Estilac pede suspensão do auxílio-moradia a juízes, mas é derrotado no Tribunal de Contas
Samir Oliveira
A sessão do Tribunal de Contas do Estado (TCE) nesta quarta-feira
(11) sepultou a possibilidade de que o auxílio-moradia pago a juízes
estaduais deixe de ser desembolsado pelos cofres públicos até que seja
julgado a legalidade do benefício. O conselheiro Estilac Xavier
apresentou um relatório favorável à suspensão, mas foi derrotado no voto
por seus colegas. Adroaldo Loureiro, Algir Lorenzon e Iradir Pietroski
resolveram ignorar os argumentos expostos durante mais de uma hora por
Estilac e acompanhar o entendimento de Marco Peixoto, que não vê
problemas no pagamento desse privilégio aos magistrados gaúchos.
O auxílio-moradia – chamado pelos juízes de Parcela Autônoma de
Equivalência (PAE) – foi instituído no dia 3 de fevereiro de 2010 por
meio de um ato administrativo do então presidente do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul (TJ-RS), Leo Lima. O argumento dos magistrados
estaduais é de que os juízes federais já recebem o benefício,
equivalente ao pagamento de auxílio-moradia a deputados federais entre
1994 e 1998, que foi incorporado ao salário dos ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF).
Em auditoria realizada na folha de pagamento do TJ-RS em 2010, o
Tribunal de Contas constatou em detalhes como é feito o desembolso. Um
magistrado que esteja pelo menos desde 1994 na Justiça estadual tem
direito a R$ 115 mil de auxílio moradia, mais R$ 275 mil da correção
aplicada pelo IGPM e mais R$ 430 mil dos juros, totalizando R$ 820 mil. O
valor é distribuído de forma parcelada ao longo dos meses sobre um
salário que já está dentre os mais altos do Estado.
O privilégio recai sobre a remuneração, fazendo com que muitos juízes
recebam, na prática, um salário muito acima do que é permitido pela
Constituição, que estipula um teto de R$ 26,7 mil. Somando todos os
magistrados que recebem o auxílio-moradia, o custo para os cofres
públicos ultrapassa os R$ 600 milhões.
Em agosto do no passado, o Tribunal de Contas já havia declarado a
legalidade do pagamento. O julgamento do auxílio-moradia ocorreu sem ter
sido publicado previamente na pauta da respectiva sessão e durou pouco
mais de 30 segundos, já que o relator, César Santolim, apenas disse que
considerava válido o benefício, sendo acompanhado pelos colegas.
Sob orientação expressa do governador Tarso Genro (PT), a
Procuradoria-Geral do Estado (PGE) recorreu da decisão no ano passado. O
Ministério Público de Contas (MPC) também entrou com recurso. Os dois
órgãos exigiram a retomada do julgamento sobre a validade do pagamento
de auxílio-moradia, processo que ainda não foi apreciado.
O que foi julgado na sessão desta quarta-feira (11) pelo TCE foram os
dois agravos solicitados também pelo MPC e pela PGE, que pediam a
edição de uma medida cautelar suspendendo o pagamento do benefício até
que o tribunal se posicione novamente sobre o mérito da questão. O
relator dos agravos é Marco Peixoto, que não viu motivos para suspender o
auxílio-moradia.
Como Estilac Xavier pediu vistas ao processo, acabou relatando a
matéria nesta quarta-feira. Ele observou que a Secretaria Estadual da
Fazenda nunca foi notificada sobre os custos do pagamento para os cofres
públicos e lamentou os danos que a concessão do benefício causam a um
Estado que não está numa situação financeira confortável.
Não há previsão de quando ocorrerá a sessão que julgará os recursos
da PGE e do MPC para avaliar a legalidade do auxílio-moradia.
“Há um receio de tomar uma decisão contrária ao Poder Judiciário”, critica deputado
O deputado estadual Jeferson Fernandes (PT) é o único parlamentar da
Assembleia Legislativa que critica abertamente o pagamento de
auxílio-moradia aos juízes estaduais. Na legislatura passada, apenas
Nelson Marchezan Júnior (PSDB) – que agora é deputado federal – pautava o
assunto.
O petista acompanhou a sessão do Tribunal de Contas do Estado nesta
quarta-feira (11) e lamentou a decisão de não suspender o pagamento do
auxílio-moradia até o TCE julgar a legalidade do benefício. “Todos os
elemtnso técnicos foram desrespeitados pelo tribunal. Nitidamente há um
receito de tomar uma decisão contrária ao Poder Judiciário”, disparou.
