70040778706
Comarca de Camaquã
31-03-2011
Elaine Harzheim Macedo
Comarca de Camaquã
31-03-2011
Elaine Harzheim Macedo
ação
de reintegração de posse.
Considerando
que a residência utilizada pelo réu varão foi concedida, como comodato,
para sua residência e de sua família enquanto fosse ministro da igreja
localizada no mesmo terreno. e que na atualidade não
é ele mais o pastor daquela unidade religiosa, resta configurada
a agressão à posse indireta da parte autora, legitimando a ação
de reintegração e a sua procedência, ao efeito de se consolidar a
posse plena nas mãos da autora.
Questões
internas entre o ex-pastor e a congregação religiosa não são objeto
da lide possessória, devendo ser resolvidas no
âmbito administrativo da entidade ou, se for o caso, em ação própria.
APELAÇÃO
DESPROVIDA.
Apelação Cível | Décima Sétima Câmara Cível |
Nº 70040778706 | Comarca de Camaquã |
ADAIL JOAO ZIERO | APELANTE |
UNIAO DAS ASSEMBLEIAS DE DEUS | APELADO |
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam as Desembargadoras integrantes da Décima
Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade,
em desprover o apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária
(Presidente), as eminentes Senhoras Des.ª
Bernadete Coutinho Friedrich e Des.ª
Liége Puricelli Pires.
Porto Alegre, 31 de março de 2011.
DES.ª
ELAINE HARZHEIM MACEDO,
Relatora.
RELATÓRIO
Des.ª
Elaine Harzheim Macedo (RELATORA)
Cuida-se de ação de reintegração de posse,
ajuizada por UNIAO DAS ASSEMBLEIAS DE DEUS em face de ADAIL
JOAO ZIERO. Narrou a autora ser proprietária de imóvel, com a
edificação de um prédio destinado à igreja e, aos fundos, de uma
casa, que foram construídos pela própria demandante, servindo a moradia
aos ministros da comunidade religiosa. Relatou que o requerido, após
afastar-se da agremiação pastoral, invadiu a referida residência
e passou a residir no local, quando afastado de suas funções ministeriais.
Afirmou que houve tentativa de conciliação, havendo, inclusive, uma
proposta para que o demandado se mudasse do local para uma outra residência
a ser fornecida pela autora. Asseverou que houve o aceite de tal acordo,
mas jamais ocorreu sua efetivação, porquanto o réu se recusou a deixar
a moradia. Salientou que a partir de então, com a continuidade da ocupação
irregular, sem qualquer anuência da proprietária, tornou-se a posse
injusta. Requereu, liminarmente, seja reintegrada na posse da referida
casa. Pediu a procedência do feito. Acostou documentos (fls. 05/29).
Realizada audiência preliminar, o pleito liminar
restou indeferido (fls. 36/38).
O réu contestou (fls. 39/49), arguindo em preliminar
a nulidade do processo em face da ausência de citação de JOVELINA
ZIERO, cônjuge do demandado, a qual se faz imperativa, diante do litisconsórcio
necessário. No que tange ao mérito, aduziu que, diferentemente do
narrado na exordial, passou a residir na casa aos fundos da Igreja no
ano de 1986, quando assumiu como seu pastor. Afirmou que, no ano de
2006, residiu em imóvel diverso, bancado pela própria instituição
religiosa, mas que em momento algum desocupou a casa em litígio, sendo
que o réu ou seus familiares pernoitavam no local, continuamente zelando
pela propriedade. Referiu que adoeceu no ano de 2007, e, em razão de
sua enfermidade, não pôde mais trabalhar. Relatou que durante o período
de sua licença fora substituído, mas que, inclusive, ambos os pastores
que atuaram em sua ausência não utilizaram as dependências aos fundos
da Igreja. Em decorrência de sua doença, a instituição religiosa
cessou o pagamento dos locativos, razão pela qual voltou a residir
exclusivamente na casa objeto do litígio. Depois de recuperado de sua
enfermidade, pretendia reassumir seu ministério, uma vez que, de acordo
com a ata que o licenciava, tratava-se de medida provisória, restando
surpreso ao receber notícia que fora dispensado. Explicou que, a fim
de dirimir o impasse houve a promessa da entrega de uma casa ao requerido,
promessa essa que, no entanto, jamais restou cumprida. Ressaltou que
ainda goza da condição de ministro religioso titular, tendo, destarte,
direito a usufruir à residência litigada. Salienta, por fim, que se
trata de posse justa, ao contrário do que tenta fazer crer a parte
adversa, e não precária. Requereu a improcedência dos pedidos esposados
na inicial. Subsidiariamente, solicitou o reconhecimento da exceção
de contrato não cumprido, garantindo-se ao demandado o direito de retenção
do bem até que lhe seja disponibilizado imóvel prometido ou quantia
equivalente. Pediu lhe seja concedido o benefício da AJG. Juntou documentos
(fls. 50/61).
Houve réplica (fls. 63/65).
Determinada a citação da mulher do réu
às fls. 71 e 71v, sobreveio contestação (fls. 75/76), fundamentalmente
aderindo aos termos da manifestação protocolada por seu cônjuge.
Acostou documentos (fls. 78/105).
Réplica à contestação da corré
às fls. 107 e 108.
Saneado o feito (fls. 109/110), houve delimitação
da matéria controvertida e determinação da produção de prova oral.
Realizada audiência de instrução (fls. 129
/143).
Apresentados memoriais escritos pelo requerido
(156 – 163).
Sobreveio sentença, a qual julgou procedente
o pleito, porquanto entendeu tratar-se de posse decorrente do cumprimento
ao dever de zelo. Nesta senda, reintegrou a parte autora na posse do
imóvel litigado, bem como condenou o réu ao pagamento das custas processuais
e honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00, suspensa a exigibilidade
já que deferida a gratuidade pleiteada.
