Fabrícia Peixoto
A alta dos alimentos ao longo de
2010 fez a inflação no Brasil chegar ao seu maior patamar em seis anos,
mas foi entre os mais pobres que o aumento geral de preços ficou ainda
mais evidente.
Os brasileiros que recebem de um a seis salários
mínimos tiveram de enfrentar uma inflação de 6,47% no ano passado,
enquanto o índice oficial, que mede até 40 salários mínimos, ficou em
5,91%.
Com um orçamento apertado e comprometido com as
necessidades básicas, as classes de baixa renda encontram dificuldade em
substituir produtos e serviços cada vez mais caros, resultando em uma
inflação maior para essa parcela da população.
Itens importantes da mesa do brasileiro tiveram
uma alta expressiva em 2010: o feijão, por exemplo, ficou até 60% mais
caro, enquanto o preço da carne subiu 30%.
Segundo economistas, alimentos mais caros
costumam ter um efeito ainda “mais cruel” entre os mais pobres, que
dedicam uma maior parcela de sua renda a essa categoria.
“Nas classes mais baixas, a alimentação tem um
peso de até 40% na despesa total, enquanto entre os mais ricos esse peso
fica perto de 10%”, diz o economista Salomão Quadros, da Fundação
Getúlio Vargas (FGV-Rio).
No ano passado, o preço dos alimentos registrou
uma alta de 10,82% para os mais pobres, representando 3,20 pontos
percentuais de toda a inflação no período – o equivalente a metade do
índice.
“Quanto mais uma inflação é influenciada pela alta dos alimentos, mais vulneráveis ficam os pobres”, diz Quadros.
Escassez
Mesmo figurando entre os maiores produtores de
alimentos do mundo, o Brasil não ficou imune à alta dos alimentos que
vem atingindo vários países e chegou a um nível recorde em dezembro,
segundo as Nações Unidas.
O caso da carne, vilão da inflação brasileira no
ano passado, é um dos mais simbólicos: a produção está em alta no país,
mas ainda assim o produto está em escassez no mercado local, o que
pressiona seu preço para cima.
“Como os preços estão em alta no mercado
internacional, o produtor brasileiro ganha mais exportando a carne,
mesmo que isso resulte em estoques menores para o mercado interno”, diz a
economista Cornélia Nogueira, do Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
“É o mercado internacional afetando o poder de compra do consumidor de baixa renda no Brasil”, acrescenta.
Uma das regras do período de inflação alta, a
substituição de um produto por um similar também está “complicada” no
país, segundo Cornélia.
“Quando milhões de pessoas decidem substituir a
carne bovina por carne de frango, por exemplo, o frango também sobe”,
diz. “Ou seja, até mesmo os produtos considerados substitutos estão mais
caros”.
Renda
Na avaliação do economista da FGV-Rio, a
“sensação” de inflação no Brasil só não foi maior em função do alto
crescimento da renda e do desemprego em queda no país.
Se por um lado os mais pobres encontraram
produtos mais caros nas prateleiras no ano passado, eles também foram
beneficiados pelo crescimento da economia, que deve fechar o ano de 2010
acima de 7,5%, segundo estimativas.
“Os preços subiram, mas é preciso lembrar que os salários, de um modo geral, subiram ainda acima da inflação”, diz Quadros.
A situação deverá ser diferente este ano, na
avaliação do economista da FGV. Isso porque a inflação continuará em um
patamar elevado no país, com alta prevista de 5,3%, mas o crescimento da
economia dará uma “freada”.
“Teremos praticamente o mesmo nível de inflação
de 2010, mas com uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) ao redor de
4,5%”, diz.
“Aquela sensação de bem-estar produzida pelo consumo em alta certamente será menor”, acrescenta o economista.
Cornélia Ribeiro, do Dieese, lembra ainda que os
mais pobres, em geral, além de não terem “sobras” no orçamento, têm
menos acesso a investimentos financeiros.
“As classes mais altas podem aplicar dinheiro e,
dessa forma, não têm seu capital corroído pela inflação. Já o cidadão
de baixa renda geralmente não tem essa opção”, diz.
Fonte: BBC
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