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quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Homem de aço


Rogério Tuma

As cirurgias cardíacas exigem frequentemente que o coração pare de bater para o cirurgião manipulá-lo com segurança. Para tanto, foi desenvolvida a circulação extracorpórea, uma máquina enorme com roletes que precisa de pelo menos duas pessoas para manuseá-la durante a cirurgia. Esse conceito iniciou uma corrida científica para a criação de um dispositivo portátil, permanente e que possa substituir o coração humano sem causar rejeição pelo corpo em que for implantado. Este é o coração artificial.
O trajeto do sangue pelo coração não é difícil de entender. O coração é uma bomba com quatro cavidades: as que recebem o sangue são os átrios, e as que mandam sangue para os outros órgãos são os ventrículos. Portanto, temos um átrio e um ventrículo direito e outro par à esquerda.
A bomba cardíaca tem função dupla. Ela precisa mandar o sangue oxigenado para os tecidos, mas também o sangue que volta com gás carbônico para os pulmões. O lado direito é o que recebe o sangue dos tecidos e o manda para os pulmões. E o lado esquerdo recebe o sangue renovado dos pulmões e o envia para o restante do corpo.
Então o trajeto do sangue é o seguinte: passa pelos tecidos, átrio direito, ventrículo direito, pulmões, átrio esquerdo, ventrículo­ esquerdo e novamente os tecidos. Os vasos que levam o sangue para o coração são chamados de veias. E as artérias transportam o sangue ejetado do coração. A artéria mais importante é a aorta, que está ligada ao ventrículo esquerdo e nela passa todo o sangue oxigenado que nutre os tecidos.
O nome verdadeiro do coração artificial mais avançado no momento é um dispositivo de auxílio do ventrículo esquerdo, o que significa que o aparelho não é um coração completo, mas apenas auxilia e não substitui o coração. E sua função é trabalhar em paralelo ao ventrículo esquerdo, recebendo o sangue do átrio esquerdo e mandando-o para a aorta. A entrada desta bomba auxiliadora fica na ponta do ventrículo esquerdo e sua abertura de saída é ligada à aorta. Este tipo de sistema é implantado dentro do tórax do paciente.
Existem duas correntes científicas em competição para fazer o dispositivo, uma americana e outra alemã. O modelo alemão parece mais bem-sucedido, pertence ao Berlin Heart GmH, que desenvolveu dois modelos de dispositivos, um externo e outro interno. O sistema interno é o mais avançado, chama-se Incor, em homenagem subliminar ao instituto brasileiro onde um dos engenheiros alemães fez um estágio. E é um equipamento de terceira geração, isto é, sua estrutura física e software são muito mais avançados.
Durante a primeira cirurgia feita no Brasil para a colocação de um dispositivo desta complexidade, ocorrida há quatro semanas, o que mais chamava a atenção na sala foi a curiosidade e a alegria do doutor Adib Jatene ao manipular a genial engenhoca.
O veterano da área a comparou com uma centrífuga para enriquecimento de urânio, capaz de girar a 80 mil rotações por minuto sem fazer qualquer ruído. “Não há mancal na máquina, mas uma rosca sem fim gira até 10 mil rotações por minuto, flutuando em um campo magnético giratório”, disse Jatene. “A vantagem de se utilizar o campo magnético é que a máquina pouco se aquece e é extremamente silenciosa, os primeiros corações artificiais faziam um barulho ensurdecedor.”
O Berlin Heart aspira o sangue do ventrículo esquerdo e o injeta diretamente na aorta, em um fluxo contínuo, não pulsátil, que atinge além de 6 litros por minuto, a quantidade de sangue que um indivíduo de 80 quilos de peso normalmente precisa para nutrir todo o seu corpo. Ainda temos muito a evoluir, mas a via de aprendizado é expressa e promissora.

Fonte: CARTACAPITAL

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