Irresignado o demandado apelou. Em suas razões
(fls. 170/ 178) refutou a fundamentação sentencial no que tange ao
argumento de que seria mero detentor do bem litigado, salientando ser
fato confesso de que o imóvel é disponibilizado pela igreja aos seus
ministros por cessão em comodato, não podendo se falar, destarte,
em detenção. Alegou erro no julgado, ainda, no que tange à constatação
de que o requerido não mais é Pastor, uma vez que jamais incorreu
em qualquer das faltas previstas no Estatuto que poderiam incidir em
afastamento da atividade, sendo ainda, dessa maneira, o ministro religioso
titular da Igreja, já que jamais fora agastado do cargo. Asseverou
a inocorrência de esbulho uma vez que quando do retorno à residência
permanecia na condição de pastor. Salientou a existência de comodato,
ignorado pela sentença, o qual perdura enquanto o contrato estiver
em vigência, e que lhe permite se opor à pretensão da autora. Guerreou
a decisão do magistrado a quo, ainda, no que tange ao posicionamento
de não conhecer da discussão acerca da obrigatoriedade da demandada
fornecer moradia ao requerido, porquanto ultrapassaria a delimitação
da matéria controvertida. Disse ser referido debate essencial ao desfecho
da lide, uma vez que intimamente relacionado com a posse e eventual
desocupação do imóvel. Requereu o reconhecimento de sua posse sobre
o imóvel, e não a mera detenção; o direito de permanecia no mesmo
diante de sua condição de pastor em decorrência de contrato ainda
vigente, ou, subsidiariamente, pela falta de denúncia do comodato;
a improcedência, na íntegra, da ação proposta. No caso de decisão
diversa, pleiteia seja concedido o direito de retenção da moradia
até o fornecimento da casa prometida.
Com as contrarrazões (fls. 183 – 187), subiram
os autos, conclusos, a esta Corte para julgamento.
Registra-se que foi observado o disposto nos
artigos 549, 551 e 552 do CPC, tendo em vista a adoção do sistema
informatizado.
É o relatório.
VOTOS
Des.ª
Elaine Harzheim Macedo (RELATORA)
O recurso não merece provimento, navegando sobre
temas que não são nem podem ser objeto da presente demanda.
A relação entre o ora apelante varão e a autora
e seus eventuais conflitos é tema que deve ser resolvido interna
corporis, cuidando-se de matéria de discricionariedade da congregação
religiosa, a ser composta por seus estatutos, não abarcada pela jurisdição
civil. Se, eventualmente, o apelante entender que restou prejudicado
em direitos subjetivos dos quais se vê como titular, por certo não
lhe será negada a via judicial, base no art. 5º, inciso XXXV, da CF,
mas trata-se, ainda assim, de demanda que requer sede própria, não
se mostrando a via possessória adequada para tanto.
Nos limites da lide posta e da definição da
coisa litigiosa, o que importa saber é se a autora era possuidora da
casa localizada aos fundos da igreja, em terreno de sua propriedade,
e se houve agressão a essa posse por ato praticado pelo apelante e
sua mulher.
Não há dúvida que a posse era exercida
pela autora. O fato é incontroverso. Os próprios recorrentes admitem
que receberam a posse da Igreja, ao efeito de atender a moradia do pastor,
função que o apelante varão exerceu no passado. Essa cessão ou comodato
provoca a natural divisão da posse, em princípio concentrada nas mãos
da entidade religiosa, passando a se constituir como posse direta a
ser exercida pelo pastor, e posse indireta, em pode da cedente ou comodante.
Legitima-se, pois, sob esse aspecto, a ação
proposta.
O segundo ponto é saber se Adail João
Ziero é ainda pastor da igreja localizada no imóvel da rua General
Zeca Netto, a justificar a sua permanência no imóvel, na condição
de possuidor direto. Também é fato incontroverso, seja porque
efetivamente provado pelas testemunhas, seja porque admitido pelos apelantes,
justificando-se o ex-pastor no descumprimento, pela Igreja, do que fora
acertado ou do que lhe seria devido, já que segundo suas alegações
deixou de exercer suas funções porque acometido de doença e sob auxílio
doença junto ao instituto previdenciário.
O fato é que não importam as razões pelas
quais Adail não é mais pastor, mas sim a circunstância
de que Adail não mais ministra a Igreja onde está localizada
a casa em que permanece residindo com sua família, o que também legitima
a autora a se ver reintegrada na posse do imóvel, dando-lhe o destino
para o qual foi construído: moradia do pastor da igreja.
Assim, a resistência dos recorrentes em liberar
a casa configura descumprimento ao que constitui obrigação ínsita
ao empréstimo de coisa infungível: o mesmo se esgota em razão da
finalidade atingida. O réu varão só poderia exercer a posse da residência,
de forma lícita e legítima, enquanto fosse ministro da igreja localizada
no mesmo terreno. Não mais sendo, configurada a agressão à posse
indireta da autora.
As demais questões postas, como já dito,
extrapolam os limites da presente demanda, nada influenciando no julgamento
da causa.
Ante o exposto, com fundamento no art. 927, do
CPC, nega-se provimento ao apelo, mantendo-se a bem lançada sentença
vergastada.
Des.ª
Bernadete Coutinho Friedrich (REVISORA) - De acordo com a Relatora.
Des.ª
Liége Puricelli Pires - De acordo com a Relatora.
DES.ª
ELAINE HARZHEIM MACEDO - Presidente - Apelação Cível nº 70040778706,
Comarca de Camaquã: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º
Grau: LUIS OTAVIO BRAGA SCHUCH
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