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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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quarta-feira, 2 de maio de 2012

Meio-ambiente - RESTINGA EM ITAPOÁ - Decisão do TRF 4ª Reggião

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004571-88.2003.404.7201/SC
RELATORA
:
Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
APELANTE
:
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA
ADVOGADO
:
Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região
APELANTE
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
APELANTE
:
UNIÃO FEDERAL
ADVOGADO
:
Procuradoria-Regional da União
APELADO
:
MUNICÍPIO DE ITAPOA/SC

:
CONDOMINIO RESIDENCIAL CANCUN BEACH RESIDENCE e outros
ADVOGADO
:
Marta Regina Bedin
INTERESSADO
:
FUNDACAO AMPARO TECNOLOGICO AO MEIO AMBIENTE - FATMA
ADVOGADO
:
Carlos da Costa Soares























EMENTA























DIREITO AMBIENTAL. ZONA COSTEIRA. RESTINGA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. ZONA URBANA CONSOLIDADA. CONDOMÍNIO. DEMOLIÇÃO E RECUPERAÇÃO DA PARTE RELATIVA AO TERRENO DE MARINHA.
O licenciamento ambiental para construção urbana depende da localização do empreendimento/imóvel, de seu tamanho, de sua finalidade, do efetivo impacto causado, o que define o interesse preponderante na atuação da Administração. Tais regras são decorrência imediata e lógica do potencial de cada empreendimento justificando o interesse pela manifestação de qual esfera da Administração, excepcionandas as atuações da União em bens de sua propriedade. Especificamente em zonas costeiras, o zoneamento e a urbanização são permitidos, inclusive em terrenos de marinha. Cabe, em qualquer destes casos, o respeito à existência dos planos diretores, à existência de APPs, às licenças/alvarás/autorizações necessárias conforme a propriedade do bem e, ainda, ao regime do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro-PNGC. O Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro-PNGC tem como uma de suas metas compatibilizar o crescimento urbanos nas zonas costeiras com a preservação ambiental, eis que não veda a ocupação da Zona Costeira, apenas a regula para preservação de áreas como de restinga, possibilitando instituição de Planos de Gerenciamento por Estados e Muncípios, e sempre exigindo para o licenciamento das obras EIA/RIMA. É possível a construção em terreno de marinha. Indispensável sejam concedidas as licenças pelos órgãos competentes.
No caso dos autos, este é o problema encontrado no empreendimento. Inexistindo licenciamento, existindo construção além da licença municipal, há construção em terreno de marinha caracterizado como zona costeira e que, conforme perícia, embora não indique a existência de restinga nos 300 metros que pretende o MPF, indica a existência de vegetação nativa, inclusive princípios de dunas, no entorno leste (divisa física do empreendimento com a areia e o oceano). Invadindo 8 metros do terreno de marinha, esta é a área em que o dano ambiental é presumido, em que as licenças concedidas não são regulares, e que conforme manifestou a proprietária da área (União), devem ser demolidas. Para além do terreno de marinha, trata-se de zona urbana consolidade cujo alvará concedido pelo município é suficiente para garantir a regularidade da construção, não demonstrado de forma inequívoca que se trata de restinga protegida pela Resolução 303/02 do CONAMA. O condomínio réu deverá cumprir ainda, integralmente, os termos do Termo de Ajustamento de Conduta firmado com a FATMA.























ACÓRDÃO























Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento aos recursos, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de abril de 2012.



































Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
Relator



Documento eletrônico assinado por Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do códigoverificador 4877414v6 e, se solicitado, do código CRC 1ECF7670.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a):Maria Lúcia Luz Leiria
Data e Hora:19/04/2012 18:56




APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004571-88.2003.404.7201/SC
RELATORA
:
Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
APELANTE
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INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA
ADVOGADO
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Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
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UNIÃO FEDERAL
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MUNICÍPIO DE ITAPOA/SC

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ADVOGADO
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Marta Regina Bedin
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:
FUNDACAO AMPARO TECNOLOGICO AO MEIO AMBIENTE - FATMA
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:
Carlos da Costa Soares























RELATÓRIO























Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA ajuizada pelo Ministério Público Federal contra o Município de Itapoá, Condomínio Residencial Cancun Beach Residence, MMD Empreendimentos Imobiliários Ltda e Maurício Dinardi impugnando construção em terreno de marinha e área de preservação permanente. Postula (a) a declaração de nulidade das licenças e alvarás expedidos irregular e ilegalmente pelo Município para a construção do Condomínio, (b) a condenação solidária do Condomínio, da construtora e de seus engenheiro civil Maurício Dinardi em obrigação de fazer, qual seja a demolição de todas as construções do imóvel, incluindo a retirada das fundações e dos entulhos, (c) a condenação solidárias destes mesmos réus à recuperar a área, bem como condenação pecuniária pelos danos causados aos interesses difusos, (d) condenar o Município de Itapoá a promover ações regressivas contra os servidores que concederam as licenças ilegais, bem como adotar todas as medidas necessárias para evitar construções em terreno de marinha ou de preservação, providenciando sempre o correto licenciamento com anuência da União, EIA/RIMA e manifestação do IBAMA e da FATMA. Tudo sob pena de multa diária.

A sentença de primeiro grau (a) reconheceu a invasão de competência pelo Município ao conceder licença para construção em terreno de marinha, (b) porém, versando a ação sobre dano ambiental e não sobre questão dominial da União, entendeu que a nulidade do alvará somente poderia ser declarada se comprovada edificação em área de preservação permanente, (c) declarou a ilegalidade da Resolução 303/CONAMA ao restringir a definição de Restinga do Código Florestal, para fins de delimitação de área de preservação permanente, de forma que não reconhecida Área de Preservação Permanente nos 300m a partir da linha preamar máxima, não verificada no local construção ilegal. Por fim, a sentença enfatizou entendimento no sentido de que, embora não se tratando de APP, o condomínio réu causa impactos ambientais, porém, deixou de determinar providências para a respectiva licença, com apresentação de estudo de impacto abordando medidas mitigadoras e/ou compensatórias, porque não foi pedido veiculado na exordial.

Apela o Ministério Público Federal, alegando que a área onde se encontra edificado o Residencial Cancun é terreno de marinha, composto por dunas recobertas de vegetação de restinga, razão pela qual é de ser deferido o pedido de demolição. Impugna a sentença que determinou a realização de licenciamento posterior de um empreendimento construído em terrenos de marinha e sobre restinga.

Insurge-se o IBAMA sustentando a legalidade da Resolução nº 303/02 do CONAMA, afastando a incidência de qualquer excesso regulamentar por parte do CONAMA.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento.

O Ministério Público Federal exara parecer, opinando pelo provimento dos recursos.

Em sessão realizada em 22/02/2011 esta Terceira Turma, por maioria, negou provimento aos recursos de apelação do IBAMA e do Ministério Público Federal.

A União interpôs embargos declaratórios informando não ter sido intimada da sentença de improcedência proferida em primeiro grau, em seu desfavor, cerceada sua defesa porque inviabilizado seu apelo. Em 31/05/2011 esta Terceira Turma decidiu:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INTIMAÇÃO. AUSÊNCIA. NULIDADE.
Os embargos declaratórios da União merecem acolhimento, tendo em vista que não houve a sua regular intimação da sentença, o que acarreta a nulidade absoluta do julgado proferido por esta Turma.
Anulado o acórdão desta turma, devem os autos retornar ao primeiro grau para a regular intimação da União sobre a sentença.

