Assim como a propaganda fideliza as crianças em relação às empresas, o ensino religioso produz o mesmo efeito em relação aos cultos.
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Clara Roman
Sem leis que regulamentem exclusivamente a publicidade infantil, anúncios para crianças pipocam na programação nas tevês brasileiras. Uma pesquisa recente do Instituto Alana, que monitorou 15 canais pouco antes do Dia das Crianças, constatou que 64% das propagandas são direcionadas para este público. O estudo focou em canais da TV aberta, como Globo, SBT, Bandeirantes e Record, e em canais da tevê fechada exclusivos para o público infantil, como Cartoon Network, Discovery Kids e Disney XD.
A empresa de brinquedos Mattel foi o destaque da pesquisa como a que mais anuncia para crianças. Em segundo lugar, a também multinacional Hasbro. A falta de legislação sobre o assunto permite que a publicidade infantil transcorra livremente. Mas, segundo o Instituto Alana, reclamações de pais são bastante comuns. O Conselho Nacional de Autoregulamentação Publicitária (CONAR) é financiado pelas próprias empresas e não tem caráter governamental.
“As empresas sabem que as crianças influenciam a compra”, afirma Gabriela Vuolo, do Instituto Alana. A lei nº 5921, de 2001, que tramita há dez anos sem aprovação, proíbe a publicidade e “comunicação mercadológica” dirigida ao público infantil. Dentre os argumentos contra a propaganda, está a falta de discernimento das crianças como espectadoras. Segundo Vuolo, até os 12 anos a pessoa ainda não entende qual é a intenção da publicidade. Até os oito, nem mesmo percebe o que faz parte da programação normal do canal.
A publicidade infantil, explica Vuolo, é interessante para as empresas porque fidelizam desde cedo as crianças aos seus produtos. “Ao mesmo tempo, a publicidade passa valores distorcidos, estimulando o consumismo e a ideia de que é necessário ter para ser alguém”, acrescenta.
Vencedora do prêmio-protesto “Empresa mais Manipuladora” do Alana, a Mattel manifestou que é uma companhia comprometida com o desenvolvimento infantil e acredita nos “benefícios do brincar”. Além disso, afirma que respeita a legislação brasileira e analisa as recomendações feitas pelo Conar. Para o Instituto Alana esse é justamente o problema.
Para as empresas, não há necessidade de infringir as leis, pois elas são suficientemente permissivas. O Conar, por sua vez, não mantém boas relações com o Instituto. No início do ano, o Alana enviou uma “denúncia” ao órgão contra uma campanha do McLanche Feliz veiculada durante o trailer de animação infantil “Rio”. A negativa do Conar veio acompanhada do veto do relator do processo com a seguinte frase: “Vale a fantasia de trocarmos o nome Instituto por outro mais característico – a bruxa Alana, que odeia criancinhas”. Desde então, o Alana deixou de enviar pedidos ao órgão de autoregulamentação.
O Alana questiona a validade do Conselho, com financiamento e participação de anunciantes, agências de publicidade e veículos de comunicação. O Conar, por sua vez, afirma que o Alana é uma entidade “que tem como grande objetivo na vida proibir publicidade para crianças e adolescentes, mas desconsidera a opinião dos pais e a educação familiar”, segundo a assessoria de imprensa.
Vuolo alerta para alguns perigos principais da publicidade. Uma questão ética permeia o debate, já que os anúncios estimulam o consumo inconsciente para um público que não tem a capacidade de fazer essa reflexão, contrariando o discurso em voga da sustentabilidade. Há também o estresse dos pais causado pelo “fator amolação”, quando as crianças infernizam os pais até que seus desejos sejam acatados. Os pais muitas vezes cedem, mesmo que isso signifique endividar-se depois.
“O pai fica numa situação de ‘Davi contra Golias’: a indústria diz que tem que comprar e joga para o pai a tarefa de dizer não”, explica ela. Há outros riscos como o estímulo à obesidade infantil. A maior parte das propagandas diz respeito a produtos com baixos valores nutricionais, com grandes quantidades de açúcar, sódio ou refrigerantes. Além disso, a publicidade pode incentivar a erotização precoce, como em um caso recente de uma marca de sutiãs que vendia peças com enchimento para meninas de 6 anos – com ilustrações do personagem “Sininho”, do filme “Peter Pan”. “A situação para as empresas é muito confortável. Mas as crianças acabam prejudicadas”, afirma Vuolo.
Fonte: CARTACAPITAL
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