Imprevisível
como sempre, ela chegou dois dias antes do anunciado — privilégio de
quem voa no seu próprio avião. É com este avião que Amy Winehouse
seguirá para todos os shows no Brasil, voltando ao fim de cada
apresentação para seu hotel carioca, em Santa Teresa.
Encastelada na montanha, cercada de seguranças, Amy Winehouse
surpreendeu também ao pedir uma bicicleta de ginástica, pesos e um
tapete de pilates, além de ir à piscina em sua primeira manhã no Rio.
Ela, que disse “não, não, não” à clínica de desintoxicação no seu hit
“Rehab”, parece passar por um surto de saúde às vésperas da turnê que
vai revelar se a estrela ainda guarda a mesma chama, depois de uma
devastadora temporada no inferno das drogas e da bebida.
Em 2008, no Rock in Rio Lisboa, Amy foi um fracasso e quase não
conseguiu cantar. Em 2009, faltou ao show dos 50 anos da sua gravadora
(Island) e foi processada por armar um barraco, aos palavrões, na
apresentação da peça infantil Cinderella, em Londres.
Ano passado, numa canja no show do cantor brasileiro Rodrigo
Lampreia, num pub de Londres, Amy cantou uma versão de “Garota de
Ipanema” tão “desconstruída” que ficou no limite entre o lixo e a
obra-prima. Os olhos e ouvidos do mundo estão voltados para o espetáculo
desta noite em Florianópolis, decisivo para a carreira de Amy Winehouse
– ou ela dá a volta por cima, ou sua carreira acabou.
Bicicleta e pilates à parte, Amy garantiu para os camarins de seus
shows um bem municiado arsenal etílico: vinhos e champanhes franceses,
cervejas mexicanas e vodca russa, sua bebida preferida. E, ainda, mel e
gengibre para calibrar a voz e, por toda parte onde passar, até mesmo
dentro dos carros blindados, balinhas Haribo (aqueles ursinhos coloridos
de gelatina importados da Alemanha).
Há poucos dias, o tabloide inglês The Sun revelou a descoberta, numa
lata de lixo, de um caderno da cantora, espécie de diário do ano de
2001. Neste insólito achado – que poderia não passar de um factoide ou
hype promocional – o item mais curioso é a página “Quando eu assinar
contrato com uma gravadora”, que enumera seus desejos: “Comprar um
apartamento em Londres. Comprar um carro. Matricular-me numa academia. E
viver como a verdadeira estrela (bombshell) que sou”.
Não demorou muito para que esses – e muitos outros – desejos de Amy
se realizassem. Seu primeiro CD, Frank (2003), foi sucesso de crítica,
embora Amy o abominasse, alegando que não teve controle sobre o produto
final. Já o segundo CD, Back to Black (2006), produzido por Mark Ronson,
correspondeu ao que ela queria e foi um estouro: já vendeu 32 milhões
de cópias.
Filha de um taxista e de uma farmacêutica, judeus não-praticantes,
Amy Jade Winehouse cresceu na periferia norte de Londres. O pai gostava
de jazz e Sinatra (daí o Frank no título do primeiro CD), a avó foi
namorada do jazzista inglês Ronnie Scott; ela ouviu as divas Ella,
Billie, Sarah, mas se fixou no timbre metálico de Dinah Washington, de
quem faria covers perfeitas (“There Is No Greater Love”, “Teach Me
Tonight” e “Someone to Watch Over Me”).
Aos 9 anos foi estudar canto e teatro, mas, apesar de esbanjar
talento, a escola a expulsou por indisciplina. Aos 13, ganhou a primeira
guitarra e formou um duo, Sweet and Sour (ela era a amarga, claro). Um
namorado mandou uma fita demo que abriu o caminho para Amy entre agentes
e gravadoras, até assinar com a Island.
Sofreu um trauma de adolescência ao saber que o pai tinha outra
mulher, a dissolução da família provocou as primeiras mutilações,
pequenos cortes a faca. Desde cedo, a música e os sentimentos pessoais
caminharam juntos. Além de intérprete, Amy começou a compor canções,
exorcizando através delas todos os seus males.
O inferno pessoal de Amy começou para valer quando se apaixonou por
Blake Fielder-Civil, que a levou para as drogas pesadas. Foi uma relação
autodestrutiva, pontuada por brigas sangrentas e reconciliações
(chegaram a se casar em Miami), que só pesou negativamente na vida e
carreira de Amy – e até hoje não se sabe se o “vício” de Amy por Blake
(ela tem no peito uma tatuagem, Blake’s) foi superado.
Fala-se de uma recaída recente – o pai a teria flagrado na cama com o
ex – e de que ela gostaria de ter um filho de Blake. Sua canção Me and
Mr. Jones proclama: “Que ninguém se meta/ Entre mim e o meu homem”.
Cabalisticamente, o 27 pesa muito: foi com essa idade que morreram a
Santíssima Trindade dos Js (Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison),
Brian Jones, Alan Wilson, Kurt Cobain. É a idade que Amy terá até 14 de
setembro – muito chão ainda a percorrer.
Sua persona de palco única – cabelões em colmeia, tatuagens e
piercings, peitões de vamp e perninhas anoréxicas – está a serviço de
uma música poderosa e instigante: uma mistura de jazz, soul e hip-hop,
projetada por um vozeirão anasalado próximo do desespero.
Conforme postou um fã no You Tube, “ela irradia vulnerabilidade o
tempo todo – parece cantar à beira do abismo, é a beleza absoluta do
artista genuíno”. É esta Amy Winehouse que os brasileiros esperam ver ressuscitar a partir desta noite em Florianópolis.
Serviço:
Informações sobre as apresentações que Amy Winhehouse faz em
Florianópolis, Rio de Janeiro, Recife e São Paulo podem ser conseguidas
na internet: www.livepass.com.br
Fonte: GAZETA DO POVO (Curitiba)
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