“Respeito as ONGs que estão aqui presentes, mas não respeito a WWF e o Greenpeace. Sou um deputado brasileiro, não aceito cobrança de gente da Europa que não tem moral para fazer isto”, afirmou o deputado federal, da bancada ruralista, Luis Carlos Heinze (PP-RS), o primeiro a se manifestar na reunião da Comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa gaúcha, que contou com a presença do relator do novo Código Florestal, deputado Paulo Piau (PMDB-MG), realizada na tarde desta segunda (21). O Espaço Adão Pretto, uma pequena sala no Parlamento estadual, estava dividido. De um lado da bancada central em que estavam os parlamentares, ficaram apoiadores do novo texto, como representantes de sindicatos rurais. De outro, ambientalistas, com cartazes, camisetas e adesivos contra as mudanças no Código Florestal. A resposta a Heinze não tardou a vir deste lado da sala.
– Sou do Greenpeace e sou brasileiro! – esbravejou um jovem que segurava um cartaz pedindo “Veta tudo, Dilma”.
– Cala a boca! – respondeu alguém do outro lado da sala.
Antes da sessão, na Praça da Matriz, cerca de vinte representantes de diversas instituições de defesa do meio-ambiente, como Apedema e Agapan, discursavam em um carro de som, enquanto Piau chegava ao Espaço Adão Pretto, recebendo efusivos abraços de deputados federais e estaduais gaúchos do PMDB, PP e PTB. O clima na sessão nunca chegou a ser tenso, sem qualquer sinal de algo mais do que provocações. Alheio ao acirramento, Paulo Piau foi cordato. Ficou até o final da sessão, ouviu as críticas duras de ecologistas e as respondeu ao final de maneira polida.
Piau (à dir.) disse que foi à Assembleia gaúcha para "contar a verdade" sobre o texto que elaborou | Foto: Marcelo Bertani/Ag. AL
Relator acredita que Dilma vetará parcialmente o texto
À imprensa, o deputado mineiro revelou que acredita em um veto parcial da presidenta Dilma Rousseff — que tem até a próxima segunda-feira (28) para publicar sua decisão no Diário Oficial. Demonstrou que a preocupação maior é que a presidenta não vete todo o texto, ou sua essência. Piau afirmou que se a presidenta fizer isto será para “ganhar alguns aplausos dos ambientalistas na Rio+20″, mas acabaria por “prejudicar o Brasil inteiro”. “Acredito na sensibilidade da presidente e que ela não vai tomar uma decisão política-eleitoreira”, disse. “Se ela vetar a essência do projeto corre com certeza risco de nós derrubarmos seu veto”, completou.
O peemedebista afirmou que a campanha pelo veto total é amplificada por multidões nas redes sociais, mas parte de “meia dúzia que tiram proveito do meio-ambiente por interesses outros”. “Olha, esta campanha de Veta tudo, Dilma… Se as pessoas tivessem consciência do reflexo que isto pode ter, com certeza não fariam. Acho que é uma campanha que a presidente, com toda sua informação, não levará em consideração”, disse.
Paulo Piau também reclamou que a imprensa estaria propagando coisas que não estão no texto relatado por ele e disse que aceitou o convite para falar na Comissão de Agricultura da AL para “contar a verdade do que está no texto, não aquilo que estão dizendo que está no texto”. Ele afirmou, por exemplo, que o novo Código não estimula o desmatamento e também defendeu a anistia a quem desmatou no passado. “Primeiro, o que está escrito não estimula derrubar uma só árvore no território brasileiro e todo o dia nós estamos vendo na imprensa que o código estimulará o desmatamento. Não é verdade. Segundo, com relação à anistia. Nossos antepassados, que subiram rio acima, construíram nossas cidades e fizeram agricultura à beira dos rios, que é onde era possível fazer. Agora estão chamando nossos antepassados de criminosos”, disse.