Intimada, a União juntou seu apelo. Argui que a sentença desconsiderou dano, inclusive e principalment ambiental, perpretado em seu patrimônio, motivo pelo qual devem ser reconhecidas nulas as licenças e alvarás concedidos pelo Município naquela área, condenando os réus à regularização e recomposição do local. Afirma que a Lei 6.938/81 (CódigoFlorestal) legitima a regulamentação da matéria mediante resolução, sendo hígida a norma do CONAMA que define Restinga como a extensão de terra de 300m a partir da linha preamar máxima, conforme Resoluções 04/85, 10/93, 261/99 e 303/02. Indica decisão adotada por esta Turma em caso análogo, também em Itapoá, em agosto/2011.

Com contrarrazões, retornaram os autos para novo julgamento.

O Ministério Público Federal reitera a fundamentação de seu parecer pelo provimento dos recursos de apelação.

É o relatório.

Peço dia.
























Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
Relator



Documento eletrônico assinado por Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do códigoverificador 4877410v8 e, se solicitado, do código CRC 5730A232.

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004571-88.2003.404.7201/SC
RELATORA
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Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
APELANTE
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INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA
ADVOGADO
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Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região
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APELANTE
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UNIÃO FEDERAL
ADVOGADO
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APELADO
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MUNICÍPIO DE ITAPOA/SC

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Marta Regina Bedin
INTERESSADO
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FUNDACAO AMPARO TECNOLOGICO AO MEIO AMBIENTE - FATMA
ADVOGADO
:
Carlos da Costa Soares























VOTO























O meio ambiente ecologicamente equilibrado é protegido pelo art. 225 da CRFB/88, e sua proteção é competência comum da União, dos Estados, do DF e dos Municípios, conforme art. 23, VI e VII, da CRFB/88. Cabe a cada uma destas esferas de governo, nos termos da lei e do interesse preponderante, fiscalizar, licenciar e, em havendo necessidade, autuar.

A Lei 4.771/65 (Código Florestal) traz definições de Área de Preservação Permanente-APP a serem respeitadas, prevendo ainda a interpretação conjunta desta norma com os planos diretores municipais para edificação nos perímetros urbanos:

"Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
(...)
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
(...)
Parágrafo único. No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal,  e nas  regiões  metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, obervar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo."

Esta lei foi regulamentada pelo Decreto 750/93 no que diz respeito ao corte, à exploração e à supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica.

"Art. 3- Para os efeitos deste Decreto, considera-se Mata Atlântica as formações florestais e ecossistemas associados inseridos no domínio Mata Atlântica, com as respectivas delimitações estabelecidas pelo Mapa de Vegetação do Brasil, IBGE 1988: Floresta Ombrófila Densa Atlântica, Floresta Ombrófila Mista, Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual, Floresta Estacional Decidual, manguezais, restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves Florestais do Nordeste."

Para fins desta norma, a Resolução 10/93 do CONAMA disse:

"Art. 5º - As definições adotadas para as formações vegetais de que trata o artigo 4º, para efeito desta Resolução, são as seguintes:
(...)
II - Restinga - vegetação que recebe influência marinha, presente ao longo do litoral brasileiro, também considerada comunidade edáfica, por depender mais da natureza do solo do que do clima. Ocorre em mosaico e encontra-se em praias, cordões arenosos, dunas e depressões, apresentando de acordo com o estágio sucessional, estrato herbáceo, arbustivo e arbóreo, este último mais interiorizado.
(...)"

Em 1999 foi publicada a Resolução 261 que aprovou "como parâmetro básico para análise dos estágios sucessionais de vegetação de restinga para o Estado de Santa Catarina, as diretrizes constantes no Anexo desta Resolução" (art. 1º), constando no texto deste Anexo, sem qualquer delimitação física por metragem/distância, que:

