulheres e filhos com mais frequência e enrijecem as regras a que eles precisam se submeter. A teoria parece fazer sentido quando as mulheres falam sobre suas experiências e problemas domiciliares: relatam a preferência do marido por um dos filhos ou as agressões frequentes e generalizadas. "Ansiedade é normal?", pergunta uma das pacientes. "Parece que vou explodir a qualquer momento." Após uma hora de conversa, as mulheres descobrem afinidades e identificação. A equipe do MSF decide estabelecer encontros quinzenais, e todas se dispõem a participar e começam a criar uma rede de amizade entre elas.
No deserto - O deserto localizado nas extremidades do distrito de Hebron é habitado principalmente por famílias de beduínos. Tradicionalmente, eles levavam uma vida nômade, mas, desde a I Guerra Mundial (1914-1918), passaram a ter dificuldades para deslocar-se entre os diferentes países e tornaram-se cada vez mais sedentários. Geralmente, são islâmicos fervorosos que mantêm características tribais em suas comunidades. Mahmud* possui uma tenda fixa em Dgaiga, um vilarejo no meio do deserto de Hebron, há 33 anos. Há dois anos, colonos judeus construíram ao lado de sua tenda e, desde então, afirma Mahmud, fazem de tudo para desalojá-lo. "Chegaram a oferecer um valor altíssimo em dinheiro para que eu e minha família fôssemos embora. Não vamos sair, temos raízes aqui", diz ele. A relação entre os vizinhos, separados por uma cerca, não é nada amigável. A mulher de Mahmud diz que no dia anterior a IDF tentou levar um amigo da vizinhança. "Sentimos que estamos o tempo todo em perigo”, diz. Além disso, eles afirmam sofrer com a proibição para construir em seu próprio terreno. "À medida que a idade avança, o frio incomoda cada vez mais. Recentemente, tentamos construir uma casa para finalmente aposentarmos a tenda de lona. Mas ela foi destruída pelos israelenses antes mesmo de ficar pronta", diz Mahmud.
Entre Dgaiga e Um al-Khair, outro vilarejo da região desértica de Hebron, há um longo caminho muito seco e inabitado, cercado por montanhas de pedras e camelos. Kameel* é um senhor de barba grisalha, também beduíno, que mora com sua mulher e filhos em uma tenda montada originalmente em 1977. Como a família cresceu, há anos tentam construir um "puxadinho" para abrigar os filhos. Em um árabe quase incompreensível mesmo para os representantes nativos do MSF, Alhadalin falava indignado da repetida destruição da estrutura por parte da IDF e dos colonos judeus. "A casa já foi destruída duas vezes. Voltamos a construir porque não temos muita saída. Talvez demorem mais desta vez", diz o filho Almutasm, chamando a atenção para a comunidade de colonos instalada há dois anos perto da propriedade. Segundo ele, os colonos fazem vigilância do terreno e mantêm a IDF informada sobre cada melhoria. Por outro lado, a família recebe ajuda de diversas organizações de ajuda humanitária, que chegaram a instalar uma planta solar para garantir energia aos beduínos. Outras alegações de destruição promovidas pela IDF foram feitas em uma escola do vilarejo de Susya, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que foi impedida de ampliar sua área. Nas regiões chamadas "H2" de Hebron, onde a presença militar é mais forte, a IDF instala câmeras de vigilância em casas de palestinos.
Confira, no infográfico, como se distribuem os palestinos pelos territórios ocupados:
Infográfico dos territórios palestinos ocupados
Cidade sagrada - A cidade de Hebron é muito visada pelos judeus, que migraram para a região em busca da terra sagrada. "O que o mundo chama de Cisjordânia, a Bíblia chama de Judeia (sul) e Samaria (norte). São terras sagradas que deveriam ser propriedade dos israelenses", explica David Haivri, colono judeu e ativista político. Nascido em Nova York, ele migrou para a cidade de Shiloh, na Samaria, para "conectar-se à sua história", e acabou se tornando o principal porta-voz dos colonos da região. Haivri ressalta como a localização de Shiloh é privilegiada, pois de lá é possível avistar Tel Aviv, inclusive o único aeroporto internacional do país, o Ben Gurion. "Se a região fosse ocupada por terroristas, ataques poderiam destruir o aeroporto e deixar Israel isolado do mundo. Por sorte, a Faixa de Gaza fica em uma região plana, que não dá a mesma visibilidade aos membros do Hamas", diz.
Haivri, além disso, afirma que Hebron faz parte da história do seu povo, segundo narra a Bíblia. "Lá estão os túmulos dos patriarcas - Abraão, Isaque, Jacob - e matriarcas - Sara, Rebeca e Lea - da nação judaica." Haivri reclama que a comunidade judaica que vive nessa área tem muito menos direitos do que as outras de Israel. "A volta dos judeus para essa terra sagrada é uma tentativa de consertar um erro. Em 2005, o estado de Israel tirou todos os colonos de Gaza, com o intuito de restabelecer a paz. Várias comunidades foram destruídas, e de nada adiantou", afirma. Haivri diz que, nessa terra que faz parte de suas origens, os judeus são agredidos pelos palestinos. "Muitas vezes precisamos ser violentos com eles também, para nos defender", diz. Segundo ele, barreiras são necessárias para garantir a segurança dos israelenses. "O ódio contra os judeus não se resume apenas aos palestinos. No mundo todo, um grande número de pessoas nos ataca, como aconteceu às embaixadas de Israel na Tailândia, na Índia e na Geórgia." Por isso, ele defende o ditado: "Boas cercas fazem bons vizinhos".

Fonte: Rev. VEJA

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