
Presidente é alvo de animosidade mais evidente do que outros líderes franceses
Se o presidente francês, Nicolas
Sarkozy, falhar em conquistar um segundo mandato nas eleições
presidenciais de domingo, um grande culpado seria o fato de ele ser
rejeitado por muitos franceses. Mas qual é o motivo por trás dessa
rejeição?
Desde que assumiu a Presidência, em 2007, nenhum
presidente francês da era moderna havia sido objeto de um
descontentamento tão evidente.
Afinal, todos os líderes são alvo de objeção por suas decisões. Poucos, porém, são odiados num nível mais pessoal.
"Existe uma raiva irracional contra Sarkozy
entre grande parte do público, e essa raiva terá um papel importante nas
eleições", opina Jean-Sebastien Ferjou, que edita o site noticioso
Atlantico.
"Digo irracional porque é isso o que é.
Pesquisas indicam que, se você pergunta à população sobre esta ou aquela
política de Sarkozy - sem mencionar o nome dele -, as pessoas tendem a
apoiá-las. Mas não votarão nele."
Sarkozy disputará o primeiro turno deste domingo
principalmente contra o candidato socialista François Hollande - os
dois favoritos se alternam no topo das pesquisas de intenções de voto,
que destacam também um alto número de indecisos.
Para o segundo turno, em maio, algumas pesquisas
indicam vantagem de Hollande - em parte porque eleitores entrevistados
dizem não querer votar em Sarkozy.
Abertamente de direita
De acordo com Ferjou, a principal razão para a
hostilidade de parte do eleitorado é o fato de Sarkozy ter sido o
primeiro líder francês a declarar-se abertamente de direita.
"É irônico, porque, na verdade, ele é totalmente
desestruturado ideologicamente. Seu talento é (usado) para energia e
movimento, é impossível entender suas origens intelectuais", agrega o
editor. "Mas ele passou uma mensagem muito clara de que não sentia
vergonha de dizer que era de direita - e isso despertou uma forte onda
de hostilidade."
Ferjou explica que, para entender isso, é
preciso lembrar que, durante anos, a direita da França abandonou
complementamente o debate intelectual, que ficou a cargo da esquerda.

Sarkozy não demonstrou vergonha de seu alinhamento à direita
"Para os chamados partidos direitistas, o único
argumento era de que eles eram melhores administradores do que os
políticos de esquerda. Mas eles haviam se rendido na batalha de ideias e
de valores. E Sarkozy pôs fim a isso, fazendo com que muitos o
odiassem."
'Sarkofobia'
O tom desta 'Sarkofobia' é dado em cafés e
salões culturais burgueses de Paris, onde o presidente é frequentemente
descrito como vulgar, obcecado por dinheiro, meio racista e perigoso.
Recentemente, o cineasta Mathieu Kassowitz disse
que, se Sarkozy passar para o segundo turno eleitoral, ficará provado
que a França virou um país "colaboracionista neofascista".
Cinco anos após sua vitória presidencial, em
2007, ter sido celebrada em um caro restaurante em Champs-Élysées,
Sarkozy ainda é criticado por seu suposto estilo de vida de "alta
sociedade".
No entanto, é bom lembrar que socialistas
graduados também são comumente flagrados em sofisticados restaurantes
parisienses. O ex-presidente François Mitterrand (que teve dois mandatos
entre 1981 e 1995), por exemplo, tinha uma grande quantidade de amigos
endinheirados.
Verdades inconvenientes
Para o advogado de direita Gilles-William
Goldnadel, as raízes da rejeição a Sarkozy vêm de uma cultura ainda
refém da sedução da esquerda.
"É aquela velha tradição revolucionária e
romântica que ataca tudo que diga respeito a dinheiro e privilégios",
declara. "E isso se soma ao fato de que a maioria dos jornalistas é
esquerdista."
Outra interpretação da Sarkofobia é dada pelo
escritor Andre Bercoff, autor de "La Chasse au Sarko" (A caçada a Sarko,
em tradução livre). Para ele, a aversão a Sarkozy não tem motivações
ideológicas: "É porque ele descumpriu as regras sobre como ser
presidente. Quando (Charles) De Gaulle criou a 5ª República, criou uma
Presidência que era como uma monarquia. E desde então todos os
presidentes, de direita ou esquerda, cumpriram isso tranquilamente. Mas
aí veio Sarkozy e disse: 'Não quero ser um rei. Quero ser um político,
um técnico de futebol'. E muita gente se ressente dele por isso."
Para Bercoff, a outra razão pela qual muitos desprezam Sarkozy é por ele ter dito aos franceses algumas verdades inconvenientes.

Para sociólogo da Sorbonne, presidente (à dir.) ainda está afinado com grande parte da população
"Os franceses estavam felizes em serem liderados
por pessoas como Mitterrand ou (Jacques) Chirac, líderes que nutriam
sua crença pós-revolucionária de que os franceses eram uma espécie de
povo escolhido para quem as regras normais da economia não se aplicam",
diz. "Mas Sarkozy destruiu essa ilusão."
Afinado
Ferjou, Goldnadel e Bercoff não creem que Sarkozy vencerá, e atribuem essa crença à rejeição ao presidente.
Mas, na Universidade Sorbonne, o professor de
sociologia Michel Maffesoli não tem tanta certeza. Para ele, apesar do
desprezo a Sarkozy exposto na mídia, o presidente ainda conta com uma
boa reputação entre grande parte da opinião pública.
"A pós-modernidade, para onde estamos nos
movendo, é muito mais ancorada no emocional do que no intelectual",
opina. "E Sarkozy captou isso instintivamente. Ele está muito mais
afinado com as pessoas comuns do que os intelectuais."
Maffesoli não acredita em pesquisas de opinião,
por achar que as pessoas dizem o que se espera que elas digam - e,
assim, minimizam seu apoio a Sarkozy.
"Mas é diferente na cabine eleitoral. Ali as pessoas se reconectam com o emocional. Por isso acho que Sarkozy pode ganhar."
Fonte: BBC
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