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Advogado - Nascido em 1949, na Ilha de SC/BR - Ateu - Adepto do Humanismo e da Ecologia - Residente em Ratones - Florianópolis/SC/BR

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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

“Um estado implacável com os débeis, e débil com os poderosos, perverte o sentido da justiça, do direito e das leis. Alguém devia pensar sobre isso”.

Baltasar Garzón, de 56 anos, ficou conhecido como juiz de instrução (investigação) na Espanha por sua batalha em defesa dos direitos humanos e sua infatigável atuação contra os corruptos e corruptores.

Sempre foi admirado por sua conduta honrada, corajosa e de sucesso nas apurações e enfrentamentos.
Um brevíssimo resumo de sua atuação serve para demonstrar sua dedicação à causa da Justiça:
a) em 1998, Garzón desenvolveu a tese da jurisdição internacional em face da consumação de crimes contra a humanidade.
Trocando em miúdos: cidadãos espanhóis residentes no Chile tinham sido presos, torturados e mortos na ditadura de Augusto Pinochet.
Com base nessa tese da jurisdição internacional e não de territorialidade, Garzón instaurou um processo, decretou a prisão de Pinochet e pediu sua prisão ao governo da Inglaterra, onde estava o ex-ditador a passeio.
Resultado: Pinochet foi preso e ficou 8 meses em prisão domiciliar em solo britânico, cujas autoridades, por questões humanitárias (saúde frágil), determinaram sua volta ao país natal. Com medo de ser preso por Garzón ou outro cultor da tese da jurisdição internacional por violações a direitos da pessoa humana, o ex-secretário de Estado Henry Kissinger, envolvido na Operação Condor (desaparecimento de opositores às ditaduras na América Latina, incluído o Brasil),  não mais saiu de seu país. Suspendeu viagens e conferências. E nem a China quis visitar quando escrevia sobre a sua economia (o livro foi lançado há pouco).
b) Garzón, só com a força da toga, enfrentou o terrorismo fundamentalista da Al-Qaeda e o terrorismo separatista basco. Colocou na cadeia terrorista do ETA e chamou a organização de sanguinária e covarde. Fez o mesmo com Bin Laden.
c) em setembro de 2008, abriu processo para apurar o desaparecimento de cidadãos espanhóis durante a Guerra Civil (1936-1939), que levou o general Francisco Franco ao poder. Franco governou a Espanha de 1939 a 1975, quando da sua morte natural. Em outubro de 2008, localizou e ordenou a abertura de 19 fossas comuns e identificou corpos de fuzilados pelo regime franquista.
d) Em 2009, Garzón apurou o caso Gurtel, uma rede de corrupção na política partidária envolvendo integrantes do Partido Popular Espanhol, hoje no poder. Como tocou em políticos e pessoas poderosos, virou alvo de perseguição e acusações voltadas a afastá-lo a qualquer custo, e com humilhação, da judicatura.
No caso Gurtel, Garzón identificou corruptos e corruptores e havia suspeita de ligações deles com lavagem de dinheiro do ETA. No processo instaurado, Garzón determinou interceptações telefônicas num presídio entre os presos e seus advogados. Sua motivação: em defesa da segurança do Estado sob grave risco.  Sob o argumento de que a legislação espanhola apenas admite  interceptações de colóquios de advogados em caso de grave risco do Estado e isso se reduz ao caso de terrorismo, instaurou-se um processo disciplinar contra Garzón em 2010.
Nesse processo disciplinar, a Suprema Corte da Espanha, na última quarta-feira (8), condenou Garzón com a pena de afastamento da Magistratura por 11 anos. Mais ainda, afirmou ter ele usado método de regimes autoritários. A decisão da Suprema Corte da Espanha será atacada por recurso a ser interposto junto à Corte de Justiça da União Europeia.
Pano rápido. Garzón não vai pendurar a toga. Continuará a atuar como procurador adjunto no Tribunal Penal Internacional (TPI), sediado na holandesa Haia e criado em 1998 pelo Tratado de Roma. O TPI, como se sabe, tem competência para julgar os processos instaurados por crimes contra a humanidade, genocídios e crimes de guerra. Garzón está no TPI desde 2010, pouco antes de ser afastado cautelarmente da Magistratura espanhola. Sua condenação foi política, numa Magistratura dividida entre conservadores e progressistas. Tudo sob pressão do Partido Popular Espanhol e toda a direita franquista que o apoia no poder.
Como se está dizendo na Europa e repetiu em editorial o prestigiado The New York Times, a sentença que condenou Garzón tem a marca da indignidade.
http://cbn.globoradio.globo.com/comentaristas/walter-maierovitch/2012/02/13/UMA-SENTENCA-INDIGNA.htm