"1. INTRODUÇÃO
"Entende-se por restinga um conjunto de ecossistemas que compreende comunidades vegetais florísticas e fisionomicamente distintas, situadas em terrenos predominantemente arenosos, de origens marinha, fluvial, lagunar, eólica ou combinações destas, de idade quaternária, em geral com solos pouco desenvolvidos. Estas comunidades vegetais formam um complexo vegetacional edáfico e pioneiro, que depende mais da natureza do solo que do clima, encontrando-se em praias, cordões arenosos, dunas e depressões associadas, planícies e terraços.
(...)
2. RESTINGA HERBÁCEA E/OU SUBARBUSTIVA
(...)
2.1 - Vegetação de praias e dunas frontais
a) A vegetação é constituída predominantemente por plantas herbáceas geralmente providas de estolões ou rizomas, com distribuição geralmente esparsa ou formando touceiras, podendo compreender vegetação lenhosa, com
subarbustos em densos agrupamentos, fixando e cobrindo totalmente o solo.
Corresponde aos agrupamentos vegetais mais próximos do mar, recebendo maior influência da salinidade marinha, através de ondas e respingos levados pelo vento.
b) Predominância dos estratos herbáceo e/ou subarbustivo.
c) A altura das plantas geralmente não ultrapassa 1 (um) metro.
d) As epífitas são inexistentes ou raras.
(...)"

Somente em 2002, mediante Resolução 303, o CONAMA definiu restinga e delimitou fisicamente a Área de Preservação Permanente por ela composta:

"Art. 2º Para os efeitos desta Resolução, são adotadas as seguintes definições:
(...)
VIII - restinga: depósito arenoso paralelo a linha da costa, de forma geralmente alongada, produzido por processos de sedimentação, onde se encontram diferentes comunidades que recebem influência marinha, também consideradas comunidades edáficas por dependerem mais da natureza do substrato do que do clima. A cobertura vegetal nas restingas ocorrem mosaico, e encontra-se em praias, cordões arenosos, dunas e depressões, apresentando, de acordo com o estágio sucessional, estrato herbáceo, arbustivos e abóreo, este último mais interiorizado;
(...)
Art. 3º Constitui Área de Preservação Permanente a área situada:
(...)
IX - nas restingas:
a) em faixa mínima de trezentos metros, medidos a partir da linha de preamar máxima;
b) em qualquer localização ou extensão, quando recoberta por vegetação com função fixadora de dunas ou estabilizadora de mangues;
(...)"

Esta nova resolução ainda definiu:

"Art. 2º (...)
XIII - área urbana consolidada: aquela que atende aos seguintes critérios:a) definição legal pelo poder público;
b) existência de, no mínimo, quatro dos seguintes equipamentos de infra-estrutura urbana:
1. malha viária com canalização de águas pluviais,
2. rede de abastecimento de água;
3. rede de esgoto;
4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública ;
5. recolhimento de resíduos sólidos urbanos;
6. tratamento de resíduos sólidos urbanos; e
c) densidade demográfica superior a cinco mil habitantes por km2."

A Lei 6.938/81 dispôs acerca da Política Nacional do Meio Ambiente-PNMA, tendo por "objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana"(art. 2º)

"Art. 10.  A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental.      
§ 1o  Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão publicados no jornal oficial, bem como em periódico regional ou local de grande circulação, ou em meio eletrônico de comunicação mantido pelo órgão ambiental competente.
(...)"   

O licenciamento, na prática, depende da localização do empreendimento/imóvel, de seu tamanho, de sua finalidade, do efetivo impacto causado, o que define o interesse preponderante na atuação da Administração. Assim, por exemplo, é competência federal (IBAMA) o licenciamento de atividades cujo impacto atinja mais de um Estado, é competência estadual empreemdimentos com mais de 20 unidades ou hotéis com acomodação para mais de 100 pessoas, e é competência municipal o alvará para residências ou empreendimentos menores (conforme IN 06 da FATMA, especificamente no Estado de Santa Catarina). Tais regras são decorrência imediata e lógica do potencial de cada empreendimento justificando o interesse pela manifestação de qual esfera da Administração, excepcionandas as atuações da União em bens de sua propriedade.

