A maçã na guerra de classes
À nossa direita o respeitável professor Greg David, capitalista, autor de Modern New York, Life Economics of a City. À nossa esquerda, não menos respeitável, o professor marxista, David Harvey, autor de Rebel Cities, From the Right to the City to the Urban Revolution. Ambos livros acabam de ser publicados.
O capitalista Greg David examina os últimos 50
anos de Nova York e argumenta que a Wall Street é a salvação da cidade.
Se houver uma mudança na política econômica de diminuição da renda dos
ricos para beneficiar as classes média e pobre, um cataclisma financeiro
destruíra Nova York.
O marxista David Harvey diz que se
os ricos não forem contidos Manhattan será um condomínio ainda mais
fechado e exclusivo dos afluentes.
Alguns números são essenciais. Em 1980, os ricos tinham 12% da renda da cidade. Hoje têm 49%.
A classe média estagnou, a pobre cresceu. Há 34
mil casas em Nova York com renda média de US$ 3,7 milhões por ano e 900
mil casas com renda de US$ 30 mil. Os ricos ganham num fim de semana de
três dias o que os pobres ganham num ano.
Ele propõe voltar aos números de 1980, 1% com 12%, 99% com 88%.
O capitalista diz que os ricos transformaram
Nova York na cidade mais atraente do mundo com seus restaurantes,
teatros, museus, faculdades, apartamentos espetaculares e vida segura.
Os ricos sustentam o preço do metro quadrado na estratosfera. Sem eles
os preços dos imóveis despencariam e também a benevolência que sustenta
ONGs e artes. Um bilionário, informa, doou US$ 100 milhões para renovar
a biblioteca pública.
O marxista conta que há pouco tempo entrou no
metrô na linha E, às seis da manhã, no aeroporto Kennedy, rumo à cidade.
O trem estava lotado, a maioria era mulheres negras, latinas, gente de
cor. "São eles que saem de longe para acordar e cuidar da cidade. No fim
do dia, exaustos, vão encarar outra longa viagem para seus pobres
apartamentos." Ele pergunta: "Quantos vão passar pela biblioteca
pública? Uma maravilhosa biblioteca é ótima para mim, um intelectual".
O capitalista Greg David vê três ameaças
destruidoras no horizonte: 1. aumento do salário mínimo para US$ 10 a
hora, mais seguro, etc ... ou de US$ 12 sem benefícios; 2. direito de
cinco dias pagos por ano em caso de doença; 3. aumento de impostos para
os ricos e expansão do governo para cuidar de programas sociais.
O marxista David Harvey defende os três pontos e
vai além. Ele usa vários exemplos de rebeliões que começaram nas
cidades e conquistaram os países , como a de Evo Morales na Bolívia.
Entre outras experiências bem sucedidas ele cita
o orçamento participatório que começou em Porto Alegre e este ano
serviu de modelo para Nova York. A cidade disponibiliza uma verba "X",
os moradores apresentam projetos, os eleitores da região decidem pelo
voto.
David Harvey diz que ao modelo funciona nas não
resolve o problema da cidade. Sua esperança é que "Occupy Wall Street"
seja a semente deste movimento capaz de mobilizar os novaiorquinos.
Ele compara Manhattan com a Manchester, de
Engels, na Inglaterra. Em 1844, o co-pai do marxismo, escreveu que os
ricos de Manchester, inclusive a familia dele, descobriram uma fórmula
para entrar e sair da cidade sem ver a vasta população de miseráveis em
volta da cidade.
Aqui eu fiquei perdido porque os 34 mil
baronetes novaiorquinos que ganham US$ 3,7 milhões por ano vivem em
Manhattan e não nos subúrbios. Nem querem morar no Bronx, Queens, Staten
Island. Algumas partes do Brooklyn sao desejáveis. A aristocracia de
Manchester detestava a cidade.
O marxista acha que uma guerra de classes seria
bom para Nova York e para todo o país. "Ela já existe", diz ele numa
entrevista e cita o bilionário Warren Buffet na introdução do livro:
"Nós, os ricos, começamos a guerra de classes e estamos ganhando."
Buffet lidera um grupo de ricos a favor de pagar
mais impostos e esta semana Obama saiu em campanha pelo país com a "lei
de Buffet".
Os milionários, como Warren Buffet, Mitt Romney e
ele mesmo, propõoe Obama, devem pagar 30% de impostos. Mitt Romney, com
um faturamento de US$ 21 milhões, pagou 14%. Até eu, percentualmente
pago mais. Warren Buffet, num depoimento no Congresso, defendeu o
aumento dos impostos para os ricos. Ele paga 15%, a secretária dele paga
30%.
"Obama promove guerra de classes", gritam os conservadores para tocar no ultra-sensível nervo anti-socialista americano.
Podem gritar. Nos próximos nove meses os Estados Unidos vão gestar a guerra de classes. Vai ser menino ou menina?
Fonte: BBC
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