Wálter Fanganiello Maierovitch, para PORTAL TERRA

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O GARROTE VIL CONTRA GARZÓN


(JB) - Quando o mais alto tribunal da Espanha decide expulsar da magistratura o juiz Baltasar Garzón, pelo fato de haver, a pedido da polícia, e de acordo com manifestação oficial do Ministério Público, ordenado a escuta das conversas entre empresários corruptores e corruptos - a fim de impedir a continuidade dos delitos - é preciso ir além dos autos.
        Acusa-se o magistrado espanhol de obsessiva atuação contra o crime organizado. Embora a extrema-direita se alinhe contra sua decisão de investigar os crimes do franquismo, ninguém ousou acusá-lo de servir a essa ou àquela convicção ideológica, ou a esse ou àquele partido político: ele atuou bravamente contra o terrorismo de direita, e contra os atos de violência do separatismo basco; decidiu investigar o terror do fascismo espanhol, a fim de assegurar aos descendentes das vítimas do totalitarismo espanhol o direito de conhecer a história de seus pais e avós; obteve vitória jurídica internacional pioneira, ao conseguir a prisão de Pinochet, na Inglaterra, ao acusá-lo de haver cometido crime contra um cidadão espanhol, no Chile. Acima de tudo, era um tenaz perseguidor dos ladrões do Erário.
        Mesmo a um leigo, como o colunista, a leitura das 70 laudas da sentença não convence de que - nesse episódio das escutas no conhecido caso Gurtel - o magistrado tenha violado o Código Penal Espanhol, nos artigos em que se apoiaram seus juízes, sobretudo  o artigo 446, 3º, em que se ancorou a decisão.  
        É de tal ousadia, e violação do senso comum, a sentença do mais elevado tribunal da Espanha, para que nela não se veja novo sinal de alarme na Europa.
O totalitarismo está de volta. Na Espanha não há mais dois partidos políticos majoritários, mas, sim  – e de acordo com a óbvia dedução de cidadãos que se manifestam pela internet – a fusão da direita e da esquerda em um PPSOE, junção do PP, resíduo do franquismo, ao derrotado PSOE, que desonra seus grandes fundadores, entre eles o lendário Pablo Iglésias.
        A reação à sentença, tanto da intelligentsia espanhola, como nas manifestações populares, são de perplexidade e espanto. Garzón repeliu a sentença e anunciou seu propósito de continuar lutando pelo reconhecimento de sua dignidade de juiz, ao recorrer ao Tribunal Constitucional. É a  instância que o pode socorrer.
         Escreve Garzón:
         “Esta sentença, sem razão jurídica, nem provas que a sustentem, elimina toda a possibilidade de que se investiguem a corrupção e seus delitos associados, abrindo espaços de impunidade, e contribui gravemente - no afã de acabar com um juiz em concreto - para ferir a independência dos juizes na Espanha”.  
             Mas, entre todas as opiniões, a mais sensata foi a da  senhora Mercedes Gallizo Llamas,  que foi  secretária geral e diretora das Instituições Penitenciárias da Espanha, quando ocorreram as escutas.
       Em artigo ontem publicado em EL Pais, ela faz uma análise da justiça espanhola que serve ao mundo inteiro, mas especialmente aos países herdeiros da tradição ibérica de injustiça:
             “Os cárceres estão habitados, em sua maioria,  pelas pessoas pobres”.  Como explica a autora do artigo, a maldade humana que existe em nossas sociedades não é punida proporcionalmente à gravidade dos delitos. Em suma: os pobres pagam, e os   ricos, não.
E continua:  
          “Faz muito tempo que todos os agentes policiais e jurídicos sabem que seria impossível a maior parte das operações de saqueio do dinheiro público, de fraudes contra a fazenda pública, de fuga de capitais a paraísos fiscais, de ocultação de bens, mediante testas-de-ferro, da lavagem de capitais, de corrupção dos responsáveis públicos, se não formasse parte dessas redes um entremeado técnico-legal que lhes dá cobertura, que obtém suculento benefício dessas operações, e que, em certos casos, acaba se situando na cúpula dessas atividades criminosas -  e que se jacta de sua influência em todos os níveis da justiça”.
         Afirma, em seguida, que a condenação de Garzón santifica as regras de um jogo repugnante, o da utilização dos princípios do Estado de Direito, para blindar, até o infinito, a cobertura legal da delinqüência organizada em alto vôo.
         “Quando um imputado recebe, na prisão, a visita diária de uma corte de advogados de honorários milionários, a maior parte dos quais não se relaciona formalmente com sua causa, sem limite de tempo, sem controle de suas atividades reais, há quem queira pensar que se assessoram para sua melhor defesa. Alguns não acreditam nisso e resolvem investigar. Não há muitos que se atrevam a fazê-lo. Quase ninguém. A partir de hoje, menos ainda.
        E conclui:
         “Um estado implacável com os débeis,  e débil com os poderosos, perverte o sentido da justiça, do direito e das leis. Alguém devia pensar sobre isso”.
         
Alguém deve pensar sobre isso, e não só em Madri que, ontem, para lembrar o belo conto de Hemingway, foi a capital do mundo. No mundo em que as comunicações derrubam as fronteiras, para o mal e para o bem, a sentença que condenou o juiz Garzón – e que equivale, em seus efeitos civis, a uma simbólica execução por meio de garrote vil – é  assustador sinal de alarme.
A Justiça perde os seus últimos e frágeis liames com o sentimento ético do homem e o sistema democrático. Se não há  ética na justiça, todos os crimes são consentidos, toda a opressão é permitida, todos os absurdos passam a ser naturais e subvertem a  lógica da vida em comum. Enfim, a farsa substitui a lei e a idéia de justiça – e Themis se vende no mercado.
 
Fonte: Blog MAURO SANTAYANA

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