Especificamente em zonas costeiras, o zoneamento e a urbanização são permitidos, inclusive em terrenos de marinha. Cabe, em qualquer destes casos, o respeito à existência dos planos diretores, à existência de APPs, às licenças/alvarás/autorizações necessárias conforme a propriedade do bem e, ainda, ao regime do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro-PNGC.

Quanto aos terrenos de marinha e seus acrescidos, são bens da União conforme art. 20, VII, da CRFB/88, que recepcionou o Decreto-lei 9.760/46, assim definindo:

"Art. 2º - São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar médio de 1831:
a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés;
b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se façam sentir a influência das marés.
Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo menos do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano.
Art. 3º - São terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha."

Sobre tais terrenos é devido pelos ocupantes o pagamento de taxas à União (SPU), autorizadas construções nos termos da legislação de regência e, a partir da Lei 9.636/98 permitida a sua alienação, quando não afetados ao serviço público.

Os terrenos da marinha localizam-se na Zona Costeira, regulada pela Lei 7.661/89, que ainda instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro-PNGC:

"Art. 2º (...)
Parágrafo único. Para os efeitos desta lei, considera-se Zona Costeira o espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre, que serão definida pelo Plano.
(...)
"Art. 3º. O PNGC deverá prever o zoneamento de usos e atividades na Zona Costeira e dar prioridade à conservação e proteção, entre outros, dos seguintes bens:
I - recursos naturais, renováveis e não renováveis; recifes, parcéis e bancos de algas; ilhas costeiras e oceânicas; sistemas fluviais, estuarinos e lagunares, baías e enseadas; praias; promontórios, costões e grutas marinhas; restingas e dunas; florestas litorâneas, manguezais e pradarias submersas;
(...)
Art. 5º. O PNGC será elaborado e executado observando normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente, estabelecidos pelo CONAMA, que contemplem, entre outros, os seguintes aspectos: urbanização; ocupação e uso do solo, do subsolo e das águas; parcelamento e remembramento do solo; sistema viário e de transporte; sistema de produção, transmissão e distribuição de energia; habitação e saneamento básico; turismo, recreação e lazer; patrimônio natural, histórico, étnico, cultural e paisagístico.
§ 1º Os Estados e Municípios poderão instituir, através de lei, os respectivos Planos Estaduais ou Municipais de Gerenciamento Costeiro, observadas as normas e diretrizes do Plano Nacional e o disposto nesta lei, e designar os órgãos competentes para a execução desses Planos.
§ 2º Normas e diretrizes sobre o uso do solo, do subsolo e das águas, bem como limitações à utilização de imóveis, poderão ser estabelecidas nos Planos de Gerenciamento Costeiro, Nacional, Estadual e Municipal, prevalecendo sempre as disposições de natureza mais restritiva.
Art. 6º. O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalação, funcionamento e ampliação de atividades, com alterações das características naturais da Zona Costeira, deverá observar, além do disposto nesta Lei, as demais normas específicas federais, estaduais e municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.
§ 1º. A falta ou o descumprimento, mesmo parcial, das condições do licenciamento previsto neste artigo serão sancionados com interdição, embargo ou demolição, sem prejuízo da cominação de outras penalidades previstas em lei.
§ 2º Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável pela atividade a elaboração do estudo de impacto ambiental e a apresentação do respectivo Relatório de Impacto Ambiental - RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei.

Em síntese, vê-se que o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro-PNGC tem como uma de suas metas compatibilizar o crescimento urbanos nas zonas costeiras com a preservação ambiental, eis que não veda a ocupação da Zona Costeira, apenas a regula para preservação de áreas como de restinga, possibilitando instituição de Planos de Gerenciamento por Estados e Muncípios, e sempre exigindo para o licenciamento das obras EIA/RIMA.

