Famílias pedem investigação de supostos roubos de bebês durante regime franquista
Mais de 30 mil crianças podem ter sido sequestradas
Centenas de famílias estiveram reunidas em Madri nesta
terça-feira (04/01) para pedir uma investigação acerca de supostos
roubos de bebês, que teriam ocorrido durante o regime do general
Francisco Franco (1939-1975).
Durante uma manifestação na praça Puerta Del Sol, um dos principais
pontos turísticos da capital espanhola, as famílias soltaram centenas de
balões para homenagear as crianças que teriam sido separadas de suas
famílias durante o regime franquista.
Milhares de crianças roubadas
Os manifestantes acreditam que o regime franquista capturou os bebês na década de 1960 e que, portanto, seus filhos ou parentes não morreram, como alegaram os médicos na época, mas foram entregues a pessoas que apoiavam o governo do general.
Os balões soltos pelos familiares levavam o nome das crianças
declaradas como mortas, por causas naturais, pelos funcionários dos
hospitais onde os nascimentos ocorreram.
As
suspeitas sobre o desaparecimento das crianças ganharam repercussão
depois da transmissão de um documentário da televisão catalã e de
investigações do juiz Baltasar Garzón. Num relatório divulgado há dois
anos, Garzón estima que haja mais de 30 mil casos envolvendo crianças
roubadas.
Depois da sangrenta guerra civil na Espanha, instituições
governamentais e religiosas passaram a usar um decreto de 1940 para
obter a guarda de crianças que estavam com a "educação moral" ameaçada
– em outras palavras, crianças que pertenciam a famílias opositoras ao
regime.
Durante as décadas de 1940 e 1950, o Estado manteve a custódia de
mais de 30 mil bebês e, de acordo com as denúncias, esses bebês teriam
tido seus nomes trocados e teriam sido adotados por pessoas que apoiavam
o franquismo.
"Pacientes enganados por médicos"
Uma das organizadoras da manifestação em Madri, Mar Soriano, soltou
um balão cor de rosa com o nome Beatriz. "Beatriz era minha irmã que
nasceu na clínica O'Donnell no dia 3 de janeiro de 1964, em Madri",
relata a espanhola. Ela afirma que Beatriz foi vendida a uma família sem
filhos e apoiadora do regime.
"Médicos desonestos e parteiras enganaram mães e pais vulneráveis",
afirma o advogado Fernando Magan, que já tentou levar o caso à Justiça
espanhola várias vezes. "Os profissionais envolvidos nos casos apontaram
fatores naturais como causa das mortes e adulteraram os registros",
afirma Magan.
Soriano conta que o bebê nasceu saudável, mas foi levado dos braços
da mãe por funcionários do hospital, que retornaram três dias depois com
a notícia de que a criança havia falecido em decorrência de uma
infecção no ouvido, um problema que não é fatal.
De acordo com Soriano, os pais nunca viram o corpo do bebê. Segundo
ela, os funcionários do hospital apenas disseram que cuidariam de tudo.
Ainda conforme as denúncias, as crianças não teriam sido sequestradas
apenas em hospitais espanhóis, mas também em outras localidades na
França, para onde os militantes de esquerda haviam fugido depois da
guerra civil.
Túmulos vazios
A
suspeita de sequestros ganhou ainda mais força depois que algumas
famílias descobriram que muitos túmulos onde os bebês supostamente
haviam sido enterrados estavam, na verdade, vazios.
No interesse de uma transição suave para a democracia, os abusos
cometidos pelo regime franquista foram varridos para debaixo do tapete.
Embora a Espanha esteja lentamente apurando os abusos ocorridos no
regime, o Supremo Tribunal da Espanha se recusa a acatar as denúncias
trazidas pelas famílias sobre os roubos de crianças.
Em busca da verdade
A verdade é tudo o que espanhola Paloma, de pouco mais de 50
anos, gostaria de saber. A dona de casa integra a rede de 300 famílias
organizada por Soriano. Ela ainda espera descobrir o paradeiro de sua
filha.
"Dei à luz a uma bonita menina de 3,5 quilos, mas ela foi levada à
incubadora por funcionários do hospital logo depois do nascimento",
conta. De acordo com Paloma, a equipe do hospital disse que o bebê tinha
morrido após um ataque cardíaco, apesar dos registros médicos não
coincidirem com as características do bebê da dona de casa.
Paloma espera que os pais adotivos de sua filha tenham cuidado muito
bem do bebê e tenham dado a ela uma boa educação. Ela não pensa em ter a
filha de volta, mas gostaria de saber o que realmente aconteceu com o
bebê, para encerrar, enfim, suas dúvidas.
Autoras: Hazel Healy/Dayse Freitas
Revisao: Soraia Vilela
Fonte: DEUSTESCHE WELLE (ALEMANHA)
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