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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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sábado, 18 de fevereiro de 2012

Turismo - Uma faca de dois gumes

- Quando me lembro da minha infância em Canasvieiras, correndo livremente pelas alvas areias, que cantavam ao ser pisadas, da água transparente, limpa, que podia ser bebida, apesar de salgada;
- Quando recordo que eu e amigos de infância cortávamos espigões secos de piteira, para fazer balsas, com as quais entendíamos espinhéis para apanhar peixes ou ir até a Ilha do Argentino, sem medo de sermos atropelados por qualquer "voadeira";
- Quando me vem à mente a circunstância de que comíamos camarões e ostras crus, pegávamos goiás e siris (de casco branco e azul), valendo-nos de puçás, na beira da praia, pela tardinha;
- Quando me recordo do sururu que as tainhas causavam quando faziam o corso, ouriçando os pescadores, alguns dos quais (os vigias) ralavam as bundas nas pedras, à espera da "manta" (cardume) que lhes asseguraria comida por vários dias (algumas consumidas frescas, outras escaladas e secas ao sol), e vejo as notícias da atualidade sobre a poluição que acomete o nosso mar, não consigo evitar uma certa revolta contra o descalabro administrativo que permitiu a deterioração da qualidade de vida na nossa querida Ilha de Santa Catarina.
Eram tempos sem luz elétrica (imperavam as pombocas de querosene e pequenos lampiões também abastecidos com o mesmo combustível, da marca Jacaré), da água de poço artesiano ou de pequenas cachoeiras, dos fogões à lenha, do colchão de palha de milho ou de capim-colchão, dos quais sinto grande nostalgia.
Eram épocas em que o transporte coletivo se resumia a um ônibus pela manhã (sentido distrito-centro) e outro à tarde, em sentido inverso, cujo motorista diriga e cobrava, conhecendo todo mundo, praticamente.
O relativo desconforto, em comparação com tempos posteriores, era compensado pela pureza do meio-ambiente, pela singeleza e pureza das pessoas, pela prevalência dos costumes e da cultura  nativa, em boa parte herdada dos açoritas e madeirenses (?) que por aqui chegaram na década de 1740, trazendo animais (bois e cavalos), os engenhos de açúcar e de farinha, técnicas de construção de embarcações, de pescaria, modo cantado de falar, temor reverencial ao suposto deus único, etc...

Aí surgiu o banho de mar como forma de lazer (até então os "amarelos" não eram muito chegados a se lavar no mar, senão para remover o sangue que sobrava da degola de arraias, de tartarugas, dos cações) e com ele a ganância pelas faixas de areia, sendo as restingas e até os morros da Ilha invadidos por incontáveis casas de veraneio, com os problemas consequentes: esgotos não tratados, cercamento de caminhos, destruição de pitangueiras e outras espécies típicas (camarinha, araçá, etc...), eliminação da cultura local, total desaparecimento da agricultura de subsistência e da criação de animais de pequeno porte e, sobretudo, desaparecimento do pescadeor artesanal, na maioria das comunidades até então predominantemente pesqueiras.
Os que não conseguiram comprar um terreno à beira-mar, também passaram a cobiçar as delícias dos banhos, surgindo, então, o turismo, uma palavra derivada da língua inglesa, atividade que motivou a construção de hospedarias, hotéis e casas do gênero, tudo sem a prévia preparação da infraestrutura necessária.
É certo que, à época, ainda não se falava em ecologia, até porque se acreditava que o mar fosse capaz de absorver todas as sujidades que o ser humano a ele lançasse, a exemplo do que acontecia com a babugem dos peixes consumidos e do cocô jogado nas praias, depois de transportado pelos negros, às costas, nos famigerados "tigres".
O tempo mostrou que subestimou-se a capacidade do ser humano de destruir a pureza das praias, das águas e do ar. 
E hoje vejo triste notícia na mídia: Canasveiras está com todas as suas praias  seriamente poluídas, imprestáveis para o banho.
Antevendo quadro tão dantesco, há cerca de dois anos, propus uma ação popular, no afã de suprir as omissões administrativas, forçando os donos de residências de praia e estabelecimentos comerciais (de Canasvierias e da Lagoa da conceição) a ligarem seus despejos aos sistemas de coleta e tratamento implantados pela CASAN. Era uma ação piloto, pensando em propor outras, para reverter quadros semelhantes existentes em outros balneários, se lograsse êxito com aquela primeira
Pois, de forma inacreditável, os semideuses do Judiciário catarinense entenderam que a ação não devia prosperar, preferindo deixar morrer a "galinha dos ovos de ouro" em que se transformou o turismo, baseado, principalmente, na atração exercida pelas praias e pelo mar. 
Não posso me furtar à afirmação de que os julgadores foram irresponsáveis, cegos, despreparados para o exercício da magistratura, por não enxergar evidências incontestáveis, ou, de outro vértice, ocorreu perniciosa influência de algum setor poderoso, que eu não consegui identificar, no sentido de não ser permitida a evolução da ação mencionada.
Uma dó! Agora não é só a babugem dos peixes e as sobras de pequenos peixes que apodreciam nas areias  (as quais os veranistas e turistas usavam como argumento para combater a pesca de arrasto) que estão a desmotivar a vinda de gente de fora para nos visitar.
São fezes,  urina e dejetos outros, que não tratados adequadamente, infestam nossas outrora cristalinas águas.
Também pudera, até o ano passado - quando denunciei aqui o descumprimento da Lei Orgânica do Município - Florianópolis não possuía, sequer, um Plano de Desenvolvimento Turístico, sendo as medidas administrativas implementadas sem critério, aleatoriamente, apesar da propalada vocação turística da região. 
Ainda não temos, sequer, um Plano Diretor e o Plano de Desenvolvimento Turístico foi baixado por decreto, em 2011, antes do Plano Diretor, pasmem.
A situação de Canasvieiras, bem como de outros balneários, é mera e previsível decorrência de pura incompetência administrativa (dezenas de anos sem planejamento e preparação para a expansão dos núcleos habitacionais). Não se previu, nem se preparou os distritos para o inchaço que os acometeu, transformando, cada um deles, em cidade. 
Falta de água tratada, excesso de dejetos não tratados, energia elétrica inconstante, ausência de policiamento eficaz, entre outras mazelas, constituem o preço que estamos pagando por não termos escolhido melhor nossos administradores, ao longo de décadas.
Quando for votar, caro leitor, pense muito bem em tudo isto e não se deixe iludir por gente como os Amin, os Berger e outros que acenem com promessas de solução para os problemas apontados, pois que, tendo estado no governo municipal, não tiveram competência para resolvê-los.
Alguns serviços essenciais melhoraram, não há negar: vias de circulação, transporte coletivo, creches, escolas e serviços de saúde. Mas, no particular da preservação do meio-ambiente e dos costumes locais, estamos vivendo situação desastrosa.

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