O petista observou que os conselheiros não apresentaram “nenhuma
justificativa para manter o pagamento” e que “não há fundamento legal ou
moral” que permita a perpetuação do privilégio. “A confiança no
Tribunal de Contas passa a ser fragilizada. É um desrespeito ao dinheiro
público”, comentou.
Jeferson Fernandes alega que a Procuradoria-Geral do Estado tem poder
para suspender imediatamente o pagamento de auxílio-moradia, já que o
benefício foi instituído por um ato administrativo do Tribunal de
Justiça. O deputado pretende conversar com o procurador-geral Carlos
Henrique Kaiper sobre o assunto. “Cabe à PGE orientar o Executivo para
que seja suspenso o pagamento até o julgamento do mérito. A procuradoria
deveria ter coragem de tomar essa atitude”, defendeu.
Ajuris diz que está convicta da legalidade do pagamento
O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris),
Pio Giovani Dresch, acompanhou a sessão do Tribunal de Contas do Estado
nesta quarta-fera (11) e garantiu que está tranquilo quanto à defesa do
que os magistrados chamam de Parcela Autônoma de Equivalência (PAE).
“Essa votação confirmou uma decisão que o tribunal já havia tomado por
unanimidade. Aguardamos ainda a decisão do mérito e estamos confiantes
de que será favorável”, opinou.
O juiz garante que o pagamento de auxílio-moradia encontra respaldo
legal. “A legalidade da PAE já foi reafirmada em diferentes instâncias,
como o Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional de Justiça. Não
temos temor de que possa haver o reconhecimento de uma ilegalidade”,
assegura.
Geraldo Da Camino questiona caráter do auxílio-moradia
Mesmo que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) venha a decidir que o
auxílio-moradia aos juízes gaúchos é ilegal, dificilmente o dinheiro já
pago aos magistrados retornará aos cofres públicos do Rio Grande do Sul.
Isso porque há na jurisprudência um princípio já consagrado que diz que
pagamentos efetuados de boa fé e com caráter alimentar não podem ser
devolvidos.
O procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC), Geraldo Da
Camino, questiona a aplicação desse princípio para o caso gaúcho. “Tenho
dificuldade de vislumbrar esse caráter alimentar em valores tão
expressivos para beneficiários que já recebem remuneração próxima ao
teto salarial do Estado. Não me parece que alguém seria privado da sua
subsistência se esses pagamentos fossem sustados”, declarou, em
entrevista após a sessão desta quarta-feira (11) do Tribunal de Contas
do Estado.
Como o MPC foi um dos órgãos que entrou com recurso para que o TCE
volte a julgar a legalidade do auxílio-moradia, Da Camino evitou se
manifestar abertamente sobre o mérito do benefício, já que ele terá que
emitir um parecer sobre o tema quando o processo for apreciado.
O procurador explicou que dois princípios jurídicos embasaram o
agravo regimental apresentado, solicitando que o TCE suste os pagamentos
até que o mérito seja julgado: o perigo na demora em não se adotar essa
medida e a suposição de verossimilhança na afirmação de que a concessão
do benefício é ilegal.
Auditores apontam contradições no posicionamento dos conselheiros
O presidente do Centro dos Auditores Públicos Externos do Tribunal de
Contas do Estado, Amauri Perusso, não esconde o descontentamento com a
forma como a cúpula do TCE vem tratando o julgamento do auxílio-moradia
aos juízes gaúchos. Ele sustenta que o trabalho técnico dos servidores,
que aponta a irregularidade do benefício, vem sendo desprezado pela
maioria dos conselheiros.
Numa audiência pública sobre o tema na semana passada, Amauri disse
que César Santolim, que julgou pela primeira vez o assunto em agosto do
ano passado, “destruiu” em alguns segundos todo o trabalho feito pelos
técnicos ao simplesmente alegar a legalidade do auxílio-moradia sem
apresentar nenhum argumento que sustentasse a posição. Nesta
quarta-feira (11), o auditor apontou incoerências na posição do
conselheiro Adroaldo Loureiro, que disse ter “sérias dúvidas” sobre o
pagamento do privilégio, mas acabou votando pela não suspensão do
benefício.
“Ele apresenta dúvidas e tem sensibilidade em relação ao voto do
Estilac e, no entanto, comodamente, se dispõe a acompanhar a posição de
Marco Peixoto. Na dúvida se protege o erário público, não se introduz a
incoerência”, critica.
Fonte: SUL 21
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