A compatibilização do crescimento urbano com a preservação ambiental também se vê na edição da Lei 11.428/06, que dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica, o qual abrange a restinga:

"Art. 1o  A conservação, a proteção, a regeneração e a utilização do Bioma Mata Atlântica, patrimônio nacional, observarão o que estabelece esta Lei, bem como a legislação ambiental vigente, em especial a Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965. 
Art. 2o  Para os efeitos desta Lei, consideram-se integrantes do Bioma Mata Atlântica (...) as vegetações de restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste.
(...)
Art. 12.  Os novos empreendimentos que impliquem o corte ou a supressão de vegetação do Bioma Mata Atlântica deverão ser implantados preferencialmente em áreas já substancialmente alteradas ou degradadas
Art. 14 (...)
§ 2o  A supressão de vegetação no estágio médio de regeneração situada em área urbana dependerá de autorização do órgão ambiental municipal competente, desde que o município possua conselho de meio ambiente, com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico.
(...)
Art. 17.  O corte ou a supressão de vegetação primária ou secundária nos estágios médio ou avançado de regeneração do Bioma Mata Atlântica, autorizados por esta Lei, ficam condicionados à compensação ambiental, na forma da destinação de área equivalente à extensão da área desmatada, com as mesmas características ecológicas, na mesma bacia hidrográfica, sempre que possível na mesma microbacia hidrográfica, e, nos casos previstos nos arts. 30 e 31, ambos desta Lei, em áreas localizadas no mesmo Município ou região metropolitana. 
§ 1o  Verificada pelo órgão ambiental a impossibilidade da compensação ambiental prevista no caput deste artigo, será exigida a reposição florestal, com espécies nativas, em área equivalente à desmatada, na mesma bacia hidrográfica, sempre que possível na mesma microbacia hidrográfica.  
§ 2o  A compensação ambiental a que se refere este artigo não se aplica aos casos previstos no inciso III do art. 23 desta Lei ou de corte ou supressão ilegais." 

Vê-se, pois, que não é absolutamente vedado o corte e supressão da Mata Atlântica, estando a lei a regular prioridades de ocupação (art. 12) bem como prever formas de compensação ambiental (art. 17).

Vejamos o caso dos autos.

A empresa MM EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, sob a supervisão do sócio e engenheiro civil MAURÍCIO DINARDI e mediante alvará do MUNICÍPIO DE ITAPOÁ/SC (Alvará de Construção 5528/02, fl. 298), iniciou o empreendimento CONDOMÍNIO RESIDENCIAL CANCUN BEACH RESIDENCE em zona urbana do Município, com 34 casas em área de 6.725,65m2 e ocupando área total de 18.499,69m2 à beira-mar.

A FATMA manifestou-se contrária à edificação em junho/2003 (fls. 62ss), por violação à Resolução CONAMA 303/02. Em julho/2003 lavrou auto de infração e embargou a obra (fl. 74). Em setembro/2003 a FATMA e a empresa firmaram TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) comprometendo-se esta a, "no mínimo": (a) recuperar toda a área frontal do empreendimento com espécies nativas, (b) doar todas as mudas de árvores necessárias ao Município para que recupere toda sua orla marítima, (c) doar ao Município 5.000m2 de terra, em área urbana, para fins de instalação de parque ou similar de uso público e (d) doar R$ 25.000,00 para elaboração de projetos de demarcação de área não passível de edificação (fls. 140ss).

No mesmo TAC a empresa reconheceu violação à Resolução 303/02 e a FATMA, nos termos desta mesma norma, reconheceu que a área em comento diz respeito à zona urbana consolidada. O embargo foi suspenso e a empresa autorizada a terminar a obra, vedada sua comercialização.

No mês seguinte, agosto/2003, a vistoria da FATMA apontou que a implantamção do condomínio estaria ocorrendo a 25m da preamar média, desrespeitadas as licenças e o terreno de marinha que dista 33m da preamar média, além de aferir a existêndia de dano ambiental nesta área.

Em outubro/2003 o Ministério Público Federal ajuizou esta AÇÃO CIVIL PÚBLICA postulando a anulação das licenças e alvarás concedidos e a condenação dos réus à demolição de toda a obra, não apenas a área em terreno de marinha mas toda aquela existente na distância de 300m a contar da preamar máxima por configurar APP (Resolução 303/02), além de pugnar por condenação pecuniária.