"O povo queria alterar o Código Florestal" | Foto: Marcelo Bertani/Ag. AL
“Legislação atual comprometeria 2 milhões de famílias”, diz Piau
Com o dito objetivo de “contar a verdade” sobre seu relatório, Piau fez extensa apresentação, que durou mais de uma hora. Durante sua fala, explicou que o código não é uma “obra acabada”, que pode haver correção de rumos, mostrando, por exemplo, que o atual código vigente teria sofrido 16 mil alterações desde 1965, quando foi criado. Ele também falou que seu texto tinha viés ambiental, produtivo e social, visando evitar que se aumente o êxodo rural. “Se for aplicar a legislação atual, 2 milhões de famílias teriam seu trabalho comprometido. O trabalhador rural está em extinção. Um dos princípios que norteou o novo Código foi que não podemos expulsar um homem sequer do campo”.
O peemedebista também usou o discurso nacionalista, comparando a preservação no país com outras nações e afirmando que a Amazônia “caminha para a internacionalização”. Piau contou que um novo Código Florestal é discutido desde 1999, mas a pressão aumentou quando muitos produtores começaram a ter que assinar Termos de Ajustamento de Conduta. Ele afirmou que, a partir disto, vários deputados protocolaram propostas alterando o Código. “Se o deputado é representante do povo, então o povo queria alterar o Código Florestal”.
O relator também afirmou que manteve 98% do texto do Senado. Segundo Piau, seu texto “definiu melhor” o que é topo de morro, leito regular de rio, entre outras questões que têm gerado polêmica, justamente pela definição dada por ele. A medição do leito de rio para o relatório de Piau, por exemplo, desconsidera as épocas de cheias; assim é possível, em teoria, desmatar uma área maior. Ainda assim, ele garante que seu texto “coíbe terminantemente novos desmatamentos”.
O deputado defendeu ainda que não pode haver normas nacionais muito específicas, definindo, por exemplo, quantos metros na beira de rio é área de preservação permanente. “A União faz normas gerais e os estados e municípios as específicas. O Brasil é muito diverso, não pode haver a mesma regra para a Amazônia e para a caatinga”, disse.
Após apresentação, Piau ouviu as críticas de ambientalistas | Foto: Marcelo Bertani/Ag. AL
Deputado ouviu críticas duras de ambientalistas
A reunião da Comissão de Agricultura seria previamente das 14 às 16h, mas a apresentação de Paulo Piau se estendeu até as 15h30. Ainda assim, o relator do novo Código Florestal não saiu pela tangente e ouviu até as 17h as manifestações de ambientalistas, de representantes de entidades rurais e dos demais deputados. Depois, respondeu alguns pontos do que foi falado. Também no momento das manifestações, o clima foi quente, com ambientalistas interrompendo os contrários e deputados como Jerônimo Goergen (PP-RS) e Darcisio Perondi (PMDB-RS) respondendo com ironia a falas de defensores das florestas.
– Eu trabalho na Smam (Secretaria Municipal de Meio-Ambiente) – disse um jovem, que seria impedido de falar por fazer parte da mesma entidade ambiental que outra pessoa que já fizera uso da palavra.
– Tu não devias estar lá? – retrucou Jerônimo Gorgen, que acabou ouvindo uma resposta ácida do colega de partido Beto Moesch, vereador de Porto Alegre: — Eu também deveria estar na Câmara Municipal, mas a Câmara entendeu que era mais importante estar aqui.
O presidente da Agapan, Francisco Milanez, rebateu em sua fala o discurso nacionalista dos deputados ruralistas, afirmando que a Agapan, mais antiga entidade ambientalista do país, nunca teve dinheiro estrangeiro e que também há interesse estrangeiro no novo Código Florestal, como das multinacionais do alimento. “O discurso do relator é de uma incoerência nunca antes vista. Há interesses exóticos ao Brasil na Amazônia da Cargill, por exemplo, que tem um porto em Santarém”.
Milanez afirmou que nossos antepassados não tiveram má-fé ao desmatarem áreas como topos de morro ou beiras de rio, mas que fizeram isto por ignorância. Hoje, com o conhecimento científico ele defendeu que é preciso aumentar as áreas de floresta, até mesmo para os interesses dos produtores. “Estamos perdendo mais, safra após safra, pela irregularidade climática”.
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