RIO - O chá de cadeira, uma provação quase obrigatória nas antessalas
de consultórios médicos, ganhou mais um endereço. Agora, ele acontece
também perto do telefone: basta tentar marcar uma consulta, com a
carteirinha do plano de saúde nas mãos, para se deparar com uma longa
espera, que, dependendo da especialidade e do profissional escolhido,
pode chegar a seis meses. Para ter uma ideia do problema, repórteres do
GLOBO telefonaram, semana passada, para 50 médicos do Rio de Janeiro,
todos credenciados pelas principais operadoras do país, para perguntar
qual o primeiro horário disponível para atendimento. Foram escolhidos,
de forma aleatória, consultórios de diversos bairros, como Barra da
Tijuca, Centro, Copacabana, Ipanema, Botafogo, Tijuca e Méier, e,
independentemente do endereço, o resultado foi pouco animador.
Planos se popularizam com rede credenciada igual
Somente
seis dos 50 doutores, de áreas tão diferentes quanto ginecologia,
clínica médica, pediatria, angiologia, otorrinolaringologia, entre
outras especialidades, tinham vaga para a mesma semana. Se forem
contabilizados sete dias úteis, a situação melhora um pouco: 15 médicos
poderiam atender. Pediatria e clínica geral foram as especialidades com
demora maior. Um clínico com consultório na Tijuca, que atende às
sextas-feiras, da manhã ao fim da tarde, só tinha disponibilidade para o
dia 7 de dezembro, seis meses e cinco dias depois da tentativa de
marcação de consulta. Dos 11 pediatras consultados, quatro tinham
horário em até sete dias úteis. O restante podia oferecer atendimento em
prazos que variavam de nove a 47 dias úteis.
Para
a presidente do Conselho Regional de Medicina, Márcia Rosa de Araújo, a
culpa está longe de ser dos médicos. Para ela, a demora na marcação —
um problema que antes só afetava quem dependia do sistema público de
saúde — é resultado de uma conta desigual: enquanto os planos de saúde
ganham cada vez mais clientes ( no ano passado, o crescimento do setor
ficou em 10%), a rede credenciada não cresce na mesma proporção.
—
Com a ascensão das classes C e D, os planos têm cada vez mais clientes,
mas não aumentam o time de médicos credenciados. As operadoras lucram
mais, só que continuam oferecendo o mesmo número de consultas e exames —
diz Márcia.
Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar
mostram que, em setembro de 2007, havia no Estado do Rio 4.559.325
pessoas com plano de saúde. Em dezembro do ano passado, já eram
6.032.586. A agência não informou os dados sobre a rede credenciada, mas
Márcia calcula que ela esteja estagnada em cerca de 15 mil médicos, que
recebem dos planos no máximo R$ 62 por consulta.
A presidente do
Cremerj lembra que o sofrimento não é somente dos pacientes. Os médicos
também encontram dificuldades para trabalhar:
— Eu sou cirurgiã
plástica. Se, semana que vem, abrir espaço na minha agenda e eu quiser
operar um paciente, dificilmente vou conseguir um hospital. Os planos de
saúde represam o número de atendimentos para ter total controle dos
custos — lamenta.
Segundo Márcia, tem sido uma dificuldade credenciar médicos novos.
—
Os recém-formados não conseguem entrar. E, para piorar, agora os planos
exigem que o médico credenciado seja pessoa jurídica para que a
operadora pague menos impostos.
A choradeira da categoria é
acompanhada pela dos pacientes. Repórteres do GLOBO foram, na semana
passada, para a porta de um centro médico, em Botafogo, conversar com
quem saía de consultas. Nádia Ferreira, por exemplo, reclamou por ter
levado dois meses e meio para conseguir marcar uma consulta com sua
gastroenterologista. E apontou ainda outro problema.
— Tem médico
que tem duas agendas. Uma para o pessoal do plano de saúde e outro para o
paciente particular. Adivinha qual anda mais rápido — disse Nádia. — Às
vezes, é tão difícil que você acaba desistindo se os sintomas não forem
graves
Demora na marcação atrasa diagnóstico
Rosane
Albuquerque, que tentou marcar uma consulta para a filha, com problemas
na tireoide, só encontrou vaga na endocrinologista que ela queria para o
fim de agosto. Os exames que a adolescente precisa fazer são outro
capítulo da novela, que começou em fevereiro:
— Até agora não
conseguimos fechar o diagnóstico. Para marcar um exame, levei quase um
mês. O resultado veio 35 dias depois. Agora, para conseguir consulta, é
outro problema. Quanto tempo vai demorar?
Repórteres do GLOBO
tentaram marcar em duas clínicas de radiologia exames de raios-X simples
(do tórax e dos seios da face). Só conseguiram para 17 dias e 11 dias
úteis depois do telefonema — um prazo em que uma gripe pode virar
pneumonia. Em casos como estes, o paciente deve botar a boca no
trombone. Uma resolução da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS),
publicada em dezembro do ano passado, estipulou prazos máximos para que
as operadoras garantam aos seus clientes atendimento em consultas,
exames e cirurgias. Isso quer dizer que se um paciente tentar marcar um
exame cujo prazo máximo para espera é de dez dias, como os de raios-X, e
for informado que só há vaga, em todos os credenciados, para dali a
dois meses, deve procurar o seu plano de saúde, que é obrigado a dar uma
solução. Se o consumidor não for atendido deve, com o número de
protocolo de atendimento do plano, procurar a ANS (telefone
0800-701-9656), que pode multar a operadora.
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