Foi realizada perícia técnica judicial in locu, juntada aos autos às fls. 827ss. Trouxe os seguintes esclarecimentos.

Conforme planta do imóvel sobreposta ao laudo da Secretaria do Patrimônio da União-SPU, dos cerca de 18.500m2 do imóvel 6.410,60m2 são terreno de marinha. Ou seja, 34,65% de área da União, cujo Município padece de competência para licenciar. Enfatizo que a construção neste local não é vedada pelo simples fato da natureza "terreno de marinha", mas dependente de licença da entidade competente. Eventual vedação poderá ser decorrente da configuração de Área de Preservação Permanente em terreno de marinha. Ainda, a vistoria realizada pela FATMA já havia constatado desrespeito às autorizações concedidas, porque a construção estaria distante 25m da linha do preamar médio.

Tenho que o condomínio está parcialmente irregular.

Embora possível a construção em terreno de marinha, indispensável sejam concedidas as licenças pelos órgãos competentes. No caso dos autos, este é o problema encontrado no empreendimento. Inexistindo licenciamento, existindo construção além da licença municipal, há construção em terreno de marinha caracterizado como zona costeira e que, conforme perícia, embora não indique a existência de restinga nos 300 metros que pretende o MPF, indica a existência de vegetação nativa, inclusive princípios de dunas, no entorno leste (divisa física do empreendimento com a areia e o oceano). Invadindo 8 metros do terreno de marinha, esta é a área em que o dano ambiental é presumido, em que as licenças concedidas não são regulares, e que conforme manifestou a proprietária da área (União), devem ser demolidas. Para além do terreno de marinha, trata-se de zona urbana consolidade cujo alvará concedido pelo município é suficiente para garantir a regularidade da construção, não demonstrado de forma inequívoca que se trata de restinga protegida pela Resolução 303/02 do CONAMA.

Assim, há que ser demolido o muro que indevidamente obsta o movimento natural das dunas no terreno de marinha, bem como toda e qualquer construção dentro dos 33m além da linha do preamar médio. A área deve ser recuperada às expensas do condomínio réu, que deverá cumprir ainda, integralmente, os termos do Termo de Ajustamento de Conduta firmado com a FATMA: doação de todas as mudas de árvores necessárias ao Município para que recupere toda sua orla marítima; doação ao Município 5.000m2 de terra, em área urbana, para fins de instalação de parque ou similar de uso público e doeção de R$ 25.000,00 para elaboração de projetos de demarcação de área não passível de edificação (já cumprida em parte).

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento aos recursos de apelação.























Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
Relator



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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/04/2012
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004571-88.2003.404.7201/SC
ORIGEM: SC 200372010045711


RELATOR
:
Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
PRESIDENTE
:
FERNANDO QUADROS DA SILVA
PROCURADOR
:
Dr(a)Carlos Eduardo Copetti Leite
APELANTE
:
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA
ADVOGADO
:
Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região
APELANTE
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
APELANTE
:
UNIÃO FEDERAL
ADVOGADO
:
Procuradoria-Regional da União
APELADO
:
MUNICÍPIO DE ITAPOA/SC

:
CONDOMINIO RESIDENCIAL CANCUN BEACH RESIDENCE e outros
ADVOGADO
:
Marta Regina Bedin
INTERESSADO
:
FUNDACAO AMPARO TECNOLOGICO AO MEIO AMBIENTE - FATMA
ADVOGADO
:
Carlos da Costa Soares





Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18/04/2012, na seqüência 18, disponibilizada no DE de 10/04/2012, da qual foi intimado(a) UNIÃO FEDERAL, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.





Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS.





RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA
VOTANTE(S)
:
Des. Federal MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA

:
Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ

:
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA









Letícia Pereira Carello
Diretora de Secretaria



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