Duas ásperas tragédias assombram a Bahia neste ano da graça de
2012: a seca e a indiferença. Enquanto a estiagem cresce de modo
exponencial, as manifestações de solidariedade praticamente inexistem. O
silêncio dos mais diversos setores sociais é inversamente proporcional
aos assustadores dados relacionados ao flagelo. Para que se tenha uma
ideia concreta, de janeiro até o final de maio, o número de municípios
em situação de emergência saltou de 43 para 244, atingindo mais de dois
milhões e 700 mil baianos que penam no castigado semiárido. No entanto,
apesar de tantas e tamanhas dores, não existiu uma mísera campanha de
mobilização para amenizar tais efeitos. Nem mesmo o apelo financeiro,
fala-se em mais de R$ 100 milhões de prejuízo, tem conseguido atrair o
interesse das almas benevolentes.
Os sociólogos de bodega podem argumentar, não sem razão, que tais
movimentações nunca vão resolver os ancestrais problemas da seca. É
fato. Eles podem dizer também, do alto de suas sábias negligências, que
são necessárias políticas permanentes para a convivência com a estiagem.
Perfeito. De barriga cheia, é fácil teorizar sobre a fome alheia.
O problema, amigos de infortúnios, é que, na falta das fundamentais e
efetivas ações dos governos, que demoram mais de chegar do que a chuva,
os atos solidários sempre desempenharam um papel fundamental para
abrandar o perverso quadro. No entanto, neste ano da graça de 2012, nem
isso. A Bahia, repito, tem sido vítima de duas ásperas tragédias: a seca
e a indiferença.
Nunca antes na história deste país se viu tamanho descaso. As redes
de TV, que normalmente estão a postos para faturar com as lágrimas
alheias, não esboçaram, até este momento, qualquer campanha para
sensibilizar a população. As igrejas, idem. Até mesmo as novidadeiras
redes sociais, sempre tão afoitas para abraçar causas comoventes,
permanecem num estranho mutismo diante de tão grave e urgente questão.
Não houve sequer um mísero jogo beneficente.
O que explica tamanho desinteresse? Francamente, desconheço. Aliás,
pior. Não compreendo. O alheamento é tanto e tamanho que atinge a todos
nós. A seca não está em nossas pautas ou prioridades, nem mesmo como
catarse. Nos bares, becos, vielas e ladeiras desta província lambuzada
de dendê o tema não existe. É como se alguma mão divina (ou maligna)
tivesse colocado a problemática no index prohibitorum, numa espécie de
macabro pacto de alheamento.
Nas poucas vezes em que o debate tangenciou, digamos assim, a questão
da redução de danos da seca foi para saber se as prefeituras deveriam
ou não realizar carnaval fora de época ou se seria moralmente legítimo
se contratar milionários cantores de axé, travestidos de forrozeiros
para os festejos juninos.
Ah, sim. Não pensem que faço estes lamentos com o distanciamento
brechtiano. Não e nécaras. Este omisso sertanejo que ora sopra estas
denúncias também estava sedado pela apatia. Só me atentei para a falta
de ações, inclusive minha, porque na manhã desta sexta-feira (1), vi a
notícia de que a União dos Municípios da Bahia (UPB) lançou a campanha
“Seca na Bahia. Solidariedade, já!”.
Ato contínuo, fui me inteirar da campanha da UPB e já vi pessoas
dizendo que é exploração política, que o presidente da instituição é
candidato em 2014 e que os atos são paliativos. OK. Vale apurar tudo.
Contudo vale também, e muito, que gastemos nossas energias não apenas
denunciando outrem, mas também batalhando por mais campanhas solidárias
nestes tempos temerários.
Amém?
Franciel Cruz é jornalista
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