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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Os dilemas do poder judaico

 

 THE NEW YORK TIMES-  ROGER, COHEN, É COLUNISTA,- O Estado de S.Paulo

Artigo

The Crisis of Zionism (A crise do sionismo, em tradução literal) de Peter Beinart é um importante livro novo que rejeita a manipulação da vitimização judaica em nome do domínio dos palestinos por Israel e afirma que, hoje, a verdadeira questão para os judeus não é o desafio da fraqueza, mas as exigências do poder. "Estão nos pedindo para perpetuar a narrativa da vitimização que se esquiva da questão judaica central de nosso tempo: a questão de como usar eticamente o poder judaico", ele escreve.

Esse poder, por 45 anos, foi exercido sobre milhões de palestinos que não gozam de nenhum dos direitos de cidadania e sofrem todas as humilhações de um povo ocupado.

Beinart, um renomado jornalista liberal, está certo ao inverter a traiçoeira figura da vitimização. Não se trata de 1938 revisitado, ou mesmo de 1967. Israel é forte hoje, uma economia vibrante e o único Estado com armas nucleares do Oriente Médio. Seu inabalável aliado, os EUA, abriga uma comunidade judaica que nunca foi tão integrada e influente. Os turbulentos Estados árabes têm como foco a própria reinvenção, não em Israel; o principal aliado regional do Irã, a Síria, está à beira do abismo.

Ameaças persistem, é claro. A vertente pela aniquilação de Israel na ideologia palestina, presente desde 1948, não desapareceu. O antissemitismo árabe intensifica-se, embora, ao menos na Tunísia, ele esteja sendo atenuado. Hezbollah e Hamas têm seus foguetes e mísseis. O Irã tem um programa nuclear que avança aos solavancos.

Mas o maior perigo até agora para Israel é que ele desperdice as oportunidades de poder ou ataque militarmente (o Irã) mais por excesso de vitimização do que por alguma coalizão imaginável de seus inimigos capaz de desfechar-lhe um ataque arrasador.

No entanto, como escreve Beinart, importantes organizações judaicas americanas, com agendas geralmente influenciadas por alguns doadores ricos (como o magnata dos cassinos Sheldon Adelson), têm feito de uma defesa em geral acrítica de Israel - em vez de uma crítica construtiva - a pedra angular de suas políticas e visto o desvio da sempre rejuvenescida narrativa da vitimização como uma dissensão inaceitável.

Ele cita Abraham Foxman, o diretor da Liga Antidifamação: "A democracia israelense deve decidir: os judeus americanos devem apoiar". Essas prescrições funcionavam para um Israel pequeno e assediado e uma geração de sobreviventes do Holocausto; hoje, elas não servem. "Em seu apoio para barrar a multiplicação dos assentamentos e seu conforto com a crítica pública à política israelense, a massa dos judeus americanos está à esquerda das organizações que falam em seu nome, organizações que quase sempre se opõem a uma pressão americana sobre líderes israelenses e culpam quase exclusivamente os palestinos pela falta de paz no Oriente Médio", escreve Beinart. Culpar os palestinos - de desunião, de demagogia, de buscar não as linhas de 1967, mas a extinção de Israel - é fácil, embora cada vez mais um exercício de distorção das grandes mudanças palestinas sob o primeiro-ministro Salam Fayyad.

O jogo da culpa seria muito mais crível, porém, se o governo do premiê Binyamin Netanyahu tivesse mostrado o mínimo interesse na paz; não mostrou. A expansão subsidiada dos assentamentos na Cisjordânia continua, uma reclamação concreta das terras que Netanyahu chama de Judeia e Samaria.

Beinart nota (atenção diplomatas israelenses de boa vontade que "reposicionariam" Israel): "Israel não tem um problema de relações públicas, tem um problema de política. Não se pode vender a ocupação numa era pós-colonial". Essa ocupação, prolongada para a eternidade, significaria, como disse o presidente Barack Obama, que "o sonho de um Estado judaico e democrático não será realizado". O que Netanyahu e as principais organizações judaicas americanas não percebem é que, nas palavras de Beinart, "quanto menos democrático o sionismo se tornar, mais pessoas de todo o mundo questionarão a legitimidade do próprio sionismo". Israel, ele afirma com justeza, é uma democracia dentro da linha verde, "mas na Cisjordânia é uma etnocracia, um lugar onde judeus gozam de cidadania, mas os palestinos, não". Algumas das páginas mais fascinantes de The Crisis of Zionism traçam o pano de fundo ideológico do choque áspero entre Obama e Netanyahu.

Beinart demonstra que a forte influência sionista liberal do rabino Arnold Jacob Wolf sobre Obama durante seus anos em Chicago. Wolf detestava a ideia de "um Israel sitiado por antissemitas"; seu ensinamento era "ecumênico" e "integracionista". Ele se ligava às raízes liberais do sionismo americano e aos ensinamentos éticos dos profetas que, como está expresso no Êxodo, ordenou que os judeus não oprimissem estrangeiros "tendo sido eles próprios estrangeiros na terra do Egito".

O contraste com Netanyahu - criado na vertente sionista de Jabotinsky por um pai que via os árabes como "semibárbaros" e rejeitava um "moralismo castrado" em favor de uma nova estirpe de judeus guerreiros - dificilmente poderia ser maior. Beinart pinta um quadro persuasivo de um Netanyahu dedicado em seu íntimo - apesar de aceitar dois Estados no fim do dia - à prevenção de qualquer Estado palestino viável. Seu retrato da antiga amizade de Netanyahu com Adelson e outros judeus americanos de direita é particularmente sugestivo - o mesmo Adelson que ultimamente tem financiado Newt Gingrich, aquele que não se cansa de falar de "um povo palestino inventado".

É deprimente que Netanyahu vença. Obama, que começou dizendo que os assentamentos tinham de parar, terminou vetando uma resolução do Conselho de Segurança da ONU nesse sentido. Ele teve de abandonar seu sionismo liberal para sobreviver na política americana. Não poderia haver demonstração mais clara da importância e oportunidade do livro de Beinart para o futuro de Israel. / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK
 
Fonte: COISAS JUDAICAS

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